Um grão...                       

Quem não conhece um grão de areia!? Eu não o conheço... Queria ser intimo dele. Sentí-lo entre minha alma e meu corpo. Saber do  seu segredo. Mastigá-lo até sentir uma profunda dor na minha mente... Rente... Somente...

                       Queria saber a força de um grão de areia!Você sabe?Qual o poder de transformação. De onde tira a sua cor. Qual a sua origem!Saber da sua dor... Odor... Labor...

                       Queria ser um grão de areia..., para sentir os pés dos que se apóiam  nele. Receber da terra o calor. Sustentar plantas. Tornar-me estrada. Ser brinquedo nas mãos das crianças, passear por entre os dedos. Tomar forma e às vezes me desintegrar; transformar-me em outro castelo... Belo... Selo...

                       Queria ser um grão..., para formar paredes e ser confidentes dos segredos. Guardar tesouros sem senti-los meus. Espiar corpos nus imersos em suas fraquezas. Misturar-me às lágrimas... Ri e chorar por não saber chorar de ri... Subir... Descer...

                       Queria ser..., para formar muros; às vezes escadas. Habitar os mares, dormir nos bares e acordar com o sereno da manhã. Cair nos olhos, ferir alguns pés e morar em sapatos... Ratos... Gatos...

                       Queria..., me enterrar nos  corpos, encher os olhos e as bocas e ver morrer os vivos. Habitar a carne misturando-me ao sangue, passeando nas consciências, sem ciência, apenas queria... Seria... Riria...

                       Queria Ser um grão de areia..., formando lastro para receber palavras. Tornar-me intimo dos que escrevem e ser marcado pelas promessas que deixam indeléveis marcas, ou simplesmente sumir com a água e termos um filho em segredo... Medo... Avesso...

                       Queria ser um grão..., um cisco talvez. Coçar e irritar as pupilas e deixar vermelhos os olhos. Ficar entre o olhar que busca e nada enxerga. Irritar, irritar sem me irritar. Correr nos glóbulos... Abrolhos... Logos...

                       Queria ser..., aquilo que incomoda. Que arranha quando entre dois corpos. Participar de momentos mais prazerosos e ser lembrado pelo incômodo. Estar entre grandes e mesmo assim permanecer pequeno... Aceno... Obsceno...

                       Queria..., para ver o que existe debaixo do tapete para além de mim. Resistir às vassouras, ficando para trás, para que possa arranhar pés. Grudar nas pás para saber em que lugar fica o lixo. Pregar nas costas misturando-me ao suor... Dó... Nó...

                       Infelizmente, não tenho a graça de um grão. Sou muito pequeno para ser um. Penso ser grande, talvez dois ou mais. Paro nos meus delírios de ser castelo. Como ser parede sem ser grão?Juntar-me a quem?!Como ganhar a confiança da água?Onde encontrar movimento que amolenta... Inventa... Inocenta...

                       Não, não tenho a força de um grão. Quero ser só. Triunfar em minhas batalhas; general de mim mesmo. Crio minhas guerras e sonho ser mais que um rei, nunca um grão. Em vão sumo na bruma de minha luta e caio sobre minha própria sombra... Imunda... Inunda...

                      Não, não tenho o brilho de um grão. Por não deixar-me tocar, ou quem sabe por não abandonar-me à luz. Por estar sempre no quarto escuro, contando meus feitos... Os anos que passam, ou os que nunca existiram... Sumiram... Suspiram...

Queria saber a força de homem!!Você sabe?Eu...,não sei.Ou talvez,não queira saber.Tornar-me íntimo... Ah! Um grão de areia...