Estudar, aprender, fazer melhor

        O bom do estudar é a certeza de que sempre há o que aprender; o mais importante do aprender é a certeza do fazer melhor; o mais gratificante do estudar, aprender e fazer melhor é viver melhor a escola da vida. Estudar: assimilar, analisar, entender, acessar, familiarizar-se, identificar, apropriar-se, envolver-se, deixar-se envolver...Voltando às origens e significado da expressão, estudar corresponde a aplicar a capacidade intelectual a fim de adquirir conhecimentos e habilidades. Há diversas formas cursar, assistir a aulas/vídeo-aulas, ler, acompanhar, assimilar, dedicar-se ao exame e análise de um fato, um texto, uma proposta, um tema, um assunto, uma ideia. Nessa síncrese (ato de tomar conhecimento, tomar para si, compreender, apropriar-se), ocorre o fenômeno mais elementar que se conhece: aplicação efetiva da autopercepção. No estágio anterior havia a curiosidade, a expectativa, a vontade. Oportuno, há os questionamentos acerca do objeto estudado: o que sei sobre, o que preciso saber sobre, para usar de que forma, quando...? Agora, constata-se o entendimento, o envolvimento, o apropriar-se. Nessa fase, levanta-se um outro elemento do processo: o aprender.

       Aprender como se faz como se diz, como se processa, como se propõe, com que objetivos, em que contexto. APRENDER é ficar sabendo, ter na memória, tomar conhecimento, apropriar-se, adquirir habilidades práticas, a partir de um depuramento da capacidade de apreciação, de percepção. Expressão gerada aa partir do Latim AD, “junto” mais prehendere, com o sentido de “levar para junto de si”, metaforicamente “levar para junto da memória”. E este verbo se origina em prae-, “à frente”, mais hendere, relacionado a hedera, “hera”, já que essa planta trepadeira se agarra, se prende às paredes para poder crescer. Entende-se, por analogia, que o aprendizado se agarra ao estudo para se desenvolver.

       A fim de ilustrar esse recorte, vale recorrer a mais uma fábula que traz em si, a importância de se obter o conhecimento por meio do estudo que nos leva ao aprendizado que termina  sendo a rota perseguida detidamente por todos aqueles que pretendam alçar voos mais altos e seguros. Muitas vezes, por falta da informação necessária à compreensão de um determinado, aparentemente sem grande importância, nos colocamos em situações vexatórias dos que não sabem, não devem, não podem. Vejamos esse recorte, de La Fontaine que nos faz refletir sobre esses dois pontos: estudar e aprender: “O burro e a cobra. Como recompensa por um serviço prestado, os homens pediram a Júpiter a eterna juventude, o que ele concedeu. Pegou na juventude, pô-la em cima de um Burro e mandou que a levasse aos homens. Indo o Burro no seu caminho, chega a um ribeiro com sede, onde estava uma Cobra que disse que não o deixaria beber daquela água se não lhe desse o que levava às costas. O Burro, que não sabia o valor do que transportava, deu-lhe a juventude a troco da água. E assim os homens continuaram a envelhecer, e as Cobras renovando-se a cada ano.

        A curta fábula do burro e da cobra nos ensina que devemos ser sempre precavidos e informados, nunca oferecendo aquilo que temos sem sabermos a sua real importância. O burro foi encarregado de carregar um material precioso, embora desconhecesse a real importância dele. Caindo na chantagem de uma cobra mais malandra, o burro facilmente entregou aquilo que carregava - porque não tinha qualquer noção do quão valiosa era a juventude. A fábula fala também, portanto, da ignorância e das consequências do desconhecimento.

             Estamos diante dos pólos que definem o estudar e o aprender. Muitas vezes, pela prática histórica de expor os conteúdos para os seus alunos, o professor desconhecendo a capacidade de absorção e compreensão dos mesmos, o faz, na melhor das intenções acreditando estar dando o melhor si para transmitir, de modo unilateral. Nem sempre o aluno estar apto a entender como entender e, termina aprendendo, não coo lhe foi ensinado, mas como conseguiu assimilar. Na sua visão, muitas vezes, aquele conteúdo não garante ser necessário para o conjunto ensino/aprendizagem. Passa a ser, para ele, um fardo, sem propósito, sem objetivos, sem sentido, desconectado de tudo o que ele pensa, sabe e espera. Não haverá correspondência de objetivos. Instalar-se-á um rol de conflitos com desdobramentos indiscutíveis. Para o professor, conceder o que lhe é próprio: o conhecimento adquirido com o fito de transmitir para outrem, é uma tarefa por demais salutar, desde que as condições da escola, assim o permitam ainda que nem sempre seja uma tarefa fácil pois,  na outra ponta do processo encontra-se o aluno que, nem sempre traz um histórico favorável à disposição do procurar estudar para melhor aprender. Ora, como tem sido alardeado, há outros interesses, há outros valores em jogo, há outras atrações, dentre os quais, as redes sociais, os influenciadores, as telas, os celulares fazem frente aos tênues laços que ligam os alunos aos professores e todos juntos aos estudos, ao aprendizado e ao conhecimento.

            Retomando à fábula, o burro não tinha culpa de não conhecer o conteúdo que lhe foi confiado por Júpiter, como muitas vezes, o aluno por não conhecer o conteúdo transmitido pelo professor  com todas as metodologias, não dará o verdadeiro valor do encargo que lhe foi confiado. Tal discrepância distancia, cada vez, mais o estudar, do aprender. Por ignorar o peso desse, ou daquele pré-requisito para a cristalização do conhecimento mesmo o que possa ser facilmente entendido adquire uma complexidade que amplia costumeiramente a distância entre o que o professor apresenta e a forma como o aluno recebe.

          Não recebendo na sua plenitude não haverá envolvimento para apropriação. O conteúdo passa a ser um fardo, um empecilho aos seus outros afazeres que não estejam relacionados à rotina diária dos estudos, das lições, das tarefas, dos deveres, dos exercícios, dos testes, das provas, da aprovação ou reprovação. Tudo parece muito engessado aos olhos o aluno; tudo parece muito distante porque surge a ideia do descaso, do desinteresse, da dispersão, da indisciplina, do enfrentamento que na verdade não é intencional mas, uma consequência da forma como as crianças foram preparadas na chamada, primeira escola, para saberem lidar com o sistema de ensino que surge como algo insípido, pouco atraente, pouco promissor. Cria-se uma barreira de valores que entram em choque a cada instante da já desgastada relação.

       Na sequência do estudar, aprender e fazer melhor, todos precisam dar o melhor de si. Urge que sejam revistos valores que norteiam todo um processo de estudos, pesquisas e ensinamentos, considerando que independente dos objetivos de cada um dos envolvidos no processo traz consigo um histórico que nem sempre seguem os mesmos princípios. A criança que foi educada em um lar com limites criará em si um perfil propício a cumprir regras e seguir instruções, diferentemente daquela a quem não foram dadas as lições necessárias para a construção de um perfil propício aos rigores de grandes jornadas de estudos, aprendizagem e configuração do conhecimento.

        Fazendo uma direta alusão à necessidade de se reconhecer o valor do outro a partir do respeito por ele e por si mesmo, é possível reforçar a máxima: “Ninguém tem o dever de ser igual a você”. Nesse raciocínio, o professor precisa ver o aluno como um agente de peso no processo instalado entre eles. Assim, merecedor de cuidados, independente do que ele espera da aula. O aluno, por seu turno, também não pode, nem deve esperar que o professor pense igual a ele e, em decorrência, atenda aos seus interesses. Cabe ais dois agentes estabelecerem uma parceria de onde surgirão frutos de um trabalho onde em vez de hierarquia de valores, prevaleçam a liderança do professor, a liberdade do aluno e a consequente harmonia entre ambos.

       Para fazer melhor, todos devem repensar seus papeis: no caso do aluno, na sua ainda imaturidade inerente à pouca idade e tempo de formação, recorrer aos pais é o caminho. Afinal, desse acordo dependem todas as possibilidades de ajustes na disciplina e na condução das tarefas; para o professor, a necessidade de se posicionar como agente condutor de um processo onde liderança é o sentimento que precisa ser trabalhado. Que sejam deixados de lado o domínio, o poder de mando, a superioridade em nome de uma parceria onde todos sejam protagonistas livres e respeitados entre si e diante de todos. Estuda-se e aprende-se desde que haja a predisposição do fazer melhor.

·         Sebastião Maciel Costa