Sobre Sócrates

Por Leôncio de Aguiar Vasconcellos Filho | 23/10/2025 | Filosofia

Os períodos da humanidade são, pelos historiadores, divididos em épocas cujo escolhido demarcador foi a ideologia ou religião. Mas, em poucas teses, vimos a perpetuidade temporal ser fatiada segundo a filosofia vigente, bem como seus protagonistas. E o maior deles, sem dúvidas, foi Sócrates.

Nascido em 470 a.C., de acordo com a lenda teve seu destino preconizado pelo Oráculo de Delfos. Na infância, já ajudava seu pai, Sofronisco, embora num ofício para o qual não possuía muito talento. Durante seu crescimento, foi se interessando pela resolução individual dos problemas, muitas vezes de modo fisicamente imóvel, silencioso e sentado, num estado de profunda meditação (em certas ocasiões, permaneceu assim até sob nevascas). E, desse espírito intelectual, nasceu a maiêutica, que é o método dialético e socrático de busca pela verdade numa dupla etapa, com a confrontação do interlocutor frente ao seu dilema e posteriores resoluções do que daí adviesse. Sócrates, portanto, não pode ser considerado um sofista, mas um buscador da verdade objetiva daquilo que, segundo seu mestre Anaxágoras, é a vertente do universo: a biologia, a percepção e a cosmologia. 

Anaxágoras foi o mestre de Sócrates, que foi o formador de Platão. A maior parte do que se sabe sobre Sócrates resulta da interpretação de alguns de seus contemporâneos, como o comediante Aristófanes, ou de filósofos posteriores, como o próprio Platão e Xenofonte. Pela tradição da oralidade, tem-se o conhecimento de que ele ministrava seus saberes em praças públicas, especialmente para a juventude (de cujos costumes reclamava, por não seguirem as antigas tradições, como o bem tratar aos anciões), e recusava qualquer espécie de pagamento pela transmissão do conhecimento: afinal, isso está muito ligado à simbiótica vertente de, declamando “só sei que nada sei”, não escrever suas ideias, pois fixada objetividade, certeira ou errônea, em eventuais manuscritos, comprometeria seu nome, ecoando por gerações. 

Há dúvidas sobre se Sócrates serviu aos exércitos atenienses durante as guerras ocorridas enquanto em idade militar, e sobre se ele induziu ou instigou soldados a desertarem, ao que respondeu que tal equivaleria a desertar ele, Sócrates, da filosofia. Não porque soubesse muito, mas porque era sua vocação (independentemente disso, há, também, rumores de que ele salvou vários companheiros nos campos de batalha). Mas a derradeira acusação que sobre ele se abateu foi a de “impiedade”, que era a corrupção da juventude pela tentativa de inserção de outros deuses que não aqueles que protegiam a pólis (dentre outros fatos com tipicidades a ele atribuídas). No seu julgamento, lhe foi questionado, por exemplo, se confirmaria que o sol e lua não eram deuses, mas, respectivamente, um pedaço de rocha e uma outra Terra, confirmando dita teoria e fazendo duvidar-se do letramento de seus juízes.

Foi condenado à morte, mas não tentou utilizar esferas de influência ou amigos poderosos para, ao contrário de Anaxágoras (que fugiu para Lâmpsaco e lá fundou uma escola filosófica, que, não obstante a extemporaneidade, ainda hoje é tida como pré-socrática), escapar à sentença de morte. Preferiu, entretanto, não esperar a hora letal de sua execução e se suicidou com cicuta. Era 399 a.C.

Perdemos o que fora, talvez, o maior de toda a Antiguidade Clássica Europeia.