Uma perspectiva jurídica sobre os direitos das crianças e dos adolescentes

Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado

Título II

Dos Direitos Fundamentais

Capítulo V

 

INTRODUÇÃO

            É de conhecimento público que o trabalho infantil é proibido no Brasil, como forma de configurar maus-tratos e exploração da criança e do adolescente. Em termos técnicos, trabalho infantil é toda e qualquer forma de trabalho exercido por crianças ou adolescentes com idade menor àquela definida pela lei, privando-os de sua infância, seu potencial e sua dignidade.

            O trabalho infantil é um fenômeno social ainda a ser combatido, presente em todas as épocas e em todos os países, inclusive nos chamados desenvolvidos, com maior ou menor extensão e intensidade, altamente agressivos à saúde física e psíquica e ao desenvolvimento moral e social da criança e do adolescente.

           Desde os tempos remotos, o trabalho infantil é comum, e apesar de condenada na maioria dos países, ainda é a realidade de milhões de crianças ao redor do globo.

Durante a Idade Média, o trabalho infantil estava vinculado à complementação da renda familiar. Já no Feudalismo, a exploração de mão de obra infantil ocorria em favor dos senhores feudais, pois as crianças eram vistas como aprendizes dos mestres artesãos. Não bastasse, com a Revolução Industrial, a prática exploratória infantil era vista como um orçamento mais benéfico, ou seja, mais barata, principalmente em comparação à força de trabalho do homem. As crianças, aqui, trabalhavam em troca de moradia e alimentação. Esse quadro revolucionário levou a inúmeras crianças mutiladas nos maquinários e até mesmo mortas em acidentes nas fábricas. Tudo isso sem contar os constantes abusos aos quais elas eram submetidas, de castigos severos até a exploração sexual.

  1. Do direito à profissionalização e à proteção no trabalho 

         Atualmente, em paralelo com o artigo 7º, inciso XXXIII, da Constituição Federal de 88, que proíbe o trabalho noturno (entre as 22 e 5 horas), perigoso ou insalubre a menores de 18 anos e de qualquer trabalho a menores de 16 anos, o artigo 60 do Estatuto da Criança e do Adolescente veda qualquer trabalho a menores de 14 (quatorze) anos de idade, exceto se for em condição de aprendiz.

           Essa proibição tem por intuito evitar desgaste prematuro à pessoa em condição de desenvolvimento, sabidos os malefícios, eminentemente pela necessidade de escolarização. A única exceção é em casos de menor aprendiz, a partir dos 14 em diante, todavia, adaptada a sua condição peculiar.

1.1. Trabalho perigoso, insalubre e penoso

            Além da vossa Carta Magna, o Estatuto da Criança e do Adolescente prescreve as vedações ao trabalho do adolescente no que concerne ao horário de trabalho, à qualidade do mesmo e ao local. Deste modo, o artigo 67 dispõe que, ao adolescente aprendiz, é impedido o trabalho noturno (das 22 de um dia e as 5h do dia seguinte); perigoso, insalubre ou penoso; realizado em locais prejudiciais à sua formação e ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social; e, por fim, realizado em horários e locais que não permitam a frequência do menor à escola.

            O trabalho perigoso é definido no art. 193 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) pelo contato com substâncias inflamáveis, explosivas ou energia elétrica, que impliquem risco acentuado em virtude de exposição do trabalhador; enquanto o trabalho insalubre é definido pelo art. 189 da mesma legislação como aquelas atividades que, por sua natureza ou métodos empregados, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde; por fim, o trabalho penoso, é definido como aquele que por sua natureza, cause sofrimento, dor, sacrifício ou incômodo ao adolescente aprendiz, capaz de desenvolver moléstias profissionais e dano de toda ordem.

1.2. Trabalho em locais prejudiciais ao ser humano ainda em desenvolvimento

            Como o adolescente encontra-se em fase de desenvolvimento, a necessidade de trabalhar não pode ser prejudicial ao seu crescimento, ao convívio familiar e a comunidade escolar, que lhes possibilitará as condições essenciais à sua integração futura e participação ativa na sociedade.

            À exemplos de lugares prejudiciais à formação física, psíquica, moral e social do adolescente, pode-se considerar lupanares (prostíbulos), que promovem maior exposição do menor a abusos sexuais; casas de massagem, que ensejam a violência física ou grande desgaste; hotéis de alta rotatividade, drives e outros estabelecimentos similares, que exigem de esforços intensos e longas jornadas de trabalho etc.

            A princípio, o adolescente pode desempenhar todas as atividades, porém, desde que acompanhado do empregador e que a atividade exercida possua caráter pedagógico, diretamente relacionado com o desenvolvimento pessoal e social do adolescente.

2. Menor aprendiz

          Pelo artigo 62 do ECA, considera-se aprendizagem a formação técnico-profissional ministrada segundo as diretrizes e bases da legislação de educação em vigor. Ou seja, utilizando outros termos, menor aprendiz é o adolescente sujeito a um programa metódico em que se alternam tarefas teóricas e práticas com vistas à aquisição progressiva de conhecimentos profissionalizantes, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz compromete-se a executar, com zelo e diligência, as tarefas necessárias a essa formação.

            A formação técnico-profissional deverá planejar horário especial para o exercício das atividades, de modo a prezar o acesso e a frequência obrigatória do menor ao ensino regular, além de promover atividade compatível com o desenvolvimento do adolescente.

2.1. Direito de aprendizagem do adolescente portador de deficiência

            A pessoa portadora de deficiência, como todo cidadão, tem direito ao trabalho e o dever de trabalhar, e tem direito a políticas públicas que lhe garantam a possibilidade de trabalhar. Porquanto, o artigo 66 do Estatuto da Criança e do Adolescente confere ao adolescente portador de deficiência o direito ao trabalho protegido. Esse dispositivo decorre do próprio texto constitucional (art. 227, § 1º, II), com a obrigatoriedade de programas de prevenção e atendimento especial voltado aos portadores de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação. 

          O artigo 208, III, da Constituição/1988, considera ser dever do Estado o atendimento educacional especializando aos portadores de deficiência, especialmente na rede regular de ensino. Já o artigo 214, inciso IV, estabelece o plano nacional de educação, visando à articulação e ao desenvolvimento do ensino em suas diversas etapas, de forma a que conduzam à “formação para o trabalho”.

           Quanto aos direitos sociais (art. 7º, XXXI), veda qualquer forma de discriminação no tocante ao salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência”. Isto é, a empresa deve propor ações que promovam o acesso e a inclusão do portador de deficiência no âmbito trabalhista, de modo que exista profissionais regulamentado à sua jornada de trabalho e dispostos a lhe atender e atender as suas particularidades, buscando, sobretudo, o desenvolvimento de suas capacidades. Compromete-se, ainda mais, a propiciar, a aquisição de equipamentos destinados a uso pessoa, a fim de corrigir, diminuir e superar as limitações dos portadores de deficiência, no sentido de possibilitar o ingresso e a integração destes no trabalho, de forma a garantir um meio de sustentação e um meio de realização e superação da sua própria deficiência, evitando, assim, a sua marginalização. A omissão implica responsabilidade do poder público e dos entes privados.

             Assim, a aprendizagem, mais do que uma forma de trabalho, é uma parte integrante da educação e formação do adolescente, portador ou não de deficiência.

 CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Conclui-se, portanto, que a profissionalização e a proteção no trabalho devem ser entendidas na sua interface como o caminho para a emancipação humana, considerando que a primeira tem em sua dimensão política a educação global (social, política, cultural), negando o treinamento e o desenvolvimento de capacidades como etapas isoladas da educação básica. Finalmente, quanto ao aspecto da proteção no trabalho, entende-se que, na medida em que o exercício da cidadania for vivenciada durante o processo educativo, deve-se desenvolver numa relação trabalho/indivíduo/sociedade, via programas de natureza pedagógica; assim a defesa dos direitos do trabalho de crianças e adolescentes estará garantida.

  1. 1. Jane Gomes de Castro: Graduada em  Ciências Biológicas e Pedagogia; Especialista em Ecoturismo e Educação Ambiental
  2. 2. Adriana Peres de Barros: Graduada em Pedagogia; Especialização em Educação Infantil e Alfabetização; Psicopedagogia Institucional.