Como seria possível sentir-se saudades do que não se teve, do que não se conhece e do que não se viu? Falta, a gente sente; mas saudade, como? Mas é possível, sim.

    Às vezes quando penso que alguma coisa em minha vida poderia ter acontecido, mas não aconteceu, eu passo a sonhar imaginando que ela realmente existiu. E é disso que sinto saudades, de uma história que nunca houve. O sonho me faz suprir o vazio desse conteúdo abstrato da minha memória carente, matando a saudade do que existiu somente nos devaneios de uma mente fantasiosa.

     Quando penso que uma coisa poderia ter sido de uma forma, mas tive que aceitá-la de outra bem diferente, às vezes me surpreendo imaginando que ela foi como eu gostaria que ela tivesse sido. Só que não foi, e não é. Então me brota do peito uma saudade enorme daquele fato irreal, que eu tanto gostaria que tivesse sido verdadeiro.

    Quando vejo alguém fazer exatamente algo que eu gostaria de ter aprendido a fazer, ou ter algo que eu gostaria de ter tido, começo a imaginar que aquela pessoa sou eu!  Depois entro na realidade e tudo se torna uma grande confusão, uma certa mistura de decepção e frustração, sei lá. Aí eu sinto saudades dessas coisas que nunca existiram pra mim. Sinto-me vivendo fora da realidade presente, saudosa de um passado que não foi o meu, mas depois do sonho eu me refaço, renasço das cinzas de um fogo irreal como um fogo fátuo.

   Esses desejos da minha alma são coisas tão banais, tão corriqueiras, desejos que todos têm, como eu, mas que para quem as têm, nem significam o que significariam pra mim, que não tive. São coisas simples como poder compartilhar os mesmos gostos com alguém, saber fazer ou ter alguma coisa  que eu não aprendi ou não tive,pois é disso que eu sinto falta, e por mais ridículo que possa ser, encho-me de saudade dessas coisas que eu não pude ter ou ser. E de vez em quando eu me transporto, dou uma marcha à ré no tempo e me coloco no lugar de uma dessas pessoas, pra me sentir feliz. E consigo ser.

    A vida não é como a gente quer que ela seja nem as pessoas são obrigadas a corresponder aos nossos anseios, nem a gostar do que gostamos, nem nós podemos saber fazer o que outros sabem, mas é aí que temos que aprender a conviver com essa dupla personalidade: a imaginária, que nos remete a um pseudo passado, o que, no meu caso me leva a um paraíso que me consola. E com a personalidade real, palpável, pé no chão, que me faz aterrissar e encarar a minha vida real.  Então tenho que recorrer à adaptação e me adequar à minha vida e às pessoas com quem tenho que conviver e tentar viver o presente olhando mais para o futuro do que para esse passado irreal, apenas fantasioso. Infelizmente, e paradoxalmente em relação a tudo isso, posso afirmar  que há momentos em que esses devaneios até me ajudaram a carregar os fardos, amenizando certos pesos que temos que suportar. E depois de termos vivido um longo sonho acordados, sentimos que matamos a nossa saudade, como se agora tivéssemos o que realmente gostaríamos de ter tido e vivido, já que depois dos sonhos sempre despertamos com mais força para aceitar a nossa realidade presente. Uma ilusão, claro, mas viver  o sonho é como se nos encontrássemos com alguém que estava longe e ao abraçá-lo fortemente, matássemos a saudade que estávamos sentindo.  Dizem que quando alguém pára de sonhar, começa a morrer. Talvez por isso, a cada dia esses devaneios nos façam rejuvenescer.

Júnia - 2013