Tudo ou nada.

Por Carlos José Esteves Gondim | 06/02/2018 | Crônicas

MEMÓRIAS DE UM PROFESSOR QUASE NORMAL. Episódio 08: Tudo ou nada.
Aconteceu alguns meses após eu ter começado a minha vida de professor na FCAP/UFRA, lá pelos idos de 1974. Naquele tempo, havia em todos os departamentos, uma entidade formal chamada Comissão de Disciplina. Não, não era tratado a disciplina como comportamento, mas a disciplina matéria. Essas comissões, formadas por diversos professores que ministravam matérias afins, tinham a incumbência, dentre outras, a de analisar em conjunto, as questões, por exemplo, que fariam parte das provas das avaliações curriculares, os chamados NPC’S, NHA’S e NEF’S. Se estavam bem formuladas, dentro dos assuntos tratados, essas coisas. Pois bem. Estava eu participando de uma dessas reuniões no departamento onde eu era lotado, o de Fitotecnia. Ministrava algumas aulas de Silvicultura. Recém-contratado e, digamos, virgem na função. Eram 5 os professores que dela participavam: Prof. Calzavara, Prof. Humberto Koury, Prof. Rubens Lima, Prof. Álvaro Pantoja e eu. 
– Prof. Gondim! Recebi uma reclamação de um aluno seu. Disse que o senhor é um péssimo professor! Que não sabe ensinar! Portanto, para mim o seu conceito está assim: (E fez aquele gesto de polegar estendido para baixo, com os demais dedos fechados na palma da mão)! Era o prof. Rubens Lima. Empalideci. Calado estava, calado fiquei. Os outros professores presentes entreolharam-se, mais ou menos surpresos. Em um daqueles milésimos de milésimos de segundos, meu cérebro sentenciou: – É tudo ou nada! Se te calares agora, ele montará o resto da vida em ti! E respondi: – Prof. Rubens Lima. O senhor se lembra de um fato acontecido quando o senhor dava aula pra minha turma, ano passado? Sem parar de falar, continuei: – Quando, durante um intervalo de sua aula, o prof. Mário Teixeira, de Zootecnia, entrou na sala, pediu licença e começou a “cantar” as notas que faltavam da prova dele, e que toda a turma estava ansiosa em saber? E o senhor, ao retornar à sala, deu a maior descompostura nele? Vociferei sem parar! – Portanto, o seu conceito, a partir daquele momento, ficou assim: E repeti o mesmo gesto feito por ele. Agora, o ambiente ficou agitado. Entraram em ação os “deixa disso” e a reunião se encerrou.
Dias depois, Fui chamado à sala do Departamento de Fitotecnia, pelo Prof. Humberto Koury, que era o chefe de então. Lá, estava presente o Prof. Calzavara, subchefe. – O diretor da FCAP quer falar com o senhor! Disse o chefe. Não respondi nada. – É sobre aquele episódio acontecido na comissão de disciplina! Falou um deles pra mim. Continuei calado, mas pensei com meus botões: – Tôu ferrado! Em seguida, levantou-se e saímos os três em direção à sala da Diretoria. Eu, no meio, cercado pelos professores Koury e Calzavara. Seguimos quase todos calados, pelos extensos corredores do prédio central. Eu, como se estivesse caminhando em direção à forca ou à cadeira elétrica!!! Entramos todos na imensa sala da diretoria. O diretor, Prof. Elias Seffer, estava sentado em sua cadeira diante da mesa do diretor. Convidou-nos pra sentar e já foi falando: – Prof. Gondim! Quero parabenizá-lo pelo seu comportamento. Embora jovem e inexperiente o senhor se comportou muito bem, segundo me disseram os seus chefes. Confesso que eu estava pálido e trêmulo, prestes a receber a corda em meu pescoço ou a descarga elétrica. – Diretor. Só fiz o que a minha consciência me mandou fazer… Respondi, agradecido com a frase que repentinamente a minha mente elaborou. Houve alguns comentários a mais em meu favor, ditos pelos meus chefes e saímos.
Devo registrar, em homenagem a esse grande mestre, pesquisador e engenheiro agrônomo, Rubens Rodrigues Lima, que embora por um certo tempo, nossas relações resumiram-se meramente protocolares e cordiais, quando retornei de meu mestrado em 1977, voltamos a conversar e trocar ideias sobre várzea e outros temas. E ele, na primeira vez que me viu, disse-me, descendo de sua inseparável kombi: – Prof. Gondim. Por que o senhor não “pinta” os seus cabelos brancos?! Veja bem, seus alunos podem ficar pensando: O que um “velho” desses está fazendo dentro de sala de aula? E blá, blá, blá... 
Mas estes são mais uns quinhentos milhões de reais! Fica pra próxima!!!