O Livro dos Espíritos

Em “Bezerra de Menezes – O Filme” lançado em 2008 nos principais cinemas nacionais existe uma cena bastante curiosa onde Bezerra, após receber um exemplar de presente de “O Livro dos Espíritos” de um amigo, encontra-se no Bonde em seu caminho de volta para sua residência, quando reflete: “Não hei de ir para o inferno por ler isto... Depois, é ridículo confessar-me ignorante desta filosofia, quando tenho estudado todas as escolas filosóficas. Pensando assim, abri o livro e prendi-me a ele, como acontecera com a Bíblia. Lia, mas não encontrava nada que fosse novo para meu Espírito. Entretanto, tudo aquilo era novo para mim!... Eu já tinha lido ou ouvido tudo o que se achava no "O Livro dos Espíritos". Preocupei- me seriamente com este fato maravilhoso e a mim mesmo dizia: parece que eu era espírita inconsciente, ou, mesmo como se diz vulgarmente, de nascença". Conta o filme que Bezerra teria passado do ponto onde deveria descer do bonde, tão entretido estava com a leitura deste livro.

O Livro dos Espíritos foi o primeiro livro editado por Allan Kardec sobre a Doutrina Espírita, em 18 de abril de 1.857. Foi estruturado por Kardec na forma de perguntas e respostas, totalizando 1.019 tópicos. As médiuns que contribuíram nesse trabalho foram inicialmente Caroline e Julie Boudin (respectivamente, 16 e 14 anos à época), às quais mais tarde se juntaram a Celine Japhet (18 anos à época) no processo de revisão do livro. Após o primeiro esboço, o método das perguntas e respostas foi submetido à comparação com as comunicações obtidas por outros médiuns franceses, totalizando em "mais de dez", nas palavras de Kardec, o número de médiuns cujos textos psicografados contribuíram para a estruturação de O Livro dos Espíritos.

Na Revista Espírita de janeiro de 1858, na página 63, Kardec nos explica que: “Esta não é uma doutrina pessoal: é o resultado do ensino direto dos próprios Espíritos sobre os mistérios do mundo onde estaremos um dia, e sobre todas as questões que interessam à Humanidade; eles nos dão, de algum modo, o código da vida, ao nos traçarem a rota da felicidade futura. Não sendo este livro fruto de nossas idéias, visto que, sobre muitos pontos importantes tínhamos uma maneira de ver bem diversa, nossa modéstia nada sofreria com os nossos elogios; preferimos, no entanto, deixar falar os que estão inteiramente desinteressados por esta questão.”

Na página 64....

O Editor Dentu acaba de publicar uma obra deveras notável; diríamos mesmo bastante curiosa, mas há coisas que repelem toda qualificação banal. O “Livro dos Espíritos”, do Sr. Allan Kardec, é uma página nova do grande livro do infinito, e estamos persuadidos de que um marcador assinalará essa página..... Não conhecemos absolutamente o autor, mas confessamos abertamente que ficaríamos felizes em conhecê-lo. Aquele que escreveu a introdução que inicia “O Livro dos Espíritos” deve ter a alma aberta a todos os sentimentos nobres.....A todos os deserdados da Terra, a todos os que caminham e caem, regando com suas lágrimas o pó da estrada, diremos: Lede “O Livro dos Espíritos”; isso vos tornará mais fortes. Também aos felizes, aos que pelos caminhos só encontram os aplausos da multidão ou os sorrisos da fortuna, diremos: Estudai-o; ele vos tornará melhores.

. Na página 65....

O corpo da obra, diz o Sr. Allan Kardec, deve ser reivindicado inteiramente pelos Espíritos que o ditaram. Está admiravelmente classificado por perguntas e por respostas. Algumas vezes, estas últimas são sublimes, e isto não nos surpreende; mas, não foi preciso um grande mérito a quem as soube provocar?

....A doutrina se resume em duas palavras: “Não façais aos outros o que não quereríeis que vos fizessem.” Lamentamos que o Sr. Allan Kardec não tenha acrescentado: “e fazei aos outros o que gostaríeis que vos fosse feito.” O livro, aliás, o diz claramente e a doutrina, sem isso não estaria completa. Não basta não fazer o mal; é preciso também fazer o bem. Se apenas sois um homem de bem, não tereis cumprido senão a metade do vosso dever.......

Sois homens de estudo e possuís a boa-fé, que não pede senão para se instruir? Lede o Livro Primeiro sobre a Doutrina Espírita. Estais colocado na classe dos que só se ocupam consigo mesmo e que, como se diz, fazem os seus pequenos negócios muito tranqüilamente, nada vendo além dos próprios interesses? Lede as “Leis Morais”. A desgraça vos persegue com furor, e a dúvida vos envolve, por vezes, com o seu abraço gelado? Estudai o Livro Terceiro: “Esperanças e Consolações”.

Todos vós que abrigais nobres pensamentos no coração e que acreditais no bem, lede o livro do começo ao fim. Se alguém nele encontrasse matéria para zombaria, nós o lamentaríamos sinceramente.  G. du Charland

Na Revista Espírita de setembro de 1862 Kardec relata a história do leitor que desistiu do suicídio após ler O Livro dos Espíritos: Ah! Senhor! Não sei se alguém jamais poderá fazer uma idéia do efeito sobre mim produzido pela leitura de O Livro dos Espíritos. Renasceu a confiança, o amor de Deus se me apoderou do coração e eu sentia como se um bálsamo divino se espalhasse em todo o meu ser. Ah! Dizia a mim mesmo, em toda a vida busquei a verdade e a justiça de Deus e não encontrei senão abusos e mentiras; e agora, na velhice, tenho a felicidade de encontrar essa verdade tão desejada. Que mudança em minha situação que, de tão triste, tornou-se tão ditosa!


O Livro dos Espíritos - - continuação

O professor Hippolyte Léon Denizard Rivail, após um dia de intensa atividade, relacionada à publicação da primeira edição de “O Livro dos Espíritos”, abre o seu caderno de memórias e faz a seguinte anotação: “Hoje, finalmente, 18 de abril de 1.857, posso dizer que lancei a público o trabalho mais importante da minha vida graças a enorme benefício que espalhará...”

Na Revista Espírita de junho de 1.865, Kardec explica: “Quando concebi a idéia de O Livro dos Espíritos, minha intenção era não me pôr em evidência e ficar desconhecido; mas, prontamente ultrapassado, isto não me foi possível: tive de renunciar aos meus gostos de insulamento, sob pena de abdicar da obra empreendida e que crescia prodigiosamente; foi preciso seguir seu impulso e tomar-lhe as rédeas. Se meu nome tem agora alguma popularidade, seguramente não fui eu que o procurei, pois é notório que nem a devo à propaganda, nem à camaradagem da imprensa, e que jamais aproveitei de minha posição e de minhas relações para me lançar no mundo, quando isto me teria sido fácil..... Com o fruto de minhas vigílias que provi, pelo menos em maior parte, às necessidades materiais do estabelecimento da Doutrina....No começo eu lamentava que minha pouca fortuna não me permitisse fazer o que queria fazer pelo bem da causa; hoje aí vejo o dedo da Providência e a realização dessa predição tantas vezes repetida pelos bons Espíritos: Não te inquietes com coisa alguma; Deus sabe o que te é preciso e saberá provê-lo.”

Existe ainda um episódio histórico bastante curioso que envolve “O Livro dos Espíritos”. Em 1861, Lachâtre que vivia em Barcelona, encomenda 300 volumes de obras espíritas, dentre as quais O Livro dos Espíritos. Os livros são apreendidos pelo bispo local, num episódio que ficou conhecido como “Auto-de-fé de Barcelona”. Em 1º. de maio de 1.864 a Igreja Romana coloca a obra no “Index” - o catálogo das obras cuja leitura é vedada aos seus fiéis.

Na Revista Espírita de Setembro de 1.861, Kardec publica detalhes sobre o episódio que ficou conhecido por “O Auto da Fé de Barcelona”: Em 09/10/1861, na esplanada da cidade de Barcelona (lugar onde eram executados os criminosos condenados ao último suplício, e por ordem do bispo daquela cidade), foram queimados 300 volumes e brochuras sobre o Espiritismo, entre eles, a Revista Espírita, O Livro dos Espíritos e O Livro dos Médiuns. Quando o fogo consumiu os trezentos volumes o sacerdote e seus ajudantes se retiraram cobertos pelas vaias de numerosos assistentes, que gritavam: Abaixo a Inquisição! Em seguida várias pessoas se aproximaram da fogueira e recolheram as suas cinzas. Uma parte das cinzas nos foi enviada. Ali se encontra um fragmento de O Livro dos Espíritos, consumido pela metade. Nós o conservamos preciosamente, como autêntico testemunho desse ato de insensatez.

Vamos então, conhecer com um pouco mais de detalhes o conteúdo desta obra.....

Já na sua introdução no item “1 – Palavras Novas”, Kardec diz: “Para designar coisas novas são necessárias palavras novas.”

Interessante lembrar que a Revista Espírita de Janeiro de 1.858, nas páginas 30 a 33 traz um artigo escrito por Kardec, denominado “ Diferentes Modos de Comunicação”. Diz, em resumo, Kardec:

      As comunicações inteligentes entre os Espíritos e os homens pode ocorrer por meio de sinais, pela escrita e pela palavra.

      Os sinais consistem no movimento significativo de certos objetos e, frequentemente, no ruídos ou golpes desferidos....De todos esses objetos, por serem os mais cômodos, pela mobilidade e facilidade com que nos colocamos à sua volta, as mesas são os mais frequentemente utilizados: daí a designação do fenômeno em geral pelas expressões bastante trivais de “mesas falantes” e de “dança das mesas”, expressões que convém banir, primeiro porque se prestam ao ridículo, depois porque podem induzir ao erro, fazendo crer, neste particular, que elas tenham uma influência especial.

Kardec continua:

      “A este modo de comunicação daremos o nome de “sematologia espírita”, expressão que dá uma perfeita idéia e compreende todas as variedades de comunicações por meio de sinais, movimentos dos corpos ou pancadas. Um de nossos correspondentes chegou mesmo a propor-nos que se designasse especialmente este último meio, o das pancadas, pela palavra “tiptologia”.

      Observem que Kardec tinha um extremo cuidado na escolha das palavras e definições da Doutrina Espírita. Note-se também que embora ele, humildimente, não atribui-se a sua autoria a muitas coisas, esse foi um dos papéis fundamentais do Codificador na elaboração da nova Doutrina que surgia naquele momento.

      O segundo modo de comunicação é a escrita. Designá-lo-emos sob o nome de “psicografia”, igualmente empregado por um correspondente.

      Nos casos em que a escrita é obtida por um movimento involuntário das mãos do médium, quase febril; tomam o lápis, malgrado seu, e o deixam do mesmo modo; nem a vontade, nem o desejo podem fazê-la prosseguir, caso não o deva fazer. É a “psicografia direta”.

      Quanto a escrita é obtida somente pela imposição das mãos sobre um objeto disposto de modo conveniente e munido de lapis ou qualquer outro instrumento apropriado a escrever e a força oculta que age sobre a pessoa transmite-se ao objeto, que se torna um apêndice da mão, imprimindo-lhe o movimento necessário para traçar os caracteres é denominada “ psicografia indireta”.

      As comunicações inteligentes entre os Espíritos e os homens pode ocorrer por meio de sinais, pela escrita e pela palavra.

      Os sinais consistem no movimento significativo de certos objetos e, frequentemente, no ruídos ou golpes desferidos....De todos esses objetos, por serem os mais cômodos, pela mobilidade e facilidade com que nos colocamos à sua volta, as mesas são os mais frequentemente utilizados: daí a designação do fenômeno em geral pelas expressões bastante trivais de “mesas falantes” e de “dança das mesas”, expressões que convém banir, primeiro porque se prestam ao ridículo, depois porque podem induzir ao erro, fazendo crer, neste particular, que elas tenham uma influência especial.

      “A este modo de comunicação daremos o nome de “sematologia espírita”, expressão que dá uma perfeita idéia e compreende todas as variedades de comunicações por meio de sinais, movimentos dos corpos ou pancadas. Um de nossos correspondentes chegou mesmo a propor-nos que se designasse especialmente este último meio, o das pancadas, pela palavra “tiptologia”.

      Observem que Kardec tinha um extremo cuidado na escolha das palavras e definições da Doutrina Espírita. Note-se também que embora ele, humildimente, não atribui-se a sua autoria a muitas coisas, esse foi um dos papéis fundamentais do Codificador na elaboração da nova Doutrina que surgia naquele momento.

      O segundo modo de comunicação é a escrita. Designá-lo-emos sob o nome de “psicografia”, igualmente empregado por um correspondente.

      Nos casos em que a escrita é obtida por um movimento involuntário das mãos do médium, quase febril; tomam o lápis, malgrado seu, e o deixam do mesmo modo; nem a vontade, nem o desejo podem fazê-la prosseguir, caso não o deva fazer. É a “psicografia direta”.

      Quanto a escrita é obtida somente pela imposição das mãos sobre um objeto disposto de modo conveniente e munido de lapis ou qualquer outro instrumento apropriado a escrever e a força oculta que age sobre a pessoa transmite-se ao objeto, que se torna um apêndice da mão, imprimindo-lhe o movimento necessário para traçar os caracteres é denominada “ psicografia indireta”.

      As comunicações inteligentes entre os Espíritos e os homens pode ocorrer por meio de sinais, pela escrita e pela palavra.

      Os sinais consistem no movimento significativo de certos objetos e, frequentemente, no ruídos ou golpes desferidos....De todos esses objetos, por serem os mais cômodos, pela mobilidade e facilidade com que nos colocamos à sua volta, as mesas são os mais frequentemente utilizados: daí a designação do fenômeno em geral pelas expressões bastante trivais de “mesas falantes” e de “dança das mesas”, expressões que convém banir, primeiro porque se prestam ao ridículo, depois porque podem induzir ao erro, fazendo crer, neste particular, que elas tenham uma influência especial.

      Os espíritos transmitem, por vezes, certas comunicações escritas sem intermédio direto. Os caracteres, neste caso, são traçados espontaneamente por um poder extra-humano, vísivel ou invisível. Daremos a esse modo de comunicação escrita o de “espiritografia”, para distinguí-lo de “psicografia”, ou escrita obtida por um médium. Na psicografia a alma do médium desempenha, necessariamente, um certo papel, pelo menos como intermediário, ao passo que na espiritografia é o Espírito que age diretamente, por si mesmo.

      O terceiro modo de comunicação é a palavra. Certas pessoas sofrem nos órgãos vocais a influência de um poder oculto que se faz sentir na mão daqueles que escrevem. Transmitem, pela palavra, o que outras transmitem pela escrita.

      As comunicações verbais, como as escritas, ocorrem algumas vezes sem intermediário corpóreo. Palavras e frases podem ressoar aos nossos ouvidos ou em nosso cérebro, sem causa física aparente. Os Espíritos podem, igualmente, aparecer-nos em sonho ou em estado de vigília, e dirigir-nos a palavra para nos dar avisos ou instruções.

      Para seguir o mesmo sistema de nomenclatura que adotamos para as comunicações escritas, deveríamos chamar a palavra transmitida pelo médium, de “psicologia”, e a originada diretamente do Espírito de “espiritologia”. Porém, a palavra “psicologia” já tem uma acepção conhecida e não a podemos distorcer. Designaremos, pois, todas as comunicações verbais sob o nome de “espiritologia”: as primeiras pelas palavras “espiritologia mediata”, e as segundas pelas de “espiritologia direta”.

      Dos diferentes modos de comunicação a “sematologia” é o mais incompleto; é muito lento e não se presta senão com dificuldade a desenvolvimentos de uma certa extensão. Os Espíritos superiores dela não se servem voluntariamente, seja por causa da lentidão, seja porque as respostas, por “sim” e por “não”, são incompletas e sujeitas a erro. Para o ensino preferem os meios mais rápidos: a escrita e a palavra.

      Com efeito, a escrita e a palavra são os meios mais completos para a transmissão do pensamento dos Espíritos,quer pela precisão das respostas, quer pela extensão dos desenvolvimentos que comportam. A escrita tem a vantagem de deixar traços materiais e de ser um dos meios mais adequados para combater a dúvida. De resto, não se é livre para escolher; os Espíritos comunicam-se pelos meios que julgam apropriados: isso depende das aptidões.

Mas retornando à Introdução de “O Livro dos Espíritos”, diz Kardec: As palavras “espiritual”, “espiritualista”, “espiritualismo” têm um significado bem definido, e acrescentar-lhes uma nova significação para aplicá-las à Doutrina dos Espíritos seria multiplicar os casos já tão numerosos de palavras com duplo sentido.

O espiritualismo é o oposto do materialismo, e qualquer um que acredite ter em si algo além da matéria é espiritualista, embora isso não queira dizer que creia na existência dos Espíritos ou em suas comunicações com o mundo material.

Diz ainda Kardec no item 1 da Introdução de “O Livro dos Espíritos”:

Utilizaremos as palavras “espiritual”, “espiritualismo” para designar a crença nos Espíritos. As palavras “espírita” e “espiritismo”, que lembram a origem e têm em si a raiz e que, por isso mesmo têm a vantagem de ser perfeitamente inteligíveis, reservando à palavra “espiritualismo” sua significação própria.

Diremos que a “Doutrina Espírita” ou o “Espiritismo” tem por princípio a relação do mundo material com os Espíritos ou seres do mundo espiritual. Os adeptos do Espiritismo serão os Espíritas ou, se quiserem, os “espiritistas”.

Finaliza Kardec o item 1 da Introdução de “O Livro dos Espíritos”:

Como especialidade, “O Livro dos Espíritos”  contém a Doutrina Espírita; como generalidade, liga-se ao “espiritualismo” num dos seus aspectos. Esta é a razão por que traz, no início de seu título, as palavras: “filosofia espiritualista”.

No próximo artigo continuaremos a tratar deste importante livro para a Doutrina Espírita. Até lá.