Vício de produto ou defeito do fato do produto? Alerta ao consumidor!

Priscilla Lícia Feitosa de Araújo Cabral, advogada especialista em direito do consumidor

É muito comum, o uso equivocado dos termos vício de produto e defeito de produto no nosso cotidiano, essencialmente na seara jurídica, em razão do significado gramatical dos próprios termos que nos levam a esse engano.

Assim, o vício do produto para o direito consumerista se refere a qualidade do produto ou serviço, que uma vez constatado compromete sua finalidade.

Embora a gramática da língua portuguesa utilize a expressão vício como sinônimo de defeito, o legislador, com o advento do Código de Defesa do Consumidor, entendeu estes como termos diferentes, com significados distintos.

O artigo 18 do referido Código trata acerca da responsabilidade por vício do produto e do serviço. Mas o que vem a ser vício?

Vício de produto ou serviço é um termo usado pelo Código de Defesa do Consumidor para classificar produtos ou serviços que manifeste alguma incorreção, inviabilizando ou dificultando a utilização do produto e/ou a concretização do serviço para a finalidade ao qual se destina.

Neste caso, há a possibilidade de reparo do produto pelo fornecedor. O parágrafo 1º do mencionado artigo 18, estipula o prazo de 30 (trinta) dias para o consumidor ter sanado o vício do produto pelo fornecedor. Prevendo, ainda, o mencionado código, a redução ou ampliação do referido prazo.

Contudo, uma vez não sanado o vício, o consumidor, a sua faculdade, poderá requerer a substituição do produto, a restituição do valor pago ou ainda o abatimento proporcional do preço.

Já quando da ocorrência do defeito do fato do produto, o direito consumerista estabelece uma relação não de qualidade e/ou quantidade do produto, mas uma relação vinculada à segurança do produto e à finalidade ao qual se destina, ou seja, interessa aqui a segurança do produto ou serviço e sua adequação.

Logo, o produto defeituoso é aquele que não apenas possui a dificuldade de utilização do bem com o fim a que se almeja, mas simplesmente não proporciona a correta utilização do objeto, criando-se uma situação fática e gerando como consequência um dano ao consumidor.

No defeito do fato do produto não há a possibilidade de reparo ofertado nos incisos I, II, e III, do parágrafo 1º, do artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor, pois diante do fato jurídico criado, é gera ao consumidor o direito de uma indenização perante o fornecedor, uma vez que o defeito apresentado no produto levou aquele à situação de risco, criando-se um fato.

Aqui tem-se atingido a segurança do consumidor, que se põe em risco, em razão do produto ou serviço não atingir seu fim corretamente, não adequando-o ao resultado concreto ou esperado.

Para elucidar melhor as questões ventiladas acima, imaginemos a aquisição de um veículo automotor. Determinado consumidor adquire o automóvel e ao sair da concessionária com o objeto comprado percebe que ao acionar os freios estes não respondem de imediato. Preocupado, o consumidor retorna à concessionária, apresentando o veículo, para que esta possa realizar os ajustes necessários para o reparo do bem. Neste caso, temos a ocorrência de vício de produto, uma vez que houve a caracterização de vício passível de correção.

Agora imaginemos, a mesma hipótese, o seguinte caso. O consumidor adquire determinado automóvel e ao sair com o objeto comprado envolve-se em um acidente porque ao tentar acionar os freios estes não respondem, provocando um acidente. Nesta situação nos deparamos com defeito do fato do produto. Aqui não há um simples vício que diminua a qualidade ou quantidade do produto. Nos deparamos com uma situação fática de risco de segurança que expôs o consumidor. Neste caso não há possibilidade de chamamento do fabricante / comerciante para reparo. Gera-se ao consumidor direito de pleitear uma indenização em face do fato jurídico existente e criado pela falta de segurança que o produto adquirido lhe trouxe.

Portanto, a classificação quanto ao vício do produto ou defeito de fato do produto será caracterizada quando da análise do caso concreto.

Assim, uma televisão que simplesmente não funciona gera efeitos e consequências jurídicas diferentes de uma televisão que explode ao ligar, por exemplo.

Interessante, ainda, destacar que a configuração de um não exclui, necessariamente, a observância do outro, uma vez que em uma mesma situação podemos nos deparar com vício de produto e defeito do fato do produto.

Destaque-se, também, que a consequência jurídica do comerciante do produto ou serviço difere quando da configuração do ocorrido para vício do produto ou defeito do fato do produto, uma vez que no primeiro caso temos a solidariedade caracterizada, enquanto que no segundo temos a subsidiariedade devidamente notada.

Importante salientar, também, que a legislação consumerista ampara às vítimas do “acidente” referente a defeito do fato do produto, equiparando-as à consumidores. Não permitindo apenas aos consumidores que tiveram uma relação de consumo “concreta” com os supostos fabricantes reaverem seus direitos, mas também aqueles que se tornaram vítimas do produto defeituoso colocado no mercado.

Por fim e diante de tudo o que fora exposto, ao nos depararmos com fatos dessa natureza, devemos observar o caso concreto para, posteriormente, enquadra-lo na legislação pertinente, configurando-o em vício ou defeito do fato do produto e, assim, posteriormente, analisarmos as consequências jurídicas e responsabilidades legais previstas.