VIRGÍLIA E CAPITU: PERSONAGENS FEMININAS EM ROMANCES DE MACHADO DE ASSIS* 

Maria Luzirene Morais de Sousa**

RESUMO:                                                                       

O presente artigo constitui-se na tentativa de compreensão das personagens femininas: Virgilia e Capitu, criadas por Machado de Assis em suas obras. Sendo que, para este trabalho, utilizei como referencia obras de alguns críticos literários que discorreram sobre o tema, bem como a produção do próprio autor dando ênfase para Memórias Póstumas de Brás Cubas e o clássico Dom Casmurro.

Palavras – Chave: Virgilia, Capitu, Memórias Póstumas de Brás Cubas, Dom Casmurro.

INTRODUÇÃO

            Dono de uma das Literaturas mais ricas do mundo, a Literatura Brasileira abriga uma das maiores coleções de livros de diversos autores de diversas épocas e é sempre estudada por alunos, professores, críticos ou por pessoas que querem ter o simples prazer de uma leitura. Cada um destes busca estes livros para diversos fins, o que faz com que cada um veja determinadas obras de maneiras diferentes. Isto é de importância vital para que as obras sejam mais valorizadas por quem as lê e apenas as tornam mais ricas do ponto de vista crítico.

             Podem-se analisar estas obras dando destaque às mulheres, elas que são muito bem exploradas por Machado de Assis receberão um foco especial neste trabalho, pois seus personagens principais são sempre homens, em sua maioria homens com problemas interiores, solitários e que não tem um final feliz em suas relações amorosas.

             Neste trabalho, analisei Virgilia e Capitu, personagens femininas criadas por Machado de Assis em suas obras literárias. Primeiramente, abordaremos o contexto histórico em que o autor e suas produções se inserem, depois apresentaremos as características dessas personagens e por fim, estabeleceremos relações entre as mesmas com o intuito de compreender a visão machadiana a cerca do universo feminino.

                                                    MATERIAIS E MÉTODOS                              

             Este trabalho constitui-se de um estudo sobre a comparação de duas personagens femininas: Virgilia e Capitu, respectivamente, personagens de romances machadianos. Para fazer este estudo realizei consultas a livros de vários críticos, tais como: D’incaro, Xavier,  Beauvoir e uma entrevista com Alfredo Bosi.

             Os critérios para o referido artigo foi a leitura sobre um pouco da vida e obra de Machado de Assis, bem como a mulher descrita por o mesmo e uma breve comparação das personagens Virgilia  de Memórias Póstumas de Brás Cubas e Capitu de Dom Casmurro.

             Nos romances de Machado de Assis há sempre um destaque para as figuras femininas. Porém, a mulher é muitas vezes retratada com traços de mau caráter, embora em alguns casos ele a privilegie como ser dotado de inteligência e cultura.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

             Considerado por muitos críticos como o maior escritor brasileiro, Joaquim Maria Machado de Assis teve uma existência relativamente estável e conheceu em vida o prestígio e a fama que lhe cabiam. O mulato nascido no Morro do Livramento, Rio de Janeiro, em 1839, tinha todos os requisitos para ser apenas mais um dos muitos cidadãos fracassados que preenchem o universo das periferias das grandes cidades. Entretanto, ao morrer em 1908, recebe honras fúnebres de chefe de estado. Órfã ainda criança, Machado vendeu doces na rua para ajudar a sustentar a família; na juventude foi caixeiro de uma livraria e tipógrafo, mais tarde tornou-se jornalista, profissão que o encaminhou para a literatura. Porém, o seu sustento vinha do emprego que arranjara no funcionalismo público, chegou a fazer carreira, foi oficial gabinete de ministro, diretor de órgão público e por ocasião da Proclamação da República em 1889, estava sob seus cuidados a Diretoria do Comércio da cidade do Rio de Janeiro. Além do emprego público, a carreira de Machado de Assis como escritor contou com outra base sólida: O casamento com a portuguesa Carolina de Novais. A esposa tornou-se uma grande incentivadora de seus escritos e há quem diga que em muitos de seus textos há resquícios da influência dela.

             As obras da fase realista de Machado de Assis têm como cenário a cidade do Rio de Janeiro do final do século XIX e inicio do século XX; seus personagens são representantes autênticos da sociedade burguesa vigente na época, as narrações são sempre conduzidas por protagonistas masculinos o que nos leva a crer que a mulher é sempre mostrada a partir de um ângulo que revela a visão do homem a respeito da condição feminina. Partindo do pressuposto de que a sociedade da época era fortemente marcada pelo patriarcalismo e que nessa condição a figura feminina ideologicamente estava submissa ao homem, não é de se estranhar o fato de que na maioria das vezes são atribuídas à mulher posturas negativas. Um aspecto relevante que deve ser salientado a priore é o fato de que no século XIX a sociedade brasileira sofreu uma série de transformações que culminaram no advento do capitalismo e na consequente urbanização que passou a permitir novas formas de convivência social. Diante disso, cabe aqui frisar, que a ascensão da burguesia trouxe para a sociedade uma nova mentalidade, uma maneira diferente de organização das vivências familiares e domésticas. O homem agora está diante de uma mulher que se entrega facilmente à sensibilidade e as novas formas de pensar o amor.

           Vale atentar para o que diz D’Incaro:

Presenciamos ainda nesse período o nascimento de uma nova mulher nas relações da chamada família burguesa, agora marcada pela valorização da intimidade e da maturidade. Um sólido ambiente familiar, o lar acolhedor, filhos educados e esposa dedicada ao marido e às crianças e desobrigada de qualquer trabalho produtivo, representavam o ideal de retidão e probidade, um tesouro social imprescindível. Verdadeiros emblemas desse mundo relativamente fechado, a boa reputação financeira e a articulação com a parentela como forma de proteção ao mundo externo marcaram o processo de urbanização do país. (1989. pag.1)

             Com o advento dos “novos tempos”, os quais são marcados pelas mudanças de caráter político, social e econômico, a mulher até então presa ao ideário da família patriarcal ganho certas liberdades e ocupa novos espaços. Porém, ao mesmo tempo em que ganha maior liberdade passa a desempenhar novas funções dentro do âmbito das vivências domésticas. Agora, a mulher tem que se ocupar do lar, dos filhos e do marido e ainda ser sua companheira na vida social.

             Conforme estudo feito por D’Incaro, o mundo familiar mostrado por Machado de Assis nos romances da fase romântica contrasta com os da fase realista. Os textos da primeira fase mostram mulheres solitárias, tias solteironas ou viúvas que procuram favorecer a felicidade de seus protegidos. Há exemplos de moças pobres que amam homens que lhe são proibidos. Nessas relações há sempre uma barreira entre o amor e o casamento. São amores impossíveis. Contudo, os romances machadianos escritos a partir de 1881, trazem famílias predominantemente urbanas formadas quase sempre pelo núcleo: Marido, esposa e filhos. Nesses romances, situações de conflito é uma constância: Triângulo amoroso, sentimentos ambíguos, ciúmes, casamentos de conveniências e relações amorosas tediosas. A figura feminina é sempre a causadora do conflito, a mulher descrita por protagonistas essencialmente masculinos tem na maioria das vezes uma imagem negativa.

            O crítico Alfredo Bosi aponta características relacionadas no que se refere à vida social das personagens femininas criadas por Machado de Assis. Segundo esse autor, são mulheres que procuram tirar proveito das relações afetivas para vencer na vida, elas têm uma fase inicial em que estão subordinadas a uma situação desfavorável, depois procuram dar um salto prendendo-se a casamentos de interesse. A relação amorosa é vista como a única possibilidade de ascensão social para a mulher da sociedade da época. É o caso de Guiomar, em A Mão e A Luva, e parcialmente de Iaiá Garcia, no romance de mesmo nome. Nos romances da fase realista, as personagens femininas já estão com status elevado por terem conseguido casamentos sólidos, agora elas dão-se ao luxo de arquitetar namoros adulterinos, casos de Virgília em Memórias Póstumas de Brás Cubas e de Sofia em Quincas Borba. Nesse quesito, Capitu, personagem de Dom Casmurro, é o grande mistério, não sabemos exatamente o que ela fez, se traiu ou não o marido.

             Em Memórias Póstumas de Brás Cubas, pode-se perceber através da personagem Virgília, que a mulher não era tão submissa. Essa personagem machadiana era uma mulher corajosa, capaz de romper com padrões da sociedade, como trair o marido, que, para a mulher daquela época era uma atitude bastante atrevida, de grande determinação. Virgília não foi uma mulher covarde, que temeu a sociedade, pela sua submissão de mulher e deixou de viver um grande amor. Pelo o contrário, além de trair o marido, ela foi capaz de viver um casamento por interesse, pois não abria mão da sua posição social e assim, manteve um casamento por conveniência. Como pode- se perceber abaixo, Virgília passava para o esposo uma imagem de uma mulher perfeita e submissa:

   [...] Lobo Neves, a princípio, metia-me grandes sustos. Pura ilusão! Como adorasse a mulher, não se vexava de mo dizer muitas vezes; achava que Virgília era a perfeição mesma, um conjunto de qualidades sólidas  e finas, amorável, elegante, austera, um modelo. E a confiança não parava aí. De fresta que era, chegou à porta escancarada. Um dia confessou-me que trazia uma triste carcoma na existência; faltava-lhe a glória pública [...]. (ASSIS, p.101, cap. 58).

              Sabe-se, entretanto, que Virgília não era tão perfeita, submissa como imaginava o seu esposo. A seguir, percebe-se isso claramente.

[...] Empunhara o binóculo da imaginação; lobrigava, ao longe, uma casa nossa, uma vida nossa, um mundo nosso, em que não havia Lobo Neves, nem casamento, nem moral, nem nenhum outro liame, que nos tolhesse a expansão da vontade. Esta idéia embriagou-me; eliminados assim o mundo, a moral e o marido, bastava penetrar naquela habitação dos anjos [...].

- Virgília- disse -, eu proponho-te uma coisa.

- Que é?

- Amas-me?

- Oh! Suspirou ela, cingindo-me os braços ao pescoço (ASSIS, 1999 p.107, cap. 63).

[...] Virgília amava-me com fúria; aquela resposta  era a verdade patente. Com os braços em meu pescoço, calada, respirando muito, deixou-se ficar a olhar para mim, com os seus grandes e belos olhos, que dava a sensação singular de luz úmida; eu deixei-me estar a vê-los, a namorar-lhe a boca fresca como a madrugada, e insaciável como a morte [...] (ASSIS, 1999 p.108, cap.63).

             Percebe-se assim, que Virgília era uma mulher hipócrita, petulante, ambiciosa, interesseira que não abria mão da sua vida social, ao lado de um político bem sucedido, para viver simplesmente um amor. Ela queria sua posição na sociedade, dinheiro e também poder viver um amor, com paixão, mas, em nenhum momento,  pensava em abandonar seu casamento, para viver um amor clandestino. Não teve remorso, ao abandonar Brás Cubas, para viver ao lado de Lobo Neves, que era um político bem sucedido. Na realidade, viver esse amor secreto era para Virgília uma ambição de luta e liberdade contra a submissão da classe feminina tão sofrida da época.  Pode-se perceber que Virgília fugia do estereótipo de mulher do século XIX.

             Como se pode perceber Virgília, na realidade, só era uma mulher submissa que seguia as normas da época, apenas na aparência. Virgília era uma mulher que fazia de tudo para manter o seu casamento e sua posição social. O prestígio de seu marido era algo que ela jamais queria perder. O trecho, a seguir, mostra exatamente o que ela gostava e desejava manter.

[...] O privilégio econômico detido pelos homens, seu valor social, o prestígio do casamento, a utilidade de um apoio masculino, tudo impele as mulheres a desejarem ardorosamente agradar aos homens. Em conjunto, elas ainda se encontram em situação de vassalas. Disso decorre que a mulher se conhece e se escolhe, não tal como existe para si, mas tal que o homem a define. Cumpre-nos, portanto, descrevê-la primeiramente como os homens a sonham, desde que ser-para-os-homens é um dos elementos essenciais de sua condição concreta [...]. (BEAUVOIR, 2009, p.203). 

              Dessa forma, Virgília sai do perfil da mulher daquele tempo, que era totalmente submissa ao marido, ou seja, aparentemente, ela passa por uma mulher perfeita e submissa, mas, na realidade, ela tem atitudes corajosas de uma mulher à frente de seu tempo.

             Outro exemplo desse tipo de mulher é Capitu, considerada pela crítica, a principal personagem feminina de Machado de Assis, que, desde moça, demonstra o controle de situações, que, naturalmente, levando em consideração a época representada, o leitor espera que sejam tomadas por um homem, no caso, em questão, por Bentinho. Capitu e Bentinho, quando jovens, estavam a sós no quintal, após Capitu escrever o nome dos dois no chão, e o pai de Capitu indo em direção dos dois pergunta:

- Vocês estão jogando o siso? Perguntou.

Olhei para um pé do sabugueiro que ficava perto. Capitu respondeu por ambos.

- Estávamos, sim, senhor, mas Bentinho ri logo, não agüenta.

- Quando eu cheguei à porta, não ria.

- Já tinha rido de outras vezes; não pode. Papai quer ver?

[...] E séria, fitou em mim os olhos, convidando-me ao jogo. O susto é naturalmente sério; eu estava ainda sob a ação do que trouxe a entrada de Pádua, e não fui capaz de rir, por mais que devesse fazê-lo, para legitimar a resposta de Capitu. Esta, cansada de esperar, desviou o resto, dizendo que eu não ria daquela vez por estar ao pé do pai. E nem assim ri [...] (ASSIS, s/d. p. 39 – 40, cap. 15).

              Assim, conforme o trecho destacado é uma mulher, Capitu, que rege a situação, é ela quem mente para o pai e quer convencê-lo de que estão jogando siso, tomando a iniciativa de convidar Bentinho para a brincadeira. Enquanto que Bentinho não age como líder, o que é esperado para o homem da época, aliás, ele é incapaz de sustentar a mentira da companheira, não conseguindo dissimular um sorriso. Essa atitude de Capitu não é uma atitude de mulher submissa, ela tem voz e autonomia.  Em outros momentos Capitu demonstra ser uma mulher que tem iniciativa e que tem controle sobre seu romance com  Bentinho, é ela, uma mulher quem “dá as cartas” e consegue dissimular acerca do que ela não deseja que os outros saibam:

[...] Ouvimos o ferrolho da porta que dava para o corredor interno; era a mãe que abria. Eu, uma vez que confesso tudo, digo aqui que não  tive tempo de soltar as mãos da minha amiga; pensei nisso, cheguei a tentá-lo, mas Capitu, antes que o pai acabasse de entrar, fez um gesto inesperado, pousou a boca na minha boca, e deu de vontade o que estava a recusar à força [...].

- Mas, Bentinho, que é pronotário apostólico?

- Ora, vivam! Exclamou o pai.

- Que susto, meu Deus! (ASSIS, s/d, p. 82 - 83, cap. 38) Observe que é Capitu, após não aceitar as investidas de Bentinho, que toma a iniciativa e o beija, atitude talvez que ela desejasse que fosse de Bentinho. Além disso, é ela que mais uma vez disfarça, ao perceber que o pai já está entrando no ambiente, em que os dois se encontram, e finge não esperar sua entrada, reagindo como se levasse um susto.

             Assim, Capitu, mais uma vez, age com autonomia, dissimulação e criatividade, ao fazer com que situações embaraçadas, que a envolvam, passem despercebidas. Ainda, no mesmo capítulo, Capitu aconselha seu pai a ir à casa do padre cumprimentá-lo. Pode-se observado, por esta postura, que os interesses de Capitu perpassam o ambiente doméstico. Dessa forma, ela foge (mais uma vez) do  estereótipo de mulher definido pela sociedade da época.

             Assim, reafirmamos a declaração de Ribeiro acerca de Capitu:

[...] O estereótipo de Capitu como mulher independente e altiva diante dos códigos sociais de sua época planifica a personagem a ponto de esperarem dela as atitudes que de fato toma. Capitu torna-se mais complexa, no entanto, se comparada a Bentinho e ao seu “alter ego” narrador, Dom Casmurro, transcende a figura da mulher moderna: passamos a torcer por ela, mesmo sem saber direito o que ela fez ou não [...] (Ribeiro, p.57).  

             Pode-se perceber que Capitu era uma mulher, além do seu tempo. No trecho que se segue, fica claro que, desde moça, Capitu já era bastante atrevida:

[...] O esforço é sentido de construir um perfil, este sim, sinuoso. Ela tem não só idéias atrevidas, aos 14 anos, mas tê-las-a, muito  mais atrevidas, mais tarde. E francamente, é genial a idéia que passa do atrevimento teórico e da habilidade prática. Os adjetivos hábil, sinuoso e surdo delineiam um estilo de atuação minilista e de uma competência de profissional. A Capitu de mais tarde já está aí, em potencial e quase pronta [...] (RIBEIRO, 2008, p. 234).

              Capitu, de acordo com Ribeiro, é uma mulher bastante corajosa para sua época e essa bravura que já aparece, quando moça, ganha proporções cada vez maiores, de acordo com que a personagem machadiana vai amadurecendo. Em outra situação, é a mãe de Capitu, D. Fortunata, quem determina uma importante decisão do marido com a ajuda de outra mulher: D. Glória; quando o Pádua fora sorteado em um bilhete de loteria com dez contos de réis e teve logo a idéia de comprar um cavalo do Cabo, uma jóia para a mulher, uma sepultura perpétua de família, entre outras coisas:

[...] mas a mulher, esta D. Fortunata [...] é que lhe disse que o melhor era comprar a casa, e guardar o que sobrasse para acudir às moléstias grandes. Pádua hesitou muito; afinal, teve que ceder aos conselhos de minha mãe, a quem D. Fortunata pediu auxílio (ASSIS, p.41, cap. 16).

             Observem que é a mulher quem está sempre ao comando, criando as melhores formas de dar segurança à família (compra da casa). Enquanto Pádua está preocupado em ostentar poder com coisas supérfluas, D. Fortunata está preocupada com o futuro da sua família. Assim, nesse episódio, mais uma vez, é o feminino que determina a situação (D. Fortunata e D. Glória), pois são elas que convencem o Pádua a desistir dos planos, que ele já havia feito para o dinheiro do prêmio.

             Ainda discorrendo a respeito de Capitu, sabemos que ela é uma personagem estável, não se modifica no curso da estória. A problemática do olhar, o jogo de sedução permanece no decorrer da narrativa. Com seus “olhos de ressaca” e de cigana oblíqua sai bem de situações difíceis, exemplo do episódio do penteado e da inscrição no muro:

“Capitu riscava sobre o riscado, para apagar bem o escrito (Cap XIII)”. Capitu compôs depressa, tão depressa que, quando a mãe apontou a porta, ela abanava a cabeça e ria. “Nenhum laivo amarelo, nenhuma contração de acanhamento, um riso espontâneo e claro” (Cap XXXIII).

             Em torno do olhar e dos olhares de Capitu nota-se que ela desde a adolescência já começa a preparar o salto social que deseja, faz isso por meio do jogo de sedução e manipulação. A comparação entre os olhos de ressaca com as ondas demonstra a capacidade que ambos têm de atrair e atemoriza suas vítimas através do fascínio: “... olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá idéia daquela feição nova. Traziam não sei que fluído misterioso e enérgico, praia nos dias de ressaca”.

             Nota-se também que os protagonistas das principais obras realistas de Machado não mostram muito interesse por personagens que não tem a atração que o perigo causa a simplicidade não atrai os personagens masculinos. É o que encontramos no caso de Eugênia, a flor da moita e Brás Cubas. É o que diz Alfredo Bosi neste trecho. (2000, p. 71) “Eugênia, a flor da moita, tem um caráter altivo que falta às amantes, ricas ou pobres, de Brás Cubas”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

             Os romances realistas de Machado de Assis, principalmente Memórias Póstumas de Brás Cubas e Dom Casmurro, são narrações construídas em flashback, há sempre protagonistas masculinos já cinquentões e solitários relembrando às vivências na tentativa de atar as duas portas da vida: Infância e velhice. São obras de caráter memorialista que revelam a visão de quem teve uma vida amarga e fracassada. Compreende-se o fato da figura feminina ser sempre tratada de maneira negativa. É a visão masculina determinada pela ideologia da época a respeito da condição da mulher.

             Assim percebe-se assim, que Virgília era uma mulher hipócrita, petulante, ambiciosa, interesseira que não abria mão da sua vida social, ao lado de um político bem sucedido, para viver simplesmente um amor. Ela queria sua posição na sociedade, dinheiro e também poder viver um amor, com paixão, mas, em nenhum momento,  pensava em abandonar seu casamento, para viver um amor clandestino.        Já a personagem Capitu em alguns momentos demonstra ser uma mulher que tem iniciativa e que tem controle sobre seu romance com  Bentinho, é ela, uma mulher quem “dá as cartas” e consegue dissimular acerca do que ela não deseja que os outros saibam.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASSIS, Machado de. Memórias Póstumas de Brás Cubas. 25ª ed. Rio de Janeiro: Edioro, 1999.

ASSIS, Machado de. Dom Casmurro. S.ed. São Paulo: Klick editora, s/d.

BOSI, Alfredo. Entrevista sobre Machado de Assis. Disponível em: HTTP:www.mec.gov.br/seed/tvescola/mestres/PDF/Revisão-T.machado Alfredo%20Bosi.pdf Acesso em: 09/06/12 10:40 hrs

D’INCARO, Maria Ângela. Mulher e família burguesa. In: ENGEL, Magali G. Imagens femininas em romances naturalistas brasileiras. Rio de Janeiro: Xenon editora

 RIBEIRO, Luis Felipe. Mulheres de Papel. Um estudo do imaginário em José de Alencar e Machado de Assis. 2ª edição. Rio de Janeiro. Florence Universitária: Fundação Biblioteca Nacional. 2008.

XAVIER, Therezinha Mucci. A personagem Feminina no Romance de Machado de Assis. 1ª ed. Rio de Janeiro: Presença, 1986.