Será que a morte chega com um afago?

 

Será que a morte chega com um afago?

Um abraço afetuoso para dar boas-vindas,

Um olhar compreensivo de acolhida,

Uma mão estendida sem que aponte um dedo inquisidor,

Pois quem chega quer deixar o peso inútil de um corpo abandonado,

Que talvez sirva de remendo ou uma segunda chance,

Ou não mais que cinzas e mero alimento,

De volta à terra

 

Será que a morte chega com um sorriso?

Puro, sem malícia, sem falsas intenções

Uma luz guia, uma porta que se abre sem rangidos,

Um tapete macio onde os pés perceberão firmeza,

E um passo será mil,

E um salto cobrirá montanhas,

O caminho livre, sem obstáculos, sem atropelos

A estrada sem fim

 

Será que a morte vai ser justa?

No tempo certo, na hora exata,

Sem engano de identificação,

Sem que a escolha tenha sido adulterada,

Sem que se pretenda um atalho,

Que não se parta deixando dívidas nem dúvidas,

E que não sobrem cartas de despedida a serem escritas,

Nem o brinde final sem esvaziar todo o cálice.

 

Será que a morte chega de frente?

Sem surpresa, sem dor ou lamento,

Mais uma etapa, mais um capítulo,

Outra aula, infindáveis aulas, necessárias aulas

De uma graduação eterna,

Sem que se possa saber o momento em que o aluno vira o mestre,

Nem quando o carbono vira diamante,

E o fim volta ao começo.

 

Será a morte um prazer?

E as músicas que me escapam serão tocadas com arranjos perfeitos,

As imagens que inundam minha mente serão projetadas em telas planas colossais

As palavras soltas serão reunidas em longas frases,

Em discursos que adocem os ouvidos e tragam conforto e esperança,

Os sonhos estarão materializados e eu não precisarei esperar pelas noites jamais

Não quero choro, nem vela, nem uma fita púrpura, negra ou amarela,

Só quero me encontrar com todos novamente

 

Será?

 

                                                                            Ivan Henrique Roberto

                                                                                         21.agosto.2022