A filosofia se identifica com um certo saber, acompanhado de um estado de vida peculiar. E mais, a filosofia é uma ciência que dá ao homem um certo sentido da realidade, assim como, v.g., a religião.

Associado a essa premissa, que por sua formulação, mostra-se aparentemente destituída de uma realidade factível, leva-nos, leitore(a)s, a ter uma falsa impressão de que alcançar o sentido da realidade apontado pela filosofia não é relevante para se poder alcançar um sentido de vida que possibilite ter presente a felicidade em nosso viver.

Tal aspecto da vida filosoficamente orientada é salientado por Fábio Konder Comparato, ao preceituar que: “[...] a felicidade não é uma dádiva e sim a recompensa de um esforço constante e bem orientado. Daí a importância da investigação sobe o que é bom ou que é mau para se alcançar esse objetivo, [...]” (2016, p. 17).

Desse modo, um olhar atento ao que o pensamento filosófico tem a nos dizer é, ao menos, prudente, por nos dar elementos de reflexão que pode nos impulsionar à descoberta do real sentido da existência: a essência do (sobre)viver.

Nesse espirito, portanto, o pensamento de Sócrates é voltado à essência, ao ser. E pensar na essência é pensar em conceitos. É pensar em delimitar.

Sócrates ensina que definir é por limites em uma coisa. Assim, algo é. A definição nos conduz à essência das coisas.

Dentro dessa premissa, a ética socrática aborda o homem do ponto de vista de sua interioridade. Por tal razão, a conhecida frase atribuída a Sócrates, qual seja: conhece-se a ti mesmo.

Desse modo, o centro da ética socrática situa-se no conceito de areté (a virtude). Assim, a premissa socrática preceitua que devemos tomar posse de nós mesmos pelo saber.

Sócrates situa a filosofia no caminho da verdade, combatendo a retórica sofista, ou seja: “[...] a aparente sabedoria do bem dizer, incapaz, de ser outra coisa, a não ser opinião” (MARÍAS, 2015, p. 45). Algo hoje, ao se evidenciar a noção daquilo que é essencial em contraponto ao que é aparente, como, v.g.: “A especialização das imagens do mundo se realiza no mundo da imagem autonomizada, no qual o mentiroso mentiu para si mesmo” (DEBORD, 1997, p. 13).

Assim, a definição de homem, no sentido de delimitar sua essência, reside em sua alma (sua razão ou seu eu consciente), identificada como a diferença específica do homem em relação aos outros animais.

O sentido do corpo se localiza na sua instrumentalidade adstrita à alma. O corpo em si não é bom ou mau. Elemento acessório e transitório à alma, que ao bem servir à alma, alcança a sua melhor definição.

Em leitura filosófica, sob a premissa socrática, o que se tem por bom, valioso e desejável para o senso comum, não se mostra como um bem, pois atende somente ao corpo, que se revela valioso, não em si mesmo, mas quando se presta ao homem, que se define pela sua alma (como já dito).

Enfim, deve-se ter claro que a falta de consciência de si, leva-nos a celebrar/celebrizar tudo aquilo que se volta ao corpo, identificando (equivocadamente) o corpo como elemento essencial de nós mesmos. Ao revés, prescinde-se daquilo que é duradouro e essencial: o eu consciente. Note, no mundo, hoje: a arena real/virtual, onde se digladiam a imagem de mim e o eu (realidade da nossa alma), sem que quase ninguém se tenha despertado para isso.

 

REFERÊNCIAS

 

COMPARATO, Fábio Konder. Ética.3ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.

 

DEBORD, Guy. A Sociedade do Espetáculo. São Paulo: Contraponto, 1997.

 

MARIÁS, Julián. História da Filosofia. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2015.