Uma noite estranha
Publicado em 27 de fevereiro de 2013 por Adriana de Barros Silva
UMA NOITE ESTRANHA
No dia 2 de fevereiro de 2002, finalmente Fabio e eu após pouparmos de nossos salários para comprar a tão sonhada casa própria fomos juntos acertar detalhes para a reforma. No carro gol preto 99, chegamos ao local, juntamente com uma tempestade de verão, ventos fortes, raios e trovões. Desço do carro e olho a casa.
_Eu já estive aqui antes. Sussurra.
Um raio chama sua atenção para o número 6 pendurado que o vento o empurra de um lado ao outro.
_Claro! Querida você veio comigo vê-la antes de há comprarmos. Diz abrindo a porta rapidamente, em seguida cai à chuva forte.
_Lógico, ainda bem que não viemos de noite. Falou saindo do hall e entrando na cozinha.
_Ficará ótima quando terminarmos com a reforma. Exclama Fabio todo animado indo direto aos fundos da casa.
Não demorou e eu comecei a ouvir goteiras, fui até a cozinha e encontrei meu marido com seu caderninho de anotações aberto e todo entretido, anotando, sorrindo, sussurrando o que eu não podia ouvir e o deixei sozinho. Fui para o quarto principal da casa que ficava entre o hall do lado oposto a sala.
Tropecei em uma pedra e bati a mão em um tijolo na parede que caiu, vi dentro do buraco um brilho fraco, coloquei minha mão e tirei de lá em meio a muita poeira uma pequena caixinha retangular de bronze que limpei com a manga da blusa. O vento joga a chuva forte pela janela me fazendo recuar até o lado oposto do quarto, tentei abri-la, mas não consegui, tirei do bolso uma chave no canto vi um caixote o ajeitei no chão formando um apoio e me ajoelhei em frente coloquei a caixinha em cima e forcei sua abertura com a chave.
Quando é aberta há dentro uma foto, larguei a chave no caixote e sentei-me ajoelhada com o olhar surpreso e a boca semiaberta. “Eu estava pasma”
Cinco anos antes
Foi numa tarde como outra qualquer, quando nuvens escuras cobriam o céu entre raios, trovões e ventos violentos. Procurei abrigo, mas tudo a minha volta era estranho.
_Passo ajudá-la? Disse um rapaz cobrindo-me com seu guarda-chuva pude observar que era branco, alto e tinha os cabelos dourados.
_Muito obrigada. Eu disse.
_Bom! Sei que a tempestade durará muito tempo e eu moro aqui perto. Não gostaria de se abrigar nela até a chuva passar?
_Eu acho?! Bem?! Não sei?! Disse meio desconcertada, mas senti confiança quando olhei seus olhos azuis que transmitiam ternura e bondade. Logo respondi. _Seria ótimo.
Não demorou chegamos a uma casa modesta com um murro baixo e portão pequeno antes que pudesse observar ao redor a chuva caiu grossa e violenta o vento forte arrebatador; ele abriu a porta antes de entrar vi o número 66 ao lado direito em cima da porta, ao passar pelo hall uma sala adorável bem iluminada os moveis antigos o sofá todo em madeira com almofadas de cor vinho rendadas.
_Está tremendo, venha troque essa roupa molhada.
_Sim, claro.
No banheiro a mesma sensação de estar em outra época, tudo ao redor era antiquado, até a roupa emprestada um lindo vestido de gola V em rendas, manga balão com babados de cor branca com detalhes em rosa.
Ao sair do banheiro o encontrei sentado no sofá.
_Que lindo vestido serviu perfeitamente. Eu disse.
_Na senhorita ficou estonteante, preparei um chá, por favor, sente-se. Disse apontando o seu lado no sofá.
O chá foi servido em um lindo aparelho de prata colocada em uma mesinha de madeira servindo-o perguntou-me.
_Com limão?
_Não, obrigada. Respondi e dei um pequeno gole um chá mate delicioso.
_Qual o nome de sua graça? Perguntou ele tomando um gole do chá.
A linguagem não me pareceu estranha na hora.
_O meu nome é Ângela. É o seu?
_Rodrigo.
Houve um breve silencio, e a tempestade só piorava, levantei-me e fui até a janela.
_Rodrigo, você tem telefone?
_Sinto muito, mas não tenho e não acho prudente sair com este mau tempo. Tenha paciência logo à chuva pára, a minha casa é sua enquanto precisar.
Quando me girei Rodrigo estava ao meu lado olhando-me carinhosamente colocou a mão em meu ombro e eu estremeci.
_Esta com frio? Disse pegando do encosto da poltrona um lindo xale rosa com franjas rosa e branco. _Use este xale. Falou passando sobre os meus ombros e ficamos com as faces bem próximas achei que iria me beija, no entanto, afastou-se.
_Vou preparar o jantar. Pegou o jogo de chá e saiu da sala.
Fiquei observando a decoração, a cortina branca lisa com babados, abajur de tecido entre uma poltrona a outra, um tapete grande todo estampado, a mesa de centro de madeira. Chamou-me atenção foi uma mesinha de canto retangular que estava ao lado da porta que ligava a sala ao hall, repleta de porta-retratos de bronze com fotos antigas de pessoas do século XVIII. Levou 15 minutos e retornou.
_O jantar está pronto, espero que goste de sopa de cebola. Trazia nas mãos uma bandeja de porcelana e talheres de prata, servido com a sopa pão caseiro em fatias.
Apreciamos o jantar com uma conversa cordial. Esqueci-me da chuva e da hora, levou a bandeja e por mais que eu argumentasse para que me deixasse lavar os pratos acabou vencendo-me pelo cansaço, não esperei muito tempo, surgiu sorrindo.
_A chuva ainda não parou, mas estou abusando da sua hopistalidade devo ir agora, vou colocar as minhas roupas.
Aproximou-se e ficamos frente a frente pegou as minhas mãos, levantei o meu rosto e beijou-me lentamente.
Foi a melhor noite da minha vida.
Quando a chuva parou fui para casa, após longas explicações fui perdoada.
Voltei uma semana depois para fazer uma visita e encontrei uma casa velha e abandonada, perguntei aos visinhos se conheciam um rapaz chamado Rodrigo Pontes com suas descrições, mas nada descobri. Entrei na casa, mas ao redor estava em ruínas só o número na parede 66 confirmava que aquela era a casa.
Com os olhos lagrimejados sai da casa antes de atravessar o portão olhei para traz com um suave sorriso nos lábios e disse.
_Obrigado, Rodrigo! Foi a melhor noite da minha vida.
Cinco anos depois
Uma lágrima rolou dos meus olhos. Caí para traz.
_Como eu pude esquecer! Ajeitei-me novamente de joelhos, olhei dentro da caixinha e nela continha uma carta, a peguei com cuidado estava amarelada e dobrada em quatro partes o bilhete escrito com uma letra redonda e delicada.
São Paulo 2 de fevereiro de 1912
Oh! Meu amado quando lerdes, eu já terei bebido o elixir maldito que me libertara do meu triste destino de viver sem o doce sabor de teus beijos e do calor de seu abraço, perdoe-me pela minha fraqueza, mas ambos sabemos que não temos como lutar contra o barão meu pai sua morte seria inevitável e viver nos braços de outro homem seria insuportável.
Rodrigo guarde este retrato como prova de meu amor.
Hoje e eternamente sua Ângela.
Trinta anos depois
_Continua vovó, a que aconteceu depois?
_Acabou ai querida, a história dessa casa. Disse com um largo sorriso e um suave suspiro. Ambas sentadas no sofá da sala.
_Mas vovó, a foto quem é que estava na foto?
Esticou o braço e pegou um retrato que se encontrava na mesinha de canto ao lado do sofá. Mostrou a sua neta uma menina de sete anos.
_Que linda! Quem é?
_Esta é a foto e seu nome é Ângela.
_Seu nome é Ângela não é vovó?
_Sim, mas não e só o nome semelhante nós somos iguais, bom pelo menos quando eu era jovem.
_E o moço, você não o viu mais? E o que aconteceu com ele? Era um fantasma?
_Calma! Quantas perguntas! Bem eu nunca mais o vi, pesquisei sobre essa casa e ele era um antigo proprietário que faleceu seis meses, depois da morte da jovem Ângela. Não sei se era um fantasma ou um anjo.
_Que triste! Por que a senhora estava naquela rua se não conhecia ninguém?
Antes de responder deu uma pequena risada pelas insistentes perguntas curiosas feitas pela Karina.
_Karina! Fui a uma entrevista de emprego e retornava para casa quando começou a chover se não fosse por Rodrigo eu poderia ter morrido.
_Como? Por quê? Perguntou passando o retrato de uma mão à outra brincando.
Pegando o retrato da mão da Karina e ainda o segurando respondeu?
_Houve uma enchente violenta naquelas ruas principalmente onde eu estava indo e o teto do ponto que eu pegaria o ônibus caiu matando duas pessoas, como pode ver Karina aquela noite estranha salvou a minha vida.
Levantou-se e colocou o retrato no lugar.
O retrato de uma linda mulher branca, cabelos pretos com penteado em coque sentada em um sofá de madeira com almofadas vinho rendada com as mãos postas uma sobre a outra com o rosto olhando para frente com um lindo vestido com gola V em rendas manga balão com babados branco com detalhes em rosa.
Escrito em letras minúsculas do lado direito na vertical.
“Eternamente sua Ângela”