Visita Inesperada

 

O Campus da PUC de São Paulo na Rua Monte Alegre é uma verdadeira viagem no tempo. Ali se encontra o famoso e polêmico teatro TUCA, e uma variedade de estilos arquitetônicos que retratam etapas do crescimento da Universidade.

As salas de aula distribuem-se por três prédios. O primeiro, um casarão muito antigo, com grandes janelas e pé direito elevado, que remetem às velhas escolas de meados do século passado. O segundo prédio é espartano. Um conjunto de salas em forma de bloco retangular que os alunos apelidavam, a contragosto da direção, de Cingapura em referência a prédios de habitação popular de São Paulo assim denominados por certo político, para associar seu nome à “grife”. Ao lado desses dois, um prédio ultramoderno e confortável, refletindo o progresso e conquistas da Universidade. Tenho orgulho por ter feito meu mestrado na PUC de São Paulo, embora não tenha sido nesse Campus.

Só circulei por ali em uma única oportunidade. Ao fim do Mestrado fui convidado para participar de uma formação de professores, por um período de mais ou menos um ano, com aulas aos sábados, o dia todo. A história que vou contar ocorreu no velho casarão.

Foi num desses dias de aula, no intervalo do almoço, enquanto os alunos saíam e eu apagava o quadro negro e juntava minhas coisas. Apareceu na sala um senhor de sorriso simpático, vestido de maneira muito casual, como alguém que saiu de casa para ir à padaria. Tinha uma voz aguda e um tanto rouca, típica dos anciãos. Começou a observar o que restava escrito no quadro demonstrando conhecer do que se tratava. Eu expliquei que nosso curso era uma Especialização para professores de Matemática.

Passou-me a sensação de ser um velho professor com saudade da sala de aula. Começamos uma conversa agradável. Na verdade, ele falou e eu ouvi. Ao ver as notações matemáticas no quadro, ele falou algo que sugeria que a tecnologia trouxe o pixel, que tornava mensurável aquilo que antes era a abstração do infinitesimal, e coisas do tipo. Pronunciou muitas vezes a palavra pixel, sugerindo que essa inovação trazia um novo paradigma no olhar da matemática. Algo assim. Acho que dei aqui a minha interpretação às palavras dele, que eram ainda mais confusas.

Perguntei seu nome, mas ele falou no meio de um sorriso tímido, daquela forma que sugere que isso não é importante e que não é preciso memorizar. Parece que disse era da USP, mas sempre fugia dessas perguntas. Queria mesmo era falar do pixel. Assim ficamos sozinhos na sala por vários minutos em conversa amigável.

Cheguei atrasado para o almoço. Meus colegas haviam notado meu atraso. Contei-lhes a história. Perguntei se haviam visto o velhinho circulando por ali. Ninguém viu, mas na pressa e no burburinho daquele mundo de gente saindo junto, quem iria notar? Não dei importância a isso.

Alguns colegas mais íntimos do velho prédio e de suas lendas, entretanto, começaram a esboçar um sorriso malicioso e insinuante, de canto de boca. Perguntaram-me se o vi entrando, disse que não, mas estava distraído. Se eu sabia seu nome, disse que não. Terei apertado sua mão?  Não me lembrava, talvez sim, talvez não. Os sorrisos e insinuações só aumentaram. Foi o assunto que divertiu o almoço e o cafezinho.

Confesso que fiquei um pouco desconfortável com as brincadeiras, pois, especulações sobrenaturais à parte, aqueles minutos na companhia do velho professor, não sei por que, fizeram com que eu me sentisse feliz. Por isso relevei as brincadeiras.

Afinal, mesmo sem saber de onde pode ter vindo meu estranho amigo e da matemática confusa que fluiu em nossa conversa, foi muito bom tê-lo encontrado naquele sábado.  Tomara que tenha sido recíproco. Pensando bem, talvez um dia eu apareça assim também nas salas de aula da EsPCEx.