Com a proclamação da República em 1889, apenas um ano após a Lei Áurea que acabou com a escravidão, decretou-se na constituição, a separação entre estado e a Igreja Católica. Até então, o chefe da Igreja Católica no Brasil era oficialmente o Imperador. Era ele, por exemplo, quem nomeava os bispos. Por isso, a Igreja Católica tinha diversos privilégios concedidos pelo estado.

Num estado laico, pressupõe-se a liberdade religiosa, não se dando preferência a nenhum credo. Todas seriam iguais perante a lei. Na prática a teoria era outra, como dizia o jornalista Joelmir Betting. De forma que a Igreja Católica continuou tendo grande poder e privilégios durante a República Velha e mesmo após a Revolução de 1930. Em todas as cerimonias oficiais, inaugurações e outros eventos, lá estava um bispo ou cardeal abençoando as obras públicas ou da res-pública.

O escritor Jorge Amado conta em seu livro de quase de memórias, Navegação de Cabotagem, que a vida não só dos seguidores de credos africanos, como também cristãos de outros matizes, não era nada fácil, pois as perseguições eram frequentes.  Ele conta que em campanha política pelo estado do Ceará em 1946, presenciou saques e destruição de templos protestantes sob o comando de padres católicos.

Jorge Amado, desde jovem se interessou pelas crenças de origem africana, tornando-se um defensor da liberdade das pessoas de praticarem seus rituais religiosos, sem nenhuma restrição.  Faltava uma emenda que fizesse com que a constituição federal fosse devidamente cumprida em todas as letras em relação ao estado laico.  Como deputado comunista, não recebeu apoio de sua própria bancada, pois a religião é vista como ópio do povo pelas teorias marxistas.

Apoiado por deputados conservadores ilustres e ilustrados, como Gilberto Freyre, Milton Campos, Otávio Mangabeira, Luiz Vianna Filho e com o aval do secretário geral do Partido Comunista, Luiz Carlos Prestes, conseguiu o número de assinaturas necessárias para encaminhar a Emenda Constitucional no Congresso. Assim, em 1946 é aprovada a emenda que estabelece de fato e de direito a liberdade religiosa numa república que nasceu laica, mas só no nome, pois manteve-se fiel a tradição monárquica de vínculo com a Igreja Católica.

Assim, graças a um deputado e escritor, na época filiado ao partido comunista, estabeleceu-se de direito à liberdade de credo no Brasil. A partir daí ficou garantido aos protestantes, espíritas e aos seguidores de credos de origem africana, o direito de frequentarem, sem restrições, as suas igrejas ou templos. Infelizmente, os credos africanos continuam sendo até nossos dias, vítimas do preconceito e intolerância por parte dos cristãos que se consideram os seguidores da única e verdadeira religião.