A ideia de responsabilidade civil nas relações familiares, no final do século XIX, era de que as normas de direito de família tinham por finalidade maior trazer proteção à família decorrente do casamento, legítimo organismo familiar, que tinha o condão de estabelecer um vínculo jurídico indissolúvel, onde o pátrio poder era exercido pelo marido, submetendo a sua autoridade a mulher e a prole, com vistas a garantir a boa ordem e a preservação e perpetuação do patrimônio daquele núcleo familiar. Os casamentos e as filiações não se fundavam no afeto, mas na necessidade de exteriorização do poder, ao lado – e com a mesma conotação e relevância – da propriedade. Contudo, ao longo do século XX, este ramo do direito sofreu inúmeras transformações. Passou-se a buscar uma maior valorização do ser humano, não somente atentando para a preservação da família como celula mater da sociedade, mas tratando de forma particular os componentes de cada núcleo familiar. O modelo ortodoxo de família não mais atendia as demandas da sociedade e transformações se fizeram indispensáveis. Reafirmou-se a ideia de funcionalização da família, onde o que importa não são os vínculos biológicos ou jurídicos, mas sim a realização psicológica e afetiva de cada um de seus membros.

Deve também o Estado atuar, no sentido de agir como garantidor desta nova ordem familiar, conforme disposto no caput do artigo 226 do texto constitucional: A família, base da sociedade, tem especial proteção do estado. Pode-se perceber a assunção por parte do Estado da necessidade de se reconhecer a nova família, ao estabelecer os princípios da igualdade entre os cônjuges; a simplificação dos requisitos para a dissolução do casamento através do divórcio direto; o reconhecimento de novos modelos de família, ao tratar da união estável e das famílias monoparentais e a absoluta igualdade entre os filhos, independentemente de sua origem. Ao proteger e tutelar, a família tem por finalidade promover um indivíduo melhor, mais equilibrado em seu meio social.

Como consequência das transformações normativas e sociais, o casamento sofreu tímidas mas contundentes inovações. Distancia-se do conceito de casamento que definia tal vínculo como um “contrato bilateral e solene”, pelo qual um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente, legitimando por eles suas relações sexuais; estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de interesses e parte-se para o conceito de casamento como uma “união entre duas pessoas de sexo diferente, realizando uma integração fisiopsíquica permanente”. Questões pessoais, anteriormente tratadas como de “foro íntimo”, pertinentes apenas aqueles que se sentiam de alguma maneira prejudicados, passaram a ser trazidas ao judiciário. A concepção de que o direito de família possuía componentes éticos e morais que não deveriam se submeter à apreciação judicial não podem mais prosperar e tal posicionamento encontra amparo no paragrafo único do artigo 1.567 do código civil: “Havendo divergência, qualquer dos cônjuges poderá recorrer ao juiz, que decidirá tendo em consideração aqueles interesses”.

Com a Lei do Divórcio (6.515/77) surgiram às figuras da separação judicial e do divórcio, como meios para se atingir a dissolução do casamento.

Uma das finalidades desta norma era privilegiar a qualidade das relações conjugais. Para alguns autores sequer deveria ainda persistir no direito brasileiro a separação judicial como forma de rompimento indireto do vínculo conjugal, bastando à busca pelo divórcio, como meio mais eficaz, menos oneroso para as partes e para o próprio Poder Judiciário e principalmente, menos sofrido, evitando que aqueles que já sofrem pela frustração do rompimento de um vínculo famíliar se submetam duas vezes a tutela do judiciário.

Quanto ao dano moral, por longo tempo entendeu-se não ser cabível o ressarcimento de danos nas relações familiares. A ideia é de que o importante para a configuração do dano moral não é o ilícito em si mesmo, mas sim a repercussão que ele possa ter. Embora a jurisprudência pátria ainda atue timidamente quanto ao reconhecimento da possibilidade da responsabilidade civil por lesão a direitos provenientes de uma relação familiar, a doutrina caminha no sentido de reconhecer sua possibilidade, uma vez que o reconhecimento do dano moral hoje passa pelo reconhecimento dos direitos da personalidade como um desdobramento do princípio da dignidade da pessoa humana.

Dentre algumas hipóteses que devem gerar a reparação por dano moral, podemos citar o abandono afetivo aos filhos por parte dos genitores, a violência dos pais em face dos filhos, o abuso sexual de crianças e adolescentes, o rompimento vexatório de relação de união estável e algumas hipóteses de dissolução do vínculo conjugal.

Em suma, ainda é muito polêmica a questão do dano moral nas relações familiares. Não há um embasamento legal que trate do assunto, assim como há opiniões diversas na doutrina, em que cada autor acaba dando um entendimento mais pessoal sobre assunto relacionado a responsabilidade e indenizações. No mesmo sentido, não se encontram muitas jurisprudências que tratem de cada questão.

Com isso, acaba ficando difícil se ter um melhor entendimento de como tratar cada situação relacionada a danos morais nas relações familiares pois, além da pouca matéria, acaba ficando difícil uma melhor interpretação da lei, visto estar espalhada por não ter um espaço específico tratando do assunto.

Apesar disso, houve um grande avanço na legislação, apesar de ser ainda esparsa e não tratar do assunto somente em si, mas buscando ao longo da legislação embasamento que tratam diretamente dessas relações. O que antes se preservava apenas a relação de casamento como um vínculo fechado em que o que acontecia nele deveria ser resolvido entre seus membros, dando mais poder ao pai em relação aos demais, hoje o que mais prevalece é a pessoa em si, se há respeito e valorização com cada membro familiar. Deixa-se de lado o lado familiar fechado e busca-se a realização e afetividade de cada um.

A participação do Estado parece ser fundamental no tocante do assunto. A valorização do ser humano em si nas relações familiares começou a ser priorizada, o que acabou mudando totalmente a concepção inicial dessas relações. O reconhecimento de novas famílias acabou sendo necessário e indispensável. Figuras como o divórcio, a total igualdade entre os filhos e o reconhecimento de união estável também se somaram como ideias de um melhor bem estar entre as pessoas.

Quanto a questão do dano moral nas relações familiares, entende-se que deva haver algum ato ilícito para que ocorra algum tipo de indenização. Ligado a isso, a ideia de ter uma repercussão quando aconteçam problemas nas relações familiares acaba por acarretar diversos problemas, como a humilhação, o sofrimento ou até o abalo do ente familiar. A indenização recorrente não tem a ideia de que o valor material irá resolver os problemas, mas vai gerar uma satisfação que acaba por confrontar a parte mais frágil e assim ter uma ideia de ressarcimento por parte do agressor para com a afetividade moral do ofendido.

No mesmo sentido se vale em relação à existência da responsabilidade civil entre cônjuges por ocasião da dissolução da sociedade conjugal. Nesse assunto, principalmente, faltam ainda soluções para resolver essa questão, tendo com única solução a dissolução do matrimônio, solução que nem sempre põe fim a angústias e resolve todos os problemas. Claro que deve ser tomado todo o cuidado, não se banalizando e abrindo brechas para que, para qualquer ato indesejado no casamento, ocorram tentativas de indenização ou de separação de fato, mas ao máximo deve-se valorizar a ideia da felicidade do cidadão em si, do jeito que desejar mais sempre respeitando ao próximo.