Pelo volume dos projetos e programas defendidos por um verdadeiro exército de estudiosos e profissionais da saúde, tudo nos conduz a uma geração “fitness” que calcula, mede, analisa, avalia, testa e comprova o que se come, como se come, quando se come, o quanto se come para que se come.

As clínicas e programas de reelaboração de cardápios, a academias e reeducação alimentar e postural pululam e se proliferam, em nome de uma melhor qualidade de vida, sinal de maturidade do homem moderno das caminhadas, academias, “spa”, clínicas, espaços e muita resiliência. Esse despertar, ainda que tardio, para que se tenha consciência de que o nosso corpo é o resultado de o quê e como comemos, reforça que a cada dia, buscamos evoluir a fim de que se obtenham resultados que justifiquem os grandes investimentos em pesquisas, estudos, análises e investigações que conduzam a espécie humana a um futuro, se não brilhante, pelo menos seguro e saudável.

Somos o que comemos, diz a ciência. Somos que fazemos, diz a história. Colhemos o que plantamos, diz a natureza. Defendemos o que acreditamos, diz a filosofia...  Pensamos o que sabemos, sabemos o que lemos, ou lemos o que pensamos? Nesse repertório surgem linhas de raciocínio que precisam ser pontuadas.

Quem garante a saúde do físico é a alimentação que tem sido objeto de preocupação por parte daqueles que têm o que comer. Quem garante a saúde da mente e do espírito, deve ser o que pensamos, quando e quanto pensamos, como pensamos, porque pensamos e para quê pensamos. Para pensar, basta estar vivo. Mas para estar vivo, nos são impostas as regras de convivência e de sobrevivência. Vamos estudar para aprender a pensar melhor. Vamos fazer uma leitura de mundo dos fatos que os rodeiam e que precisam ser lidos e analisados, em nome da vida, em nome do sucesso da espécie.

Em resumo, é preciso ler. Ler e ler bem, sob pena de tudo o mais vir a ruir. Leitura de mundo, leitura que precisa ser feita para que se posa decidir. Não se discute aqui, a leitura do letramento, da decodificação de signos, da interpretação de fenômenos, da capacidade de se julgar. Mas sim, leitura no sentido literal de sentir. Perscrutar, sondar, tomar pé, amealhar informações para os próximos passos.

O que se tem lido? Com que olhares tem sido observada a vida moderna? De que forma, um primeiro olhar para um fato, nos habilita a falar sobre o mesmo? E assim, temos caminhado. Voltando ao início deste “ensaio”, há exércitos em busca da saúde físico-estética, discutem-se as melhores opções de reeducação de posturas e hábitos. Onde está a preocupação com o que se lê, como se lê, quando de lê, para que se lê? Não há registros dessa inquietação quando o assunto é a forma como as pessoas precisam pensar, porque se inquietaram; precisam agir porque aprenderam; aprenderam porque leram; leram porque precisaram e, por isso, souberam escolher o que lê.

Analisando o quadro sócio educacional dos dias atuais, os  educadores se deparam com uma realidade que e distanciam, cada vez mais, do plano lógico dos fatos sociais. Sempre houve classes mais e menos letradas em quaisquer civilizações. Mas também é fato que quanto mais instruída a sociedade, mais espaço ela ocupa no seu tempo e no seu espaço. A instrução a que nos atemos é àquela que repousa no ventre da escola como segmento natural da família no que tange à formação de novas gerações.

Essas gerações leem a letra do “funk”, as expressões que as telenovelas fazem questão de disseminar, trazem em si, o conteúdo dos “memes” e dos vídeos que insistem em parodiar uma cultura que se desintegra a cada ano, os “Ebook” disponibilizados na mídia são vistos como espectros de uma sociedade que hipocritamente insistem em “ensinar” de uma forma e agir de outra... revistas de quadrinhos, fazem parte do passado, O Mikey e a Minnie parecem idosos de uma geração que já se foi, Tom & Jerry, o Pica-pau, O papa-léguas... já não se identificam com os ideais de formação lúdica para nossos aprendizes de leitores.

Diante da escassez de uma “literatura” que cumpra o papel de instruir, de educar e direcionar para uma melhor compreensão de mundo, há de se questionar, o que, de fato, se espera que os jovens leiam. Assim, pela falta de bons livros, de bons textos, de boas crônicas, de bons artigos de opinião, de boas resenhas, de boas letras musicais, de bons espetáculos, de bons teatros, de bons filmes, de bons documentários, há um vácuo de possibilidades de incentivos e de motivação para que os jovens queiram ler.

As famílias pouco têm o que oferecer para ser lido. Não há como controlar o conteúdo ou o gênero a que a criança ou o jovem vivem expostos: pornografia, violência, corrupção, sexo fácil, banalização da morte, desvalorização da vida e dos valores sociais. Eles ficam, de fato, à mercê do que existe. É como se utilizar por analogia, do princípio: “De tanto ver triunfar as nulidades, o que tem importância, passa a ser ignorado...”. Assim, há de se questionar, por onde andam os best sellers, os grandes escritores, os grandes poetas, os pensadores do hoje, os compositores, as grandes canções.

.Mesmo reconhecendo a ausência de um produto considerado de qualidade para contribuir com a formação das novas gerações, a sociedade cobra da juventude um hábito que não dispõe de suporte para o seu exercício.

“A juventude, não lê”, fica presa ao vício da internet, dos jogos eletrônicos, nos celulares...  Mas como “desviar” seus olhares para outro cenário? Onde estão os defensores da saúde mental? Como esquecer do nosso início que defende o naturismo, o vegetarismo, o “vegano”, o “sarado” física e politicamente correto, em nome da mente, do sentimento, do pensamento, do desenvolvimento bio-psico-social? Um corpo são depende de uma mente sã. Como ter uma mente sã, sem ler, sem estudar, sem viajar nas letras de uma bela canção, nas folhas de um bom romance, nas cenas de um bom filme?

Onde estariam as organizações sociais, profissionais e educacionais em defesa desse material? Na escola, de forma acadêmica, se indicam determinadas leituras adequadas a idade-série. Não raro, essa tarefa de ler surge como uma tarefa, uma carga, um castigo que se encerra na avaliação decorrente da leitura. Fora da escola, há uma lacuna de materiais, onde as livrarias, box e bancas de revistas e jornais de pouco dispõem para ser   socializado, vendido, comprado, estudado lido, aprendido... Oportuno se faz que sejam levantados os dados do que se disponibiliza para ser lido, principalmente na fase de formação do perfil daqueles que serão a sequência do pensamento vivo de uma geração que, na prática, pouco tem produzido em favor da leitura saudável, prazerosa e gratificante.

Se o corpo físico reflete a qualidade da alimentação, o corpo metal, o sistema reflexivo, o complexo interpretativo depende do que lemos, do que vemos, do que temos, do que aprendemos, do que sabemos, do que somos em um momento em que as informações têm a velocidade da luz e nem sempre, a consistência para ser fixada na mente do leitor e transformadas em conhecimento para a melhoria da qualidade de vida.

Saber o que comer pode ser resultante do acesso à comida, que nos habilita a estudar o que é melhor, mais saudável. Saber o que lê se torna uma atividade complexa, pois depende da capacidade de “selecionar” o que vale a pena ser absorvido em meio a tantas informações que vão como vêm, sem qualidade acadêmica, sem um conteúdo que garanta motivação para aprendizagem e qualificação, numa alusão ao lixo eletrônico-virtual-musical-poético-brasileiro de periferia cultural.

Sebastião Maciel Costa

Mestre em Ciências Pedagógicas

Membro da Academia de Letras de Ilhéus