Sinésio Dozzi Tezza nasceu em Butiá, distrito de Descalvado, no Estado de São Paulo em 1942. Foi criado na fazenda dos avós, chamada Caucaia do Alto. Ainda moço, foi para Santo André, junto com os pais, para tentar a sorte, pois a fazenda dos avós foi dividida e, apesar de grande, os filhos eram muitos e não dava mais para viver da terra. Na cidade grande precisou concluir seus estudos com dificuldades, pois abandonou cedo a escola para trabalhar. Com sua determinação, fez o curso supletivo e conseguiu entrar na universidade onde fez o curso de Relações Públicas. E foi lá que conheceu Ana Amélia, o grande amor de sua vida, com quem compartilha até hoje os bons e os difíceis momentos da vida.

Teve uma juventude alegre e feliz, envolveu-se com teatro e música, tendo composto em parceria algumas belas canções, ainda inéditas, como Maysa, com o Saulo de Tarso, uma homenagem a inesquecível cantora da bossa nova. É uma pessoa extrovertida, sem medo de parecer ridículo, é capaz de subir no palco e declamar um poema ou fazer um discurso, mesmo trocando palavras ou esquecendo o texto. Lembro-me uma vez no casamento de um amigo, o Milton Eto, ele não se conformou em ver todos os japoneses fazerem os tradicionais discursos e, nós brasileiros, amigos do noivo não fazermos nada e sem entender uma palavra do que diziam.  Não teve dúvidas, subiu numa mesa e sob o olhar atento do povo do Sol-Nascente, teceu uma ladainha que não tinha mais fim. Para o desespero do noivo, não se esqueceu de tecer loas as boas virtudes do Milton como boêmio e bebedor de primeira linha. “Numa mesa de bar esse nosso amigo não passa vergonha e é capaz de tomar um garrafão de cachaça e ainda dirigir”. Foi muito divertido, mas a família da noiva ficou preocupada com as nada lisonjeiras referências que ele deu do noivo, mas era só brincadeira, pois o consorte já era um professor de língua portuguesa cioso de suas responsabilidades.

 O Sinésio é uma pessoa encantadora pela sua maneira gentil e sedutora. Apesar de formado em Relações Públicas, acabou sendo vendedor, aliás, um ótimo vendedor. O nosso amigo é capaz de vender qualquer coisa que for colocada em suas mãos. Habilidoso com as palavras seduz facilmente os seus interlocutores, enchendo-os de elogios, merecidos ou mão. A verdade é que as pessoas gostam de ser elogiadas, pois faz bem para o ego, já li qualquer coisa assim em livros de autoajuda.

Ambicioso e cansado de vender para a empresa em que trabalhava e não vendo futuro como compositor e poeta, resolveu ter o seu próprio negócio: montou uma empresa, com dois amigos como sócios para fabricar o produto que já vendia. Com a cara e a coragem os três iniciaram o empreendimento. O início foi difícil pelas dificuldades próprias de novos empreendedores, sem muita experiência e sem muito capital. O pior aconteceu: as dificuldades empresariais acabaram por destruir uma longa amizade e a sociedade acabou sendo desfeita. Mas o Sinésio tinha fibra de empreendedor e não desistiu. Novamente começou outra empresa, do mesmo ramo, desta vez com outro sócio.  Também não deu certo e lá foi ele de novo tentar a sorte mais uma vez.  Afinal associou-se com uma pessoa certa. Ele cuidava da parte administrativa e comercial e o sócio da produção. A firma prosperou e o nosso poeta transformou-se num empresário bem sucedido.

O nosso poeta-empresário sempre acalentou um velho sonho: aprender tocar um instrumento. Houve uma época em que todas as semanas ele aparecia em casa para trazer a filha que estudava piano com minha mulher. Durante um bom tempo, enquanto sua filha Thais se ocupava em aprender música, desfiávamos longas conversas sempre regadas a um bom vinho. Na época eu sempre recebia umas garrafas de clientes e fornecedores da empresa onde trabalhava e fui abastecendo minha adega. Eu e o Sinésio conseguimos dilapidar o estoque nos bons meses de suas visitas semanais. Ele até hoje, sempre que nos encontramos, nos lembramos das boas garrafas que tomamos juntos, temperadas com boas histórias.  Por fim, aproveitando o tempo, tentou também aprender piano, mas, pretensioso demais, escolheu a difícil “Eu sei que vou te amar” do saudoso Tom Jobim. A harmonia e os acordes foram demais para o meu amigo e ele acabou desistindo, não da música, mas do instrumento.

 Algum tempo depois, decidiu tocar viola caipira, o instrumento ligado as suas origens rurais. Quando garoto, ainda de calças curtas, ficava de cócoras ouvindo durante horas os cantadores de sua terra natal.  É de lá que vem o seu jeito simples de falar, de andar e de ficar vez por outra, matutando sobre a vida com o mesmo jeitão do velho Constantino, seu pai.  A moda de viola sempre povoou seu imaginário de poeta. Ele é capaz de cantar por horas a fio velhas canções de Raul Torres, João Pacífico e Tonico e Tinoco. Seus poemas são repletos de simbologias do mundo caipira, costumes do campo e da natureza. “Chora lua no serrado, Manda-Chuva te contar”, são versos de um poema que ele fez para o Urutau, ave de hábitos noturnos, que povoa o imaginário caipira pelos seus mistérios. Esse poema foi transformado em uma bela canção com a maestria do velho Kalunga.   O Sinésio é bastante é eclético em seu gosto musical e não despreza um bom samba do Chico Buarque, Tom Jobim ou as canções mineiras de Milton Nascimento. É como contador de causos que está também um dos seus pontos fortes, sua veia dramática e humorística. Consegue envolver a platéia de tal maneira que dá para ouvir até o zumbido de mosca. Vai criando emoções em cima de emoções até chegar ao desfecho da história, que normalmente termina com gostosas gargalhadas.

Sinésio Dozzi-Tezza, carrega no sobrenome duplo, aristocráticas origens de Treviso, norte da Itália de onde vieram seus bisavós. Seus antepassados viveram tempos de fausto e riqueza até que um deles, não me lembro em qual século, resolveu dilapidar a fortuna na jogatina e com belas mulheres, coisa que não deixa o Sinésio triste, pois acredita que ele soube aproveitar a vida.  Hoje, o carismático descendente brasileiro da casa Dozzi-Tezza é um empresário, poeta, contador de causos e tocador de viola. Talvez ele pudesse ir mais longe, mas acredito que foi até longe demais, pois bom seria se não fosse, para tanta paixão tão curta a vida.