Vamos falar sobre motivação, aquele “impulso” que nos leva a ter vontade – ou não – de fazer certas coisas. Quando se procura entender o que ela é, as respostas encontradas são muito diversas. Por exemplo, no DICIONÁRIO ONLINE MICHAELIS/UOL, tem-se a seguinte definição:

“motivação
mo.ti.va.ção
sf (motivar+ção1 Ato de motivar. 2 Exposição de motivos. 3Psicol Espécie de energia psicológica ou tensão que põe em movimento o organismo humano, determinando um dado comportamento. 4 Sociol Processo de iniciação de uma ação consciente e voluntária.”

Esta é uma definição “bonita”, embora não esclareça muito a respeito do que é de fato a motivação e como ela ocorre em nossa vida. Um ponto interessante dessa definição é que ela está carregada da “essência” do que muitas pessoas pensam quando se fala em “estar motivado”: estar motivado para estudar seria ter essa “disposição” e vontade para se debruçar sobre os livros e listas de exercícios. Estar motivado para trabalhar seria ter a “vontade” de sair de casa (ou ir ao seu cantinho de trabalho, para quem trabalha na própria residência) e desempenhar suas tarefas. Estar motivado para o lazer seria ter a “vontade” de se arrumar e ir para a balada, sozinho ou com pessoas que lhe interessem e sejam agradáveis.

De fato, muitos acreditam que a motivação é uma “energia”, um “algo” que impulsiona as pessoas a buscarem novas perspectivas, novos caminhos, enfim, realizarem metas. E esse “algo” estaria dentro de nós. Isso se reflete na forma como ouvimos incentivos ou procuramos incentivar quem nos rodeia: quase sempre os incentivos se remetem à necessidade de “estarmos motivados” a buscar mudanças e agirmos de maneiras diferentes das quais estamos habituados. Assim, conseguiríamos atingir nossos objetivos e melhoraríamos nosso trabalho, nossa vida afetiva, ou alcançaríamos nossos sonhos. Muito bonito... mas ainda não explica o que é essa tal motivação. Será que ela está mesmo dentro de nós? E como ela “funciona”?

 Para entendermos o que é motivação, torna-se necessário que saibamos um pouco a respeito do que nos leva a nos comportarmos de uma maneira ou de outra, diante de uma determinada situação. Exceto pelos comportamentos reflexos (como dilatar ou contrair nossa pupila diante de diferentes intensidades de luz), a maioria dos nossos comportamentos é chamada de operante. Eles operam, agem no ambiente produzindo consequências (ou seja, modificando esse ambiente) e são afetados por estas consequências. Estas consequências mantêm o nosso comportamento ou nos faz modificar nossas atitudes. De uma maneira geral, nos comportamos para obtermos consequências que nos são agradáveis (ditas reforçadoras – por exemplo, aperto o interruptor da parede em uma sala escura e a luz se acende) ou para evitar consequências desagradáveis (ou aversivas – como quando eu me retiro de uma festa para não ver uma pessoa cuja presença me desagrada). As consequências produzidas pelo nosso comportamento ocorrem de maneira tão natural que, muitas vezes, nem nos damos conta de sua presença – mas ao refletirmos por um tempo, percebemos que só continuamos a nos comportar devido às consequências que nossas atitudes produzem ao nosso redor (Moreira & Medeiros, 2007).

Esta relação entre a forma como nos comportamos e suas consequências no nosso meio só é estabelecida quando aprendemos a nos comportar de determinadas formas, a partir de nossa experiência de vida no contato com outras pessoas e com diversas situações. Um dia, uma pessoa aprendeu que, quando entrava em uma sala escura, ela poderia pressionar um botão que, na maioria das vezes, se encontra em uma das paredes de um cômodo, e a sala se tornava iluminada porque as luzes se acendiam. E como ela aprendeu isso? Por ter vivido essa experiência, por ter visto alguém acendendo uma luz ou por alguém ter lhe dito o que fazer. Ela percebeu o que acontecia e viu que dava certo, então passou a se comportar desta forma diante da necessidade de entrar em uma sala escura – porque aprendeu que funciona!

Outro exemplo: imaginemos que, hipoteticamente, eu tive uma história passada relacionada a determinada pessoa que me fez perceber que estar em sua presença não me era agradável. Numa situação, quando a evitei, não entrei em atrito e me senti bem. A partir de então, passo a evitar o contato com ela para evitar sua presença desagradável (me comporto evitando sua presença: me retiro diante de sua chegada a um local; não vou se souber que ela estará presente; se não puder sair, evito ficar próximo a ela... e, desta forma, evito me frustrar ou me irritar).

Mas o que isso tem a ver com motivação?

Motivação pode ser definida, a grosso modo, como dar motivos ou criar oportunidades para um indivíduo se comportar de determinada forma. E isto ocorre se esta forma de se comportar permitir a este indivíduo o acesso a consequências agradáveis (provendo as consequências reforçadoras ou evitando as aversivas). Isto pode ocorrer de várias formas, então, vamos tentar entender algumas delas.

Podemos pensar em criar oportunidades para que uma determinada forma de se comportar ocorra. Para isto, precisa-se estabelecer um determinado valor para a consequência que esse comportamento irá produzir. Por exemplo, se eu quiser que uma pessoa apresente a resposta de “pedir um copo d’água”, devo me certificar de que, primeiramente, ela esteja com sede – quem, em sã consciência, vai solicitar um copo d’água se tiver acabado de beber uma garrafa cheia dela? – e, diante das várias respostas emitidas pelo indivíduo, somente ao ouvir um pedido como “Me dê um copo d’água?”, eu apresento a consequência (dou-lhe um copo cheio de água). Em outras palavras, criei uma oportunidade na qual a água adquiriu um grande valor reforçador (quando se está com muita sede, um copo com água pode valer mais do que R$1.000,00) e ofereci a consequência diante da resposta que eu queria que ele apresentasse (outras respostas não davam acesso à água, apenas o pedido verbal). Assim, ensinei a este indivíduo qual resposta deveria ser emitida para que ele obtivesse a consequência reforçadora.

Desta maneira, podemos dizer que motivação envolve uma série de operações que produzem determinados efeitos na forma como um indivíduo se comporta: ela muda determinadas formas de responder deste indivíduo (com sede à pedir por água) e torna possível que ele tenha acesso às consequências reforçadoras dessa resposta (beber água à saciação da sede). Tradicionalmente, acreditava-se que apenas ao se estabelecer uma oportunidade para uma forma específica de responder era o suficiente para que um indivíduo se comportasse para obter a consequência que o reforçaria. Entretanto, se não houvesse uma história prévia de aprendizagem de qual resposta produz o reforço, somente esta oportunidade não traria o resultado reforçador esperado. (Millenson, 1967/1975). Em nosso exemplo, apenas “privar de água” e gerar sede não garantia o acesso à consequência reforçadora (obter o copo d’água); foi necessária a aprendizagem da resposta específica que gerava essa consequência (a resposta verbal “Me dê um copo d’água”).

De acordo com o que vimos até agora, pode-se entender a motivação como fruto de nossa história de vida, que se relaciona à forma como respondemos (nos comportamos) diante de diversas situações. Aprendemos a nos comportar diante de determinados eventos em nosso cotidiano, pois tivemos uma experiência prévia na qual aprendemos que, ao emitir determinadas respostas, determinadas consequências que nos são reforçadoras poderão ser obtidas.

Entretanto, faz-se necessária uma ressalva quanto ao que é valor reforçador. Uma determinada consequência, quando apresentada a diversos indivíduos, pode ser reforçadora para alguns e, para outros, não. Eu posso estar diante de uma taça de sorvete de chocolate e me sentir bem, apresentando todos os “sintomas” de alguém que adora este sabor: só a aparência e o aroma já me fazem salivar, já imagino o sabor do sorvete... Outra pessoa, em cuja história de vida teve intoxicação com uma sobremesa sabor chocolate, pode sentir verdadeira aversão diante da mesma taça de sorvete – embrulha-lhe o estômago, apresenta sintomas de ânsia, sente arrepios na pele. Assim, o valor reforçador de uma determinada consequência varia de acordo com a história de vida de cada indivíduo. Neste sentido, o termo “indivíduo” foi propositalmente utilizado neste texto, pois para cada um, o que é reforçador ou não dependerá da sua história de aprendizagem durante sua vida – é particular e deve ser analisada individualmente.

Diante de tudo isso, podemos pensar em motivação no trabalho, na Educação ou em qualquer outro ambiente como um fator relacionado a cada indivíduo em particular, levando em conta o que é mais importante para cada um – ou seja, o que é reforçador ou não para cada indivíduo. Em uma mesma seção de uma empresa, por exemplo, para um funcionário o aumento de salário pode ser um fator que o motiva a desempenhar suas funções com mais “vontade” se, em sua história de vida, a possibilidade de acesso a maior quantidade de dinheiro foi um fator muito relevante e reforçador – como, por exemplo, uma história de dificuldades financeiras. Para outro funcionário, a possibilidade de ascensão na carreira pode ser o “fator motivacional” mais relevante se, em sua vida, houve uma história passada de reforçamento de seu bom desempenho técnico, mais do que respostas relacionadas a sanar a necessidade financeira. Considerando estas diferenças, provavelmente o primeiro funcionário buscará motivação para se empenhar em atividades que lhe garantam acréscimos em seu salário (não se oporá à sua realização e a algumas horas extras, estará em busca de oportunidades de emprego em cargos que tenham melhor remuneração, entre outras). Já o segundo procurará se empenhar em respostas que garantam seu sucesso na carreira escolhida (buscará formação acadêmica e certificações para ascender na carreira, poderá aceitar subir de cargo mesmo com remuneração próxima da que recebe atualmente, se empenhará na execução de suas funções...). Propor neste contexto algumas estratégias motivacionais seria uma atividade árdua, pois deveria levar em conta o que é relevante para cada um destes profissionais e o que se desejaria motivar no ambiente de trabalho, para se elaborar estratégias que sejam efetivas por levar em conta suas individualidades.

Quando partimos para a área da Educação, podemos pensar em comparações semelhantes. Nem todos os alunos de uma turma têm as mesmas motivações. Na escola regular, por exemplo, um aluno com uma história de vida na qual a formação acadêmica não é relevante, mas apenas o “cumprir etapas”, seu empenho se limitará, provavelmente, ao mínimo possível para atingir os critérios de aprovação nas disciplinas cursadas para “terminar o curso”. Já um aluno que tenha experimentado em sua história passada consequências reforçadoras por se desempenhar bem na escola, cujo empenho em buscar novidades e sua curiosidade pelo que é novo tenham sido reforçados, certamente será um aluno mais participativo, buscará boas notas, se empenhará em realizar as atividades acadêmicas e poderá se envolver em atividades extra curriculares para ter acesso a experiências novas. O professor, diante destes dois indivíduos, poderá criar estratégias para mantê-los motivados em sua disciplina, embora deva levar em consideração o que é reforçador para cada um deles, buscando adaptar sua conduta e sua expectativa ao que pode ser realizado com cada um deles, de acordo com as suas diferentes perspectivas.

Portanto, motivar-se é buscar, dentro daquilo que lhe é importante devido à sua própria história de vida, como obter mais consequências reforçadoras de acordo com sua forma de se comportar diante das diversas situações às quais está exposto. O ambiente pode oferecer determinadas situações nas quais é possível para um indivíduo obter as consequências que lhe são reforçadoras. Entretanto, conhecendo-se e tendo acesso ao que lhe é particularmente relevante (ou seja, reforçador), o próprio indivíduo pode encontrar neste ambiente o que lhe é motivador para manter-se respondendo às contingências que vivencia.

 

Referências

DICIONÁRIO ONLINE MICHAELIS/UOL. Disponível em http://michaelis.uol.com.br (Consulta realizada em Abril/2012)

MILLENSON, J. R. Princípios de análise do comportamento. Brasília: Coordenada, 1975 (Publicado originalmente em 1967).

MOREIRA, M. B.; MEDEIROS, C. A. Princípios básicos de análise do comportamento. Porto Alegre: Artmed, 2007.