Sorriu-me, com o cigarro na boca. Aproximou-se, ainda sorrindo. Me encolhi na cadeira em que estava, virei, pedi vodka. Voltei-me à ele, ainda aproximando-se. Sentou-se ao meu lado, perguntou:
- Queres ir comigo? Tenho Chico em algum CD, cigarro e mais bebida.
Pisquei. Entendeu. Levantou-se, piscou, o segui.

O quarto estava escuro em um apartamento de um edifício quatro estrelas num canto da cidade, que não sabia qual. Deitei-me. Esperei. Uma mão gelada tocou minhas pernas, shhhhh! - sussurrou - uma música surgiu no fundo quando nossos olhos finalmente se encontraram.
- Não sei - eu disse.
- Tudo bem - ele respondeu. Deitou-se ao meu lado.
Continuamos ali, em silêncio. Quando te vi chegar fiquei paralisado, tocava. Virei-me, encarei-o. Tinha os olhos um tanto claros, penetrantes. No sorriso que se abriu via-se dentes amarelados, nariz pequeno. O cabelo, pouco, era preto. Seu braço se ergueu, sua mão tocou meu rosto. O carinho, de leve, na minha barba de três dias por fazer, era o melhor que já recebera. Meu corpo esquentou, sorri também. Por um tempo. Virei-me rapidamente para o outro lado.
- Não sei - eu disse.
- Tudo bem - ele sussurrou.
Me abraçou, estremeci. Dormimos. Acordei cedo, o que pareceu tarde pra ele. Já havia saído. Corrido. Fugido. Não sei. Fechei os olhos. Quis, mas não fiz. Ou não quis. Sentei-me.
Uma pequena abertura no meio do livro denunciava um cartão que estava lá dentro. Eu te amo, dizia.
- Não sei - sussurrei.
Tudo bem, ouvi sua voz ecoar pelo quarto. Tudo bem, tudo bem, tudo bem, continuava.
Levantei. Saí. Não voltei.
Vivi infeliz.