“Somos o 99%”: o ideal, o paradoxo e a inexorabilidade

Por Jansen Felipe Rocha Costa | 14/11/2011 | Sociedade

O nosso planeta Terra adoece de inúmeros males, dos quais os mais notórios não nos são desconhecidos. Temas como a corrupção, abusos contra os direitos humanos, censura, racismo, diferencias sociais, cobiça corporativa, desigualdade financeira, imposição tributária desmedida e desigual, a influência do setor privado sobre o governo, xenofobia, homofobia, precariedade da educação, insuficiência do sistema de saúde, entre outros direitos, leis e deveres estúpidos, como o de tributar para manter um ótimo cardápio e serviço de quarto nas cadeias, e pagar salários às famílias dos criminosos ali presos, são simplesmente tão comuns, que parecem não mais afetar-nos. É algo assim como aquela frase que de tanto ser usada, tornou-se um clichê e perdeu todo o seu poder apelativo. No entanto, caro leitor, ser ciente de algum acontecimento e fazer algo em prol ou contra dele, é tão diferente quanto “apoiar”, que é um verbo ativo, e “ser a favor”, que é passivo.

No dia 17 de Setembro de 2011, um pequeno grupo de pessoas acampou no Parque Zuccotti, dando início a um movimento de protesto contra o sistema corrompido pelos males já acima mencionados, sob o slogan “somos o 99%”. Isto último significou o mote de sua causa, seu ideal, referindo-se à descomunal diferença na repartição da riqueza nos Estados Unidos, entre o 1% mais rico e o 99% restante da população. Pessoalmente, sou inclinado a “simpatizar”, isto é, “ser a favor” de tais ideais, mas é justamente esse o problema: o paradoxo no qual o ativista e o simpatizante encerram-se. O ativista, por um lado, que sacrifica tudo, pode ser contado em centos, como aqueles 100 ou 200 ativistas que acamparam no parque, passando frio, fome, dor, perjúrio, vexame e crítica. Já os “simpatizantes”, que segundo as pesquisas realizadas, representam aproximadamente o 59% da população norte-americana, o que seria aproximadamente uns 185 milhões de pessoas, limitam sua árdua labor colaborativa a clicar em “curtir” no Facebook, a twitar frases, repassar e-mails, e nos melhores dos casos, participar de abaixo-assinados e até doar algum dinheiro. Agora, o movimento que clama pelo 99% da população, da qual 59% mostra-se favorável, nem sequer é representado pelo o 0.00001% desses 99%, passando a tornar-se vítimas das próprias peripécias e subterfúgios do capitalismo, alvo da sua própria crítica.

Inexoravelmente, acrescentam-se ao espetáculo figuras representativas da cultura pop, da cultura alterna, da cultura subalterna, da cultura contracorrente e até da sem corrente, que junto a políticos e comerciantes oportunistas, transformam o ideal em um circo inelutável. A luta pela patente do nome do movimento, camisetas, bonés, bandeiras, programas de televisão, músicas, shows, etc. aparece do mesmo jeito que as luzes em Las Vegas ao golpe das 18 horas, envolvendo o movimento e o seu ideal em um estranho paradoxo, algo assim como um bolo gelado recheado de ilusões, expectativas, boa vontade e sonhos, que leva cobertura de abusos policiais, oportunismos comerciais e políticos, com retoques deliciosos de sensacionalismo mediático, para depois ser batido por militantes ativos, inoperantes, simpatizantes inúteis, internautas, sabotadores, policiais prepotentes, políticos corruptos, artistas e outros personagens (ir)relevantes. Deste bolinho paradoxal, não tem como se escapar, e lamentavelmente, como muitas e até incontáveis vezes, não se chegará a nada mais que algum tipo de “acordo” que termine favorecendo apenas o 1% do 99% que critica o outro 1%. Assim, finalmente, enquanto todo o mundo não sofrer as mesmas dores de parto, então seu povo nunca verá o seu filho nascer, o fruto da revolta definitiva, do chega! O filho da esperança mundial, do qual, muito provavelmente, o Occupy Wall Street não será mãe desta vez.