Primeiro longa-metragem produzido por uma escola pública no Brasil, com duração de 44 minutos, filmado na Escola Olímpio Cunha, de Cariacica, conta a história de um jovem que sonhava em ser professor, ainda que a carreira do magistério não motive muito, o que acaba causando falta de mestres, visto que vários bons professores deixam de ministrar aula, sobretudo por conta da indisciplina de muitos alunos, os quais se mostram egoístas em seu universo de brincadeiras e brigas, sem colaboração com os professores, conforme se observa na obra. 

Na ficha técnica da obra, encontramos Evaldo Pereira, no roteiro de direção; Anselmo Loyola e Evaldo Pereira, como operadores de câmera; Ariel Ferreira e Éric Souza, na assistência de câmera; Humberto Fonseca na captação de áudio; Thalita de Oliveira como assistente de áudio; e Anselmo Loyola atuando na assistência de direção.

A realidade inicial apresentada no filme mostra um recém-professor "jogado" em sala, sem o devido preparo, esperando-se que ele encontre seu caminho sozinho, como acontece muito na educação, infelizmente. Já de início, o protagonista do filme, Valentim, encontra dificuldade para "dominar" a turma, que não o ouve, e se questiona sobre o uso da força para o respeito. O filme também demonstra pais cheios de problemas refletindo suas dificuldades no comportamento dos filhos na escola, acarretando falta, evasão e violência no ambiente de ensino.

Outra questão recorrente nas escolas brasileiras abordada no documentário vem a ser a falta de união entre os mestres, por conta de vaidades e sentimentos de superioridade de uns em relação a outros. Isso dificulta o trabalho conjunto e compromete o resultado dos discentes. A obra também trata a temática da dificuldade de inclusão do deficiente no sistema regular de ensino. 

Interessante notar o estranhamento no conselho de classe do filme pela presença de muitos alunos de recuperação na disciplina de Artes. Vale observar que não há disciplina fácil, uma vez que cada matéria tem suas especificidades. Ocorre que a cultura escolar não tem por hábito enxergar Artes como uma disciplina que "reprova", denotando profundo desconhecimento do valor da arte na construção cultural das sociedades. Ainda há, também, um preconceito em se julgar que a culpa seja do professor quando muitos alunos da sala estão abaixo da média. 

Para se trabalhar na educação, nota-se no filme a importância da família e do apoio de colegas, pois no interior da escola já há muitos que torcem contra trabalhos inovadores, por causa de pessoas vaidosas, amargas e invejosas presentes nos meios de trabalho. Além disso, a cobrança por resultados se faz diariamente, gerando certa competitividade prejudicial ao ensino e aprendizagem. Porém, um faxineiro ensina na obra a importância de todos os profissionais da escola e a relevância de se valorizar o trabalho com prazer e a saúde. 

É grande o ensinamento de que cada educador acaba encontrando seu estilo, e os alunos aprendem um pouco com cada estilo de professor. Muitos estudantes que criticaram o jovem professor quando foram dar aula tiveram dificuldades. Falta mais cooperação, já que há escolas dentro de uma escola. Isso exige muito trabalho, mudança de atitude, olhar atento e busca de melhorias na aprendizagem, sugere a história em seu desenrolar. 

Valentim mostra a diversidade de possibilidades da arte: música, dança, pintura, escultura, literatura e cinema, entre tantas aparições artísticas. Tudo isso traz uma gama de interpretações plurissignificativas de bandas, textos, desenhos, entre outras manifestações da arte. Para tanto, a interação alunos/professores/pais em mostras de talentos (linguagem musical, dança, máscara, cinema, tatuagem de henna, língua de sinais) revela a importância da interdisciplinaridade no processo educacional, rompendo barreiras entre as matérias escolares. O filme intenta sugerir uma escola mais humana, menos reprodutivista, menos competitiva e mais cooperativa. Inclusive a religiosidade na escola merece uma atenção especial, sem doutrinações de determinadas denominações.

Nem tudo pode ser feito somente na escola. O filme mostra a necessidade de se romper o muro escolar em busca da interação com a sociedade. Para isso, os portões escolares precisam estar abertos ao envolvimento de toda a comunidade nos projetos escolares. 

Quando um pai no filme se desculpa com o professor pelo seu erro, fica a lição de que todos devem estar envolvidos no processo de ensino e aprendizagem, visto que muitas vezes os desvios de comportamento em sala podem ter origem nas sequelas produzidos no seio da família. 

Valentim mostra a história de um professor que encontra dificuldades para educar, mas que descobre no caminho da liberdade artística grande aprendizado no ambiente escolar. O filme, legendado, rodado com apenas uma câmera fotográfica, sem grandes recursos, com participação de alunos surdos, em nada perde em conteúdo para grandes filmes sobre a processo educacional. A história é inspirada na própria vida do roteirista, o professor Evaldo Pereira.

Parabéns a todos os envolvidos! 

Resenhista: Jean Carlos Neris de Paula