DIA 30/10/15

ÁFRICA – PERÍODO NÃO DISTINGUIDO

Por orientação da psicóloga eu descia por uma escada íngreme, alta, mas sem medo. Quando eu cheguei ao fim da escada eu me vi muito diferente.

Eu era negro, totalmente. Olhei para os meus pés, grandes, duros, descalços. Passei as mãos em meu rosto e ele aparentava ser redondo. A minha altura não devia passar de 1,70. A meu lado, bem próximo, o meu irmão, muito parecido com o Tony, meu irmão atual. Não sei se contávamos a idade, mas acho que eu tinha uns 30 anos.

Próximos a mim, muita gente, todos negros, a maioria homens, mas algumas mulheres com crianças no colo, penduradas de lado. Todos olhavam indignados para a nossa floresta totalmente queimada, um pó negro se espalhando por todos os lados. Não sobrara absolutamente nada, só restos de arvores requebradas.

Nisso, um homem, que parecia ser o nosso chefe, começa a falar e diz que tudo isso havia sido feito por um povo vizinho e que tínhamos de nos vingar.

Juntou todos os homens, inclusive eu e meu irmão, e armados apenas de paus e algumas facas fomos em direção para onde o chefe disse que estavam os nossos inimigos. Caminhamos muito, não sei precisar quanto tempo.  Chegamos no alto de uma montanha não muito grande e deitados observamos a “vila” no vale abaixo. Muitas choupanas, muitos homens, muitos mais do que nós, circulando. Observamos muito tempo e pensei: não temos chance nenhuma. Meu irmão, do meu lado, me disse: Vamos embora. Eu retruquei, não, não podemos, vamos aguardar.

Pouco tempo depois o nosso chefe deu a ordem para voltarmos para casa. Disse que eram muitos, que devíamos voltar, nos preparar, chamar outros grupos vizinhos e aí voltar e atacar.

Chegamos em “casa”. Era uma choupana, sem praticamente nada dentro, e morávamos lá apenas eu e meu irmão. Não me lembro de uma mãe ou um pai. Se os tive, devo tê-los perdido quando criança, pois não tenho nenhum registro disso. Dormimos, não sei quanto e acordamos com uma gritaria. Saímos para fora da choupana e estávamos totalmente cercados por muitos homens, nossos inimigos. Nosso chefe estava sendo espancado e logo após ele desapareceu no meio daquela turba. Fomos amarrados e levados para a aldeia dos inimigos. Não vi mais o meu irmão.

Não consigo precisar quando tempo fiquei ali, mas a minha sensação é de que não foi muito tempo. Só me lembro do final, eu muito velho, pelo menos na aparência, arqueado, feio, de barbas já brancas, carregando pedras (acho que todo período ali eu só carreguei pedras), de um lado para outro. Cai, não me levantei mais. Morri.

Olhei de cima e vi aquele corpo inerte, sem vida, e pensei o porquê daquela vida, tão sofrida, sem nenhum sentido para mim. Ao mesmo tempo, a sensação de que brevemente eu iria saber o motivo de tudo aquilo. Eu me sentia leve, tranquilo, apenas com dúvidas e ao mesmo tempo com certeza que as dúvidas seriam esclarecidas. Pela primeira vez eu vi uma luz forte, brilhante e clara, como nunca havia visto. Não me lembro de sol naquela minha vida de escravo que tive.

Análise comparativa com a vida atual: Vejo pouca coisa relacionada à minha vida atual, a não ser os sentimentos a partir de onde eu me via morto.  Eu passei pela maior dificuldade da minha vida atual até o momento, que foi o de perder o meu amor, a minha mulher, ainda jovem, com 44 anos. Já sofri muito com isso por não conseguir entender e aceitar esse fato, mas hoje eu tenho certeza que em algum momento as minhas dúvidas serão esclarecidas.

Outro fato foi o meu irmão, que para mim era o meu irmão Tony de hoje.