INTERAÇÕES ENTRE MATURAÇÃO DO CÉREBRO E EXPERIÊNCIAS COM O USO ABUSIVO DE NOVAS TECNOLOGIAS NO DESENVOLVIMENTO COMPORTAMENTAL DAS CRIANÇAS.


Maria Antônia Costa Silva de Oliveira


RESUMO

O uso cada vez mais crescente de internet tem trazido muitas facilidades para o dia a dia dos seres humanos. Várias pesquisas comprovam os benefícios desta ferramenta, mas a falta de controle produziu em uma parcela da população, principalmente nos mais jovens, severos impactos no convívio familiar, na vida acadêmica, nas interações sociais e prejuízos a saúde. Este artigo tem como objetivo realizar uma revisão na literatura científica, nos artigos que abordam uma possível dependência do uso abusivo de internet por crianças, assim como discutir os possíveis impactos que esta experiência pode causar na maturação do cérebro em desenvolvimento. A busca foi realizada nos bancos de dados da PubMed não havendo data mínima devido a pouca publicação existente. As palavras-chave utilizadas foram: dependência de internet, maturação cerebral e desenvolvimento comportamental. Foram analisados 121 artigos, só 17 foram aproveitados por apresentarem conteúdos compatíveis com o interesse dessa pesquisa. E, excluídos 104 artigos por não apresentarem clareza com os objetivos iniciais. Os artigos analisados sobre dependência de internet apresentaram dados divergentes quanto a uma sintomatologia única entre os pesquisadores, provavelmente, devido à falta de um consenso e o emprego de conceitos divergentes implicando, assim, no uso de critérios de diagnósticos distintos. Novas investigações sobre o tema se fazem necessárias para verificar se o uso abusivo das novas tecnologias poderá acarretar prejuízos relevantes nas interações entre maturação cerebral, com as devidas implicações neuroquímicas existentes, e prováveis interferências no desenvolvimento comportamental das crianças.

INTRODUÇÃO

O uso das novas tecnologias por crianças na fase de desenvolvimento é cada vez mais crescente. Muitas, entram em contato ainda muito cedo estimuladas pelos pais e familiares que influenciados pela cibercultura consideram o uso dos instrumentos eletrônicos inofensivos para as crianças. O impacto causado pela revolução digital é impressionante e, hoje, é impossível se pensar como poderia ser a vida das pessoas sem o acesso as inúmeras oportunidades oferecidas pelas tecnologias digitais. Segundo (PERES et al., 2012), crianças entre 5 a 9 anos tem acesso as tecnologias de informações e comunicações – TICs, em especial celulares, computadores e internet. Eisenstein e Bestefenon (2011) afirmam que a internet atravessou fronteiras, dissolveu barreiras culturais, penetrou bloqueios políticos, vaporizou diferenças sociais e cresceu mais rápido e em todas as direções, superando as expectativas do futuro planejado nos séculos passados e as certezas tecnológicas. Dentro deste contexto o ciberespaço promove novas formas de organizações no cérebro e alterações comportamentais nos indivíduos independentemente de qual seja a faixa etária, nível social ou grau de escolaridade. A introdução destas tecnologias na infância vem preocupando profissionais de saúde e educadores devido a vulnerabilidade deste grupo e por estarem ainda em fase de desenvolvimento estrutural e psicológico.

NEUROPSICOLOGIA E DEPENDENCIA DE INTERNET A ciência neuropsicológica ganhou reconhecimento e sua aplicabilidade atingiu diversas áreas de conhecimento. Dentro deste contexto, neurocientistas vem alertando, através das suas publicações e da prática clínica, pais, familiares e cuidadores para a possibilidade do surgimento de doenças cerebrais causadas pelo uso excessivo de internet. Segundo Young (2007), divulgações não científicas recentes tem mostrado que alguns usuários de Internet estão se tornando dependentes desta modalidade de comunicação da mesma forma que muitos indivíduos se tornam dependentes de drogas, álcool, ou jogos com consequente prejuízo no trabalho, escola e relacionamentos interpessoais. (YOUNG, 2007). A Associação Americana de Psicologia - APA reconheceu uma nova doença chamada “uso patológico de internet”. Os chamados viciados ficam em média mais de 5 horas por dia conectados, o que acaba gerando uma dependência semelhante as drogas e
ao jogo de azar, considerando suas interferências no âmbito familiar e do trabalho de maneira prejudicial (APA, 2006). Também recentemente o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders – (DSM-V) introduziu em sua publicação o uso problemático com as novas tecnologias como Transtorno do jogo pela Internet. Cristiano Nabuco de Abreu e Dora Sampaio Goes em (RANGÉ et al, 2011) tecem considerações sobre o uso abusivo de internet e suas diversas práticas apresentando as dificuldades encontradas pelos pesquisadores para classificar o transtorno dentro dos critérios exigidos como uma entidade nosológica. Ainda observando sobre o assunto ele faz referência aos primeiros estudos realizados pela psicóloga Kimberly Young, que apresentou uma das primeiras pesquisas sobre vicio de internet na conferência anual da American Psychological Association, em Toronto, a qual chamou de Dependência de internet: o surgimento de um novo transtorno (YOUNG, 1996). Em seu artigo sobre Dependência de jogos eletrônicos: a possibilidade de um novo diagnóstico psiquiátrico, (LEMOS & SANTANA, 2011) citam as possíveis patologias que poderão ocorrer num individuo que faz uso abusivo de tecnologias digitais. Considera que um elemento relevante a ser mencionado se refere à ocorrência de comorbidades nos usuários patológicos de jogos eletrônicos e internet. Há um número crescente de pacientes dependentes associados à depressão, suicídio, transtorno de ansiedade social, transtorno de ansiedade generalizada, transtorno obsessivo-compulsivo e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Entre os pesquisadores que se debruçaram sobre o problema, (CAPLAN, 2002) considerou as dependências tecnológicas como um subgrupo das dependências comportamentais; já que a dependência de internet e de videogames apresentariam os componentes centrais de dependência isto é, saliência, modificação do humor, tolerância, abstinência, conflito e recaída. Para Uhlmann e Swanson (2004), determinados jogos com conteúdo de violência podem levar o adolescente a perceber-se como agressivo. Segundo o autor ataques epilépticos provocados pelo jogo de vídeos games têm sido reportados pela literatura da área neurológica desde a década de 50, elas podem ser desencadeadas pelo piscar rápido e rítmico de luzes, que gera descargas elétricas anormais no cérebro. Contudo, ele registra que o elo existente entre eles e os vários tipos de jogos são incertos. (UHLMANN & SWANSON, 2004) apud ALVES & CARVALHO, 2011).
Outros problemas neurológicos poderão ocorrer em crianças e adolescentes provocados pelo acesso continuado do videogame, computador e outras mídias digitais, como dor de cabeça e enxaqueca, distúrbios do sono, redução da capacidade intelectual e produtiva, síndrome do túnel do carpo, dificuldade de concentração, depressão, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, (TDAH) déficit de atenção induzido pelo uso compartilhado de diversas tecnologias e queda de rendimento escolar. Outros problemas físicos também podem ocorrer como riscos auditivos por exposição aguda ou trauma acústico, transtornos posturais como a hipercifose e a crevico-braquialgia e ainda o uso de drogas e medicamentos oferecidos pelos sites de vendas on-line. Crianças desta geração inseridas num mundo em mudanças constantes estão submetidas a riscos e problemas de saúde. Durante uma fase de crescimento e desenvolvimento onde a maturação cerebral ainda não tenha alcançado o patamar esperado pode-lhes ocasionar confusões e problemas de memória e de concentração. Um fator importante observado na maior parte dos artigos pesquisados faz referência a situação de vulnerabilidade a que está inserida a criança, o que a faz presa fácil dos diversos tipos de predadores sejam reais ou virtuais. As condições de precariedade social, familiar e das falhas nas políticas públicas, da qual é dependente, interferem em um desenvolvimento desejável, promovendo facilitadores que produzem situações que a leva a condição de vítima. MATURAÇAO CEREBRAL E COMPORTAMENTO O cérebro é considerado o órgão mais importante do ser humano e devido a sua complexidade desempenha importante papel em todas as funções corporal. A infância é um período durante o qual o cérebro passa por mudanças significativas. Intuitivamente, muitas pessoas acreditam que o desenvolvimento do cérebro estaria associado a um aumento linear em suas dimensões, que acompanharia a idade. (DURSTON, 2013). Estudos recentes conduzidos pela autora relatam que as diferentes áreas do cérebro desenvolvem-se segundo trajetórias individuais, e aumentam ou diminuem de tamanho ao longo do tempo. No seu artigo ela argumenta que a idade em que a espessura máxima ocorre através do córtex varia, portanto, as regiões corticais relacionadas a funções primárias, como sistemas motores e sensoriais amadurece primeiro; e, posteriormente, amadurece as áreas de
associações de ordem superior, como o córtex pré-frontal. (DURSTON, 2013). Segundo sua análise sobre o desenvolvimento do cérebro e suas relações com o desenvolvimento comportamental, ela considera que o desenvolvimento lento do córtex pré-frontal está associado com o desenvolvimento relativamente lento do controle comportamental, ao passo que as áreas subcorticais no striatum amadurecem mais rapidamente, o que pode estar relacionado ao comportamento impulsivo e orientado para recompensas, exibido por adolescentes (DURSTON, 2013). Estudos realizados com humanos sugerem cada vez mais que estressores graves e precoces, podem resultar em redução do volume cerebral, desregulação do sistema neuroendócrino de resposta ao estresse, e disfunção límbica, envolvendo regiões como o hipocampo, o cortex pré-frontal medial e a amigdala. (GUNNAR et. al 2013). Segundo esses pesquisadores os períodos sensíveis e as etapas de maior plasticidade do cérebro são particularmente vulneráveis aos efeitos de longo prazo causados por hormônios do estresse, e podem resultar em alterações das trajetórias normais e da organização do cérebro jovem.
O SISTEMA DOPAMINÉRGICO
Os pesquisadores enfatizam que a dopamina é o neurotransmissor que está associado com a experiência de prazer e que o uso de substâncias psicoativas ou atividades comuns na vida diária do individuo provocam mudanças neste neurotransmissor. O uso das técnicas de neuroimagem funcional tem demonstrado as alterações que acontecem no córtex pré-frontal com a estimulação provocada pelo aumento ou a diminuição da dopamina no cérebro. Neste sentido as drogas de abuso convergem para um mecanismo neurobiológico comum com intervenção dos circuitos límbicos do cérebro. 

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