SENSAÇÃO DE SEGURANÇA GERA INSEGURANÇA
Por REGILBERTO GIRÃO | 12/11/2009 | PolíticaEm que tipo de época vivemos, não? Todos se perguntam, numa hora ou outra.
Ainda há os que ainda comentam: "Quem imaginaria que algo parecido poderia acontecer? Minha Nossa Senhora..."
Pois não é mais surprêsa. Espera-se de tudo e de qualquer um, esteja maltrapilho ou trajando belas roupas. O maior problema de todos é que quanto mais fatos ocorrem, mais banais eles se tornam. O esquecimento é rápido.
Ainda é possível ver e ouvir pessoas burburinhando e lamuriando, saudosamente, outros tempos.
Tempos em que se podia brincar às ruas, trajar shorts e andar sem camisa, pedalar, sem muito se preocupar se teria a bicicleta roubada, seus tênis furtados ou em ser raptado.
Tempos em que muros eram feitos para separar terrenos, tinham altura suficiente para comadres trocarem algumas fofocas, enquanto penduravam roupas em varais ou as colocavam sobre telas ou arbustos para quarar ao sol, e, obviamente, serem pulados pelas crianças. Afinal de contas, "por que dar a volta na casa, se meu destino é a casa do vizinho?".
Tempos em que as fachadas das casas eram visíveis - era chique -, com muretas tão baixas que mais serviam para sentar com a turma e "bater um papo" e, para quem passasse, era a oportunidade para se ver um jardim bem cuidado.
Se alguém se machucasse ou passasse mal à rua, mesmo sendo um estranho, vizinhos vinham em peso para socorrer, medicar, soprar, gritar pelo "Seu Zé" da caminhonete para levar alguém ao hospital ou à farmácia - o que era mais comum.
Publicado em um jornal ou em uma revista, há algum tempo, alguém narrou algo parecido. Descrevia o passeio de um pai com suas duas filhas, ainda crianças, em Copacabana, quando foi abordado por senhores - "minhocas de praia" - com o intuito de avisá-lo de que não passasse por certo lugar, visto que havia "camisinhas de vênus" jogadas à areia, não sendo prudente deixar com que suas filhas presenciassem tal cena.
Tal fato se repetiu, anos depois, num passeio com as filhas já adolescentes. Porém o assunto era outro: haviam jogado, à beira do calçadão, seringas, que ensejavam o uso de drogas injetáveis.
Bem. As camisinhas e as seringas, hoje, passam despercebidas. Pouco se liga se filhos ou netos, sejam crianças ou não, presenciem cenas de sexo ou de um viciado inoculando drogas em suas próprias veias. Basta ligar a televisão. Violência se tornou objeto de prateleira. É o que há de mais consumido, seja por meio da mídia impressa, falada ou televisiva. Quantas vezes se ouviram dizer: "Este ai (jornal), se torcer, escorre sangue"?
O cancro dos séculos, herança do passado - com o devido respeito às proporcionalidades das outras épocas -, é a violência.
Por motivos conhecidos, registrados e recorrentes - terras e riquezas -, homens travaram legendários embates mortais, com bravura e honra, em batalhas onde prevaleciam, com as devidas exceções, valores morais e éticos, além dos cívicos - alguns encutidos nas cabeças dos jovens, outros por vedadeiro civismo.
Historicamente, leis e normas foram construídas e modificadas, ao longo do tempo, de forma a adequarem-se às necessidades das épocas e remendadas, a cada novo evento que feria alguns valores, tradições ou costumes - ou por interesses de alguns.
Não vivemos diferentes destas outras épocas. Só alguns fatores fazem com que entendamos que a coisa tomou proporção incontrolável e gigantesca: densidade demográfica, desproporções bélica e econômica, consumismo e o volume de informações que trafega, hoje, à velocidade da luz.
A disparidade na distribuição de renda e nas aportunidades de trabalho, aliada ao alto grau de necessidade que o homem tem de colocar em exibição suas posses - carros, jóias, roupas, tênis, etc. - acabam por motivar a ação daqueles que se vêem desprivilegiados diante deste contexto.
Neste momento, vêem-se espaços invadidos e promiscuidos, diante da falta de capacidade do Estado em prover a segurança em sua devida proporção. Deste não se pode cobrar tanto, visto que as estatísticas não permitiriam com que contingenciassem as polícias com o suficiente.
Para tanto, promovem-se, mesmo contra as leis, formas que visam atenuar a possibilidade de terem-se os bens e vidas colocados em maior risco e "tentar" intimidar possíveis intrusos.
Colocam-se cercas eletrificadas, consertinas (lâminas com alto poder cortante, sob forma helicoidal) por sobre os muros - que tomam proporções de "arranha-céus" (exagero do autor) -, portões clausura, câmeras de vigilância, sensores de presença e de invasão - até mesmo com infravermelho -, caixilhos blindados para os porteiros - quando estes existem -, que chegam a suportar até 5 disparos efetuados por um fusil AR-15 - armamento que deveria ser de uso, exclusivamente, militar -, sinais sonoros para portas, alarmes, portas blindadas, salas e botões de pânico, sofisicados sistemas de CFTV (Circuito Fechado de Televisão), que chegam a detectar se uma pessoa vai ou vem e, até mesmo, objetos deixados em um ambiente por muito tempo.
Muitas coisa? Nada. Tem muito mais tecnologia a ser conhecida e usada.
Tem um pequeno detalhe, nesta história toda. Tais quais as "caimisinha de vênus" e a "seringa usada por um drogado", que o tempo e convívio cotidianos fizeram com que fossem banalizadas, esta parafernalha eletrônica, encontrada em qualquer bairro ou em prateleiras de supermerado (do tipo PLUG & PLAY - instale você mesmo), provocam a natural transferência do medo para a falsa sensação de segurança.
Quantos ignoram, total e completamente, alarmes que disparam pelas vizinhanças, sejam em carros ou edificações residenciais ou comerciais?
O medo, por natureza, provoca reações no homem que, quando supridas por outras medidas, deixam de existir ou são escamoteadas. São reações colocadas de lado, por termos mais o que fazer. São reações que provocam alerta, vigilância e observação que são transportadas para simples dipositivos eletrônicos.
Dentre tantos possíveis motivos, tal qual a falta de orientação, está o mais pernicioso de todos, que é o não desejar recebê-la. É o desprezo e o querer ignorar a realidade de algo que bate à soleira.
O que se percebe é que o ser humano só se senbiliza quando algo lhe acontece direta ou indiretamente. Ou seja, quando é assaltado, roubado, agredido ou quando um de seus entes queridos passa por algo semelhante ou, até mesmo, um vizinho - quando o conhece.
Outro modo de fazer com se sinta desta forma é "presenciar", por meio da televisão ou Internet, eventos catastróficos que comovem, sensibilizam e aguçam a sensação de medo. Em alguns casos, se ouve e se vê quem diga que "poderia ter acontecido com comigo" ou "se não fosse por um determinado motivo, eu estaria ali e seria uma das vítimas.".
Usando dos jargões técnicos da área de segurança, existe uma frase que espelha bem este comportamento:
"Só se coloca cadeado à porta, depois que a chutaram."
E é bem verdade. Diariamente, profissionais da área de Segurança - aqueles relegados às situações depois que ocorreram -, presenciam e sentem o desdém às sugestões, aos avisos e aos alertas que tentam, incansavelmente, transportar às pessoas.
A impressão é de que são instransponíveis, imortais, intocáveis e que a chance de algo lhes acontecer é menor que as próprias possibilidades e probabilidades.
Por fim, o pior dos questionamentos: "Por que vocês não pensaram nisto antes?"
REGILBERTO GIRÃO