O vocábulo nepotismo vem do latim nepos, que significa sobrinho. No direito administrativo, o termo passou a ser utilizado para designar a nomeação de parentes para a ocupação de cargos comissionados. Ao longo de nossa história jurídica, nunca houve uma lei vedando atos de nepotismo. A razão reside no fato de que os dois principais atores do processo legislativo, ou seja, o poder executivo e o poder legislativo sempre foram pródigos na prática de proverem seus cargos com familiares dos agentes políticos.

Para moralizar o grave quadro existente, o Conselho Nacional de justiça editou a Resolução nº 07, em 18 de outubro de 2005, vedando o nepotismo no poder judiciário. Em 29 de agosto de 2008, o Supremo Tribunal Federal publicou a Súmula Vinculante nº 13, fixando expressamente a vedação à contratação de parentes, em todos os poderes da República.

No entanto, logo emergiu uma relevante questão jurídica. Para os atingidos pela vedação, somente com a publicação da Súmula Vinculante nº 13 passou a haver, em nosso direito, proibição ao nepotismo no Brasil, pois, antes, não havia legislação contendo vedação. Em muitos casos, a alegação era a de que havia leis estaduais e municipais autorizando expressamente, em seu texto, os atos de nepotismo. Para o Ministério Público, a vedação existe desde a entrada em vigor da Constituição Federal, inserta nos princípios constitucionais da impessoalidade e moralidade, cuja violação implica em ato de improbidade. Esta controvérsia foi levada aos Tribunais Superiores.   

No julgamento realizado em 13.08.2013, a Segunda turma do STJ analisou o Recurso Especial n º 1.286.631/MG, interposto pelo Ministério Público contra decisão do TJMG que descaracterizou como ato de improbidade a nomeação da filha de um vereador, fundamentado, dentre outros motivos, no fato do nepotismo ter ocorrido antes da publicação da Súmula Vinculante nº 13, pois, anteriormente a esta data havia amparo legal para a contratação de parentes.

O Relator, Ministro Castro Moreira, no entanto, divergiu deste entendimento, entendendo que a vedação ao nepotismo existe desde a entrada em vigor da atual Constituição Federal, como destacado em seu voto:  

Quanto à data da publicação (29.8.2008) da Súmula Vinculante nº 13/STF como termo inicial para a caracterização do ato de improbidade em discussão, é fato irrelevante. Tal súmula decorre da aplicação direta do art. 37, caput, da Constituição Federal de 1988, em vigor, quando da nomeação da servidora Eliane.

Os demais Ministros da Segunda Turma, por unanimidade, seguiram o voto do Relator, em decisão assim ementada:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NEPOTISMO. CARGO EM COMISSÃO. CÂMARA MUNICIPAL. FILHA DE VERADOR. PRESIDENTE. DOLO GENÉRICO CARACTERIZADO. RESTABELECIMENTO DA CONDENAÇÃO DE PRIMEIRO GRAU. ART. 11 DA LEI Nº 8.429/92.

No julgamento realizado em 24.4.2014, a Segunda Turma do STJ analisou questão similar no AgRg no Recurso Especial nº 1.386.255/PB, tendo por Relator o Ministro Humberto Martins. O agravante afirmou, em sua defesa, que inexistiu violação à legalidade, pois não havia, à época, qualquer lei lhe proibindo de nomear parentes, nos seguintes termos:   

Não há que se falar que a conduta feriu aos princípios da administração pública quando não houve afronta à legalidade, pois não havia dispositivo cogente à época, tampouco à moralidade, visto que é atrelada à legalidade.   

No entanto, o Relator, em seu voto, discordou desta argumentação, destacando: 

A nomeação de parentes para ocupar cargos em comissão, ainda que ocorrida antes da edição da Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal, constitui ato de improbidade administrativa, que atenta contra os princípios da Administração Pública, nos termos do art. 11 da Lei nº 8.429/92, sendo despicienda a existência de regra explícita de qualquer natureza acerca da proibição. O Supremo Tribunal Federal, ao editar a mencionada Súmula vinculante, apenas consolidou entendimento, há muito pacificado naquela Corte, ...

Os demais Ministros da Segunda Turma, por unanimidade, seguiram o entendimento do Relator, proferindo decisão assim ementada.  

(...) 2. A nomeação de parentes para ocupar cargos em comissão, ainda que ocorrida antes da publicação da Súmula Vinculante nº 13, constitui ato de improbidade administrativa, que atenta contra os princípios da administração pública, nos termos do art. 11 da Lei nº 8.429/92, sendo despicienda a existência de regra explícita de qualquer natureza acerca da proibição.

No julgamento ocorrido em 12.05.2015, a Segunda Turma do STJ, no AgRg no Recurso Especial 1362789/MG, tendo por Relator o Ministro Humberto Martins, analisou a acusação contra um prefeito acusado de nomear parentes para cargos comissionados da prefeitura. O acórdão recorrido do TJMG afastara o ato de improbidade, pela prática de nepotismo, em face das nomeações terem ocorrido antes da Súmula Vinculante nº 13, em decisão assim ementada:

PODER EXECUTIVO DO MUNICÍPIO DE CARNEIRINHO. NEPOTISMO. ATO DE IMPROBIDADE. NÃO COMPROVADO.

Não se pode atribuir como ímprobo os atos de nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, para ocupar os cargos de comissão ou funções comissionadas, se até a edição da Súmula Vinculante nº 13 havia enorme dissenso jurisprudencial sobre o assunto. 

O acórdão do tribunal mineiro destacou:

Tendo as nomeações se operado nos anos de 2005, 2006 e 2007, antes da entrada em vigor da Súmula Vinculante de efeito ex nunc, não há como atribuir como ímprobo os atos praticados pelo segundo apelante (prefeito) ...  

Os demais Ministros da Segunda Turma, por unanimidade, seguiram o entendimento do Relator, proferindo decisão assim ementada.  

ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NEPOTISMO. NOMEAÇÃO DE FAMILAIRES PARA OCUPAR CARGOS EM COMISSÃO ANTES DA EDIÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE 13/STF. DESCUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL. VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. OFENSA AO ART. 11 DA LEI 8.429/92.

  1. A nomeação de parentes para ocupar cargos em comissão, ainda que ocorrida antes da publicação da Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal, constitui ato de improbidade administrativa, que atenta contra os princípios da administração pública, nos termos do art. 11 da Lei nº 8.429/92, sendo despicienda a existência de rega explícita de qualquer natureza acerca da proibição.

No ano de 2015, a Segunda Turma do STJ analisou, no AgRg no Recurso Especial nº 1.535.600/RN, litígio versando sobre a nomeação por uma prefeita de seu irmão para o exercício de cargo comissionado. O TJRN afastou a improbidade pelo fato da Constituição, em seu art. 37, II e V, permitir a livre nomeação para cargos públicos, pela Lei Municipal nº 16/97, atribuir ao prefeito a livre escolha, e por terem os atos sido praticados antes da edição da Súmula Vinculante nº 13. 

No entanto, o Relator, Min. Mauro Campbell Marques, em discordância com o acórdão do TJRN, que afastou a existência de improbidade, considerou que o nepotismo é um ato improbo, como destacado em seu voto:

Contudo, a Segunda Turma do STJ já se manifestou no sentido de que a nomeação de parentes para ocupar cargos em comissão, mesmo antes da publicação da Súmula Vinculante 13/STF, constitui ato de improbidade administrativa que ofende os princípios da administração pública, nos termos do artigo 11 da Lei 8.429/92. 

            Todos estes julgados evidenciam que as alegações de violação à segurança jurídica e de impossibilidade de interpretação retroativa não prosperaram. A jurisprudência dos Tribunais Superiores tem assentado, primeiro, que os princípios que regem a Administração Pública não são apenas um enfeite no texto constitucional.  Segundo, tem sido conferido à lei de improbidade, desde a sua entrada em vigor, ampla aplicabilidade a todas as situações que se enquadrem nas hipóteses de ato improbo.