RESPEITAR O OUTRO É PERMITIR QUE ELE APRENDA.

Crianças criadas em ambientes diferentes trazem em seus históricos, saberes e experiências que as identificam como aptas ou não para defenderem os mesmos pontos de vista... A natureza humana traz em si, marcas que definem seu comportamento diante das sensações, dos sentimentos e limites.  “Eu não estava na escola da vida, no dia em que essa lição foi ministrada” Estando à margem do conhecimento de aprendizados que só a vida prática ensina, a presença de pais firmes e determinados forja filhos fortes e decididos na hora de escolher o melhor a fazer.

 Ainda na defesa do princípio de responsabilidade, não basta que algumas famílias dêem efetiva assistência na formação dos seus filhos se, outras com que esses mesmos filhos irão conviver, encontrar-se, estudar, trabalhar, acompanhar-se, casar-se... é preciso que  se pense na formação do homem como um todo. E esse todo se refere ao social, ao coletivo, ao outro. Á saúde da espécie humana na gestão da vida no Planeta que aos poucos se vê, sem chão, tempo pouso, sem teto, sem razão de ser, sem rumo.  Revivamos as experiências de duas moscas.  Incapazes de modificar comportamentos mas, presentes quando se discute a inutilidade de alguns elementos do universo dos insetos.

Contam que, certa vez, duas moscas caíram num copo de leite. A primeira era forte e valente, assim logo ao cair, nadou até a borda do copo, mas como a superfície era muito lisa e ela tinha suas asas molhadas, não conseguiu sair. Acreditando que não havia saída, a mosca desanimou, parou de nadar e de se debater, e afundou…

Sua companheira de infortúnio, apesar de não ser tão forte, era tenaz e, por isso, continuou a se debater, a se debater por tanto tempo que, aos poucos, o leite ao redor, com toda aquela agitação, foi se transformando e formou um pequeno nódulo de manteiga, onde a mosca tenaz conseguiu, com muito esforço, subir e dali levantar voo para algum lugar seguro.

Durante anos, ouvimos esta primeira parte da história como um elogio à persistência que, sem dúvida, é uma habilidade que nos leva ao sucesso.

Tempos depois a mosca tenaz, por descuido ou acidente caiu no copo. Começou a se debater, na esperança de que no devido tempo, se salvaria. Outra mosca passando por ali e vendo a aflição da companheira de espécie, pousou na beira do copo e gritou:

– Tem um canudo ali, nade até lá e suba pelo canudo!

A mosca tenaz não lhe deu ouvidos, baseando-se na sua experiência anterior de sucesso, e continuou a se debater, até que, exausta afundou no copo cheio de água.

“Quantos de nós, baseados em experiências anteriores, deixamos de notar as mudanças no ambiente e ficamos nos esforçando para alcançar os resultados esperados até que afundamos na nossa própria falta de visão.”

Nisso consiste a tentativa de chamar a atenção do homem moderno, do pai intelectual, da mãe que não é necessariamente “a Amélia”, do professor que sabe que não sabe de tudo e do aluno/criança/aprendiz que não sabe que não sabe como se resolviam os problemas no passado. Preocupados em suprir todas as carências e necessidades dos seus filhos, muitos pais desenvolvem estratégias que vão desde uma babá eletrônica até às sofisticadas câmeras a fim de assegurar efetiva segurança enquanto não estão por perto. Notadamente quando se juntam, as crianças perdem a noção do perigo que não temem, já que estão habituadas a vencer batalhas virtuais nos jogos eletrônicos do seu universo avançado desse específico conhecimento e se atiram de corpo e alma no desconhecido risco de suas aventuras. São destemidas ainda que não disponham de ferramentas testadas por si mesmas ou experimentadas pelos seus pais, pela falta de tempo imposta pelo ritmo frenético da vida moderna, vivem aventuras de alto risco.

Os pais, vêem em cada pequeno um herói preparado para quaisquer enfrentamentos. Só que as lições que deveriam ter sido trabalhadas precisam estar recheadas de exemplos e de capacidade crítica para fazê-los conhecedores tanto das suas potencialidades quanto das suas limitações. É o jogo da vida: perde-se para ganhar; aprende-se a ganhar, perdendo, apende-se a fazer, fazendo; aprende-se a ser, sendo. 

Durante anos, ouvimos comentários sobre a máxima de que “é de menino que se torce o pepino”, é a parte da história que faz elogio à persistência, para que a criança aprenda a alargar a sua consciência de aprendiz que precisa ser estimulado a alternar acertos com equívocos, vanços com retrocessos, persistência com a capacidade de resistir, habilidade que nos leva ao sucesso. Nossa vida de homens de outras gerações não foi facilitada, nossos descuidos foram pontuados, censurados, dir-se-ia, punidos. Hoje, como a mosca que nada e nada no leite esperando que o líquido se transforme em pasta, onde ela não afunde e siga... ledo engano, vai nadar e perecer nas dificuldades que a própria vida vai nos impor.

 A mosca que se autodenominava de conhecedora de outras experiências que deram certo não pretendia ousar se desafiar, tentar novas possibilidades. Seu erro foi acreditar que no passado uma determinada ação foi coroada de êxito, razão pela qual acreditou ser capaz de solucionar o seu problema.

Nisso reside uma explicação: em nenhum momento se condena a experiência, a vivência, a zona de conforto, a rotina. Mas se o tempo avançou, muitas coisas mudaram, inclusive a capacidade de lutar bem como as condições de lutas e as armas disponibilizadas. Não se pode retroceder no tempo e ignorar sem impossível viver sem a tecnologia, sem a modernidade, sem a robótica, sem a biotecnologia, sem a inteligência artificial, sem as viagens espaciais, sem a velocidade da luz. Não se concebe a vida sem a internet, sem as redes sociais, sem as florestas de arranha-céus sem, sem os céus arranhados pela incapacidade de alguns em distinguir um caminho para seguir e se fazer seguidos.

Não se discute que a criança do hoje é diferente da criança do século passado, que a capacidade de reagir de um adolescente dos nossos dias transcende quaisquer expectativas do que foi há dois séculos. A criança reage, como sabe, age como lhe convém, escolhe como aprendeu a escolher, decide com viu ou vê outros agindo, assimila mais a partir do que uma outra criança faz do que com as lições que deveriam ser transmitidas por meio de atitudes firmes e seguras dos seus educadores. Educadores aqui vistos como os pais, já que aos pais cabe educar e aos professores, ensinar a observar, comparar, avaliar, cristalizar, aprender e aplicar da melhor forma possível. Afinal, não há necessidade de se perguntar onde se formam os professores, assim como se questiona; onde estão sendo formados os pais de hoje.

Não se trata de reconhecer, insinuar ou imaginar que os pais de hoje estão equivocados na maneira de educar, ensinar aos seus filhos o melhor caminho para o futuro, não se trata de por em dúvida se o caminho que esta sendo trilhado é resultado de estudos e pesquisas muito bem fundamentados, não se estar defendendo teorias ultrapassadas de outras culturas e de outros tempos, não se discute que todos os passos dados pela ciência no avanço e nas conquistas têm seu valor para a melhoria da qualidade de vida.

O que se aponta é a perda de alguns valores que revestiram tantos homens valorosos como a dignidade, a ética, o respeito pelo outro e pela vida, as lições baseadas em regras invioláveis que forjaram tantos feitos que se tornaram referências para tantas sociedades. Como pretender que crianças que convivem com a fragilidade das relações, com a supressão de responsabilidades, com as facilidades que muitas vezes encantam os inexperientes e embrutecem os sentimentos, que vêem triunfar a nulidade possam ser resistentes, persistentes e capazes de vencer seus próprios desafios? Não se dá o que não se tem, não se faz o que não se sabe, não garante o impensável.

  • Sebastião Maciel Costa