Nascidos em Bordéis (dos diretores Zana Briski e Ross Kauffman - 2004) é um documentário que relata a  vida cotidiana no distrito da Luz Vermelha, Calcutá. O filme é dedicado às mulheres e crianças que sobrevivem neste distrito/favela/bordel. Como fotógrafa, Zana Briski está engajada no uso da arte para a denúncia social. Ela escolheu como foco as mulheres que tem por herança, após gerações a "profissão" de prostitutas. Como cenário temos a prostituição, tráfico de drogas e bebidas ilícitas, violência, sujeira e pobreza. E por extensão as crianças, filhas e filhos dessas mulheres. Suas famílias.

Briski se muda de Nova Iorque para o distrito da Luz Vermelha e fica morando com as prostitutas durante alguns anos. Ela é surpreendida pela curiosidade das crianças em ver como funciona uma câmera fotográfica, tirar fotos, serem fotografadas... e daí surge a ideia de que as crianças munidas de câmeras fotográficas pudessem  retratar tudo que lhes chama-se a atenção, com o olhar delas. Zana resolve ensiná-las a fotografar e os resultados são emocionantes. E enquanto as crianças vão descobrindo essa forma de se expressar, os cineastas lutam para poder dar mais esperança e uma vida melhor a essas crianças, para as quais a pobreza é a maior ameaça à realização dos sonhos.

Zana acompanha nove crianças nascidas no bordel, e acaba se tornando professora, assistente social e amiga delas. A fotógrafa conseguiu levar as fotos capturadas pelas crianças a leilões em Nova York, realizou exposições na própria Índia, além de levar o menino Avijit a Amsterdã, para participar de um projeto internacional.

Através das fotos tiradas pelas crianças pode-se observar a devastação e a beleza de suas histórias, suas angústias em relação ao futuro, o modo como eles lidam com a infância, suas perspectivas de vida, assim como a descoberta de um novo mundo, um novo horizonte. Enquanto isso, os cineastas tentam traçar um futuro melhor para elas.

Por vezes triste e à beira do desespero, noutros momentos mais espirituoso e reluzente, cru e sensível, o documentário evidencia as débeis condições de vida da população daquele bairro, expondo em particular os dilemas de um grupo de crianças forçadas a vivenciar as complexidades da idade adulta desde muito cedo.

Tudo conspira para que essas crianças tenham uma droga de futuro. As meninas provavelmente também entrarão para a prostituição e os garotos terão de continuar a trabalhar em subempregos pelo resto de suas vidas. Briski dá a essas crianças muito mais que uma câmera fotográfica, elas ganham voz e esperança através da fotografia. E nós somos levados a enxergar o mundo pelos seus olhos e partilhar de suas vidas. Briski consegue um modo de melhorar as condições de vida dessas crianças, ela é movida por um sentimento de compaixão.

É interessante ver que essas crianças, mesmo sem nunca terem visto ou manuseado uma câmera, conseguem tocar e emocionar a gente com as suas fotografias. Muitas dilacerantes de tão tristes e por vezes carregadas de um otimismo que só as crianças têm. Mesmo com as péssimas condições de vida elas se empenham e acreditam no que estão fazendo, a fotografia é um momento de lazer e felicidade, apesar de elas a levarem muito a sério, é uma forma de “esquecer” as precárias condições em que vivem.Fazer com que essas crianças se sintam felizes, mesmo que por algumas horas, é uma grande recompensa. Mesmo com toda a condição em que vivem elas conseguem transmitir alegria e otimismo.

Ele nos faz questionar sobre o que aquele pequeno objeto(a câmera fotográfica)poderia trazer para aquelas crianças? A auto-descoberta. Mesmo em um ambiente pesado, pude perceber várias fotos de diversos ângulos com situações de ludicidade. Para que as crianças pudessem tirar fotos, seria necessária uma integração das crianças com a câmera, através da mediação da fotógrafa, as crianças conseguiram com rara beleza plástica, fotos belíssimas.

Aprender a ver suas vidas de acordo com o que viam pela câmera, esta foi a sacada principal da ideia do projeto social. Fazer com que os aprendizes a fotógrafos conseguissem enxergar o que antes eles não percebiam. Cada cena daquela, retratada nas fotografias, faziam parte de um roteiro que eles conheciam muito bem. A fotografia como captadora da imagem e do momento, os trouxe novas visões para cenas do cotidiano.

A fotografia suaviza a dura realidade das crianças, especialmente a das meninas que sabiam que um futuro nada generoso às esperava. A prostituição é uma ameaça constante em suas vidas. Por convenção familiar ou por exclusão social, as crianças fizeram da fotografia um escapismo do real. Os momentos com a câmera abstraiam a realidade e traziam momentos de esperança.

É um documentário sensível, belo, revelador e captador de uma realidade que por muitos é desconhecida. Ficamos sempre com as imagens distorcidas das novelas e nos contentamos a ver o que é esteticamente politicamente correto. A dura realidade das crianças indianas que nascem no bairro da luz vermelha é um alerta de que pequenas iniciativas como a da fotógrafa, podem trazer um pouco de luz e um sorriso no rosto daqueles pequeninos sofridos. Ele capta sobre o talento desperdiçado em meio à pobreza, sobre o poder da compaixão e da indiferença. Deixa o espectador pensando que é um trabalho que deve ser imitado por pessoas que acreditam que a esperança existe, mesmo que todas as circunstâncias levem a crer o contrário.