Relações Públicas
Publicado em 05 de dezembro de 2009 por Romano Dazzi
277 - RELAÇÕES PÚBLICAS
Estava outro dia numa fila de candidatos a um emprego.
Fiz tantas filas, que não me lembro qual era a firma, mas não faz diferença.
Só sei que, depois de uma rápida conversa, o gerente dava a cada um uma senha.
Senha verde à direita, vermelha à esquerda.
Encontrei-me na fila da direita, e só fui descobrir o porquê, bem depois.
Acontece que, como todas as grandes firmas, esta também tem duas caras.
A primeira é a cara do “ANTES”:
moldada especialmente para atrair os clientes, é convincente e suave; assim:
a) veja que qualidade, que variedade de modelos, que acabamentos...
b) observe as cores e os reflexos; demore o tempo que quiser, fique à vontade...
c) agora veja os preços, os descontos, as condições, os prazos de financiamento
d) saiba que damos uma garantia de montagem rápida e eficiente em sua casa
e) tem também a cobertura de seguro contra qualquer acidente ou problema.
f) compare quantas vantagens , contra o pouco que os concorrentes oferecem
g) você estará sob a proteção do nosso nome!
h) e ainda a garantia do fabricante – um dos melhores do mundo!
i) Você não se arrependerá; está fechando o melhor negócio de sua vida!
A segunda é a cara do “DEPOIS”:
criada para lidar com clientes insatisfeitos e reclamações difíceis de lidar;
ela vai mudando de tom aos poucos, assim:
j) “vamos providenciar rapidamente...”
k) “tenha um pouco de paciência!”
l) “nunca prometemos uma coisa destas!...”
m) “só o fabricante é que sabe; nós apenas vendemos!”
n) “ah, não vai dar em menos de uma semana!”
o) “já fizemos tudo o que podíamos! ”
o) “outra vez o senhor?”
q) “não me aborreça!”
e por fim, a cara extrema:
r) “ah, é? Então quer saber de uma coisa? vá reclamar onde quiser,
com o procon, com o bispo, com o raio que o parta... não aceitamos desaforos!
Vou chamar o segurança!”
Voltando à senha, o entrevistador achou que eu tinha cara de bonzinho, solícito, prestativo; e que seria capaz de convencer meus clientes a levarem o que eu vendia; por isso, fui para o grupo da senha verde....
Dei graças a Deus, pois não sou de briga, não gosto de polêmica e quero sossego.
Fui me firmando no serviço, já gostando de vender, usando todos os pontos da primeira lista.
O cliente escutada enlevado, feliz... e mais uma venda ia a meu crédito.
Mas duas semanas depois, me aparece um casal, furioso; tinham comprado uma cama e ela quebrou, de repente, no meio da noite.
Eram pessoas irredutíveis, teimosas, insuportáveis.
Queriam uma cama nova, invocavam a garantia.
Achei que não me cabia formular perguntas indiscretas, indagando sobre detalhes ou circunstâncias constrangedoras, que podiam ter provocado o acidente. .
Além disso, minha função é vender. Sou senha verde, meu Deus!
Eles interpretaram minha atitude como um desafio, uma falta de respeito.
Quase apanhei. Levei uns empurrões, por conta da minha passividade.
Logo o segurança apareceu e eles foram encaminhados ao setor “vermelho”
Em sucessivas e inúteis investidas, receberam todas as considerações do segundo bloco, mas continuaram numa atitude beligerante.
Resultado: estão acampados há três dias no setor de móveis, no terceiro andar e não querem arredar pé.
Quando um sai, o outro fica sentado numa cama qualquer.
Os filhos já levaram pijamas, remédios, kits de sobrevivência.
Agora, então, não querem nem mesmo negociar a devolução da entrada, ou um tipo de cama de melhor qualidade, pelo mesmo preço. Enfim, uma tragédia.
Mas a culpa é minha.
O manual, que só li depois, diz que o limite para aquela cama, é de 150 quilos, de “carga estática” .
Quer dizer que, se a carga se mexer, vai tudo para o chão. Fazer o quê?
Tinha que avisá-los antes. Agora é tarde.
E para dizer a verdade, não vejo a hora de acordar.....que pesadelo!