UMA BREVE ANÁLISE DA RESPONSABILDADE TRIBUTÁRIA DO SÓCIO ADMINISTRADOR E SEUS EFEITOS NO CAMPO JURÍDICO.

 

                                                                                    [1] Carlos Alberto Pereira Oliveira

                   2 Marcos Vinício Rocha Viana                                                         

 

RESUMO: Este artigo tem como objetivo apresentar uma análise teórico-jurídica sobre a responsabilidade tributária do sócio administrador e os reflexos e incidências da mesma no âmbito jurídico. Ao mesmo tempo, busca-se relacionar a maneira como o ordenamento jurídico brasileiro trata a questão frente aos diplomas legais que visam regulamentar e organizar a dinâmica tributária nacional. Num plano lógico, abordam-se os pressupostos e elementos que norteiam a essência das obrigações tributárias destacando-se o caráter efetivo que elas demandam do contribuinte direto. Com este afinco, procura-se definir ou visualizar aspectos tangentes à responsabilidade subsidiária e por substituição que as situações jurídicas de plano tributário podem ocasionar nas demandas que envolvem a figura jurídica do sócio administrador. Esta análise pretende elucidar ou diminuir as dúvidas que são suscitadas diante das interpretações que podem ser desenvolvidas sobre a responsabilidade tributária entre os sócios, já que nesses casos não se pode utilizar medidas e ações injustas que gerem prejuízos e desequilíbrios na estrutura produtiva das empresas.

Palavras-Chave: Responsabilidade Tributária; Sócio Administrador; Campo Jurídico.   

 

INTRODUÇÃO

Faz-se necessário esplandecer a história antiga, em referência a alguns relatos esporádicos, sobre aspectos e costumes tributários dos povos e particularmente a partir do que se conhece sobre a experiência de judeus, gregos e, de forma mais completa, dos romanos. Constata-se uma relação conflituosa, em que os interesses contrastantes acabam por gerar uma superestrutura de princípios, normas e limitações que formam o arcabouço do direito tributário contemporâneo. Verifica-se, portanto, que não importa o grau de desenvolvimento econômico ou cultural dos povos, o objetivo de pagar sempre menos impostos, senão ignorá-los é uma constância no seio da sociedade, ainda assim quando é sabido que nem sempre os tributos são revestidos em proveito do Estado para com os anseios sociais, e sim se destinam, em sua maioria para atender interesses privados dos detentores do poder, mesmo que estes sejam rotulados de interesses públicos.

Desta forma, o ato de pagar impostos, pouquíssimas vezes remetem à simpatia do contribuinte, particularmente são tidos como injustos e iníquos, conquanto este ato é tido como norma de rejeição social. No tocante a responsabilização dos sócios se faz mister um breve esclarecimento acerca do surgimento da obrigação tributária, a qual decorre de uma relação jurídica composta por um sujeito ativo (credor) e um sujeito passivo (devedor), ligados por um dever jurídico, que obriga o sujeito a entregar certa quantia em dinheiro ao sujeito passivo.

Por outro lado, é de suma elucidar o artigo 121 do Código Tributário Nacional (CTN), posto que ressalta; “sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária”. O CTN, ainda, no mesmo dispositivo legal, aduz a distinção de contribuinte, que possui relação direta com o fato gerador da obrigação, do responsável, que, mesmo não realizando o fato gerador da obrigação, a lei lhe imputa o dever de satisfazer o crédito tributário em favor do sujeito ativo (Fisco).

Diante do exposto, depreende-se que os parâmetros para responsabilização de terceiros encontram-se dispostos no artigo 128 do CTN, que por sua vez, assim dispõe:

Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste Capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.

 

BREVE ANÁLISE DOS PRESSUPOSTOS DAS OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS

Entende-se que a obrigação tributária de pagar o débito poderá ser efetuada pelo contribuinte direto, ou seja, aquele que realizou o evento para o nascimento da relação jurídica, ou pelo responsável, para tanto recai sobre ele tal dever por transferência do dever ou por substituição da pessoa que deveria ser o sujeito passivo. Para efeito de distinção entre responsabilidade por transferência e responsabilidade por substituição tal diferença pode ser assim definida, ocorre a transferência quando a obrigação tributária depois do seu surgimento, em desfavor de uma pessoa determinada, ao caso, seria o sujeito passivo direto, entretanto, em virtude de um fato posterior, transfere-se para outra pessoa diferente, já a por substituição ocorre quando em virtude de uma disposição expressa de lei a obrigação tributária surge desde logo contra uma pessoa diferente daquela que esteja em relação econômica com o ato, o fato ou negócio tributado. Nesse caso é a própria lei que substitui o sujeito passivo direto por outro indireto. Com efeito, quando a responsabilidade recair sobre os sócios, sócios-gerentes e diretores das pessoas jurídicas, tem-se o dispositivo em questão; substituição tributária, em que o dito “responsável”, terceiro na relação tributária, torna-se sujeito passivo do dever de pagar o tributo, substituindo a sociedade na relação jurídica fiscal.

 

   RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA

Consoante ao artigo 134 CTN, ocorrerá responsabilidade subsidiária dos sócios em casos de liquidação de sociedade de pessoas. Desta forma, na impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal, os sócios se tornam responsáveis subsidiários do crédito tributário, ou seja, só haverá responsabilidade tributária dos sócios após comprovação que a pessoa jurídica não possui bens suficientes para efetuar o pagamento da dívida, e, além disso, somente em relação aos atos ou omissões nos quais foram efetivamente responsáveis. Diante do exposto, assim elucida a doutrina de Hugo de Brito Machado:

A responsabilidade de terceiros, prevista no art. 134 do CTN, pressupõe duas condições: a primeira é que o contribuinte não possa cumprir sua obrigação, e a segunda é que o terceiro tenha participado do ato que configure o fato gerador do tributo, ou em relação a este se tenha indevidamente omitido. (...) É preciso que exista uma relação entre a obrigação tributária e o comportamento daquele a quem a lei atribui à responsabilidade. (MACHADO, 2000, p. 127).

Em distinção ao CTN expressando que há responsabilidade solidária, vê-se, no entanto, a responsabilidade subsidiária, uma vez que, o sócio só será responsabilizado se a empresa não tiver como pagar o tributo. Existe, no caso, um benefício de ordem, que impede a execução do sócio na hipótese da sociedade ter patrimônio para honrar a dívida. Cumpre salientar que, neste caso, não há responsabilidade pelas penalidades que não sejam de caráter moratório.

Para que ocorra a incidência do art. 134, VII, CTN, e seja possível a responsabilidade solidária do sócio é indispensável a prova de ato comissivo ou omissivo quanto ao não pagamento do tributo, além da demonstração de ter sido frustrada a tentativa de localizar-se bens de propriedade da pessoa jurídica para garantir o crédito tributário em juízo.  Quanto à responsabilidade de terceiros, prevista no art. 134 do CTN, pressupõem-se duas condições: a primeira é que o contribuinte não possa cumprir sua obrigação, e a segunda é que o terceiro tenha participado do ato que configure o fato gerador do tributo, ou em relação a este se tenha indevidamente omitido. “É preciso que exista uma relação entre a obrigação tributária e o comportamento daquele a quem a lei atribui à responsabilidade". (Malheiros, 2006, p.176).

Depreende-se que, quando a lei menciona sociedades de pessoas, não contempla as sociedades de capital, dentre as quais as sociedades anônimas.  São sociedades de pessoas aquelas em que a realização do objeto social depende fundamentalmente dos atributos individuais dos sócios. Os atributos das pessoas dos sócios são mais importantes que sua contribuição material para a sociedade. Inclusive, como as qualidades dos sócios podem interferir na realização do objeto social, o ingresso de um novo sócio está condicionado à aceitação dos demais, pois os interesses dos outros sócios podem ser afetados. As sociedades em nome coletivo e em comandita simples são de pessoas. A sociedade limitada pode ser de pessoas ou de capital.

Em contrapartida, nas sociedades de capitais os atributos dos sócios são irrelevantes para o sucesso ou insucesso da empresa explorada pela sociedade. Quando uma pessoa adquire uma ação de uma sociedade anônima, as qualidades subjetivas desse acionista não interferem de forma nenhuma com o desempenho da sociedade. O único fator a considerar é a contribuição material dada para a sociedade. O sócio pode alienar sua participação societária a qualquer um, independentemente da anuência dos demais. As sociedades anônimas e em comandita por ações são sempre de capital. A sociedade limitada pode ser ou não de capital.  Contudo, importante ressaltar que, muitas vezes, a Fazenda Pública busca generalizar a responsabilidade dos sócios em caso de liquidação da sociedade, sem fazer diferença se a sociedade é de pessoas ou de capital: simplesmente utiliza o art. 134 do CTN para responsabilizar os sócios por débitos tributários no caso da sociedade não ser mais encontrada em seu endereço. Não obstante, é preciso atentar para a disposição expressa contida na lei de que a responsabilidade dos sócios está bem delimitada pelo art. 134 apenas nas sociedades de pessoas é que tal responsabilidade subsiste, não podendo atingir sociedades de capital.

 

 

RESPONSABILIDADE POR SUBSTITUIÇÃO

A interpretação do texto do art. 135 do CTN, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), conta com entendimento sedimentado há anos, no sentido de afastar a responsabilidade tributária do sócio administrador, sempre que não ficar comprovado o agir com dolo, excesso de poderes, infração à lei ou estatuto. Sendo assim, para alcançarem a responsabilização pessoal do administrador, devem as Fazendas Públicas prescindir de prova da dissolução irregular da sociedade, o que autoriza o redirecionamento da execução contra o sócio, que deverá responder pela dívida com seu patrimônio particular. Vale lembrar que a Certidão de Dívida Ativa (CDA) é o título executivo utilizado pela Administração como subsídio para a cobrança judicial de seus créditos. Na CDA, constam todos os dados da obrigação, tais como: tributo devido, fatos geradores, períodos de apuração e vencimento, composição do valor, data da constituição definitiva etc. Assim alude o artigo 135, III do CTN:

“Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.”

Sendo assim, o sócio-gerente ou administrador é responsável tributário por substituição, não por sua condição de sócio, mas na condição de gestor de bens alheios, acaba praticando atos com excesso de poderes, infração à lei ou ao contrato social, ou seja, quando, por exemplo, ocorrer à dissolução irregular da sociedade mediante o desaparecimento da firma, sem quitar os débitos existentes.

O principal pressuposto para a responsabilidade tributária de sócios-gerentes, diretores e administradores das pessoas jurídicas de direito privado reside no dolo. Imprescindível à comprovação do intuito precípuo em fraudar a lei ou contrato social para auferir vantagem indevida, posto que o art. 135 não traz hipótese de responsabilidade objetiva. No caso de pessoas jurídicas cuja responsabilidade dos sócios tem limitação, como as sociedades por cotas de responsabilidade limitada e as sociedades anônimas, estes somente respondem pelo débito tributário em circunstâncias específicas, seja de acordo com os preceitos do art. 135 ou no limite da integralização do capital social ou do valor das ações.

Como o art. 135 prevê a possibilidade de haver responsabilidade dos representantes legais, conclui-se que apenas o sócio-gerente pode ser responsabilizado, excluindo-se o sócio não gerente, que não tem poderes de decisão na empresa. De fato, o sócio não gerente não pode arcar com a responsabilidade tributária, visto que não tem poder para praticar atos geradores de responsabilidade. O sócio só se transforma em responsável tributário após a prova de cometimento de ato ilícito, e por isto, a execução só pode ser redirecionada contra ele após a produção desta prova. Ajuizar ação contra o sócio, pura e simplesmente, é infringir o art. 135, visto que este não autoriza execução contra sócio, só autoriza execução contra o responsável tributário.

Em relação á propositura de execução fiscal diretamente contra o sócio, em virtude de seu nome já está na Certidão de dívida Ativa, entende-se que só poderá ser admitida com importante ressalva: prévia apuração de responsabilidade no processo administrativo. A presunção de liquidez e certeza do crédito tributário é resultante de um procedimento administrativo fiscal onde é garantido ao sujeito passivo o contraditório e a ampla defesa. Portanto, a Fazenda Pública só poderia constituir o seu próprio título executivo se este for extraído de um procedimento administrativo, submetido a todas as garantias constitucionais processuais, sob pena de lesão à Constituição da República, que garante o direito ao contraditório e à ampla defesa tanto em processos administrativos quanto em processos judiciais. A Constituição também determina que toda pessoa deve ser considerada inocente até que se prove o contrário. Deste modo, essa prova é exclusiva de quem alega ou imputa um fato a outrem, vale dizer, sempre da Fazenda Pública. Ao exigir do suposto responsável tributário a prova negativa da inexistência de ilicitude, o Superior Tribunal de Justiça acaba por estabelecer uma responsabilização tributária objetiva sem amparo na legislação. Mas a responsabilização de sócios e administradores é exceção, e não regra, e não pode ser entendida como tal, muito menos em desprestígio dos princípios constitucionais.

CONCLUSÃO

 A regra emanada da lei é a de que não há responsabilidade dos sócios pelas dívidas societárias, sendo necessário para que tal regra seja rompida a comprovação, a cargo do Fisco, da culpa subjetiva do sócio-gerente ou administrador, ou seja, a comprovação da violação de lei, violação do contrato social ou do estatuto social, ou se agiu com excesso de mandato. A indiscriminada responsabilização de sócios e administradores pelos débitos das sociedades aos quais participam o que fere o comando legal e importa em desestímulo à atividade econômica. Com efeito, vê-se que a responsabilidade tributária preconizada no art. 134 do CTN limita-se às sociedades de pessoas, não podendo atingir as sociedades de capital.

Da mesma forma, a responsabilidade expressa no art. 135 do CTN só se configura se a Fazenda Pública demonstrar, de antemão, a prática de ato ilícito, abuso de direito ou atuação em desconformidade com os atos constitutivos da empresa, por parte de seus sócios ou administradores, sendo que o simples não pagamento do tributo não configura ato ilícito capaz de caracterizar esta responsabilidade, sendo assim, o mero não recolhimento de tributo não configura infração de lei para o fim do disposto no inciso III, do art. 135 do CTN.  Por fim, os sócios não podem ser responsabilizados tributariamente com supedâneo no art. 124 do CTN porque, em regra, não possuem interesse jurídico no fato gerador tributário praticado pela sociedade, sendo que o interesse econômico não é suficiente para gerar responsabilidade.

Conclui-se, portanto, que é necessário interpretar corretamente as normas para que não haja a injusta responsabilização dos sócios, o que acarreta na infração ao princípio da preservação das empresas, trazendo como consequência o aumento de riscos na atividade econômica, o decréscimo das fontes de emprego, prejuízo à livre concorrência e, em última esfera, ao equilíbrio da sociedade capitalista como um todo.

ABSTRACT: this article aims to present a theoretical legal analysis on the tax liability of the managing partner and the reflexes and the same effect under the law. At the same time, we seek to relate the way the Brazilian legal system treats the question in relation to legislation aimed at regulating and organizing the national tax dynamics. A logical plan, discuss the assumptions and elements that guide the essence of tax liabilities by highlighting the effective character that they demand the direct contributor. With this hard to define or view tangent aspects to secondary liability and by replacing the tax plan legal situations can result in demands involving the legal figure of the managing partner. This analysis aims to elucidate or decrease the doubts that are raised on the interpretations that can be developed on the tax liability between partners.

Keywords: Tax Liability; Managing Partner; Legal Field.

REFERÊNCIAS

ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. 4ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2005.

BRASIL. Código Tributário Nacional. 25 out. 1966.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: 05 out. 1988

CURSO DE DIREITO TRIBUTÁRIO. 27ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 14 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010.

MACHADO, Hugo de Brito, Curso de Direito Tributário, 18º ed., Ed. Malheiros, 2000.

MURTA, Antonio Carlos Diniz. Responsabilidade tributária dos sócios: sociedades por quotas de responsabilidade limitada. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.

VAZ, José Otávio de Vianna. A responsabilidade tributária dos administradores de sociedade no Código Tributário Nacional. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

 

 



[1] Acadêmico do 9º período de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES).

2 Acadêmico do 9º período de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES).