TERRITÓRIO E A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE CULTURAL

Tatiane Paula Silva dos Santos – IF Goiano [email protected]

 

Resumo

O presente artigo objetiva trabalhar e refletir sobre o território como uma área delimitada e a construção identitária, sobretudo a capital Goiânia e sua história. Tendo em vista que a construção de Goiânia surge em meio a transformações políticas que estavam acontecendo no Brasil, refletiremos sobre o impacto dessas transformações na criação da cidade Goiânia, bem como no processo de povoamento e construção da identidade desse povo.

Ainda analisaremos neste trabalho sobre os territórios quilombolas urbanos presentes na capital Goiânia e região metropolitana, pois é indiscutível que tal cultura deve ser considerada e analisada como pertencente da cultura goiana e também do Brasil.

Ainda neste estudo consideraremos a obra Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire, pois se trata de um estudo e projeto para libertação de um povo que ainda não é consciente da sua importância na construção social, assim como de seus direitos, situação perceptível na população carente goiana e em comunidades urbanas quilombolas.

 

Palavras-chave: Território. Construção identitária. Paulo Freire.

 

Introdução

            A capital Goiânia “nasceu” em 1930, seu fundador foi Pedro Ludovico, foi planejada pelo engenheiro-arquiteto Atílio Corrêa Lima e pelo urbanista Armando de Godói. Diante dessa apresentação sobre a cidade Goiânia nos questionamos em relação ao povo goiano: quem é esse povo? De onde vieram? Para refletirmos sobre essas perguntas consideraremos o documentário “Nossa história daria um filme - Episódio de Abertura (Goiânia)”, produzido e publicado pela TV UFG, que conta a história de Goiânia a partir de seus pioneiros e de seus bairros representativos, neste documentário é possível conhecermos sobre a processo de formação territorial e da construção cultural de Goiânia e outras cidades goianas, ainda neste vídeo é feita uma análise da formação de cada região de Goiânia.

            Para tanto consideraremos ainda os territórios quilombolas urbanos presentes na capital goiana e na região metropolitana, visto que Fernando Bueno Oliveira e Maria Idelma Vieira D’Abadia fazem a seguinte consideração sobre as comunidades quilombolas urbanas:

Já as comunidades quilombolas urbanas se veem inseridas em meio aos problemas próprios de espaços urbanos carregados da complexidade e da heterogeneidade que permeiam a vida citadina. A apropriação de seus territórios se vincula, geralmente, à realidade da periferia e\ou de espaços marginalizados e \ou segregados. São espaços etnicamente diferenciados por serem constituídos por grupos identitários que buscam o reconhecimento de sua identidade e a segurança jurídica de seu direito à propriedade para romper o ciclo da segregação espacial. (OLIVEIRA ; D’ABADIA, 2015, p. 259).

            No que diz respeito a conscientização dessa população carente e marginalizada consideraremos a obra Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire, pois é por meio de um processo de alfabetização concretizado que se possibilita a consciência de classe e lutas concretas por inclusão real de um povo injustiçado na sociedade. Veja o que o professor Ernani Maria Fiori (Pedagogia do Oprimido, 1994) afirma no prefácio da obra de Paulo Freire:

Paulo Freire é um pensador comprometido com a vida: não pensa ideias, pensa a existência. E também educador: existencia seu pensamento numa pedagogia em que o esforço totalizador da “práxis” humana busca, na interioridade desta, totalizar-se como “prática da liberdade”. Em sociedade cuja dinâmica estrutural conduz à dominação de consciências, “a pedagogia dominante é a pedagogia das classes dominantes”. Os métodos da opressão não podem, contraditoriamente, servir à libertação do oprimido. Nessas sociedades, governadas pelos interesses de grupos, classes e nações dominantes, a “educação como prática da liberdade” postula, necessariamente, uma “pedagogia do oprimido”. (FREIRE, 1994, p. 5).

 

Diante disso, a obra Pedagogia do Oprimido (1994) de Paulo Freire vem somar com o presente debate. E com o propósito de desenvolver a respectiva temática, buscamos estabelecer um diálogo entre a referida obra, o texto Territórios quilombolas em contextos rurais e urbanos (2015) de autoria de Fernando Bueno Oliveira e Maria Idelma Vieira D’Abadia e, por fim, o documentário “Nossa história daria um filme - Episódio de Abertura (Goiânia), cuja finalidade é práticas pedagógicas que minimizem as diferenças sociais que serão evidenciadas a partir do presente estudo.

 

Desenvolvimento

Rainer Gonçalves Sousa faz algumas considerações importantes sobre a fundação de Goiânia, veja:

A cidade de Goiânia, atual capital do estado de Goiás, foi formada a partir das transformações políticas que marcaram a história do nosso país na década de 1930. Contudo, o projeto de mudança da capital goiana já era discutido anteriormente. Isso porque a Cidade de Goiás, primeira capital goiana, criada no século XVIII, havia sido fundada em razão da atividade aurífera naquela época. Após o período do ouro, essa justificativa não mais valia e as cidades envolvidas com a criação de gado e o desenvolvimento da agricultura, mais alocadas ao sul, passaram a ter maior importância para Goiás.Com a fundação do regime republicano, temos registradas as primeiras discussões oficiais que consideravam a transferência da capital de Goiás. Entretanto, a nossa primeira constituição republicana, de 1891, e as suas duas reformas subsequentes, de 1898 e 1918, acabaram sustentando a capital na antiga região aurífera. Em 1930, a revolução liderada por Getúlio Vargas impôs uma renovação das lideranças políticas nacionais e regionais. Nesse período, o regime varguista estabeleceu aliança com outras figuras políticas goianas. Foi daí que o médico Pedro Ludovico Teixeira foi nomeado como interventor do estado de Goiás e, estabelecendo um sentido de renovação, buscou colocar em prática o projeto de mudança da capital. No ano de 1932 foi organizada uma comissão que deveria realizar a escolha da melhor região para a qual a nova capital seria transferida. (https://escolakids.uol.com.br/historia/a-fundacao-de-goiania.htm)

 

            Diante de tais considerações e o documentário “Nossa história daria um filme - Episódio de Abertura (Goiânia)” é possível percebermos que a construção de Goiânia aconteceu com muitas utopias, mas também baseada em autoritarismos, com transformações políticas e migrações, pois como mostrado no documentário em estudo várias famílias vieram para trabalharem nas construção da capital e aqui “firmaram moradias”, por outro lado temos, conforme apresentado no documentário, a formação das periferias, espaços que inicialmente não atendiam necessidades básicas de seus moradores, como energia elétrica, água tratada, saneamento básico.

            Diante disso, consideraremos também nessa perspectiva a formação das comunidades quilombolas urbanas, que estão inseridas principalmente na região periférica de Goiânia e região metropolitana. Como bem afirma Oliveira e D’Abadia:

(...) os assim chamados “quilombos urbanos” contemporâneos se configuram como grupos sociais de resistência a um sistema de exclusão, comunidades de ascendência marcadamente negra – mas não exclusivamente, no geral empobrecidas, com ethos e costumes diferenciados dos grupos que lhes circundam. Um confinamento espacial é proporcionado pela marginalização por parte das políticas públicas. A ausência de políticas específicas para um contingente dotado dessa peculiaridade histórica e a precariedade das políticas universalistas conformaram os “quilombos urbanos” como espaços socialmente distantes. Em Goiás, cinco comunidades quilombolas urbanas são certificadas pela Fundação Cultural Palmares: o Jardim Cascata (Aparecida de Goiânia), Tomás Cardoso (Goianésia), Nossa Senhora Aparecida (Cromínia), Antônio Borges (Barro Alto) e Vó Rita (Trindade) (RaTTS; FURTADO, 2010). Observamos um intenso processo de migração de jovens, adultos e até idosos do campo para bairros de cidades próximas em face de precárias condições de vida na área rural e na busca por educação, trabalho, e saúde, a exemplo dos Kalunga de Cavalcante (PAULA, 2003) (OLIVEIRA ; D’ABADIA, 2015, p. 269).

 

Diante do presente cenário, ressalta-se, a importância da pedagogia libertadora, apresentada e defendida por Paulo Freire, pois as diferenças sociais e econômicas são evidentes em Goiânia e na região metropolitana, trata-se de um povo que não tem ciência dos seus direitos, vivem como “oprimidos”. Nas palavras de Paulo Freire:

O grande problema está em como poderão os oprimidos, que “hospedam” ao opressor em si participar da elaboração, como seres duplos, inautênticos, da pedagogia de sua libertação. Somente na medida em que se descubram “hospedeiros” do opressor poderão contribuir para o partejamento de sua pedagogia libertadora Enquanto vivam a dualidade na qual ser é parecer e parecer é parecer com o opressor, é impossível fazê-lo. A pedagogia do oprimido, que não pode ser elaborada pelos opressores, é um dos instrumentos para esta descoberta crítica – a dos oprimidos por si mesmos e a dos opressores pelos oprimidos, como manifestações da desumanização. (FREIRE, 1994, p. 17).

Destarte, fica evidente que somente através de uma educação que propicie a conscientização e que como defendido por Paulo Freire que possibilita ao indivíduo inserir-se no processo histórico, como sujeito é que ensejará o indivíduo perceber, primeiramente, que está como oprimido e posteriormente buscar meios se libertar efetivamente do opressor.

 

Considerações finais

            Ao longo deste artigo abordamos sobre a construção e fundação da cidade Goiânia, refletimos sobre as comunidades quilombolas urbanas e sobre a proposta de uma pedagogia libertadora, de Paulo Freire. Este estudo nos proporcionou conhecer melhor sobre o a construção da nossa capital Goiânia e sua cultura.

            Ao analisarmos a obra de Paulo Freire repensamos nossa prática docente e percebemos a importância de adotarmos uma postura ética e inclusiva em relação aos excluídos ou marginalizados. Para Paulo Freire não devemos temer ouvir e lutar com o povo, mas lutar com eles. Veja:

Não teme enfrentar, não teme ouvir, não teme o desvelamento do mundo. Não teme o encontro com o povo. Não teme o diálogo com ele, de que resulta o crescente saber de ambos. Não se sente dono do tempo, nem dono dos homens, nem libertador dos oprimidos. Com eles se compromete, dentro do tempo, para com eles lutar. (FREIRE, 1994, p. 14).

            Sendo assim, faz se necessário refletirmos nossa função como professores, conhecer e estudar diferentes culturas e realidades para que possamos praticar a pedagogia libertadora, pregada por Freire, nos comprometendo e lutando com os que precisam de libertação, sabendo que não somos libertadores, nem donos do tempo, mas professores que são “instrumentos” para a “mudança de vida”.

 

Referências

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 17ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987.

OLIVEIRA E D’ABADIA, Fernando Bueno e Maria Idelma Vieira. Territórios quilombolas em contextos rurais e urbanos brasileiros, 2015.

SOUSA – Rainer Gonçalves – A fundação de Goiânia https://escolakids.uol.com.br/historia/a-fundacao-de-goiania.htm – acesso em 01 de abril de 2020.