CHARGEBACK X DIREITO DE ARREPENDIMENTO: O ESTORNO DAS OPERAÇÕES COM CARTÃO DE CRÉDITO NAS TRANSAÇÕES COMERCIAIS

Lidiane Borges Coutinho

Marina Stella da Silva Aguiar

                     

RESUMO

O presente trabalho visa discorrer sobre as diferenças existentes entre a cláusula chargeback e o direito de arrependimento, previsto no Código do Consumidor, art. 49, ambos decorrentes das relações de consumo a distância, onde o consumidor não tem contato direto com a mercadoria. Porém, enquanto o chargeback visa evitar fraudes e transações que não obedeçam ao previsto nos contratos das credenciadoras de cartões, o que acaba por prejudicar os lojistas, que assumem riscos que nada têm a ver diretamente com sua atividade, o direito de arrependimento visa beneficiar o consumidor, resguardando seu direito de declaração de vontade em uma relação que pode leva-lo a erro acerca da mercadoria adquirida. Far-se-á também uma exposição acerca das controvérsias e questionamentos acerca da legitimidade da cláusula chargeback e em como essa pode violar princípios essenciais à existência dos contratos. Por fim, apontar-se-á a possibilidade de transferência dos prejuízos gerados pelo chargeback para as credenciadoras de cartão de crédito, de forma a proteger os lojistas de riscos alheios aos das suas próprias atividades.

 

Palavras-chave: Chargeback. Direito de arrependimento. Princípios.

                                                                                                                      

1 INTRODUÇÃO

 

Nos últimos anos o avanço tecnológico acarretou o surgimento e difusão do e-commerce, comércio eletrônico cujas atividades e transações financeiras são feitas por meio virtual e não há contato entre lojista e mercadoria e consumidor.

Por sua vez, a popularização do e-commerce e a facilidade de transações financeiras virtuais serem fraudadas puseram em foco o chargeback, cláusula contratual que viabiliza o cancelamento de compras online quando o titular do cartão de crédito ou débito não reconhece a compra ou quando não há obediência da transação às regulamentações previstas pelas administradoras do cartão.

Muito se discute sobre a validade da cláusula do chargeback, pois esta transfere todos os riscos de um possível ressarcimento ao comerciante, riscos esses que são criados por brechas decorrentes da administração das próprias facilitadoras e que são transpassados para responsabilidade do lojista, que além de suportar os riscos de sua própria atividade passa a suportar também essa ampla desvantagem em relação aos benefícios desfrutados pelas administradoras de cartões de crédito.

Como um negócio passível de apresentar problemas, juntamente com as funções facilitadoras do cartão de crédito para as transações comerciais no comércio eletrônico, surgiu, paulatinamente, a necessidade de reger por regulamentações e legislações as relações entre os lojistas, os consumidores e as credenciadoras de cartão de crédito.

Cientificamente, faz-se mister discorrer acerca das distinções entre o direito de arrependimento e o chargeback uma  vez que parecem, de início, se tratar do mesmo direito, e que, consequentemente, podem gerar os mesmos efeitos, mas, na verdade, dizem respeito a práticas diferentes. O Código do Consumidor e a lei 7.962/2013 sobre a contratação no comércio eletrônico protegem de forma bem ampla os interesses do consumidor, enquanto a proteção dos interesses do lojistas no e-commerce ficam à cargo de medidas que estes mesmos devem tomar para não sofrerem o prejuízo decorrentes do chargeback e de possíveis fraudes. Este estudo proporciona a compreensão dos prejuízos recorrentes que o cancelamento das operações com cartões de crédito causa aos lojistas, e faz perceber a presença de insegurança nos contratos tanto quanto entre consumidores e credenciadoras de cartão de crédito, como entre aqueles e os próprios lojistas cujas expectativas de lucro são frustradas, posto que são os que mais resultam lesados no negócio quando a venda não prospera.

Portanto, é perceptível que a questão a ser tratada mais adiante a respeito das formas de cancelamento das operações realizadas com cartão de crédito, tem, na sua desmistificação, relevância no âmbito jurídico, uma vez que envolve a discussão de causas relativas ao comércio e, principalmente, aos direitos do consumidor.

Realizado com base numa ótica procedimental, este estudo abrange característica bibliográfica, e, no tocante aos objetivos, exploratória. (GIL, 2010) Para que o caso em questão seja profundamente compreendido, o presente trabalho apresenta fatos relevantes a fim de que se possa construir um pensamento acerca do problema.

 

2 CHARGEBACK X DIREITO DE ARREPENDIMENTO

 

Chargeback pode ser conceituado da seguinte maneira:

O chargeback é o cancelamento de uma compra online realizada através de cartão de débito ou crédito, que pode acontecer em virtude do não reconhecimento da compra pelo titular do cartão ou ainda pelo fato de a transação não obedecer às regulamentações previstas nos contratos, termos, aditivos e manuais editados pelas administradoras de cartão. (RICCIO, 2015).

 

Portanto, chargeback é uma cláusula contratual criada pelas credenciadoras de cartões de crédito, de forma a garantir maior segurança em suas transações, livrando o consumidor de prejuízos em situações que ele poderia vir a ser lesado por fraude de terceiros. Ele ocorre em duas situações: quando o titular do cartão de crédito ou débito não reconhece a respectiva compra e  quando há descumprimento das normas acordadas entre a administradora do cartão e o lojista. Ou seja, para que haja o chargeback é imprescindível que ocorra uma dessas duas situações, sob pena do consumidor ou da administradora incorrerem em abuso de direito caso aleguem o chargeback sem devida motivação.

Porém, enquanto o chargeback protege o consumidor de prejuízos decorrentes de fraudes de terceiros, ele é um verdadeiro terror para os lojistas, que passam a arcar não só com todos os riscos inerentes às operações de cartões de crédito e débito, mas também à possibilidade do consumidor agir com má fé, alegando não reconhecer uma compra legítima.

Não bastasse o prejuízo pelo não recebimento pelas vendas efetuadas, o lojista ainda pode ser surpreendido pela bizarra situação de passar da posição de lesado para a de devedor da administradora. Suponhamos a situação em que o lojista efetua várias vendas e muitas delas são recusadas pela administradora. Independentemente das outras transações serem legítimas ou não, elas respondem pelo valor das transações fraudadas e portanto, devem ser usadas para reposição de valores que tenham sido sacados pelo lojista antes da negativação da compra. É justamente nessa situação que muitas lojas virtuais encerram suas atividades. Como o fluxo de vendas é interrompido, mas não o fluxo de negativação de compras já efetuadas, o resultado é um saldo devedor na conta do lojista afiliado. (GUGLINSKI 2013).

 

O chargeback muito se difere do direito de arrependimento, este é previsto pelo Código do Consumidor em seu artigo 49:

Art 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio. (BRASIL, 2015, p. 762)

 

Segundo Cláudia Lima Marques (2002) o direito de arrependimento é um instituto criado para resguardar a declaração de vontade do consumidor, visto que compras onde não há contato entre consumidor e produto podem facilmente causar uma impressão errada acerca daquele produto.

Dessa forma, o consumidor assume uma posição vulnerável na relação de consumo eletrônico:

A vulnerabilidade é subprincípio derivado do grande princípio social da equivalência material, no plano da teoria geral dos contratos. É, todavia, princípio autônomo nas relações contratuais nas quais a vulnerabilidade de um dos figurantes é presumida por lei. Exemplo frisante é a do contrato de consumo, em que recebe expressa e destacada referência no CDC. (LÔBO, 2013).

 

Diferentemente do chargeback, o direito de arrependimento não precisa ser motivado, constituindo assim um direito potestativo do consumidor. É direito potestativo, pois o comprador não entra em contato direto com a mercadoria, podendo se enganar quanto a sua cor, dimensão, forma, textura, dentre outros, de forma que disporá de um prazo de sete dias contados ou da assinatura do contrato ou do recebimento do serviço ou produto para desistir da compra e prosseguir com sua devolução, como afirma Guglinski (2013, p [?]):

Para que o consumidor exercite o seu direito de arrependimento não há a necessidade da ocorrência de qualquer evento, bastando a sua vontade de não mais contratar, isto é, de prosseguir com o negócio. Não há necessidade, por exemplo, da ocorrência de vícios do produto ou do serviço para que o consumidor desista de contratar. O direito de desistir do negócio celebrado carece de motivação, devendo o consumidor receber, imediatamente, a quantia eventualmente paga, monetariamente corrigida. (GUGLINSKI 2013, p[?]).

 

Chargeback e direito de arrependimento diferem, portanto, em sua essência. Enquanto um é clausula contratual e precisa de relevante razão de direito para ocorrer, o outro é expressamente previsto em lei e visa proteger a declaração de vontade do consumidor, sem necessitar de justificativa para ser efetivado. Outra diferença é que, enquanto o chargeback gera uma desproporção entre contratantes e prejudica o comerciante, o direito de arrependimento serve justamente para o contrario, para evitar que o consumidor seja lesado. Uma semelhança entre eles é que em ambos o comerciante sai em desvantagem, mas, enquanto um é direito do consumidor e ocorre por insatisfação com um serviço prestado, de forma que o lojista estará apenas se sujeitando aos riscos de sua atividade, o outro decorre de falhas da credenciadora, terceiro em relação a essa obrigação contratual.

 

2.1 Breves considerações acerca do exercício do direito de arrependimento no e-commerce

 

Felipe Caputti (2015, p.[?]) questiona se o direito de arrependimento, também chamado de prazo de reflexão, pode ser alegado em toda compra que acontece pelo e-commerce. Caputti (2015, p.[?]) afirma que o artigo 49 do CDC condiciona o direito de arrependimento à compra feita somente fora do estabelecimento comercial do lojista, o dispositivo seria uma garantia de proteção do consumidor contra o marketing agressivo, que poderia distorcer as características do produto; entretanto, se posiciona contra a aplicação do direito de arrependimento a todos os casos ocorrido no e-commerce, uma vez que o consumidor tem e pode ter acesso a toda informação atinente ao produto. Portanto, tal direito só deveria ser aplicado na ocasião em que o site possibilite ao consumidor uma compra consciente, na qual este esteja a par das descrições do produto. Fundamenta-se em jurisprudências cujas decisões restringem o direito de arrependimento:

 O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, nos autos do processo 0002317-28.2012.8.07.0018, consignou que arrependimento não se traduz em prerrogativa a assegurar o distrato imotivado do contrato, mas o direito de o consumidor arrepender-se quando adquire bem ou serviço em situação que não lhe permitira aferir com precisão e exatidão o que adquirira. [...] É necessário compreender que a ratio do direito de arrependimento é a proteção do consumidor diante de sua vulnerabilidade no ato de consumo. No caso deste ato ocorrer pela internet, dever-se-á analisar se houve emprego de técnicas de marketing agressivo e se o contato imediato com o bem da vida pretendido influenciaria nas expectativas e necessidades do consumidor. (TJDF apud CAPUTTI, 2015. p[?])

 

Tal entendimento protege o consumidor de ser lesado e o lojista de ser abusado na hipótese do primeiro exercer de maneira abusiva o seu direito. Caputti (2015, p.[?]) entende que aquele que busca obter um produto pelo e-commerce está no controle da situação, não está sendo influenciado e pressionado por algum vendedor, imperando na relação de compra e venda a impessoalidade, o que deixa o consumidor à vontade para fazer as suas escolhas, supõe-se que,  consciente e confiante nas descrições do produto; portanto, dispondo de todas as informações essenciais do produto, o direito de arrependimento estaria vinculado ao marketing abusivo, com o qual são frustradas as expectativas do consumidor sobre o produto no momento da entrega.

 

3 TRANSFERÊNCIA DAS CONSEQUÊNCIAS DO CANCELAMENTO DA COMPRA PARA AS CREDENCIADORAS DE CARTÃO

 

Ao se falar em operações de compra com cartão de crédito é necessário levar em conta que quatro partícipes protagonizam essa relação: o banco emissor do cartão de crédito, o consumidor/usuário, as credenciadoras e os lojistas. O banco emite o cartão ao abrir um determinado crédito para o consumidor e este, por sua vez passa a desfrutar do usufruto do cartão de crédito para transacionar os valores de suas compras. Por outro lado, há a relação entre credenciadora e lojista, onde a primeira permite a integração do ponto de venda do segundo a uma plataforma digital e presta para ele todos os serviços da transação econômica virtual, desde a captura até a liquidação do pagamento. Por fim, a relação entre credenciadora e consumidor consiste em uma verdadeira sub-rogação de obrigações, pois aquela efetua o pagamento para o lojista no lugar deste, de forma que um terceiro substitui o credor originário da relação obrigacional:

a sub-rogação, é o instituto jurídico que melhor se amolda à operação em análise, pois um terceiro (credenciadora que recebe valores do banco emissor do cartão), e não o primitivo devedor (o consumidor), é quem efetua o pagamento ao lojista. Há uma verdadeira substituição do credor originário da obrigação, de forma que o novo credor é quem passa a dispor de todos os direitos, as ações e as garantias que tinha o primeiro. (FILIPPIN, 2015, p. [?])

Porém, muitas das vezes ocorre da credenciadora não reconhecer a dívida ou o titular do cartão de crédito não reconhecer a compra, seja por fraude de terceiros ou por má-fé do próprio consumidor e contatar a administradora para que esta cancele a compra e providencie o estorno, configurando assim o chargeback. É mister se dizer que nenhuma prova se faz necessária para esse cancelamento, a simples alegação do titular questionando a origem do débito é suficiente para que a administradora e credenciadora procedam com o estorno.

Em vista do principio da função social, o qual, segundo Tartuce (2011, p. 97) consiste em ‘’um princípio contratual, de ordem pública, pelo qual o contrato deve ser, necessariamente, visualizado e interpretado de acordo com o contexto da sociedade’’ é possível afirmar que a cláusula do chargeback afronta o social, pois consiste em prejuízos para os lojistas do e-commerce, ferramenta amplamente difundida e utilizada nos dias atuais e imprescindível para a movimentação da economia.

Ainda se falando em princípios, o professor Paulo Luiz Netto Lôbo (2002, p. [?]) atenta para o princípio da equivalência material das prestações, o qual protege as partes contratantes do desequilíbrio contratual: uma das partes não pode possuir vantagens excessivas em desfavor da outra.

Pois bem, visto que as credenciadoras detém o domínio exclusivo de sua atividade, chega a ser uma injustiça punir os lojistas por uma falha resultante de sua própria atividade ou por uma alegação do consumidor, onde nem mesmo provas são requeridas. Assim como os comerciantes se arriscam em todo momento no exercício de sua atividade, também há de se falar em responsabilidade das credenciadoras sobre o risco de suas atividades, que estão amplamente expostas a riscos de fraudes.

A fundamentação legal para a afirmação contida acima consta no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil: “haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.” (BRASIL, 2015, p. 210). Pode-se recorrer também à súmula 479 editada pelo STJ ‘As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.”.(BRASIL, 2015, p. 1682)

Portanto, é ilógico imputar tamanha desproporção aos comerciantes com a cláusula do chargeback. Faz-se imprescindível a necessidade de atender ao principio da função social e da equivalência material das prestações, de forma a proteger os lojistas em sua atividade, transferindo assim os riscos do chargeback para os verdadeiros responsáveis pela sua ocorrência: as credenciadoras de cartões de crédito.

 

3.1 Opções alternativas: intermediários de pagamento e empresas especializadas em análise de risco

 

É imprescindível atentar para o fato de que, apesar da solução apontada no tópico anterior ser a mais correta, há de se admitir que “dificilmente o comerciante conseguirá discutir os termos afetos aos riscos envolvendo o chargeback’’ (GUGLINSKI, 2013). Em vista desse impasse, especialistas em e-commerce apontam intermediários de pagamento, como MercadoPago, Bcash, Paypal, Verifica (empresa independente advinda do PagSeguro UOL) e empresas especializadas em análise de risco como as melhores soluções para os riscos enfrentados no comércio eletrônico.

Segundo Natarelli (20[?], p. [?]):

O Verifica é, pois, a solução de gerenciamento do risco criada e utilizada pelo UOL, especialmente desenhada para reduzir o índice de fraudes no comércio eletrônico. Combina alta capacidade de processamento online, expertise de profissionais treinados, uma ampla base de transações e eficientes métodos estatísticos, resultando em uma poderosa solução, que agora está disponível gratuitamente para lojas virtuais. O Verifica estima o risco de chargeback de transações realizadas com cartão não presente em suas transações online. O serviço identifica as vendas que possuem maior propensão à fraude, baseado em ferramentas estatísticas e data mining.

 

Opção alternativa aos intermediários de pagamento seria a tecnologia de análise de risco e prevenção à fraude, que consiste no investimento em empresas especializadas na área, que garantem transações virtuais seguras.

Existem empresas no Brasil especializadas em prevenir fraudes, focadas principalmente na segurança de transações realizadas por meio de cartão de crédito no meio eletrônico. As líderes de mercado (Clearsale e Fcontrol) possuem bases de banco de dados bastantes amplas para as consultas das informações dos clientes e realizam o cruzamento de informações da compra com dados de outros e-commerces que utilizam seus serviços. (MROWSKOWSKI, 2015)

 

Portanto, face à inúmera quantidade de fraudes e riscos relacionados à atividade comercial eletrônica, é imprescindível que os lojistas invistam em intermediários de pagamento e empresas especializadas em análise de risco, o que, apesar de demandar maiores custas aos comerciantes (fato que consequentemente refletirá no preço dos produtos ofertados), os livrará dos imensos prejuízos gerados pelo chargeback.

 

4 A FRAGILIDADE DAS OPERAÇÕES FEITAS COM CARTÃO DE CRÉDITO NO COMÉRCIO ELETRÔNICO RELACIONADA AOS RISCOS DO CHARGEBACK

 

As operações feitas com cartões de crédito, principalmente as do e-commerce, não escapam ao dever de serem efetuadas tendo em vista a boa-fé e a primazia da confiança na relação entre as partes do negócio.

Riccio (2015, p. [?]) dispõe que existem 4 ocasiões que ensejam a prática do chargeback, são elas:

1. Erro de processamento do Banco (mais raro de acontecer);

2. Erro no valor cobrado (por exemplo, era para a loja ter cobrado apenas R$ 100,00 e veio na fatura do cliente um valor de R$ 200,00);

3. O cliente não recebeu a mercadoria conforme combinado na compra pela internet ou por telefone, então entra em contato com a administradora de cartão e solicita o cancelamento da compra;

4. Fraude – o consumidor alega que não autorizou a compra (por exemplo, ocorreu roubo dos dados do seu cartão de crédito);

 

O chargeback deixa ser um provento e torna-se um vilão uma vez que o vendedor está vulnerável a todos os prejuízos, este perde da mercadoria e o lucro que poderia obter com a venda da mesma quando a credenciadora autoriza o estorno. Segundo Josieane Osórios (2013, p. [?]), consultora e coordenadora do curso de e-commerce “uma situação de desacordo comercial ocorre quando o cliente alega que houve um problema qualquer na transação comercial como, por exemplo, erro no preenchimento dos dados do comprador, divergência de assinaturas ou insatisfação do cliente com o produto adquirido”. O direito do consumidor é legítimo, assim como tais justificativas, porém pelo fato do vendedor estar sujeito a todos os riscos inerentes a compra, a fragilidade do negócio gera insegurança jurídica e abre margem para pessoas mal intencionadas. Como lembra Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 22):

A boa-fé objetiva classifica-se como norma de comportamento, fundada em um princípio geral do direito segundo o qual todos devem agir de boa-fé nas suas relações recíprocas. Nessa acepção, está fundada na honestidade, na retidão, na lealdade e na consideração para com os interesses do outro contraente, em especial no sentido de não lhe sonegar informações relevantes a respeito do objeto e conteúdo do negócio.

 

Destarte, os riscos do chargeback assumem diferentes facetas, estes podem envolver condutas consideradas legítimas pela lei, como quando o consumidor alega, de boa-fé, um dos problemas supracitados que podem ocorrer com o negócio; entretanto, como ressalta Josieane Osórios (2013, p.[?]), pode ocorrer uma situação adversa quando “[...]o verdadeiro titular do cartão, agindo de má fé, efetua a compra na loja virtual e depois alega não reconhecer aquela compra, exigindo o estorno do lançamento em sua fatura”, ou seja, os riscos também abarcam a conduta consumidores que cometem práticas fraudulentas ao alegar falsas situações, posto que não aconteceram.

[...] os chargebacks, são causados por clientes dos bancos emissores de cartões que agiram de má-fé (simples negativa da compra efetivamente realizada) ou que foram vítimas de fraudadores que violaram o sistema de segurança das próprias credenciadoras. A cláusula excludente de responsabilidade por chargeback atenta contra o bom desenvolvimento do mercado de compra à distância, pois, coercitivamente, a credenciadora impõe ao lojista o encargo de assumir um prejuízo oriundo de operação que foi inicialmente autorizada pela própria credenciadora. (FILIPPIN, 2015, p.[?])

A praticidade das operações realizadas com cartão de crédito pelo e-commerce acaba desvalorizada pelos lojistas, uma vez que resulta num ônus que se for recorrente ao longo tempo pode gerar a falência de uma empresa. O chargeback assim como os mecanismos de troca de produtos e o direito de arrependimento é uma garantia para o consumidor, mas pela insegurança jurídica que representa pode resultar numa injustiça para o lojistas, o que serve de alerta para que aperfeiçoem suas lojas, através de dispositivos de proteção,  para vendas mais seguras, evitando fraudes pelo chargeback. João Paulo de Mello Filippin (2015, p. [?]) afirma que a decisão de quem deve arcar com esses prejuízos depende de como se efetivou a venda, são duas as hipóteses:

 (i) não subsistem dúvidas de que o lojista que não conseguir comprovar a regularidade (em especial com a emissão de respectivo documento fiscal) na venda e na entrega do produto ou do serviço deverá arcar com o prejuízo decorrente do chargeback. Pois aqui não há prova da relação jurídica primitiva que deu origem ao crédito reclamado pelo lojista; (ii) análise tormentosa reside nos casos em que o lojista de fato entregou a mercadoria ou realizou a prestação do serviço e mesmo assim o usuário do cartão contesta a operação de pagamento, seja por simples negativa genérica ou por ter sido vítima de fraudador. (FILIPPIN, 2015, p.[?])

Segundo Elisa Mombelli (2015, p[?]) o prejuízo, hoje em dia, sem dúvidas recai sobre o lojista, uma vez que mesmo na ocasião de já ter entregado o produto ao consumidor, não tem o retorno financeiro das compras canceladas através da alegação do chargeback. As operadoras de cartão de crédito propõem um contrato no qual caso o cliente queira o seu crédito de volta, quem vai arcar com as perdas é o estabelecimento comercial. Para Elisa Mombelli (2015, p.[?]), esses prejuízos podem ser ressarcidos através de uma demanda judicial, e cada vez mais os lojistas estão sendo amparados pelos tribunais brasileiros, tendo a sua vulnerabilidade ao chargeback reconhecida, possibilitando a transferência da responsabilidade para as credenciadoras e administradoras de cartões de crédito.

Nas vendas on-line o vendedor fica vulnerável a fraudes, como clonagem de cartões e o uso de cartões de créditos roubados. As administradoras de cartão de crédito se eximem das responsabilidades atinentes à efetivação das vendas, sendo que são estas que autorizam o uso do crédito. Ao contrário do consumidor que dispõe de todas as informações que caracterizam o produto, o lojista desconhece durante todo o processo de compra e venda os riscos aos quais estão vulneráveis, nada mais sabem do que as informações que o cliente apresenta nos dados cadastrais e do seu saldo bancário disponível, ficando muito vulneráveis a golpes, é o que assevera Romeu Sobrinho ao analisar esse processo (2011, p. [?]). Os contratos feitos entre as administradoras e o lojistas só são desfavoráveis a esses últimos; enquanto as administradoras se dão direitos, os lojistas ficam responsáveis pelos riscos que a operação oferece. Fora isso, ainda existem os aditivos, podem surgir novas normas da credenciadora que não serão sequer avisadas previamente e o contratante, o lojista, não pode recusar segui-las (SOBRINHO, 2015, p. [?]). O chargeback configura o seguinte:

Suponhamos a situação em que o lojista efetua várias vendas e muitas delas são recusadas pela administradora; Independentemente das outras transações serem legítimas ou não, elas respondem pelo valor das transações fraudadas e, portanto, serão usadas para reposição de valores que tenham sido sacados pelo lojista antes da negativação da compra. É justamente nessa situação que muitas lojas virtuais encerram suas atividades. Como o fluxo de vendas é interrompido, mas não o fluxo de negativação de compras já efetuadas, o resultado é um saldo devedor na conta do lojista afiliado. (SOBRINHO, 2015, p. [?]).

 

É preciso que o lojista tenha a garantia da transação e que ela ocorra de forma segura e vigiada para que sejam analisados todos os riscos da operação a fim de evitar golpes e futuros prejuízo.

A administradora dos cartões de crédito se recusam a arcar com as responsabilidades das perdas advindas da autorização de transações fraudulentas, ainda que, por óbvio, devessem analisar a possibilidade da ocorrência desses riscos em cada operação. Um exemplo dessa rejeição de responsabilidades foi alegado pela prestadora de serviços Visanet em juízo:

Prestação de serviços. Empresa afiliada ao sistema Visanet. Prestadora do serviço que se nega ao pagamento de compra efetuada com cartão de crédito, por meio de internet, após constatar fraude em sua utilização. Operação realizada por empresa afiliada do sistema operacional dentro das cautelas normais e após o recebimento de autorização da prestadora do serviço. Risco inerente à atividade, que deve ser carreado à prestadora do serviço. Sentença mantida. Recurso não provido” (Apel. 0193188-71.2008.8.26.0100, 34ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Rosa Maria de Andrade Nery, j. 20/08.2012). (FILIPPIN, 2015, p. [?])

 

Se a prestadora de serviços é a encarregada de autorizar a transação, seria também esta a parte incumbida de analisar os riscos da mesma para evitar injustiças e prejuízos para o lojista.

 

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Provém da popularização dos meios eletrônicos a ampla difusão de lojas online, que disponibilizam seus produtos para consumo a partir de transações virtuais de cartões de crédito ou débito.

Foi apresentada a importância do direito de arrependimento para o consumidor, inclusive nas compras feitas pelo e-commerce com a utilização do cartão de crédito; ao mesmo tempo, conclui-se que se deve ficar alerta para o exercício abusivo desse direito, uma vez que todas as partes dessa relação de compra e venda devem  observar os princípios da boa-fé objetiva, para que esse privilégio seja utilizado apenas quando o produto realmente frustra todas as expectativas do consumidor.

Diante dessa realidade de também surge a figura do chargeback, cláusula contratual amplamente controvertida e desproporcional aos contratantes e que coloca os lojistas em grande desvantagem quanto às credenciadoras de cartões, as quais transferem todos os riscos de sua própria atividade para os comerciantes, que ficam expostos a todo tipo de fraudes e má fé por parte do consumidor ou da própria credenciadora.

A partir do exposto conclui-se, com base na legislação brasileira e em decisões do STJ, que é possível transferir as consequências do chargeback para as credenciadoras de cartões de crédito e débito, de forma que estas passem a arcar com os riscos inerentes à sua atividade sem transferi-los para o encargo dos lojistas, que já enfrentam muitos riscos advindos de sua própria atividade comercial.

Outra solução encontrada foi a adoção de intermediários de pagamento e empresas especializadas em análise de risco, que atuem de forma a bloquear quaisquer fraudes que possam vir a prejudicar o rendimento das lojas virtuais e que, apesar de custarem caro aos lojistas, têm o condão de protegê-los de situações como as geradas pelos chargebacks.

Fato é que as empresas precisam adotar novos mecanismos de proteção para evitar a falência. Notadamente, os lojistas, na atualidade, são os que ficam sujeitos a todos os riscos dessas operações, uma vez que os contratos com as credenciadoras de cartões os desfavorecem totalmente.

Ou seja, esse prejuízo precisa ser distribuído de uma forma mais justa entre os responsáveis pela transação do crédito e as empresas de compra e venda on-line precisam proteger-se de todos os tipos de golpes.

 

 

REFERÊNCIAS

 

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