Nanete Neves foi a primeira jornalista a entrevistar o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade com uma estratégia típica de profissionais experimentados, mesmo sendo uma iniciante. Saiu de São Paulo para fazer uma matéria falando com pessoas ligadas ao poeta, mas furou o bloqueio e conseguiu o que ninguém havia conseguido até então, um bate papo na intimidade de Carlos, como ele gostava de ser chamado.

Mas Nanete não parou por aí e continuou escrevendo, publicando e ensinando futuros escritores. Seu último livro De âmbar e trigo ela conta a história de uma família de refugiados tchecos no Brasil na época da chamada Primavera de Praga, logo depois que Dubcek liderou a liberalização do país contrariando corajosamente o totalitarismo soviético. Infelizmente a romântica primavera se transformou em tragédia, com tanques invadindo a bela capital checoslovaca, matando, prendendo e sufocando as ideias libertárias.

Para quem acompanhou a revolução checoslovaca no final dos anos sessenta, não há como ler o livro e não  se recordar do renovador cinema checo, com filmes como “Um dia um gato” e “A pequena loja da Rua Principal”, escritores como Milan Kundera que publica, tempos depois  ”A insustentável leveza do ser”, um retrato dos tempos sombrios no pequeno país europeu.

A novela de Nanete é bonita e envolvente onde estão presentes tragédias, tristezas, amor e a solidariedade do povo mineiro acolhendo o casal de refugiados.  Um padre estrangeiro, uma professora dedicada, duas solteironas solidárias, um fazendeiro ranzinza e uma garota que sobreviveu a grandes perdas, são alguns dos personagens.

Um velho professor de literatura no colégio dizia que conhecia um bom livro quando lida a última página, começamos a sentir saudades dos personagens. Isso acontece quando eles são verossímeis, construídos com a competência dos grandes escritores.  A novela de Nanete consegue isso. Nikolina, uma forte presença feminina, pela sua generosidade e empatia, o Padre Nilo pela força de sua presença na comunidade, o fazendeiro ranzinza que se transforma, constroem a narrativa.

A leitura uma vez iniciada é difícil de ser interrompida. A escritora deixa sempre algum fio do tecido solto, gerando a expectativa de algo novo vai acontecer, mudando todo o curso da história. O leitor ou leitora se sente presente na ainda pequena Araguari, no triângulo mineiro, parecendo caminhar junto com a narradora pelas ruas, visitando a igreja, as casas simples, os quintais repletos de jabuticabeiras que parecem estar sempre carregadas de doces frutos.

Os sabores mineiros estão presentes em cada capítulo. O café fraco, o pão de queijo, o bolo de fubá, o tutu, a couve e o leitãozinho assado, tudo exala das páginas do livro de forma saborosa, sugerindo que a escritora participou ativamente da história, mesmo que não tenha nunca visitado a cidade, o que não acredito.

Enfim, uma novela simples, gostosa, construída num texto ágil, sintético e delicado, revelando que Nanete é uma escritora com recursos para lançar voos mais altos.