RESTITUIÇÃO DE COMPENSAÇÃO DE ICMS EXPORTAÇÃO

 

O presente trabalho aborda um caso que envolve a Empresa Silva e Silva, nome fantasia SS Comércio, que opera na atividade econômica de comércio varejista de mercadorias, com a sede em São Luís (MA), que foi autuada por inadimplência no pagamento de ICMS de diversos meses referentes aos exercícios financeiros de 1999 a 2000. Diante disso, a Secretaria de Fazenda do Estado do Maranhão – SEFAZ-MA, intima no dia 06 de fevereiro de 2002 a SS Comércio, para que liquide a divida dos referidos créditos tributários no prazo de 72 horas, sob pena de inscrição na divida ativa e suspensão no cadastro de contribuintes.

Nessa situação, a administração da empresa resolve após consultar seu contador, utilizar o recurso de compra de créditos tributários de ICMS exportação, baseado no decreto Nº 16.501 de 19 de outubro de 1998, para liquidar através do instituto da compensação os créditos tributários exigidos. Sendo assim, o contador protocolou tempestivamente o pedido de compensação nos termos da lei, que foi devidamente deferido, ocasionando conseqüentemente a extinção dos referidos créditos tributários.

Contudo, após analisar minuciosamente os fatos, os advogados perceberam que a empresa tem direito a redução da multa paga em 60%, já que os valores cobrados foram compensados em menos de 30 dias, nos termos do art. 907, I do Decreto 14.744/95 de 29 de setembro de 1995.

É diante desse caso em tela que vamos analisar se há viabilidade ou não do ajuizamento da ação de repetição de indébito tributário, mas antes de encontrarmos as possíveis soluções deste caso, vamos primeiramente analisar as teorias e questões pertinentes para a identificação do problema.

Desta forma, vamos primeiramente analisar a obrigação tributária para que possamos entender a constituição do crédito tributário, para posteriormente analisarmos a suspensão, extinção e exclusão dos créditos tributários, e o cabimento da ação de repetição do indébito, para que possamos entender como o desfecho deste caso. 

A obrigação tributária se especializa no campo dos tributos, pelo seu objeto, que será sempre uma prestação de natureza tributária, ou seja, de conteúdo pertinente ao tributo.[1]E esta obrigação tributária de acordo com o Código Tributário Nacional no seu art. 113 se divide em: obrigação principal e acessória, sendo que a obrigação tributária principal surge com a ocorrência do fato gerador, que tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária, isto é, a obrigação principal é sempre uma quantia em dinheiro, seria o caso de uma obrigação de dar. Já, a obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos, ou seja, é sempre não patrimonialista, seria a obrigação de fazer em sentido amplo.[2]Ressaltando que essa relação de acessoriedade, no Direito Tributário, decorre do fato das obrigações acessórias serem criadas com o objetivo de viabilizar o cumprimento da obrigação tributária principal, no entanto, há casos em que essas relações obrigacionais principais e acessórias são independentes entre si.[3]

Diante disso, o crédito tributário representa o momento da exigibilidade da relação jurídico-tributária, sendo quando a própria obrigação tributária principal é formalizada pelo lançamento, ou seja, o lançamento é o instrumento que confere exigibilidade tornando certa e liquida a obrigação, quantificando-a e qualificando-a, como previsto no art. 142 do CTN.[4]

Após a constituição do crédito tributário por meio do lançamento, este se torna certo, liquido e exigível para que o sujeito passivo cumpra com a sua obrigação, sob pena da Administração Tributária ter que utilizar meios executivos para o recebimento judicial do credito tributário ora exigido[5]. Contudo, o CTN prevê no art. 151 hipóteses taxativas na qual o crédito tributário poderá ter a sua exigibilidade suspensa, e tal suspensão é temporária, não ocasionando, portanto a desconstituição do crédito, mas tão somente fica suspensa a exigibilidade do crédito do sujeito passivo, obrigando a Fazenda Pública abster-se de formalizá-lo ou mesmo de cobrá-lo.[6]

É importante ressaltar também que há previsão de exclusão do crédito tributário, por meios da isenção e da anistia, sendo situações em que mesmo que tenha ocorrido o fato gerador e a obrigação tributária, não haverá o lançamento, consequentemente não há que se falar em crédito tributário, sendo normas desonerativas de deveres patrimoniais dos contribuintes. [7]

As modalidades de extinção do crédito tributário, por sua vez, estão previstas no art. 156 do CTN, sendo uma forma pela qual a obrigação tributária do contribuinte irá se extinguir, ressaltando que essa extinção só irá ocorrer nas obrigações principais. E uma dessas modalidades de extinção é o instituto da compensação, que foi o instituto pelo qual a empresa SS Comércio recorreu para compensar o ICMS exportação, com a finalidade de liquidar os créditos tributários ora exigidos.

No entanto, para que seja viável a utilização deste instituto é necessário que observe o art. 368 do CC e os arts. 170 e 170-A do CTN, sendo indispensável uma lei que autorize a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública. Sendo assim, entende-se que

O direito de compensar é decorrência natural da garantia dos direitos de crédito, que consubstanciam parcelas do direito de propriedade, combinada com outros preceitos constitucionais. Seria absurdo pretender que alguém, sendo credor e, também, devedor da mesma pessoa, pudesse exigir daquela o pagamento de seu crédito, sem que estivesse também obrigado a pagar o seu débito.[8]

Desta forma, a legislação federal tem autorizado o sujeito passivo da obrigação tributária a extingui-lá por meio da compensação, sendo o meio autorizativo no caso em destaque o decreto nº 16.501, de 29 de outubro de 1998, previsto no artigo 2º.

Por fim, para que possamos adentrar as soluções do caso em análise vamos deslumbrar o que seria a Ação de Repetição de Indébito, esta seria o procedimento judicial tributário que visa à possibilidade de restituição de um pagamento indevido, ou seja, é quando o sujeito passivo paga uma quantia indevida a título de tributo ao órgão arrecadador, tendo ele o direito de pedir a restituição do que foi pago a mais, como previsto no art. 165 do CTN.[9] Contudo, o pedido de restituição deve ser pleiteado antes do prazo prescricional de 5 anos, conforme o disposto no art. 168 do CTN.

De acordo com o que foi exposto anteriormente, vamos analisar se há ou não viabilidade jurídica para o ajuizamento da Ação de Repetição do Indébito. Visto que, no caso em destaque a Empresa SS Comércio utilizou-se da compra de crédito de ICMS exportação, como forma de liquidar por meio do instituto da compensação os créditos tributários ora exigidos, no entanto, percebeu que não teve a redução da multa em 60%, visto que foram compensados em menos de 30 dias, conforme previsto no art. 907, I do Decreto 14.744/95, Regulamento ICMS do Estado do Maranhão, entrando assim com ação de repetição de indébito.

Art. 907. As multas oriundas de Termo de Verificação ou Auto de Infração terão o seu valor reduzido:
I - de 60% (sessenta por cento), quando o crédito tributário exigido for pago no prazo de até 30 (trinta) dias, a contar da data da intimação.

É justamente nesse ponto em que há discussão, visto que alguns alegam que tal artigo faz somente alusão ao pagamento stricto sensu e não as demais hipóteses de extinção, como é o caso da compensação, logo não seria cabível a ação de repetição de indébito, visto que a multa só seria possível de ser restituída se fosse feita por meio de pagamento, por alegar que a compensação não seria uma forma de pagamento, mas apenas uma das formas de extinção da obrigação. E há ainda aqueles que se valem do argumento do interesse público para negar a compensação tributária em face da Fazenda Pública, afirmando que “os créditos da Fazenda Pública seriam créditos de todos, não se devendo, por isso, admitir sejam compensados com créditos individuais dos contribuintes.” [10]

Contudo, tal posicionamento não se fortalece, visto que é necessário que se faça uma interpretação extensiva. Entendendo-se que compensação se trata de modalidade indireta de extinção de crédito tributário, por meio do confronto entre créditos e débitos, como forma de evitar desnecessária multiplicação de providências administrativas e judicial.[11] Ou seja,

Nem só de pagamento indevido vive a restituição do indébito tributário, entendido aí o pagamento sentido estrito que decorre do item I do art. 156, em cotejo com as demais formas de extinção do crédito tributário. Outras formas extintivas, equivalentes ao pagamento, podem ensejar o direito à restituição, com a compensação (...)[12]

        Desta forma, os advogados da empresa deverão alegar que houve o devido pagamento no prazo de 30 dias conforme o RICMS do Estado do Maranhão, pleiteando assim que haja a restituição de 60% da multa que fora pago a mais. Ou seja, mesmo que o pagamento como no caso em destaque seja feito indiretamente, por meio do instituto da compensação, a restituição será plenamente cabível, na medida em que a compensação é legalmente autorizada, inclusive por legislação do próprio Estado do Maranhão, que vislumbra no art. 1 da lei 7801 de 2002.

Art. 1º Fica o Poder Executivo autorizado a compensar débitos de natureza tributária ou não-tributária, ajuizados ou não, com créditos contra a Fazenda Pública Estadual, constituídos judicialmente.

Parágrafo único. Estende-se a autorização aos débitos não ajuizados, desde que reconhecidos

pelos contribuintes inadimplentes, regularizados através de parcelamento, ou não.

Por conseguinte, a devida restituição de 60% da multa compensada indevidamente é plenamente cabível, tendo o sujeito passivo o direito de reaver o que foi pago a mais por meio da ação apropriada que seria a Ação de Repetição de Indébito.

E no que diz respeito ao argumento que o interesse público, é inconsistente, visto que, “os créditos da Fazenda são créditos de todos, também são débitos de todos, inexistindo assim, qualquer óbice à compensação” [13], sendo enriquecimento ilícito do poder público se vedasse tal compensação e se inviabilizasse a restituição da multa.

REFERÊNCIAS

 

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 12 ed, ver e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.

ALEXANDRE. Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011.

COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31 ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Malheiros editores, 2011. 

SABBAG. Eduardo. Manual de Direito Tributário. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.


[1]AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 12 ed, ver e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 271

[2] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31 ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Malheiros editores, 2011, p.129.

[3] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011, p. 284 e 285.

[4] SABBAG. Eduardo. Manual de Direito Tributário. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 664

[5] Ibid, p. 831

[6]COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 691

[7] SABBAG, op cit, p. 887.

[8] MACHADO, op cit, p. 267

[9] AMARO, op cit. p. 420.

[10] MACHADO, op cit,. 225

[11] SABBAG, op cit, p. 851.

[12] Ibid, p 421.                                                                     

[13] MACHADO, op cit, p. 225.