Pode ser assustador, mas eu gosto de ver muita chuva caindo, temporais, trovoadas e muito vento. Nada disso me assusta, adoro água, maré alta, rio cheio, cachoeiras. Sei que esses fenômenos podem representar perigo e destruição, mas eles me fascinam. Sinto neles a expressão da força da natureza e que eles nos mostram como somos  pequenos diante dela, mas não sei porque, não sinto medo.

Me lembro que numa tarde de verão eu estava na praia, quando o tempo começou a mudar. Começou a ventar, nuvens escuras foram se acumulando no céu e as pessoas foram saindo assustadas, indo embora. Mas eu fiquei ali fascinada e de repente entrei no mar. Nunca tinha feito isso antes, mas comecei a nadar cada vez mais para dentro, achando maravilhoso estar sozinha entre as ondas com a chuva caindo sobre mim. Fui invadida por uma sensação incrível e me estiquei na superfície da água, boiando, enquanto raios incandescentes iluminavam o céu no horizonte. Era um lindo espetáculo! Quando uma onda me ergueu mais alto, avistei na praia alguns homens na areia gritando. Eles apontavam para o céu e acenavam para mim, para que eu saísse do mar.

Mesmo contra a minha vontade parei de boiar e voltei. Quando cheguei na areia eles estavam boquiabertos com a minha atitude e um deles me perguntou se eu era mineira, certamente porque alguns mineiros não conhecem o mar e por isso podem desconhecer os seus perigos. Então eu ri e disse que não, e que havia entrado na água simplesmente porque gostava de chuva e achava bonito um temporal no mar. Eles se entreolharam disfarçadamente e foram embora.

Outra vez eu estava debruçada numa janela no décimo sétimo andar de um prédio em São Paulo, quando o vento enfurecido começou a açoitar as copas das árvores lá embaixo na rua, e em seguida a chuva desabou torrencialmente. Já escurecia e no céu  os raios iluminavam as nuvens cinza escuro e os trovões ecoavam no espaço, enquanto eu me sentia extasiada apreciando o belo espetáculo da natureza, mas mesmo sabendo que era perigoso, não senti nenhum medo e nem saí da janela.

Conheço pessoas que ao contrário de mim, não podem ver o vento bater as janelas e uma chuva cair um pouco mais forte que entram em pânico, se escondem embaixo da cama, desmaiam. Uma dessas pessoas tem lá as suas razões, vivenciou acontecimentos traumáticos, morou em lugares inseguros sujeitos a enchentes e desabamentos e com certeza ficou marcada por esses acontecimentos. A outra não, simplesmente entra em pânico, rói as unhas, fica roxa, se esconde. Se tem algum trauma, ela mesma não sabe, não se lembra de nada que a tenha levado a isso, mas no meu caso, quem sabe se a minha intrepidez diante da fúria da natureza tem alguma razão que desconheço, algum trauma com efeito contrário, cuja origem eu não me lembro? A minha coragem e o medo de algumas pessoas nesses casos,  não têm explicação.

Traumas ou seja lá o que for à parte, o melhor mesmo é não se ter nenhum, e em vez de ficar embaixo da cama, dar chiliques ou desmaiar, ou entrar no mar debaixo de chuva, ou ficar numa janela curtindo uma tempestade sujeito a um raio que o parta, o certo é se fazer o que todo mundo faz; fechar as janelas e até mesmo como minha mãe costumava fazer lá em casa naquele tempo: ela chegava a cobrir todos os espelhos com um lençol “para não atrair corisco", como era costume antigamente, aonde não havia pára-raios. Também não se pegava em objetos de aço durante o temporal e as crianças ficavam juntas num quarto, enquanto ela e a empregada rezavam. Não precisa exagerar, mas se possível, ficar dentro de casa até as coisas melhorarem é a melhor maneira de se curtir uma tempestade, que apesar de tão bela pode causar danos irreparáveis. 

Junia/2013