RESENHA CRÍTICA DO TEXTO “CURRÍCULO, CONHECIMENTO E CULTURA”, DE Antônio Flávio Barbosa Moreira e Vera Maria Candau.

1. IDENTIFICAÇÃO DA OBRA:

Obra: Indagações sobre Currículo: Currículo, Conhecimento e Cultura

Autores: Moreira, Antônio Flávio Barbosa; Candau, Vera Maria.

Local/Ano: Brasília 2006. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica. Indagações sobre currículo.

 2. ESTRUTURA DA OBRA:

 A obra está dividida em 4 capítulos totalizando 16 páginas.

 3. RESENHA CRÍTICA DA OBRA: 

O tema Currículo Escolar é constantemente alvo de diversas pesquisas e estudos acadêmicos. Os autores Moreira & Candau (2006) abordam de maneira sistemática e abrangente o tema em questão, na obra “Currículo, Conhecimento e Cultura”. O artigo apresenta algumas reflexões acerca do currículo escolar com o objetivo que trazer para discussão a construção de um currículo que seja democrático para todos, ou seja, que haja a participação de gestores, docentes e a sociedade geral.

Vale ressaltar que o objetivo geral do texto é oferecer aos docentes e profissionais de educação em geral, elementos que possibilitem a reflexão e a discussão de questões essenciais para o desenvolvimento dos currículos escolares. Desse modo, busca-se promover uma educação de qualidade e democrática para todos.

No primeiro item do texto, os autores apresentam os estudos de currículo focando no desenvolvimento e preocupações, com a relação às questões referentes ao currículo no que sentido de que atualmente tem sido alvos de maior atenção por parte das autoridades, professores, gestores, pais, estudantes, membros da comunidade. Essas questões se baseiam em perguntas, não com o objetivo de dar conta da complexidade do pensamento deles, mas apenas para pontuar os seguintes questionamento: Quais as razões dessa preocupação tão nítida e tão persistente? Será mesmo importante que nós, profissionais da educação, acompanhemos toda essa discussão e nela nos envolvamos? Não será suficiente deixarmos que as autoridades competentes tomem as devidas decisões sobre o que deve ser ensinado nas salas de aula?

Assim sendo, os autores entendem que, para se obter respostas a esses questionamentos, é necessário entender o significado da palavra currículo em concepções distintas como: (a) os conteúdos a serem ensinados e aprendidos; (b) as experiências de aprendizagem escolares a serem vividas pelos alunos; (c) os planos pedagógicos elaborados por professores, escolas e sistemas educacionais; (d) os objetivos a serem alcançados por meio do processo de ensino; (e) os processos de avaliação que terminam por influir nos conteúdos e nos procedimentos selecionados nos diferentes graus da escolarização.

 Porém, não lhes parece produtivo assumir que algumas dessas concepções seja certa ou errada, tendo em vista que refletem variados posicionamentos e pontos de vistas teóricos. De forma diversa, defendem que “discussões sobre conhecimento, verdade, poder e identidade marcam, invariavelmente, as discussões sobre questões curriculares” (Silva, 1999a), e que, portanto, em suas concepções o currículo deve ser entendido como as experiências escolares que se desdobram em torno do conhecimento, em meio a relações sociais, e que contribuem para a construção das identidades de nossos/as estudantes.

Por isso, seu objetivo nesse contexto é conceitualizar o currículo como “coração da escola, o espaço central em que todos atuamos, o que nos torna, nos diferentes níveis do processo educacional, responsáveis por sua elaboração”. Além disso, eles ressaltam que o papel do educador é essencial no processo curricular.

Mas vale salientar que, apesar do educador estar maior tempo em contato direto com o discente, esse papel é muito amplo, e não pode ser considerado com direcionamento maior pelo educador, tendo em vista que gestores, técnicos administrativos e a sociedade têm papel fundamental na sua construção, levando a concluir que o currículo tem que observar a visão de todos.

Defendem subsidiados por Moreira (2002a), que cabe reconhecer, hoje, a preponderância da esfera cultural na organização de nossa vida social, bem como na teoria social contemporânea, para tanto deve-se levar em consideração que “as preocupações dos pesquisadores têm-se deslocado das relações entre currículo e conhecimento escolar para as relações entre currículo e cultura”.

Além disso, os autores chamam atenção que antes da análise das relações entre currículo e cultura, é imprescindível examinar o outro tema central das discussões sobre currículo que o conhecimento escolar. Nesse sentido, no segundo item do texto, os autores apresentam seu entendimento sobre o conhecimento escolar. Para eles, esse é um dos elementos centrais do currículo e que sua aprendizagem é uma das condições para que os conhecimentos socialmente produzidos possam ser apreendidos, criticados e reconstruídos por todos/as os/as estudantes do país.

Isso é bem notório quando baseiam o potencial do currículo na obra de (Avalos, 1992; Santos e Moreira 1995), os quais apontam que o currículo possui “potencial de tornar as pessoas capazes de compreender o papel que devem ter na mudança de seus contextos imediatos e da sociedade em geral, bem como de ajudá-las a adquirir os conhecimentos e as habilidades necessárias para que isso aconteça”.

De acordo com esse ponto de vista, o entendimento dos autores leva em consideração apenas a construção do currículo como algo que trará mudanças significativas para o meio social, porém, é importante lembrar que essa mudança depende também de fatores políticos, administrativos e sociais, pois são as partes interessadas nesse processo.

Outro ponto importante a se destacar é que, segundo eles, os conhecimentos escolares são advindos de saberes e conhecimentos socialmente produzidos nos chamados “âmbitos de referência dos currículos”, ou seja, são espaços onde se produzem diferentes saberes que dão origem aos conhecimentos escolares.

Nesse contexto, os autores concluem que, se o docente compreender o processo de construção do conhecimento escolar, entenderá melhor o processo pedagógico levando assim o mesmo a ser estimulado para alcançar novas abordagens tanto no sentido de selecionar e organizar os conhecimentos quanto de conferir uma orientação cultural ao currículo.

O terceiro item trata da cultura, diversidade cultural e currículo. Assim, para embasar seus questionamentos sobre cultura, eles utilizam a concepção derivada da Antropologia Social, onde ressalta a dimensão simbólica, o que a cultura faz, em vez de acentuar o que a cultura é. Nessa visão, a palavra cultura implica em um conjunto de práticas por meio das quais significados são produzidos e compartilhados em um grupo.

Além disso, os autores consideram a abordagem de Silva (1999b) em que o currículo é o espaço em que se concentram e se desdobram as lutas em torno dos diferentes significados sobre o social e sobre o político, além de certos grupos sociais expressarem sua visão de mundo, seu projeto social, sua “verdade”.

Os autores não trazem muitas informações sobre diversidade cultural, porém levam a entender que se trata da pluralidade com caráter multicultural, visando que seja contemplado na construção do currículo. Isso, porque segundo eles, vivemos em um variado e conflituoso cenário cultural se reflete no que ocorre em nossas salas de aula. Além disso, destacam em forma de pergunta que de alguma forma o currículo tem sido “contaminado” pelas diferenças derivadas de dinâmicas sociais como classe social, gênero, etnia, sexualidade, cultura e religião.

Porém, nessa visão, os autores tentam destacar essas diferenças sociais como algo que deve ser desconsiderado para a construção do currículo, mas o questionamento para essa pergunta parte do princípio de que a cultura surge a partir conhecimento adquirido no decorrer dos anos pela sociedade, e isso, por acaso não é importante para ser concebido no currículo? Por que deve ser desconsiderado já que essas diferenças fazem parte da cultura de um povo?

Com base nesses conceitos e questionamentos, os autores propõem alguns princípios visando intensificar a sensibilidade do(a) docente e do gestor para a pluralidade de valores e universos culturais, para a necessidade de um maior intercâmbio cultural no interior de cada sociedade e entre diferentes sociedades.

Esses princípios são propostos no quarto item e tem como objetivo   a construção de currículos multiculturalmente orientados, e chama a atenção para que haja um esforço na sua construção especialmente por parte de gestores e professores.

Nessa visão, os autores esperam que as considerações que desenvolveram permita a defesa do argumento de que um currículo culturalmente orientado noteiem a escolha de novos conteúdos e a adoção de novos procedimentos além de estabelecer as novas relações escolares e em sala de aula.

O primeiro princípio traz a necessidade de uma nova postura quando houver a elaboração do currículo. Os autores destacam que se deve superar o “daltonismo cultural” em que o docente não valoriza a diversidade cultural existentes em sala de aula. Esse princípio realmente torna-se uma barreira entre os docentes e discentes, tendo em vista que a visão do professor deve ser individual, pois todos são diferentes e precisam de uma atenção especial. Para isso, a sugestão dos autores é que haja uma sensibilização do corpo docente para a diversidade e pluralidade.

O segundo princípio destaca o currículo com um espaço em que se reescreve o conhecimento escolar. Os autores sugerem que o docente  procure, no currículo, reescrever o conhecimento escolar usual, tendo-se em mente as diferentes raízes étnicas e os diferentes pontos de vista envolvidos em sua produção. Esse princípio realmente é bastante relevante, pois pode levar o discente a ter questionamentos ainda não pensado antes, levando assim a construir sua própria visão histórica, e de certa forma, reescrevendo seu conhecimento escolar.

A crítica em relação a este princípio, conforme os autores, surge a partir do argumento chamado “efeito Robin Hood” (McCarthy, 1998), segundo o qual se tira de um para dar ao outro, ou seja, não estamos recomendando que simplesmente se substitua um conhecimento por outro. Porém, é algo bastante controverso, tendo em vista que existem várias visões do mundo, e de certa forma, dependendo da visão do docente, isso pode influenciar diretamente na formação do discente.

Outro pronto importante a se destacar, com base nesse princípio é que na atualidade fala-se muito em “escola sem partido”. Então, surgem algumas perguntas sem respostas: Será que tem existido realmente doutrinação de discentes a partir da influência do docente? Existe como o discente reescrever seu conhecimento escolar sem influência do docente? Como se consegue fazer isso?

O terceiro princípio trata do currículo como um espaço em que se explicita a ancoragem social dos conteúdos, ou seja, é que seja evidenciado no currículo, a construção social e os rumos subsequentes dos conhecimentos cujas raízes históricas e culturais tendem a ser usualmente “esquecidas”. Dessa forma, os autores defendem também que haja relacionamento dos conteúdos curriculares às experiências culturais dos(as) estudantes e ao mundo concreto, o que permite analisar quem lucra e quem perde com as formas de emprego desses conhecimentos.

Da mesma forma que o princípio anterior, este depende também dos ideais do docente em relação as suas convicções, tendo em vista que pode levar o discente a ter uma visão não obtida por questionamentos e sim por ideais.

Para embasamento desse princípio, eles utilizam as considerações do autor (Willinsky, 2002), que rejeita a ideia de que existe uma verdade, uma essência ou um núcleo em qualquer categoria, ou seja, o planejamento deve ser coletivo, na escola, nas distintas disciplinas, a partir de uma análise, durante determinado período de tempo, a afim de evitar formas de privilégios e legitimação de atos de opressão, que já vem sendo vem sendo empregada no decorrer dos anos.

O quarto princípio, conforme os autores, faz referência ao currículo como espaço de reconhecimento de nossas identidades culturais, ou seja, promover ocasiões que favoreçam a tomada de consciência da construção da identidade cultural de cada um de nós, docentes e gestores, relacionando-a aos processos socioculturais do contexto em que vivemos e à história de nosso país. Isso pode ser realizado buscando-se criar oportunidades em que o profissional da educação se estimule a falar sobre como percebe a construção de sua identidade. Essa é uma boa proposta tendo em vista que em uma escola, por exemplo, os docentes podem ser advindos de diferentes culturas, crenças e valores; então a socialização dessas identidades podem ser muito úteis nesse processo.

O quinto princípio trata o currículo como espaço de questionamento de nossas representações sobre os “outros”. Esse princípio diz respeito às representações que construímos dos outros, daqueles que consideramos diferentes. Assim, dependendo da forma de ver o mundo, pode haver uma forma de discriminação com pessoas que não possuem os conceitos que achamos ser o padrão. Porém, isso é muito relativo, pois dependendo do padrão definido por cada pessoa cada uma de nós pode ser tanto os outros quanto diferentes.

O sexto princípio faz referência ao currículo como um espaço de crítica cultural. Os autores sugerem que se expandam os conteúdos curriculares usuais, de modo a neles incluir alguns dos artefatos culturais que circundam o(a) aluno(a). A ideia é tornar o currículo um espaço de crítica cultural tendo como um dos caminhos abrir as portas, na escola, a diferentes manifestações da cultura popular, além das que compõem a chamada cultura erudita. Esse princípio é importantíssimo, pois valoriza a cultura local, os saberes regionais e trazem para a realidade  a identidade cultural onde a escola está inserida.

O sétimo princípio apresenta o currículo como um espaço de desenvolvimento de pesquisas onde todo(a) profissional da educação precisa comprometer-se com o estudo e com a pesquisa, bem como posicionar-se politicamente. De forma geral, esse princípio tem como objetivo principal que se torne o currículo, em cada escola, um espaço de pesquisa.

Porém, é importante ressaltar que essa pesquisa não está relacionada diretamente à pesquisa universitária, mas sugere que sejam pesquisadores(as) dos saberes, valores e práticas que ensinamos e/ou desenvolvemos, centrando nosso ensino na pesquisa. Esse princípio pode levar ao conhecimento das necessidades e anseios da comunidade em geral.

 

Resenhista: Davi Guimarães da Silva