A EDUCAÇÃO INFANTIL COMO BASE DO DESENVOLVIMENTO INTEGRAL DA CRIANÇA

Por alessandra aparecida avelino dos santos custodio | 24/09/2025 | Educação

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A EDUCAÇÃO INFANTIL COMO BASE DO DESENVOLVIMENTO INTEGRAL DA CRIANÇA


 

Ariany Maria Furlan


 

Introdução


 

A Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica no Brasil, é um espaço privilegiado para o desenvolvimento integral da criança em suas dimensões cognitivas, motoras, sociais, afetivas e culturais. Conforme preconiza a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9.394/1996), essa etapa tem como finalidade “o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade” (BRASIL, 1996). Tal orientação enfatiza a necessidade de compreender a infância como um período singular, marcado por aprendizagens significativas e experiências fundamentais para a formação da identidade.

Historicamente, a Educação Infantil foi vista como espaço assistencialista, voltado ao cuidado e à proteção. No entanto, com a ampliação de pesquisas sobre o desenvolvimento humano e com a evolução das políticas educacionais, consolidou-se a compreensão de que a infância deve ser vivida em sua plenitude, com acesso a práticas pedagógicas intencionais, lúdicas e mediadas pelo professor. Para Kramer (2011), a criança é sujeito histórico e social, inserida em um contexto cultural e político, devendo ser considerada protagonista no processo educativo.

Nesse sentido, o papel do professor na Educação Infantil torna-se central. Mais do que transmitir conteúdos, cabe a ele proporcionar situações de aprendizagem que favoreçam a exploração, a imaginação, a criatividade, a interação e a construção de conhecimentos. O brincar, a contação de histórias, a música, a arte, a literatura e o movimento são estratégias que potencializam o desenvolvimento infantil.

Este artigo tem como objetivo discutir a importância da Educação Infantil 

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como base para a formação integral da criança, destacando suas especificidades, desafios e práticas pedagógicas. A análise será fundamentada em autores da área e em documentos legais que norteiam o campo educacional brasileiro.


 

Desenvolvimento

A infância como etapa singular


 

A infância não deve ser compreendida como mera preparação para etapas posteriores da vida, mas como uma fase dotada de especificidades próprias, que merece ser valorizada em sua singularidade. Para Ariès (1981), a ideia de infância como categoria diferenciada surgiu historicamente, evidenciando que a valorização desse período não é algo natural ou universal, mas sim uma construção social. Nesse sentido, é necessário compreender que a infância possui uma lógica própria de desenvolvimento, aprendizagens e modos de ser no mundo, que não podem ser reduzidos à antecipação da vida adulta.

Reconhecer o valor da infância implica assegurar às crianças o direito de aprender, brincar e conviver em ambientes educativos de qualidade, nos quais suas necessidades afetivas, cognitivas, motoras e sociais sejam respeitadas. A escola, nesse contexto, deve ser um espaço de experiências significativas, onde a ludicidade, a imaginação e a curiosidade tenham centralidade no processo educativo. Como destaca Kramer (2003), a infância é marcada por múltiplas linguagens e formas de expressão, que devem ser acolhidas e potencializadas por práticas pedagógicas inclusivas e democráticas.

Portanto, ao se compreender a infância como etapa fundamental da vida e não apenas como uma transição, reforça-se a importância da criação de políticas públicas, currículos e práticas pedagógicas que reconheçam a criança como sujeito de direitos, produtora de cultura e participante ativa na sociedade. Tal perspectiva rompe com visões reducionistas e utilitaristas, promovendo um olhar mais humano, sensível e comprometido com o pleno desenvolvimento infantil.

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Nesse sentido, Kramer (2003), 

A infância não é apenas uma fase transitória, mas uma etapa que deve ser vivida em sua plenitude, com experiências significativas que favoreçam a expressão, a imaginação e a criatividade. Reduzir a infância à preparação para a vida adulta é negar às crianças o direito de serem protagonistas de sua própria história, de viverem o presente com intensidade e sentido. (Kramer, 2003, p. 21).


 

Nessa perspectiva, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) enfatiza os direitos de aprendizagem da criança na Educação Infantil, que incluem conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se (BRASIL, 2017). Esses direitos destacam o papel ativo da criança no processo educativo e reforçam a importância de práticas pedagógicas significativas.

O brincar é o principal meio pelo qual a criança aprende e se desenvolve, constituindo-se como atividade central na infância e no processo educativo. Para Vygotsky (1991), a brincadeira cria uma zona de desenvolvimento proximal, ou seja, possibilita que a criança atinja níveis mais elevados de compreensão e interação, realizando atividades que, sozinha, ainda não conseguiria desempenhar. Nessa perspectiva, o brincar não deve ser compreendido como mero passatempo, mas sim como atividade formadora, que estimula a imaginação, a linguagem, a socialização e a autonomia, contribuindo de forma significativa para a construção do conhecimento e para a internalização de regras e papéis sociais.

Além disso, o brincar favorece o desenvolvimento da criatividade e da capacidade de resolução de problemas, pois coloca a criança em contato com situações simbólicas que exigem tomadas de decisão, negociação e cooperação. Conforme Kishimoto (2011), o jogo é essencial na Educação Infantil, pois integra prazer, desafio e aprendizado em uma mesma prática pedagógica. Por meio de atividades lúdicas, as crianças desenvolvem habilidades cognitivas, motoras e socioemocionais, ao mesmo tempo em que se apropriam de valores culturais e aprendem a respeitar normas sociais, como esperar a vez e compartilhar materiais.

O lúdico, portanto, não deve ser visto apenas como complemento da prática educativa, mas como elemento estruturante do processo de ensino e 

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aprendizagem. Brincadeiras de faz de conta, jogos de regras, atividades de movimento e de exploração sensorial ampliam as possibilidades de experimentação da criança, permitindo que ela construa significados sobre o mundo que a cerca. Nesse sentido, cabe ao professor atuar como mediador, criando ambientes ricos e desafiadores que possibilitem a vivência de diferentes formas de brincar e que respeitem o ritmo e as necessidades individuais.

Assim, o brincar, além de proporcionar prazer, constitui-se em estratégia pedagógica fundamental, que deve ser reconhecida e valorizada pelas instituições de Educação Infantil, garantindo às crianças o direito de aprender de maneira significativa, criativa e integral.

Sobre essa importância do brincar, Horn (2004, p. 67) complementa:

O brincar é a atividade central da infância e deve ser compreendido como linguagem própria da criança. É por meio dele que a criança experimenta papéis, reproduz práticas sociais e constrói conhecimentos. Quando a escola reconhece o brincar como eixo pedagógico, ela cria condições para que a aprendizagem seja significativa, respeitando os modos de ser e estar da criança no mundo. (Horn, 2004, p. 67).


 

A leitura e a contação de histórias são práticas indispensáveis na Educação Infantil, pois despertam a imaginação, ampliam o vocabulário e fortalecem os vínculos afetivos. Abramovich (1997) afirma que “ouvir histórias é uma das experiências mais significativas da infância, pois contribui para a formação de leitores e para a construção de sentidos sobre o mundo”.

O contato com diferentes gêneros textuais possibilita às crianças desenvolverem a oralidade, a escuta atenta e a apreciação estética. A literatura infantil, especialmente os clássicos, carrega valores simbólicos que auxiliam a criança a lidar com sentimentos, emoções e desafios cotidianos.

O desenvolvimento motor é outro aspecto essencial da Educação Infantil. Atividades que envolvem correr, pular, dançar, escalar e manipular objetos favorecem a coordenação motora ampla e fina, fundamentais para aprendizagens futuras, como a escrita (FERREIRA, 2014).

A Educação Física, quando trabalhada de forma lúdica, contribui para a consciência corporal, o equilíbrio e a lateralidade, elementos indispensáveis à 

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alfabetização e ao desenvolvimento da autonomia. Segundo Oliveira (2012), o corpo é meio de expressão e comunicação, sendo necessário que as práticas pedagógicas valorizem a corporeidade como linguagem.

O professor é mediador do processo educativo, responsável por planejar, organizar e refletir sobre as práticas. Sua formação continuada é fundamental para que possa articular teoria e prática, respeitando a diversidade cultural, social e cognitiva das crianças.

Como afirmam Barbosa e Horn (2008, p. 45):

As práticas pedagógicas na Educação Infantil devem ser intencionais, planejadas e organizadas, mas sem perder de vista a ludicidade e a liberdade da criança. O professor atua como mediador, criando condições para que a criança se aproprie de saberes, construa significados e desenvolva sua autonomia. (Horn, 2008, p.45).


 

Além disso, é necessário que o professor esteja atento à inclusão, garantindo a participação de crianças com deficiência ou necessidades específicas. A perspectiva da educação inclusiva valoriza a diversidade e assegura o direito de todos ao acesso e permanência em ambientes educativos.

Apesar dos avanços legais e teóricos, a Educação Infantil ainda enfrenta desafios, como a falta de infraestrutura adequada, número reduzido de profissionais qualificados, e desvalorização social dessa etapa. Segundo Campos (2013), há necessidade de maior investimento em políticas públicas que assegurem qualidade e equidade, para que todas as crianças tenham acesso a experiências educativas significativas.

Outro desafio é a formação docente. O profissional que atua com crianças pequenas precisa ser constantemente preparado para lidar com diferentes linguagens, metodologias e contextos. Além disso, é fundamental a parceria entre escola e família, pois a aprendizagem é mais efetiva quando há continuidade entre os espaços de socialização.

Considerações Finais


 

A Educação Infantil constitui-se como etapa fundamental do processo educativo, na qual a criança deve ser reconhecida como sujeito de direitos, 

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protagonista de suas aprendizagens e parte integrante de uma sociedade em constante transformação. As práticas pedagógicas nessa fase devem ir além do assistencialismo e do preparo para o ensino fundamental, valorizando a infância em sua singularidade.

Ao longo deste artigo, discutiu-se como o brincar, a literatura, a expressão corporal e a mediação docente desempenham papéis essenciais no desenvolvimento integral da criança. O brincar aparece como eixo estruturante, promovendo aprendizagens cognitivas, motoras e sociais. A literatura infantil, por sua vez, amplia a imaginação e favorece a formação de leitores críticos e sensíveis. Já o movimento e as práticas corporais estimulam a coordenação e a autonomia, contribuindo para futuras etapas escolares.

Outro aspecto relevante é a valorização do papel do professor. Cabe a ele não apenas ensinar, mas criar condições de aprendizagem, respeitando o tempo, o ritmo e a individualidade de cada criança. A mediação pedagógica deve ser intencional, planejada e reflexiva, mas sempre permeada pela ludicidade.

Os desafios apontados, como a carência de recursos, a necessidade de formação docente e a efetivação da inclusão, mostram que ainda há um longo caminho a percorrer para garantir uma Educação Infantil de qualidade universalizada. Contudo, reconhece-se que avanços significativos foram conquistados nas últimas décadas, especialmente com a LDB, a BNCC e as políticas públicas voltadas para a infância.

Portanto, assegurar uma Educação Infantil de qualidade é investir em uma sociedade mais justa, democrática e humana. Como afirma Malaguzzi (1999), idealizador da pedagogia de Reggio Emilia: “a criança possui cem linguagens, mas lhe roubam noventa e nove”. Cabe à escola e aos educadores garantir que essas linguagens sejam reconhecidas, valorizadas e potencializadas. Somente assim será possível consolidar uma educação verdadeiramente transformadora e inclusiva.


 

Referências


 

ABRAMOVICH, Fanny. Literatura infantil: gostosuras e bobices. São Paulo: 

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Scipione, 1997.


 

ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: LTC, 1981.


 

BARBOSA, Maria Carmem Silveira; HORN, Maria das Graças. Educação Infantil: saberes e fazeres da formação de professores. Porto Alegre: Artmed, 2008.


 

BRASIL. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Brasília: MEC, 1996.


 

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017.


 

CAMPOS, Maria Malta. Educação Infantil: o debate e a pesquisa. Campinas: Autores Associados, 2013.


 

FERREIRA, Luiz. Psicomotricidade na Educação Infantil. São Paulo: Cortez, 2014.


 

KISHIMOTO, Tizuko Morchida. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. 12. ed. São Paulo: Cortez, 2011.


 

KRAMER, Sonia. Infância, educação e direitos humanos. São Paulo: Cortez, 2011.


 

MALAGUZZI, Loris. As cem linguagens da criança: a abordagem de Reggio Emilia na educação da primeira infância. Porto Alegre: Penso, 1999.


 

OLIVEIRA, Marta Kohl de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento – um processo sócio-histórico. 6. ed. São Paulo: Scipione, 2012.


 

VYGOTSKY, Lev S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1991.


 

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