A negociação coletiva constitui-se, há décadas, como o principal instrumento de fixação de direitos dos empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho, CLT. As discussões diretas entre os trabalhadores, por meio dos sindicatos, e os seus empregadores conduzem, a cada ano, à celebração de acordos e convenções coletivas responsáveis por inovar nas condições pactuadas, com a introdução, alteração e manutenção de benefícios importantes para a classe trabalhista.

A Lei 8.112/90 trouxe, em seu texto original, a extensão do instituto da negociação coletiva aos servidores públicos, assim como da possibilidade de ajuizamento de ações individuais ou coletiva frente à Justiça do Trabalho. A mudança representava uma ruptura no modelo, até então existente, fixado pelo regime estatutário, que apenas permitia a produção de direitos, por meio de projetos de lei, cuja propositura encontrava-se na competência exclusiva do chefe do Poder Executivo.

No entanto, em 1993, o Supremo Tribunal Federal, na ADI 492, Relator Min. Carlos Veloso, DJ 12/3/1993, considerou que estas duas inovações, trazidas pelas alienas “d” e “e”, do artigo 240, da Lei 8.112/90, eram inconstitucionais, em decisão assim ementada:

CONSTITUCIONAL. TRABALHO. JUSTIÇA DO TRABALHO. COMPETÊNCIA. AÇÕES DOS SERVIDORES PÚBLICOS ESTAUTÁRIOS. C.F., ARTS. 37, 39, 40, 41. 42 E 114. LEI N. 8.112, DE 1990, ART. 240, ALINEAS “D” E “E”. I. SERVIDORES PÚBLICOS ESTATUTÁRIOS: DIRETO À NEGOCIAÇÃO COLETIVA E A AÇÃO COLETIVA FRENTE À JUSTIÇA DO TRABALHO: INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 8.112/90, ART. 240, ALÍNEAS “D” E “E”. II – SERVIDORES PÚBLICOS ESTATUTÁRIOS: INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA O JULGAMENTO DOS SEUS DISSÍDIOS INDIVIDUAIS. INCONSTITUCIONALIDADE DA ALÍNEA “E” DO ART. 240, LEI 8.112/90. III – AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE.        

O Ministro Relator destacou, em seu voto, sobre a inexistência, entre os direitos constitucionais atribuídos aos servidores públicos, da celebração de acordos salariais e trabalhistas, por meio de negociação coletiva:

A Constituição, aliás, ao assegurar aos servidores públicos uma série de direitos dos trabalhadores em geral, (CF, art. 39, § 2º) a eles não garantiu o direito ao reconhecimento dos acordos e convenções coletivas de trabalho (CF, art. 7º, XXVI). Isto ocorreu, certamente, porque a relação entre os servidores públicos e o poder público são regidas por normas legais, porque sujeitas ao princípio da legalidade.     

Em 2006, o STF analisou, na ADI 554, Relator Ministro Eros Grau, DJ 5.05.2006, a possibilidade dos servidores estatutários estaduais celebrarem acordos e convenções coletivas. O Tribunal Pleno entendeu pela inconstitucionalidade do direito à negociação coletiva, em face da relação entre servidores e Estado ser regida exclusivamente por lei, inexistindo liberdade para as partes transacionarem sobre as condições trabalhistas. O acórdão trouxe a seguinte ementa:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 272, § 2º, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 4, DO ESTADO DO MATO GROSSO. SERVIDORES PÚBLICOS. ACORDOS E CONVENÇÕES COLETIVAS DO TRABALHO. VIOLAÇÃO DO ART. 61, § 1º, II, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. A celebração de convenções e acordos coletivos de trabalho consubstancia direito reservado exclusivamente aos trabalhadores da iniciativa privada. A negociação coletiva demanda a existência de partes formalmente detentoras de ampla autonomia negocial, o que não se realiza no plano da relação estatutária. 2. A Administração Pública é vinculada pelo princípio da legalidade. A atribuição de vantagens aos servidores somente pode ser concedida a partir de projeto de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, consoante dispõe o art. 61, § 1º, II, alíneas “a” e “c”, da Constituição, desde que supervenientemente aprovado pelo Poder Legislativo. Precedentes. Pedido julgado procedente para julgar inconstitucional o § 2º do artigo 272, da Lei Complementar nº 4, de 15 de outubro de 1990, do Estado de Mato Grosso.           

Em 2015, o Suprem Tribunal Federal julgou novamente o direito de negociação coletiva dos servidores públicos. A questão foi levada à Corte pelo Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário Federal na Bahia, que interpôs mandado de injunção pleiteando a regulamentação do instrumento de negociação coletiva para os servidores públicos. Como fundamento, destacou que este direito encontrava-se implícito nos incisos VI e VII, art. 37, Constituição Federal, pois era inerente ao direito de greve e de associação sindical. 

No entanto, a Corte entendeu pela inexistência do dever constitucional de legislar sobre o tema, o que afastava o cabimento do uso do remédio, em decisão com a seguinte ementa:

MANDADO DE INJUNÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. PRETENSÃO DE RECONHECIMENTO DO DIREITO À NEGOCIAÇÃO COLETIVA. INEXISTÊNCIA DO DEVER CONSTITUCIONAL DE LEGISLAR. NÃO CABIMENTO, CONSOANTE ITERATIVA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. IMPETRAÇÃO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO.  

            O Sindicato interpôs, então, agravo regimental contra a decisão. No entanto, o Relator do recurso, Ministro Luiz Fux, entendeu que não havia previsão constitucional atribuindo o direito de negociação coletiva aos servidores públicos, e, consequentemente, inexistia a mora legislativa na regulamentação, como destacado em seu voto:

In casu, todavia, não se verifica a previsão, na Carta Magna, do direito de que supostamente seriam titulares os substituídos pela parte impetrante. Como se infere do art. 5º, LXXI, da CRFB/88, o mandado de injunção tem lugar quando a falta de norma regulamentadora impedir o exercício de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Ausente a previsão constitucional do direito, bem como do dever de regulamentação, não há falar em omissão legislativa que possa ser imputada à autoridade impetrada.           

Em 19 de agosto de 2015, os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, por maioria, decidiram, no Ag. Reg. no MI 4.398/DF, desprover o recurso, em acórdão assim ementado:

AGRAVO REGIMENTAL NO MANDADO DE INJUNÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. DIREITO À NEGOCIAÇÃO COLETIVA. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

  1. O direito à negociação coletiva é restrito aos trabalhadores da iniciativa privada. Esta Corte já decidiu que viola a Constituição Federal norma que confere tal direito aos servidores públicos.  

Ao final, as decisões do Supremo Tribunal Federal deixaram assentado que, na relação estatutária que rege os servidores públicos, de forma diferente da verificada nas relações regidas pela CLT, não há espaço para negociações e fixação de direitos remuneratórios e trabalhistas, pela celebração direta de acordo entre as partes. Todos os direitos e obrigações dos servidores estão insertos no campo legal.