A didática é parte imprescindível no processo educacional. Não há ensino-aprendizagem sem a inclusão da didática. A nomenclatura didática foi criada no século XVII, por Comenius em sua obra Didática Magna de 1957 e tratava-se da arte de ensinar, que tornou-se parte integrante do trabalho do professor.

Embasada juntamente com a dialética, a didática é uma vertente educacional com conceito em permanente mudança, adaptando-se as tendências pedagógicas vigentes e, fazendo abordagem a concepções de autores mais recentes, Libâneo traz a seguinte afirmativa conceitual acerca da didática:a ela cabe converter objetivos sócio-políticos e pedagógicos em objetivos de ensino, selecionar conteúdos e métodos em função desses objetivos, estabelecer os vínculos entre ensino e aprendizagem, tendo em vista o desenvolvimento das capacidades mentais dos alunos. [...] trata da teoria geral do ensino (1990, p. 26).

Portanto, a didática está inserida em todo ou qualquer metodologia praticada no processo educacional, sendo, especificamente, a forma como o professor vai viabilizar o ensino visando sempre instigar o melhor desenvolvimento para seu alunado. No geral, as escolhas dos métodos didáticos acontecem exclusivamente para serem utilizados para toda a turma, abdicando assim das especificidades de aprendizagem de cada aluno. Partindo desse pressuposto, explanaremos neste artigo formas didáticas que favoreçam a regulamentação individualizada das aprendizagens.

Acerca desta temática, o grande educador Philippe Perrenoud traz uma abordagem minuciosa em sua obra Avaliação: da Excelência à Regulação das Aprendizagens Entre Duas Lógicas (1999), onde o autor apresenta reflexões sobre o dualismo entre as duas lógicas da avaliação, a seletiva e a de ações para a aprendizagem. Uma obra trivial para o entendimento dos procedimentos que permeiam essas duas lógicas, bem como em relação a melhor didática para a prática docente.

Culturalmente, a educação está impregnada pelo tradicionalismo e com a avaliação não é diferente, tendo em vista que a avaliação é um instrumento metodológico. Sendo o sistema educacional, ainda, tradicional, existe uma hierarquia profunda nessa sistemática, que foram internalizadas. Porém, é possível tornar essa hierarquia favorável para promover uma avaliação contínua e emancipatória, neste sentido, Perrenoud afirma: “(...) os julgamentos de êxito dependem, em geral, da síntese de várias hierarquias de excelência, operadas para fins de balanço,freqüentemente em vista de uma decisão de seleção ou de certificação” (1999, p. 35).

Ainda embasado nesse pressuposto exaltado por Perrenoud, é plausível apontar que a busca pela excelência da hierarquia que favoreça a educação perpassa pela ruptura de estigmas e estereótipos que rondam o processo educacional. Exemplificando isso, é viável que o educador estabeleça junto com seu alunado a construção de instrumentos avaliativos, pois, a partir dessa perspectiva, haveria debates e discussões para concluir qual o melhor instrumento a ser utilizado, tal como a compreensão dos alunos sobre como ele está sendo avaliado.

É sabido que didáticas são formas de práticas de ensino. Contudo, deve-se fazer com que essas práticas sejam pertinentes para a oferta de uma regulamentação da aprendizagem. Para possibilitar essa regulação é viável a construção na relação professor-aluno de um processo de negociação, onde ambos participarão das escolhas metodológicas, constituição de procedimentos, pontos relevantes e indicadores de avaliação.

Dessa forma, a legitimação do processo de avaliação torna-se verídica e adequada ao contexto no qual esteja inserida, visto que ocorrerá entendimento entre avaliador e avaliado. É também dessa maneira que haverá a aquisição de um processo avaliativo contínuo, que auxilia na regulação do processo de aprendizagem ao oportunizar a abdicação da avaliação pela lógica da seleção para a avaliação com lógica na formação integral por excelência.

Infelizmente, existem problemáticas que empecilham a prática de didáticas que favoreçam a regulamentação individualizada dos alunos acerca da aprendizagem, uma delas é relacionada ao currículo, pois o professor evidencia mais os conteúdos em detrimento do ato de ensinar. Sobre esse complexo, Perrenoud afirma como solução “(...) uma formulação dos planos de estudos em termos de objetivos e a lembrança sistemática das aprendizagens almejadas por determinada tarefa poderiam modificar a representação dos elos entre atividades constitutivas do currículo real e aprendizagens almejadas” (1999, p.83).

O sistema educacionalbrasileiro obriga o professor a ser tradicional e idealizar uma avaliação seletiva, que prime pela apresentação de resultados que abarquem os números exigidos pelos governantes. Todavia, é preciso que o sistema educacional passe a avaliar o processo ao invés do produto, pois necessitamos refletir constantemente sobre a didática empregada para a avaliação em busca de instrumentos avaliativos que desenvolvam a aprendizagem dos alunos.

Observando modelos, teorias, conceitos e métodos acerca da avaliação é perceptível que ela é um processo pragmático, possuindo ordem, objetivos e práticas que se tornam habituais no dia a dia escolar. E sobre isso, Perrenoud (199, p. 53), apresenta o seguinte pensamento:

Analisar a pragmática da avaliação é, primeiramente, considerar ações e decisões que ela fundamenta de imediato e que atingem pessoas bem-definidas. Sobre esse ponto, deve-se evidentemente distinguir as situações: a pragmática da avaliação contínua durante o ano escolar remete, de início, ao andamento da aula, à progressão no programa, à manutenção da ordem, à vezes à individualização das aprendizagens ou a certas ações de remediação. A curto prazo, a orientação não está em jogo. Trata-se daquilo que o professor faz com sua turma ou com certos alunos e também do que determinado aluno faz, sobretudo se seus resultados forem insuficientes: aula de reforço, trabalho extra, mais dedicação aos temas ou à preparação das próximas provas, eventuais aulas particulares, controle mais restrito em casa ou em aula, etc.

 

A didática é de suma importância dentro do processo educacional, até porque ela é a prática que o docente executa no ato de ensinar. Contudo, emaranhados por um sistema extremamente tradicional, os educadores findam por praticar um ensino também arraigado de tradicionalismo. E sobre esse pressuposto, é lúcido comparar com a via das duas lógicas da aprendizagem que Perrenoud tanto evidencia: lógica formativa e a seletiva. Por intermédio da utilização dessas lógicas, enquanto processo didático, o educador terá em mãos a possibilidade de promover uma educação com práticas e instrumentos que regulamentem a aprendizagem individualizada, ou persistir na prática de uma lógica que ratifique ainda mais o resultado imediatista abdicando da aprendizagem.

Sobre o dualismo das duas lógicas, Perrenoud sinaliza que:

(...) seria bom que ao agrupamento daqueles que trabalham sobre as diversas facetas e funções da avaliação, façam o contrapeso das associações, departamentos universitários, programas e projetos de pesquisa ou de desenvolvimento que reúnam abordagens transversais e abordagens didáticas do ensino e da aprendizagem, em torno do tema da diferenciação da regulação, da individualização dos percursos. (PERRENOUD, 1999, p. 168)

 

De fato, é necessário que haja maior diversidade em relação à didática e aos instrumentos avaliativos utilizados na escola, dado que toda escola possui um contexto diferenciado, bem como os alunos que a frequentam também possuem. Portanto, didáticas diferentes e instrumentos diversos atrairiam ainda mais os alunos para o processo constitutivo do ensino-aprendizagem, além disso, as necessidades envoltas no processo avaliativo seriam englobadas no processo metodológico, a partir do momento que os educadores reverenciam como essencial a utilização de instrumentos acordados com o diagnóstico realizado com seu alunado.

Logo, o processo de negociação é primordial para a aquisição da regulamentação de aprendizagens individualizadas, pois ofertar para os alunos a participação na escolha de todo ou qualquer instrumento, objetos ou metodologias educacionais é dar a eles a chance de terem seus anseios abarcados e suas qualidades melhor desenvolvidas. É também uma forma dos docentes poderem interagir com os alunos e diagnosticar diretamente o que é preciso ser trabalhado.

A aplicabilidade dessa perspectiva de fato legitima o trabalho docente e, principalmente, legitima a regulação individualizada das aprendizagens. Logicamente, trabalhar essa teoria em sala de aula requer um embate direto com o sistema burocrático que envolve a educação. Entretanto, o professor não deve abater-se diante desse complexo, que é apenas um dentre os vários percalços da educação nacional.

Porém, diferentemente dos problemas ditos crônicos, como a falta de infraestrutura, materiais, recursos e piso salarial. A problemática da prática de uma didática que favoreça a aprendizagem individualizada dos alunos dependente intimamente da didática que o professor venha a utilizar em sala de aula, pois, essa escolha deve partir única e exclusivamente dele, sem interferências do sistema ou do restante do corpo pedagógico.

Ademais, proporcionar aos alunos as didáticas que favoreçam sua aprendizagem é, acima de tudo, oportunizar um ensino-aprendizagem por excelência, através do qual o aluno poderá usufruir de um ensino que possibilite a ele ser sujeito participante e sujeito a ser construído como via de transformação social, mesmo porque, a partir do instante que englobamos as especificidades de cada aluno damos também a eles a possibilidade da aquisição da aprendizagem ideal e, consequentemente, da formação cidadã integral.

 

REFERÊNCIAS

LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1990.

PERRENOUD, Philippe. Avaliação: da Excelência à Regulação das Aprendizagens Entre Duas Lógicas. Porto Alegre: Artmed, 1999.