Relação e Efeitos Bioquímico-nutricionais Sobre o Aborto em Vacas
Por Emanuel Isaque Cordeiro da Silva | 05/05/2020 | CursosRelação e Efeitos Bioquímico-nutricionais Sobre o Aborto em Vacas
E. I. C. da Silva
Departamento de Agropecuária – IFPE Campus Belo Jardim
ABORTO EM BOVINOS
INTRODUÇÃO
O aborto é a expulsão involuntária do produto da gestação entre os 45 dias de gestação e os 250 dias. O aborto, tem diferentes origens, as mais frequentes são de caráter infeccioso, daqui, a pouca atenção dada aos abortos de outra origem, em especial os causados por problemas nutricionais. O aborto é considerado um sinal inequívoco de um complexo de origem multifatorial (MONCADA, 2001).
16.1 Contaminação dos alimentos
Um agente etiológico relacionado com o aborto nutricional são os alimentos contaminados por micotoxinas, estes são elementos tóxicos produzidos por fungos que crescem em plantas, fenos, silos, grãos, subprodutos e outros alimentos armazenados; existem diferentes tipos de micotoxinas, podem incluir-se, por exemplo, aflatoxinas e os metabolitos tóxicos produzidos por Aspergillus e Penicillium. São derivados difuranocumarínicos que atravessam a barreira placentária provocando cirrose hepática. Também provocam alterações na coagulação sanguínea devido a alterações na protrombina, fator VII e X, e possivelmente fator IX; interferem no metabolismo da síntese das proteínas devido a uma modificação no DNA padrão e RNA polimerase na fase de translação, e ácidos nucleicos.
Zearalenona: produzida por Fusarium graminearum, roseum e outros, produz perda de peso, exsudação vaginal, mortes embrionárias e abortos, uma vez que as lesões estão confinadas ao aparelho reprodutor, apresentam-se edema e hiperplasia do útero além de atrofia do ovário.
Trichotecenos: produzidos especialmente por Fusarium tricintum, tem ação citotóxica em tecidos de rápido crescimento e com rápida substituição, como a medula óssea, gônadas e tecido linfático. São teratogênicas e embriotóxicas.
Ochratoxina: é embriotóxica, provocando abortos em vacas leiteiras. O trevo branco, e em menor quantidade o trevo amarelo, possuem cumarina, que sob a ação de certos fungos se transforma em dicumarina, substância com ação anticoagulante e tóxica que impede a formação de protrombina ou fator II no fígado; devido à sua competência com a vitamina K que intervém na síntese da protrombina, atravessa a barreira placentária, apresentando-se nascimentos de animais com hemorragias fatais em gengivas e umbigos.
A deficiência de manganês inibe a coagulação sanguínea, já que a protrombina e outras proteínas associadas ao fenômeno são glicoproteínas que requerem glicerol- transferase, que contém manganês, para sua síntese.
Esse é um dos elementos de grande importância na nutrição animal, uma vez que a qualidade do alimento, bem como a conservação do mesmo estão relacionados com a saúde e o bem-estar dos animais. Sendo assim, os pastos acometidos por fungos devem ser tratados com o auxílio de um agrônomo que avaliará as vantagens e/ou desvantagens da aplicação de fungicidas no pasto. Com as forragens em campo tratadas, deve-se atentar-se ao seu armazenamento, caso esse material seja disponível em feno e silagem. Porém, forragens ensiladas e fenadas são mais resistentes ao ataque de fungos, uma vez que no processo essas perdem quase senão toda a quantidade de água presente em sua composição.
16.2 Minerais
16.2.1 Manganês (Mn)
O manganês forma a parte primordial do superóxido dismutase, enzima localizada a nível mitocondrial. A enzima exibe grande atividade antioxidante dentro dos organismos, aumenta sua atividade paralelamente com a produção de progesterona no corpo lúteo dos mamíferos razão pela qual, considera-se que exerce um papel fundamental na manutenção da função de suporte da gestação, esteroides e integridade desta estrutura em muitas espécies animais.
O carácter antioxidante destas moléculas também foi evidenciado a nível do endométrio durante o curso normal dos ciclos estrais, o que favorece a regulação dos mesmos e a preparação destes tecidos para suportar e manter uma gravidez. Por esta razão, se houver uma deficiência deste elemento, haverá abortos. O Mn também está relacionado com o desenvolvimento e crescimento dos tecidos ósseos e cartilaginosos, por serem componentes importantes das enzimas galactotransferase e glicosiltransferase responsáveis por estimular a produção de muco polissacarídeo e glicoproteínas primordiais para o desenvolvimento de tais estruturas.
Contribuições insuficientes do elemento na dieta têm sido relacionados diretamente com anestro, retorno irregular ao estro, pobre desenvolvimento folicular, cistos ovarianos, atraso na ovulação, redução nas taxas de concepção e aumento nas taxas de aborto entre outras.
Para que o criador possa se livrar de complicações que possuem relação direta com o Mn, deve-se fornecer forragens que possuem no mínimo 40 mg/kg de MS em sua composição e não mais que 1000 ppm (nível tóxico do Mn). Os métodos de suplementação são diversos, entre eles via alimento, água, ração ou com o sulfato de manganês injetável no animal, nota essa última opção torna-se mais cara, sendo a via alimentar a mais barata e acessível na propriedade.
Se as plantas da fazenda forem deficientes em Mn o agricultor pode optar pela adubação mineral de todo o terreno com o mineral e outros, desde que seja auxiliado pela consultoria de um agrônomo, uma vez que excessos podem tornar o solo inviável e podem ocasionar intoxicações no animal pela ingestão das plantas ou da água que contém excessos de minerais.
16.2.2 Iodo (I)
O iodo (I) é o elemento constitutivo principal das hormonas tireóideas (tiroxina e triiodotironina) relacionadas com a termorregulação, metabolismo intermediário, reprodução, crescimento e desenvolvimento, hematopoese, circulação sanguínea e funcionamento neuromuscular. A nível reprodutivo, as deficiências deste elemento são reconhecidas por supressão da apresentação de cios, aumento do número de natimortos, abortos, aumento de casos de retenção de membranas fetais, gestações prolongadas etc. (MONCADA, 2001).
Foi demonstrado que o I e o selênio Se interagem na alteração da função da glândula tireoide. A adição de tiroxina exógena provoca um aumento significativo do tamanho e crescimento de fetos e membranas fetais, acompanhado de desenvolvimento acelerado a nível pulmonar e tecido adiposo. Níveis deficientes de I durante a gestação tardia induzem baixos níveis de hormônios nos recém-nascidos, o que aumenta a susceptibilidade à hipotermia e diminui notavelmente a viabilidade da cria.
As deficiências de I geralmente ocorrem quando os animais consomem pastos que possuem substâncias bociógenas, contidas por exemplo em Panicum coloratum e Paspalum dilatatum, assim como no Trifolium repens. Deficiências de I induzem hipotiroidismo, redução da taxa metabólica basal, atraso do crescimento, problemas cardíacos e redução das secreções apocrinas.
O I deve ser oferecido em quantidades entre 0,25 e 0,88 mg/kg diárias e que não ultrapassem as 50 ppm para todas as categorias animais. Pode-se suplementar os animais com I através dos métodos convencionais conhecidos como a administração de volumoso, concentrado, iodo presente na água ou via injetável.
O I ainda possui relação com o Se, e este não deve ser fornecido em quantidades que ultrapassem as 0,3 e 0,10 mg/kg de MS. Também pode-se evitar deficiências de Se mediante a injeção de selenito no animal em concentrações que não ultrapassem as 5 a 10 mg presentes no líquido da injeção.
16.2.3 Cobalto (Co) e vitamina B12
O Co é um componente essencial da vitamina B12. Os microrganismos ruminais são capazes de sintetizá-la, se houver a presença do Co. A enzima metilmalonil-CoA Mutase é essencial para o metabolismo do propionato e do succinato, isto é, com a regulação dos aportes de energia nos ruminantes. Sua deficiência, portanto, leva a uma deficiência energética, os sinais clínicos são semelhantes a um quadro subclínico de deficiência proteica e/ou energética. Quando o quadro se agrava aumenta-se a perda de peso, extrema inapetência, perda de massa muscular, abortos, anemia grave e até a morte.
O Co pode ser administrado aos animais via água, alimento ou injetável. A concentração permitida do mineral na dieta dos animais em qualquer idade ou categoria devem obedecer as 0,07 – 0,11 mg/kg de MS diariamente, o que evita todo e qualquer tipo de transtorno relacionada a deficiência do mesmo.
A deficiência de Co gera uma deficiência automática da vitamina B12. Possui 4,5% de Co em sua composição. A escassez dessa vitamina pode ser observada em animais que estão fracos, diminuem o consumo de alimentos e que apresentem anemia de todo caráter. Ocorre nas formas de adenosilcobalamina (figura 1) e metilcobalamina que estão presentes em plantas e no tecidos dos animais. A função geral dessa vitamina é a síntese de células vermelhas e da manutenção da integridade do sistema nervoso.
A deficiência de vitamina B12 impede a formação de hemoglobina e ocorrem lesões a nível do SNC, o que afeta seriamente o metabolismo de carboidratos, lipídios e ácidos nucléicos, logo afetando o desenvolvimento fetal e aumentando o risco de abortos.
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Emanuel Isaque Cordeiro da Silva
Belo Jardim, 08 de abril de 2020