Resumo: Mostra como chegar aos outros sem sair de si mesmo.

Um discurso universal

“É preciso escrever para si. É assim que se pode chegar aos outros”. A frase leva a chancela de Eugène Ionesco, intelectual, teatrólogo, nascido em Slatina, Romênia, em 1909, e morto em Paris, em 1994.    

À primeira vista parece um contrassenso. Com efeito, se alguém escreve para si corre o risco de produzir uma obra hermética, incomunicável, inútil. A esta lógica, no entanto, ofereço o contraexemplo de uma suposição.

Suponhamos: sou o síndico do condomínio onde moro, e detenho a consciência de realizar naquele espaço não apenas os movimentos da minha individualidade, como também de desenvolver, harmoniosamente, com grande proveito ético, as capacidades de animal político.

Sei que participo de uma comunidade, cuja existência decorre da unidade espiritual, cultural, e da vontade coletiva.

Nestas condições, ao baixar uma portaria, não será necessário que eu a redija pensando em A ou B. Basta que eu a escreva para mim. Escrevendo para mim chegarei aos outros sem possível engano.

Chegar aos outros sem sair de si mesmo significa simplesmente proferir um discurso universal.

É como a flor chega às borboletas, na comunidade dos perfumes. É como os poetas chegam aos corações, na comunidade estética. Como o sino da capela chega aos devotos, na comunidade da fé. O gemido de quem sofre aos ouvidos de quem passa, na comunidade do amor.

 Tenho para mim que o pensamento de Ionesco aponta nessa direção.