REGIÃO DO URUARÁ-CAMAPU, RIBEIRINHA E ÁREAS ADJACENTES: HISTORICIDADE, ASPECTOS E ATIVIDADES PRODUTIVAS E A SUA RELAÇÃO NO ABASTECIMENTO DO MERCADO INTERNO E EXTERNO

 

Produzido no ano de 2018 a 2020 e divulgado em 15 de abril ano de 2020 em Santa Maria do Uruará, Prainha Pará.

Por: Sydney Pinto dos Santos[1]

 

Justificativa:

Por não haver uma descrição sucinta sobre as atividades econômicas da Região do Uruará-Camapu e Ribeirinha[2], assim como uma divulgação das atividades econômicas que emergiram nas últimas décadas na Margem Direita do Município de Prainha – Pará, as quais são bastante expressivas e fazem parte do cotidiano do cidadão, tanto ele como produtor ou executor da atividade ou mesmo como consumidor, vimos a necessidade de fazer um descrição sobre estas atividades que ora são desenvolvidas pelos moradores da Região do Uruará, inclusive em Santa Maria do Uruará (distrito) e outras comum idades adjacentes, assim para que a população tenha um pouco do conhecimento sobre as relações sociais e as finalidades destas atividades; pois assim como, este artigo possa ajudar ou colaborar nas pesquisas acadêmicas ou mesmo escolares, se tornem fonte de pesquisa referenciada acerca de nossa região do Uruará-Camapu* e Ribeirinha, as quais três regiões integradas, a primeira constituída de terra firme mas com áreas de várzeas, a outra com maior parte da várzea e uma pequena porção de terra firma. Lembrando que neste contexto geográfico e hidrológico, com suas diversas particularidades quanto fauna, flora, vegetação, relevo e outros aspectos, predomina a região Ribeirinha, região anexa as duas e que é uma grande área onde há predominância vinculada a extração animal, inclusive de pescados, criação de bubalinos e bovinos.

Assim, a principal justificativa deste trabalho está respaldada nos conhecimentos adquiridos junto aos pescadores (principalmente), criadores, ribeirinhos, produtores de piracuí, pescadores de camarão, produtores de queijo e entre outras funções desempenhadas ao longo do espaço geográfico que corresponde uma parte da Calha Sul do Município de Prainha, o qual está em grande evolução no que diz respeito á ocupação humana, no desenvolvimento de atividades relacionadas ao comércio, à produção de produtos ao mercado externo, assim como o de serviços, assim como referentes à atividade da agricultura e pecuária.

Objetivos:

Descrever sobre as inúmeras atividades econômicas desenvolvidas na Região do Uruará-Camapu e Ribeirinha e suas relações com o mercado interno e externo.

Analisar as características das atividades que são desenvolvidas no âmbito da pecuária, extrativismo animal e vegetal. Assim como os ganhos que são concernentes as estas produções.

Possibilitar através da descrição das atividades, o conhecimento sobre cada uma delas no meio social, educacional e acadêmico. E o que elas possibilitam ao cidadão produtor e este como consumidor.

Finalidade:

Expressar e levar ao conhecimento da população local e as que tem relação com as atividades produtivas quais as vantagens, benefícios, e das possibilidades futuras que estas atividades socioeconômicas podem oferecer à sociedade de forma geral. Fomentando ainda mais o conhecimento sobre estas atividades e o que elas representam economicamente à população em todos os seus âmbitos e campos de ação.

INTRODUÇÃO

Houve um tempo em que, a harmonia do homem com a natureza se dava de maneira espontânea e respeitosa, pois dela, este indivíduo, só extraia o necessário e o suficiente para a sua vivência e sobrevivência de seus entes e de si mesmo. Porém, com o passar dos séculos, mudanças profundas e necessárias na história e na construção das sociedades organizadas permitiram o surgimento de novas técnicas, instrumentos e possibilidades de mudanças que viessem contribuir e atender as necessidades contínua e dinâmica das pessoas em seu cotidiano.

Estas mudanças atingiram todos os campos, desde a produção de alimentos, passando por conhecimentos diversos, como o científico, até a maneira de como se comunicar e se informar; informação esta que possibilitou um dinamismo muito maior, nunca visto na história da humanidade, conduzindo o mundo ao que nós chamamos de processo de Globalização e universalização dos serviços, das produções e dos negócios em seus pormenores, que englobam desde a compra de matéria-prima, contratação de mão-de-obra, até a exportação e importação de produtos dos mais variados tamanhos e preços.

Esta conexão contínua e flexível, conduziu um olhar mais profundo, onde o homem não se sentiu mais parte de um único país, nação ou território, mas com direitos e deveres de um “homem universal”; processo este observado nas grandes migrações para a Europa, ou mesmo dentro da América Latina, onde os homens buscavam um espaço para atender suas necessidades e solucionar seus problemas. Porém, este um processo com um preço muito caro a pagar e incômodo e incômodo do ponto de vista étnico e político, o que acarretava muitas vezes pagando com a própria vida, tendo em vista que as migrações ou acabavam em mortes nos mares entre e principalmente a África e a Europa, ou as prisões nos Estados Unidos, ou mesmo mortes nos rios das Américas.

Lembremos que as mudanças são necessárias e que devem atender sim, as necessidades do homem, sejam elas em pequeno prazo ou a longo prazo. E neste sentindo, a alimentação depois da água e o ar, fora o principal elemento para dar continuidade a vida e preserva-la, mesmo que fosse dentro da temporalidade permitida, ou seja, o percurso entre o nascimento e a morte do indivíduo.

Pois, sem alimento, jamais seria possível que um dia os colonizadores ou ocupadores da América tivessem chegado em seu destino, povoando e espalhando-se durante gerações e gerações, não importando se o caminho tenha sido feito arduamente entre o Estreito de Bering ou atravessando o Oceano Pacífico; pois no decorrer dos séculos nesta jornada encontram os nutrientes adequados para a continuidade, ou plantando ou mesmo coletando alimentos, ou mesmo caçando, pescando.

De um jeito ou de outro, chegamos a sociedade que somos hoje, mas queremos dar ênfase também, as produções que ainda seguem uma dinâmica cultural e nos moldes artesanal, o que ao longo dos anos pouco fugiu à maneira ou maneiras daquela que outrora eram produzidas, como é o caso da farinha de mandioca, produção de paneiros, canoas, remos, peneiras, e outros apetrechos que contribuíram para que as sociedades, especialmente aquelas do território brasileiro, tivessem pelo menos o mínimo de organização social, tanto na sua produção rústica, como na coleta na floresta e outros habitats favoráveis a sua sobrevivência e permanência destes povos.

Não há nada mais condizente, hoje, de que ter uma produção de pequena ou grande escala, as quais venham respeitar a natureza, facilitando com isto uma prática onde o próprio homem se veja com parte integrante deste ecossistema, juntamente com a água, o ar puro, e as matérias-primas, como peixes, crustáceos, mandioca, árvores de madeira de lei ou mesmo aquelas ínfimas, mas que são importantes para a natureza, tornando-as quase intactas, ou seja, incorporadas dentro de uma política ambiental e social que as ajustem aos interesses dos homens sem prejudica-la ou agredi-la na em sua totalidade.

Este entendimento, permite expressar, aquilo que conhecemos como produção sustentável, que no nosso entendimento, significa produzir outras matérias com aquelas da natureza sem que haja uma agressão única, constante e universal, dando possibilidade de ressurgimento e promovendo a sua recuperação no menor espaço de tempo, ou ainda, fazendo a captura de certos seres vivos, como os pescados, sem agredir seu habitat de reprodução ou respeitando época de desenvolvimento e desova. Ou mesmo ainda utilizando equipamentos/instrumentos que venham facilitar a captura apenas daqueles tamanhos aceitáveis no mercado consumidor.

Porém, é fundamental elencar alguns aspectos e fatores que vem nas últimas décadas definindo e redefinindo as políticas ambientais, pois a depredação do meio ambiente e consequentemente dos animais que ali vivem, se reproduzem e são capturados, devem ser olhadas não como algo travador ou engessador do desenvolvimento, mas algo que possibilita a melhoria do mercado, dentro de uma dinâmica de qualidade e quantidade ideais.

Neste trabalho de pesquisa e exposição dos recursos e das atividades comerciais da Região do Uruará e comunidades adjacentes, incluindo as regiões de Camapu, comunidades da região Ribeirinha (do Puru, inclusiva) e outras, ressaltamos as principais, entre as quais se destacam, a produção do piracuí, a produção do queijo, a pesca do camarão, da captura do pescado, a exportação do açaí, do gado bovino, e da farinha de mandioca, da extração da madeira de lei; contando ainda com a produção de barcos (embarcações) e outras atividades vinculadas á economia local.

 

PRODUTOS, SUAS CARACTERÍSTICAS, PROCESSO DE PRODUÇÃO E MERCADO CONSUMIDOR

1 - PRODUÇÃO DE QUEIJO

A produção de queijo é feita exclusivamente do leite tirado de gado bubalino e bovino; quando após a retirada é armazenado em baldes de plásticos ou alumínio, quando é fervido em recipiente específico. Quando após a fervura forma uma pasta compacta que, dependendo do tempo de fervura e o acréscimo de alguns ingredientes como a banha do leite e sal, e acondicionada em outros recipientes menores, que darão forma ao mesmo.

Outra forma de produção é do queijo de coalho, onde se possibilita que o leite se coalhe por dois processos: o uso do soro fermentado ou mesmo a utilização rudimentar no uso do estômago de certos animais, como do próprio boi ou da capivara. Sendo que a massa depois de coalhada é prensada em um recipiente de madeira, contendo uma saca para extrair o máximo de soro, que após algumas horas ou dias é retirado para armazenamento.

A produção de queijo na região do Uruará, se dar exclusivamente na região de várzea, onde na época do verão estão concentrados os maiores números de rebanhos de gado, pois, devido a pastagem ser farta, possibilita uma maior quantidade de leite, assim como a engorda do rebanho; outra área de produção é nas estradas: na PA – 371 (Transuruará) e na Estrada que liga Santa Maria do Uruará à Santarém (Curuá-Una).

Esta produção de forma artesanal dar um toque de peculiaridade aos produtores, os quais muitas vezes utilizam-se de forma rudimentares que vai desde o confinamento dos bezerros, passando pela ordenha nas primeiras horas da manhã, até a sua produção na fervura da massa em fogão a lenha, até o uso de recipientes e armazenamento, como baldes e sacas de plástico.

Ressaltando que, pelo sabor e consistência da massa, o queijo de “manteiga” é o mais preferido pela população consumidora, pois mesmo sendo o seu preço e valor mais caro, é um ingrediente preferido no café da manhã, juntamente com a farinha de mandioca como complemento. Já o segundo produto, conhecido como queijo de “coalho” por ser mais salgado, e ter sabor diferente do primeiro, tem pouca saída no mercado consumidos, apesar do preço ser mais ameno.

Assim, a produção do queijo, seja ele de leite ou manteiga, ou o de “queijo de coalho”, é um produto que abastece mercados como da cidade de Santarém, Monte Alegre, Santana (Amapá), e até mesmo em pequenas quantidades o de Manaus (AM), dando assim ênfase naquilo que se produz de gênero alimentício na Região do Uruará e comunidades adjacentes.

2 - PRODUÇÃO DE FARINHA DE PEIXE (PIRACUÍ)

O piracuí, etimologicamente pode ser oriundo do tupi: pira = peixe, e do tupi kuí = muito fino, logo piracuí, farinha fina de peixe, e que é produzida do Amazonas até mais ou menos município de Almeirim no Pará. Atividade praticada por pescadores que vivem nas regiões de várzeas, próximas às margens do Rio Amazonas e outros menos expressivos onde se concentram os lagos e consequentemente a sua matéria prima principal: o acari ou cascudo, cientificamente conhecido por hypostomus plecostomus, pescado muito comum na Amazônia que varia, quando adulto, entre 30 a 50 cm de comprimento. Sendo o mesmo muito utilizado na famosa “piracaia de acari”.

Esta é uma atividade que merece destaque e respeito quanto a sua produção, armazenamento, e comercialização, pois implica em uma dinâmica muito complexa e desafiadora; pois implica em vários processos ou etapas que estão em consonância uma com a outra; isto porque, está inserida também na atividade da captura do pescado (acari ou cascudo). Quando assim podemos destacar as notáveis e complexas etapas:

2.1 – Teçume da rede (malhadeira) em malha de tamanho específico (45 ou 50 mm), o que possibilita a captura de um pescado que esteja em tamanho adequado de acordo com a legislação ambiental vigente, como também atendendo os acordos de pesca das diferentes comunidades. Quando muitas vezes esta captura em quantidade se processa mais no verão amazônico, quando as áreas lacustres estão sujeitas a baixa da água, o que possibilita os cardumes a se juntarem em pequenas lagoas. No entanto, nesta época o transporte do pescado se torna um transtorno, pois devido a distância até o local da produção torna-se um obstáculo a mais nesta atividade.

2.2 – Captura e transporte da matéria-prima:

Existem dois momentos para a captura do pescado (acari ou cascudo), o qual é utilizado na produção da FARINHA DE PEIXE ou PIRACUÍ; a primeira é o deslocamento em embarcações com a redes; em seguida a identificação ou localização de concentração dos cardumes de acari, muitas vezes localizados no inverno em ambientes próximos a aningais ou mesmo barrancos (vegetação aquática) as quais servem de alimento para este pescado, quando a sua alimentação é constituída principalmente de lodo no fundo do lago ou área lacustre ou lodo concentrado na vegetação. Após a primeira etapa constitui-se da despesca da rede, quando são separados os peixes pretos (acari) dos peixes brancos, que são outras espécies capturadas no momento; que são descartadas do processo, mas utilizadas para outros fins. Neste processo de captura são utilizados vários instrumentos ou “apetrechos” como: cacete, luva, tirador, terçado, e outros como cuia, sacas. Pois devido a carapaça lixante do pescado, implica em pequenos incidentes, como perfuração dos dedos, das mãos ou mesmo o lixamento contínuo das palmas das mãos, o que pode ocasionar lesões como ferimentos. Assim, alguns cuidados devem ser seguidos, evitando desta forma quaisquer lesões no pescador.

2.3 – Separação primária do pescado:

A parte primária do pescado (acarí) utilizada na produção do piracuí, consiste na parte do meio do pescado (ventre e costas) e a parte traseira (rabo), onde está concentrada o maior volume de carne da espécie em questão.

Após a captura do acari e o transporte até o local de produção, faz-se a separação da parte principal ou daquela que será utilizada no “assamento” ou cozimento da matéria prima. Assim, da posse de um terçado ou facão e um cacete o pescador abate o peixe, facilitando a retirada da parte anterior ou da cabeça do pescado, a qual é destacada e descartada em local específico, dependendo da época de produção do piracuí ou farinha de peixe, pois esta parte do pescado por ter uma estrutura óssea bastante expressiva não é usada no processamento. No entanto, há algumas décadas, esta parte era cozida e depois servida como alimento a suínos em cochos de madeira ou em de plásticos, o que era considerado como um suplemento alimentar bastante nutritivo aos porcos.

2.4 – ASSAMENTO OU COZIMENTO DA MATÉRIA – PRIMA:

Após a retirada da cabeça do acari, e retirada uma parte das vísceras, assim como lavada e retirado o excesso de sangue em agua corrente, quando a parte interessada do pescado é colocada em paneiros de talas de palmeiras da região ou sacas para conduzir até a cozinha ou barracão de produção para que em seguida são colocados em barris para cozimento ou em grelhas para o assamento da carne do peixe. Cada processo com seu tempo de duração que varia muito, dependendo da altura do fogo ou mesmo da madeira utilizada para o “brasamento”. Quando vale ressaltar que, para estes dois processos são utilizadas madeiras, as quais são adquiridas em serrarias locais (madeira refugo) ou mesmo retiradas das matas próximas (matas ciliares em que os galhos estão secos).

2.5 – Aquisição de materiais (acessórios) para o cozimento:

Aqui vale destacar alguns materiais e acessórios que são utilizados na produção do piracuí, que entre eles estão: madeira para o assamento ou cozimento; tambores de latão para o cozimento; grelha para o assamento; paneiros para o transporte; sacas de diferentes matérias para o armazenamento; remos e rodos para movimentar a matéria-prima no forno; forno, para a etapa de processamento, refino e trituração da massa; canoas, malhadeiras e motores para a captura do pescado; cuia, luvas, e outros acessórios auxiliares.

Os tambores ou utensílios usados no cozimento da carne de acari são adquiridos no mercado, inclusive os mais utilizados são os de 200 litros, os quais são de flange que serve como tacho de cozimento e os de plásticos, utilizados para o armazenamento da carne pós cozimento ou assamento. Já a grelha é feita de vergalhões de pequenas dimensões que é de forma quadrangular, posta em cima de uma estrutura que serve de suporte (em jirau no inverno), feita de barro em forma de forno rústico e ou na época do verão um buraco cavado no chão com largura e altura específicas, onde serão colocadas as madeiras que serão acesas e dependendo da etapa de produção da farinha de peixe ou piracuí terão seus fogos em tamanhos específicos.

2.6 – DESCASCAMENTO OU SEPARAÇÃO DA MATÉRIA – PRIMA PÓS COZIMENTO OU ASSAMENTO

Após o processo de assamento ou cozimento da carne do pescado, com uso de luvas e outros acessórios dar-se o processo de separação da carne do pescado das partes não utilizáveis como o excesso de espinhas e também das “cascas” que fazem a cobertura da carne do acari, uma carapaça que substitui as escamas que outras espécies possuem. Esta separação se dar com o uso de uma colher ou mesmo com as mãos protegidas por luvas, e são colocadas em vasilhames ou recipientes específicos que depois serão derramados no forno principal para a torragem e produção da farinha de piracuí. Ressaltando que, o acari cozido tem sua vantagem na hora da separação da carne, pois por estar mais maleável, facilita o desdobramento e manuseio, em detrimento ao acari assado em grelha, onde a carapaça está mais segura entre si e com uma carne mais firme, com pouca concentração de água.

2.7 – PROCESSAMENTO DA TORRAGEM NO FORNO (PRODUÇÃO DA FARINHA DE PEIXE)

Após separada a carne do restante não –utilizáveis (cascas e excesso de espinhas) e munidos de alguns equipamentos necessários para a produção de farinha de peixe (piracuí), a carne é colocada no forno, espécie de recipiente de forma retangular com pouca altura, que varia entre 18 a 25 cm de altura em suas bordas, e espalhada dentro do recipiente o qual recebe fogo por baixo com sentido de receber as temperaturas exatas para esta etapa de secamento, onde são evaporadas os excessos de água contida nas carnes do pescado. Desta forma, os executores da atividade, munidos de rodo, remo e soquete de madeira, vão triturando a carne que no início tinha a consistência pastosa, e que, com a perda da água, vai se “soltando”, ganhando nova textura, dinâmica e visibilidade, que com o tempo exposto a tempera exata, vão ganhando outros aspectos, como cor, mobilidade e leveza. Pois assim, retirado o excesso de água, que depende muito do processo anterior, se cozido ou assada a carne, conterá pouca ou muita água, o que determinará o tempo de exposição no forno. Onde esta massa é mexida de um lado para o outro evitando com isto que a mesma grude no fundo do forno, caso contrário podendo assim “queimar”, e tendo ao final um gosto diferente do desejado. Lembrando que, aos poucos a carne em processamento vai recebendo os cuidados necessários, como por exemplo, o quantitativo de sal suficiente para que se tenha no final um sabor na medida, além claro, de receber um quantitativo para a conservação futura do produto. Assim, o artesanal ou confeccionador do piracuí deve ter estes instrumentos em mãos: remo, cuia, soquete ou batedor e rodo, para que se tenha os cuidados necessários com a produção e no final se tenha um produto de qualidade e notável. Como falado, a torragem da farinha de peixe ou piracuí tem o tempo específico, a qual depende dos processos anteriores: cozimento ou assamento do pescado; pois no primeiro caso, no cozimento, há uma grande quantidade de água na carne, o que possibilitará um tempo maior no forno; já no assamento da carne, pelo fato de pouca existência na constituição da carne do pescado, o tempo na “fornada” é bem menor. Ressaltando que, no produto final, a cor dourada no piracui indica um produto de primeira qualidade, pois é um indicativo de que a matéria-prima usada foi exclusiva do acari; em detrimento com a cor esbranquiçada, é um indicativo de que houve uma mistura de carne de outras espécies de pescados.

2.8 – ESFRIAMENTO E ENSACAMENTO DO PRODUTO FINAL

Após alguns minutos, após a retirada do produto do fogo onde foi cozido ou assada a matéria-prima do piracuí (o acari), este segue para o esfriamento, o qual se dar de forma natural, o qual pode ficar entre o período de 2 a 3 horas desaquecendo; e que seguirá para o ensacamento em sacas de 25 a 30 quilos deste produto em sacas com capacidade para 6º quilos. Assim, quando as sacas são fechadas com costuras de outros fios, seguindo para o armazenamento à espera dos compradores, muitas vezes feita por comerciantes ou por atravessadores, os quais podem ir nos locais de preparo ou o produtor do piracuí se dirige até os espaços de venda, que entre eles varia, podendo ser um comércio, ou embarcação que transporta o produto até os espaços de comercialização no atacado.

2.9 – DA VENDA DO PIRACUI E SUA COMERCIALIZAÇÃO NOS CENTROS URBANOS

Pelo fato de que muitas vezes a demanda se torna maior que a procura, muitos comerciantes e mesmo atravessadores do produto, procuram armazenar uma grande quantidade, no sentido de esperar uma melhor época para a venda do produto, o qual é feito nas grandes cidades do Oeste do Pará ou conduzido muitas vezes para outros centros urbanos, como Macapá no estado do Amapá ou Manaus no estado do Amazonas; lembrando que, as grandes cidades e também as pequenas que mais recebem esta produção e em todas as épocas e períodos são: Santarém (maior volume), Monte Alegre, Porto de Moz, Belém, Almeirim, Santana e outras.

O preço do quilo varia muito, dependendo da qualidade do produto, cor, textura e época de comercialização, pois na época do inverno o preço torna-se mais elevado devido a duas situações: a falta de matéria-prima, por causa da expansão da área de pesca, devido ao inverno amazônico, quanto a diminuição da produção, pois existe neste período a época do defeso da espécie, o qual possibilita a produção e criação de novos peixes desta espécie; ou seja, se torna necessário a preservação do pescado; pois só assim será possível a produção em larga escala em outro ano.

2.10 – A DEFASAGEM DA ESPÉCIE E A PRODUÇÃO DE BAIXA QUALIDADE

Ao longo das décadas, um fator chamou a atenção dos pescadores, consumidores, atravessadores e comunitários que sempre conviveram e consumiram a farinha de peixe ou piracui como alimento; pois devido ao uso de malhas das redes não compatíveis, isto é, menores daquelas permitas por lei (45 a 50 mm), houve uma redução no quantitativo da matéria-prima, pois o tamanho do pescado influencia muito na qualidade e na quantidade a ser produzida anualmente e/ou no período específico, o que levou aos produtores a acrescentar na produção outras espécies como aruanã, traíra, piranha, bocó, cojuba e outros menos expressivas, o que muito caracteriza pela cor do produto final, uma cor esbranquiçada em vez de dourada, assim como também pelo tamanho das espinhas encontradas, as quais não são características da espécie acari ou cascudo (hypostomus plecostomus) da família loricariidae. Porém, existem alternativas que vem compensando a produção, como aumento do período do defeso, e também a proibição no uso de malhas menores que a exigida ou daquelas que tradicionalmente fizeram parte da captura, produção, armazenamento, venda e consumo desta iguaria tão apreciada na culinária amazônica.

2.11 – DO USO NA CULINÁRIA E NO CONSUMO COMO ALIMENTO

O piracui sempre fez parte da culinária dos amazônidas, inclusive como complemento alimentar, pois além de ser de fácil preparo, leva menos tempo, além de possibilitar o uso de diversos temperos complementares que dão um sabor e gosto muito característicos, permitindo assim, uma degustação do produto. Lembrando que depois da “catação das espinhas” é levado ao fogo para o aquecimento em temperatura ideal e a gosto, quando serão acrescentados outros ingredientes na farofa como: cebolinha, coentro, pimentão, pimentinha, tomate, cebola de cabeça. Sendo que além da farofa de piracuí, existem outras receitas bastante chamativas e apreciáveis, como: bolinho de piracui, no qual é acrescido água, batata cozida ou pó de farinha de mandioca ou trigo, ou misturar com ovo e colocar na frigideira em óleo com temperatura ideal. Este bolinho de piracui, é muito apreciado como tira-gosto em bares e restaurantes, onde as porções servidas, por ser uma iguaria, em termos excêntrica e nova, torna-se um pouco cara, pois seu preparo necessidade de experiência e saber lidar com os ingredientes complementares, como cebolinha, cebola de cabeça, alho, pimentão, cominho, coentro, ovo de galinha batido e outros. Saber também a temperatura exata e o tempo de cozimento, assim como os tamanhos das poções que serão “fritas”. Lembrando que de 1 quilograma de piracuí é possível fazer um quantitativo expressivo de porções de bolinhos de piracuí, que no seu degustar pode ser acrescentado maionese, extrato de tomate a gosto, ou outros complementos de mesa, onde possibilitará uma interação mais degustável entre o apreciado tradicional da cozinha amazônica e as novas possibilidades de receitas, como é o caso do piracuí e suas diversidades criatvas.

Além destas receitas existem outras do “tempo da vovó”, que em uma delas denominada de mojica de piracuí, em que consiste na fervura de um quantitativo de água, na qual será acrescentada um porcentual de piracui “catado” (retirado a espinha), e colocado temperos a gosto: pimenta do reino e cominho moídos, pimentinha, cebola de cabeça, cheiro-verde, tomate; que após um período de fervura, tona-se uma massa pastosa adequada para ser servida, podendo ser consumida com arroz ou com farinha de mandioca a gosto.

A farofa de piracuí além de ser consumida com arroz, pode também em muitos casos ser consumida com banana, as quais são colocadas juntas em fatias, acrescida de farinha de mandioca, arroz e outros, de acordo com o gosto do apreciador da receita. Além de ser temperada com óleo vegetal ou banha de leite ou gordura suína, que após serem “aquecidas” ao fogo são acrescentadas ao produto, assim como verduras como cheiro-verde cortado e também cebola-de-cabeça, além de pimentinha-cheirosa e tomate em algumas situações ou a gosto do consumidor, dando com isto gosto e sabor palatáveis e inconfundíveis da culinária cabloca amazônida, em especial da região Oeste do Pará, onde se destaca o município de Prainha, em especial a região ribeirinha deste município, e também a região do Camapu – Uruará, como também do Anema, Guajará, Outeiro e outras.

2.12 – DO TRANSPORTE DO PRODUTO E POSSIBILIDADES DE VENDA NO MERCADO EXTERNO

Quanto à maneira de transporte do produto das diversas regiões que produzem o piracui no município de Prainha, inclusive na região ribeirinha, sempre foram feitas por botes ou canoas motorizadas que levam o produto até um ponto específico de embarque no barco de passageiros o qual irá conduzir o produto até os centros de negociação e venda. Assim, são embarcados um quantitativo expressivo deste produto, com o intuito de ser absorvidos pelos mercados consumidores maiores.

Este embarque e transporte se dar em sacos que variam de peso, entre 25 a 30 quilos cada um, que depois são fracionados em pequenos pesos no sentido de atender o consumidor final, e variando muito no preço, dependendo da distância do mercado no qual é negociado, por exemplo, no mercado em Santarém um quantitativo com 300 gramas é muito diferente o preço que no mercado consumidor manauara.

Há muitos anos, as empresas de transporte de passageiros e mercadorias, fizeram e fazem o transporte deste produto, que saindo do Porto de Santa Maria do Uruará (calha Sul do Município de Prainha) vai fazendo o embarque do produto em pontos específicos como: Terra Preta, Mato Grosso, Tamataí, Socoró, Vira Sebo, São Joaquim, São Sebastião, Aparecida, São Judas, São Miguel, Ipanema e outros menores. Ressaltando que a produção não só ocorre em específico na região do Uruará (rio), porém na Região do Anema, Guajará, Puru, Vira Sebo, Camapu, Ipanema e uma parte no Itamucuri e Cuçari. Quando a produção do Itamucuri e Cuçari, e Pracubal atende exclusivamente o mercado da cidade de Monte Alegre, segunda maior cidade do Oeste do Pará.

As principais empresas que fazem o transporte deste produto entre os pontos de embarques e os mercados consumidores são: Grupo Furtado Navegação; Grupo Monteiro Navegação; Empresa de Navegação Guedes; Grupo Flexa; Empresa de navegação Bons Amigos; Grupo Vitória Navegação (via fluvial), e outras na Vila de Boa Vista do Cuçari; e a empresa Monte Sião (transporte terrestre).

2.13 – O PRODUTO NO DEBATE ACADÊMICO E NO USO DA ALIMENTAÇÃO ESCOLAR

No ano de 2012, no polo da Universidade Federal do Pará – UFPA, em Almeirim – Pará, no componente curricular de Gastronomia, fora apresentado por um grupo de acadêmicos do município de Prainha, inclusive de Santa Maria do Uruará, uma proposta para a alimentação escolar, a qual pudesse atender quanto as aspectos quantidade, valor nutritivo e aceitação pelos discentes, e que tivesse alguma relação coma produção familiar local; sendo então apresentado por esta equipe o uso do piracui, quando da ocasião fora colocado na apresentação e para degustação das outras turmas dos outros cursos que se encontravam no local; sendo aceita na integra, no entanto, por não haver um registro do uso e de reconhecimento como alimento, ficou no esquecimento, até que no ano de 2019, no primeiro semestre, já no município de Prainha (Câmara Municipal) fora novamente apresentado a proposta por outras pessoas, que no momento tiveram o aval de centros universitários, câmara de vereadores, representantes da sociedade, direções de escola e órgãos de vigilância sanitária, quando em audiência e presença de muitos conselhos escolares, se possibilitou a introdução deste produto na alimentação escolar, o que ainda está em processo de transição e teste. O que poderá alavancar a economia local, visto que a produção está concentrada na região, e também incentivar uma maior produção dentro dos moldes legais e aceitáveis pelos órgãos de vigilância e fiscalização. Falta os discentes se adaptarem a esta nova possiblidade alimentícia e sabor de um produto da própria realidade a qual estão inseridos.

Por outro lado, foram detectados três desafios, que ora foram detectados: 1 – o declínio do principal pescado e matéria-prima do piracuí (o acari); o uso atualmente de outros pescados na produção deste, o que possibilita um produto de baixa qualidade, visto a apresentação de uma “nova característica” ao produto e a regularização dos produtores, sabendo que se trata de uma produção artesanal sem nenhum vínculo legal no que diz respeito aos protocolos legais de produção, armazenamento, mercado e consumo.

3 - PRODUÇÃO DE AÇAÍ

A produção do açaí na região do Uruará e mesmo na Margem Direita (calha Sul) do Município de Prainha, está ganhando nos últimos anos uma maior dimensão, tanto no aspecto de quantidade, qualidade, volume, mercado, textura e aparência, além do aspecto da produção no que se refere aos cuidados necessários para a produção em vinho. Pois além de ser exportado em caroços, há hoje uma grande demanda em forma de vinho, aquele em que os caroços são batidos em máquinas especificas, ensacadas, transportadas, negociadas e consumidas.

Ressaltando que, os locais que atualmente apresentam uma maior produção e que merecem destaquem são: Região do Tamataí, Região do Uruará (Caraxió e Açu), Itamucuri, Boa Vista do Cuçari, Pacoval, onde são extraídos os caroços das palmeiras do açaizeiro (euterpe oleracea), e separados os caroços em paneiros confeccionados de tala de palmeiras ou palhas, que são transportados até os locais de preparo, que antes passam pelo processo de “choque térmico” para matar quaisquer possibilidades de manifestação de doenças como a de Chagas que muitas vezes o seu hospedeiro (barbeiro ) se faz presente nas áreas de “apanhações” do açaí. Ou muitas vezes, o produtor apenas coloca os caroços em água morna, que depois são retirados o excesso de resíduos indesejados como folhinhas e pequenos galhos, como caroços “mortos”, para seguirem para a batedeira.

Assim, na batedeira, equipamento feito de um funil metálico, que é movido dentro um outro equipamento (o descascador), os caroços são separados do suco/polpa, e são separados para serem descartados em locais adequados ou servem de adubos. Quando o suco cremoso é separado e colocado em sacos plásticos de 1 litro, em seguida colocado em isopores com gelo ou em freezers para armazenamento e conservação.

Lembrando que na apanhação do açaí há uso alguns acessórios essenciais, tanto para a segurança, como para a mobilidade do apanhador no momento da extração dos cachos do fruto no açaizeiro, no caso, a peconha ou pecunha, feita de folha de palha ou da folha do açaizeiro ou mesmo de sacas de sarrapilha ou ainda de pano em bom estado. Este instrumento possibilita ao apanhador uma grande segurança tanta para a subida, descida ou para se movimentar entre as palmeiras quando necessário da passagem de uma para a outra. O deslocamento de subida é feita em “saltos” dado pelo apanhador, que em poucos segundo, dependendo da altura da palmeira, já se encontra junto ao cacho, onde este é analisado e apanhado, caso estiver “paráu”, o mesmo é deixado de lado por não apresentar as características e qualidades necessárias para a produção do vinho/polpa.

3. 1 - Do consumo do vinho do açaí e suas peculiaridades

Mesmo não sendo um dos produtos mais notáveis da economia de Santa Maria do Uruará ou mesmo da Calha Sul do Município de Prainha, mas que aos poucos vem fazendo diferença em quantidade, consumo e comercialização, o açaí é muito apreciado juntamente e como complemento nas alimentações diárias, como por exemplo, servido junto com farinha de mandioca e apreciado com peixe frito, quando as espécies mais servidas são o pirarucu, o tambaqui, pacu, tucunaré, e outras; já incrementado com peixe assado, o açaí é consumido em pirão com curimatã, jaraqui, tambaqui, mapará, pescada e outros pescados.

Sendo que esta mistura de farinha de mandioca e vinho do açaí, é conhecida como pirão. Esta mistura, é muito consumida no almoço, visto que, pelo seu valor nutritivo e substancial, é um expediente evitado em outras refeições como o jantar.

Outra forma de consumo do vinho de açaí in natura é aquela em que se mistura com farinha de tapioca, açúcar e o vinho em si, que servido em tigelas facilita a sua degustação. Mas, percebe-se que, além deste é utilizado em sorvetes, sucos, saladas e outras iguarias.

Na vila de Santa Maria do Uruará, existe um evento específico em função do AÇAÍ, quando a escola Ezilda Aragão Brasil, no mês de outubro ou novembro, promove o Festival do Açaí, quando no momento são oferecidos aos participantes uma série de receitas que envolve o açaí como principal ingrediente nas iguarias deste festival, que juntamente com peixes fritos (pirarucu) principalmente, fazem a diferença nesta programação socioeducativa, mas com o envolvimento de toda a comunidade local.

4 - CAPTURA, PRODUÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO DO CAMARÃO

O camarão de água doce, conhecido cientificamente como macrobrachium amazonicum, presente em quase toda a totalidade do território nacional. Até o ano 2005, segundo fonte de pescadores, esta espécie era apenas usada como isca para algumas espécies, entre ela a pescada ou para o tucunaré, quando o pescador artesanal munido de uma linha e um anzol em sua extremidade, usava para captura destes pescados anteriormente citados, e tendo como isca o camarão. Já em algumas situações esporádicas, a captura do mesmo feita com o uso de uma poronga, ou mesmo de uma lamparina de querosene, colocadas no banco central de um bote ou canoa a remo, eram capturadas pequenas quantidades com fim de serem consumidos, depois de fervidos em panelas, onde na água era acrescentado sal a gosto, em seguida retirada o excesso de agua e deixado para escorrer a salmoura e depois descascados e consumidos. Esta “descascação”, consistia na retirada da cabeça do camarão, do rabo e da casca da parte central do corpo do camarão. Sendo em seguida consumidos com molho de sal e limão, ou mesmo apreciados como tira-gosto, ou ainda consumido com açaí. Lembrando que, o camarão de água doce, é usado como complemento essencial na iguaria muito conhecida no Brasil e apreciada pelos paraenses e outros povos de outros estados brasileiros, neste caso no tacacá, goma de tapioca dissolvida e cozida e depois servida com tucupi, mastruz e camarão, quando este último com seu gosto salgado, dar um tempero a mais na iguaria, tanto como expressando um sabor inconfundível e apreciável.

4.1 – a captura do camarão

A captura do camarão de água –doce (macrobrachium amazonicum) é feita de maneira artesanal, quando os pescadores e pescadoras se utilizam de alguns apetrechos de captura extremamente necessários e importantes. Que entre os quais estão: matapi, a luva, a isca, canoa movida rema ou motor rabeta, cuia, linhas, varas, sacas, barris de latão, paneiros, remos e outros como a laterna ou lamparina.

4.1.1  – matapi:  principal apetrecho usado na captura do camarão, pois é um “paneiro aquático”, que serve como armadilha. Feito de talas de palmeiras e cuidadosamente costurado, é constituído de 3 partes: as entradas laterais, onde o pescado adentra, o “salão” onde está a isca e também o suporte que ajuda a afundar ou submergir (no caso uma pedra ou ferro), e a comporta, por onde são retirados os camarões na despesca. Ressaltado que as talas são entrelaçadas e costuradas dentro de um padrão em que se deixa um espaço para a saída da água e também em tamanho ideal onde os crustáceos menores ou aqueles com tamanho que não são bem aceitos poderem escapar, ficando só os de tamanho que terão preferência no consumo e no mercado.

4.1.2  – a preparação e processamento do camarão:

Após a captura, o quantitativo é lavado em água corrente, depois de retirado do fundo da canoa, e são transportados até o local de fervura, que pode ser em um barracão rudimentar ou mesmo nas cozinhas das casas dos pescadores, onde os camarões são colocados em tambores de latão ou zinco onde serão fervidos em tempo variável, com acrescento de água e sal, sendo depois retirados do utensílio e colocados em espaço para resfriamento da fervura escorrer o excesso de água; quando em seguida são depositados em sacas plásticas para o seu armazenamento e transporte.

Nesta preparação tem as etapas intermediárias, que são, após a colocação da água nos tambores, arrumação da lenha (quando feito em fogão rústico), em seguida o acréscimo do sal, e o movimento de mistura, que é feito com uma pá de madeira ou um pequeno remo, o qual possibilita a mistura e assim ajudando no cozimento.

4.1.3 – a comercialização:

Após serem “enxugados”, os camarões são ensacados e depositados em locais específicos em que facilitará o escorrimento do excesso de salmoura; quando são embarcados nos porões das embarcações que fazem o trajeto do local do armazenamento até os centros comerciais. Que entre os principais na Região Oeste do Pará, estão o de Santarém e Monte Alegre; já se referindo aos maiores para onde são exportados, pode-se destacar o de Belém, Manaus e Macapá, este último via a cidade de Santana.

4.1.4 – o consumo:

Já no ambiente comercial nas cidades, o camarão sofre uma alta do preço em razão de vários fatores, e quando são vendidos em quantidades menores, depois consumidos de várias maneiras pelos apreciadores deste alimento. Muitas vezes servidos nos bares e restaurantes como tira-gosto. No entanto, no Estado do Pará e outros da Região Norte, o camarão, após descascado é utilizado em várias maneiras, é uma delas mais presente e tradicional, assim dizendo, é o tacacá, onde ele é servido no complemento da goma, junto com outros ingredientes constituintes. Porém existem outras de cunho gastronômico que levam mais trabalho, mas que o camarão se faz ou se apresenta como adjuvante, é o caso do bobó de camarão, lasanha de camarão, pizza de camarão e até mesmo em sanduiches, onde uma pequena porção é acrescentada, dando o traço e gosto típico do camarão.

Lembrando que, quando se trata da culinária do Estado do Pará, o camarão é muito apreciado juntamente com outro produto, o açaí, onde os dois são consumidos como complemento um do outro, dando notabilidade naquilo que consideramos como característica única e tradicional de um povo que valoriza a sua cozinha e suas diversas iguarias, com características e sabores inigualáveis.

5 - HISTOCIDADE, CAPTURA E EXPORTAÇÃO DE PESCADO NA REGIÃO DO URUARÁ-CAMAPU

Segundo Santos, (2010, p. 17), explica que:

Dada a influência nativa da história da Comunidade de Santa Maria do Uruará o de Município de Prainha, os traços culturais e sociais hoje existentes são reflexos de sua formação sócio-histórica. A pesca, nesse sentido, se configura atualmente como uma das maiores heranças culturais dos nativos em Prainha e principalmente na Comunidade pesquisada.  Contudo, hoje ela não é vista apenas como uma atividade cultural ou que garanta ao ribeirinho sua satisfação física e material. Ela vai muito mais além daquilo que se propõe. Ganhou características nove as, passando do caráter artesanal para a perspectiva comercial e empresarial, e nesse contexto, tem engendrado muitos conflitos na região.

Levando em consideração a enormes variedades de espécies de pescados existentes na região do Uruará-Camapu, principalmente na região conhecida como Rio Pará do Uruará (porção da várzea) onde o principal expoente ou ponto de referência e o Rio Pará do Uruará com seus lagos e lagotes em suas margens e na região dos lagos (Região do Camapu), esta última, uma área que é composta por inúmeros lagos e lagoas, como: Miuá, Miuazinho, Formiga, Lago do Vento Fresco (lago do Veado), Caxipá, Munguba, Lago Grande do Camapu, Fartura, Samambaia, Garça, Lago da Ilhinha, Manoel José, Compridinho, Lago do Palheta, Camaleão, Mutuquinha, Mutucão, Lago dos Bichos e outros.

5.1 - Características anteriores:

Aqui faço um pequeno esboço do que era a realidade desta grande área pesqueira, quanto as suas características no que diz respeito as espécies e também sobre a vegetação ali outrora constituinte. Não por ter vivido a realidade, porém por dois momentos e motivos: primeiro por ter convivido e me informados com pessoas de gerações diferentes; segundo por ter em um dado momento da minha história ter vivenciado como “pescador” esta atividade tão importante para a vivência, sobrevivência humana e atividade comercial da região.

No que se sabe, esta “depressão lacustre” está sujeita a dois movimentos das águas amazônicas, dos volumes das chuvas e suas variáveis: que são o inverno e o verão amazônico. Quando na época da cheia torna-se um só corpo lacustre constituinte, que abrange desde a região que se conhece como Socoró até os confins do Lago da Fartura. Onde as águas do Rio Amazonas, via Rio Pará do Uruará, preenche toda esta bacia, que são levadas pelo Rio Camapu e seus diversos igarapés que dão acesso aos leitos de lagos e lagoas.

Assim, a área que compõem esta bacia lacustre do Rio Uruará – Camapu, era constituída por grandes “florestas” de aningais, ingazeiros e outras árvores e arbustos de pequeno porte, e a enorme variedade de outros “barrancos” menores, como: pomonga, premembeca, caraparu, rabo de rato, canarana, mata-pasto, murim, agapés, vitória-régia, apé e outros.

Estes aningais tinham forma fixa, onde eles estavam entranhados na parte terrestre, tornando-os permanentes no ambiente, onde no inverno estavam seguros no fundo dos lagos, margens de igarapés, lagoas ou mesmo rios. No entanto, existem outra forma, em que os aningais se formaram em cima de compostos de capim e barrancos em decomposição, que aos poucos foram se compactando com poeira e outros materiais, formando uma plataforma flutuante, onde possibilitou o surgimento de outras espécies. Sendo que estas plataformas flutuantes se deslocam na época do inverno de um lado para o outro, dependendo do vento, da corrente da maré ou mesmo do processo de subida e baixada da água nesta área lacustre. Sendo que muitas vezes, além de carregar as espécies vegetais, também serviam para “carregar” espécies animais como cobras, capivaras, camaleões, ratos, jacarés, ninhos de pássaros, tracajá, cabeçudo, caranguejos, uruás, e outros de tamanhos menores, mas que são importantes para o ciclo e a cadeia alimentar ali existentes. As vezes estas ilhas flutuantes, encalhavam próximas aos tesos, ou mesmo eram interceptadas por alguns obstáculos, como casas, currais, cercas, árvores fixas e outros, ficando por ali por anos a fio. Temporais fortes eram um aspecto que sempre contribuíram para que estas ilhas flutuantes de aningais e em épocas de invernos grandes ou de águas cheias, como são conhecidas, fossem arrancadas de seus lugares de surgimento e “navegassem” a esmo, provocando pânico em moradores em pescadores. Nos primeiros porque as benfeitorias como casas, currais e cercas estão sujeitas a serem derrubadas ou danificadas; já os segundos, porque suas redes (malhadeiras) poderiam nunca mais serem encontradas, depois que uma ilha passasse por cima.

Além destes tipos de vegetação que predominavam no inverno, o qual serviam como refúgio, proteção, procriação e desova dos peixes e outros animais, existiam outras, mas mais especificas da época do verão, como: as várias gramíneas, juquiri e malva, que neste período serviam de agasalho, procriação e espaço para outras espécies de pássaros, como: patos do mato, garça, margulhão, marreca, paturi, piaçoca, rolinhas, ariramba, socós e outros.

Vale ressaltar com veemência que, até a década de 90 em seu início a vegetação ali existente tinha suas funções básicas para a população das varies espécies de animais e peixes, quando das principais estava a retenção da maior parte da água, onde estes aningais ao tocarem o solo ao baixar da água serviam como barreira natural, impedindo que as águas dos lagos descessem via rio Camapu – Uruará, impedindo também que os cardumes viessem em migração pelo rio Pará do Uruará até encontrarem o Rio Amazonas , o que facilitava a sua captura. Assim, antes, a área de lagos ficava com um grande volume de água, fazendo com que os peixes em sua maioria ficassem retidos em sua área de procriação, dando possibilidade assim, de se ter um pescado de qualidade e quantidade suficiente para o verão todo e assim para os anos que se seguiam.

Porém, dentro desta constatação, vale constatar que dois fatores foram negativamente fundamentais para o processo de destruição da vegetação que predominava na região, e, que ao longo dos anos foram perdendo seu quantitativo e sua importância no que concerne a promoção da vida lacustre. Um deles foi a inserção do gado bubalino na região, que com sua capacidade de adaptação de áreas alagadas, procura de alimentos às grandes distância, robustez no deslocamento alagado e de vegetação, acabaram por “fracionar” grandes áreas de pântanos na região lacustre, o que facilitou sua saída para o Rio Amazonas, em pequenas “ilhas fluviais” levadas pelas força da água via Rio Pará do Uruará, diminuindo consideravelmente o quantitativo de vegetação que segurava a água na época do verão ou mesmo impedia que os peixes em seus cardumes se deslocassem de sua área de habitação e desova.

Outro fator negativo que contribuiu, foi o fogo acionado muitas vezes de forma criminosa, o qual devastou grandes áreas de pântano constituído de aningais, assim como possibilitou a morte de milhares de animais, entre os quais se mais notou foram: tracajás, capivaras e jacarés. Um crime sem precedente que até os dias atuais é sentido, pois a presença destes animais quase que é inexistente. Pela aproximação da área lacustre do Uruará-Camapu, que é formada de terra várzea com a terra firme, muitos bandos, inclusive de capivaras se deslocaram, convivendo com outros tipos de animais daqueles de outrora, como tatu, paca, anta, cutia, veado. Já os de jacaré dos tipos, açu, tinga e una e foram quase que dizimados, encontrando-os, raramente, em algumas áreas de predominância de pântanos permanentes ou de áreas alagadas na época do verão. Quanto ao período de acasalamento,

Dentro desta abordagem, em épocas que remontam, em especial as décadas de 80 e 90, no que diz respeito a captura, processamento, armazenamento e comercialização de pescado e outros artigos da caça e pesca nesta região do URUARÁ-CAMAPU, destacamos a salmoura de pescado e carne de caças, que diante as dificuldades existentes, servia como uma alternativa viável de sobrevivência ao pescador artesanal, tendo em vista que seus apetrechos rudimentares de pesca e caça, estavam concentradas no arco e flecha (zagaia, bico, sararaca), arpão, caniço, cacete, anzol (tiradeira e de linha longa) e pequenas redes, chamadas de malhadeira-mole.

Esta atividade executada dentro de uma dinâmica do remo e canoa, além de outros como toldo de japá (feito de palha, cipó e pedaços de madeira bruta) e do fogareiro, permitia que o pescador passasse mais de uma semana longe de sua residência, as vezes remando vários dias até chegar ao melhor local para “mariscar”. Este mariscar, nada mais era do que a atividade pesqueira daquela época, onde o sal, a lamparina, o fogareiro e o tabaco para espantar os carapanãs a noite, eram algo que não podiam faltar na atividade de mariscar.

Bem verdade que nesta atividade, a concentração não estava apenas na captura de pirarucu, surubim, tambaqui e pirapitinga, peixes maiores, e seu processamento (salga), mas, também, a atividade conjugada da caça a capivara e do jacaré, quando suas carnes eram também salmouradas e armazenadas para depois serem vendidas nos poucos comércios existentes ou aos regatões que até então serviam como troca entre as mercadorias que eles traziam e as mantas de carne de peixes e caças processadas pelos pescadores artesanais. Quando ao chegarem as suas residências colocavam os pescados e as carnes nos varais para que ao sol, pudesse sair mais o excesso de salmoura, sendo depois recolhidas, dobradas e armazenadas em locais para este fim, e por último, aguardar o comprador, que muitas vezes se dava por dinheiro em espécie ou pela troca com mercadorias ou instrumentos/equipamentos para a caça e a pesca.

Assim, a região de lagos da área do Camapu foi por muitos anos e até décadas um grande referencial aos que se dedicavam a atividade pesqueira, onde a caça e a pesca artesanal eram executada na base do remo, vela e vara de empurrar. Permitindo com isto um processo de seleção, controle e conservação das espécies a serem capturadas. Quando homem, animais de várias espécies, incluindo peixes e espécies vegetais conviviam em completa e perfeita harmonia; possibilitando o bom convívio e o respeito ao processo de criação, desenvolvimento e captura do que era necessário e o suficiente à sobrevivência do homem simples, leigo, mas conhecedor das leis naturais que regiam o processo da caça e pesca.

Lembrando que muitos destes produtos que os pescadores daquela época adquiriam para a sua atividade eram: pilhas para lanterna, querosene, anzóis, linhas de variados tamanhos, remos, chapéus, tabaco, arpões, pólvora, chumbo, espoleta, algodão, facas e facões (terçados) flechas, farinha e sal, dentre outros que variavam de importância na pesca e caça, como no caso de lonas, sacas e latas.

Com estas aquisições feitas no comércio local ou mesmo nos barcos dos regatões que apareciam de dois em dois meses ou mais, criava-se um vínculo vicioso, onde o pescador dependia dos produtos para sua casa, como também aqueles que seriam utilizados na atividade; e o “comerciante” dependia do produto advindo da atividade da pesca ou do “mariscar” para que assim movimentassem um comércio ainda muito ínfimo e embrionário, porém fundamental para a sobrevivência de ambas as partes. Ou seja, sem o produto advindo da atividade pesqueira não haveria a necessidade da marretagem, e assim sem os produtos do comércio fluvial, o pescador ficava quase impossibilitado de desenvolvê-la.

Como observa Santos (2010, p. 16) sobre a grande importância do pescado na mesa do pescador e dos lugares que tem esta relação com este tipo de alimentação:

Como se vê não é engano dizer que a pesca habita a alma de nossa gente. Pode até ser que ao turista mais desinformado fique a impressão o que o destino provável seja apenas o Pantanal ou Amazônia. Mas seria um engano. Seja as águas frias do Espírito Santo, os riachos paulistas do interior ou os ribeirões mineiros, aqui neste Brasil nunca tem caboclo, índio ou ribeirinho que ficasse sem peixe bom para pescar.

 

5. 2 - Características atuais:

Como advento e aparecimento de vários equipamentos e acessórios na atividade pesqueira, entre eles as diversas redes de pescar e seus variados tamanhos, tanto comprimento, como no tamanho da malha, assim como canoas mais leves e de fácil deslocamento fluvial, e principalmente do motor rabeta, o qual possibilitou mais agilidade e alcance e deslocamento às longas distâncias em pouco tempo, a pescaria ou atividade pesqueira, ganhou outras dimensões, dinâmica e flexibilidade na sua execução. Pois, dimensões pelo fato de se adquirir novos e precisos acessórios à atividade, assim, como o aumento do mercado de pescado ser mais promissor no que diz respeito a absorção do quantitativo pescado; dinâmica, porque possibilitou o pescador ser mais ágil na atividade, levando pouco tempo para lançar a rede, assim como despesca-la, como também facilitando chegar mais perto dos cardumes em pouco espaço de tempo, facilitando a sua vida quanto ao tempo que ficava fora do ambiente familiar; já flexível, tendo em vista a presença do geleiro praticamente próximo de sua casa, comprando inúmeras espécies de uma só vez, assim como pagando em espécie o quantitativo fornecido pelo pescador ao geleiro; também, facilitou porque o geleiro fosse o próprio fornecedor dos chamados “arreios” de pescaria, permitindo com isto que o pescador não tivesse um gasto extra ao se deslocar para as compras deste apetrechos/acessórios nos centros urbanos, como as malhadeiras, por exemplo.

Como cita Santos (2010, p. 11):

Evidentemente, se houve um aumento de embarcações denominadas de geleiras, consequentemente, houvera um aumento significativo de pescadores nessa atividade, causando um enorme desequilíbrio na quantidade de pescado, como também na qualidade. Quando se observou que, as diferenças de malhas das redes de captura, tornou-se um problema gravíssimo, isto porque se contribui para que se capturasse peixes que estavam ainda em fase de desenvolvimento. Porém, houvesse ainda a pesca predatória, realizada, inclusive na época do defeso, ou simplesmente no período da piracema, quando os peixes se reúnem em cardumes maiores, facilitando com isso à sua captura nos principais lagos existentes na região ou mesmos nos rios.

Os dias atuais, em relação a atividade pesqueira na Região que compreende o Rio Pará do Uruará e Camapu, são basicamente caracterizados pela presença assídua e constante do geleiro, que é um comprador intermediário do pescado na área de captura, que o armazena e transporta a demanda comprada para a sua posterior comercialização em um posto comercial existente em uma cidade ou centro urbano da região Oeste e até mesmo de outros Estados da região Norte; onde o principal equipamento é o barco geleiro, o qual é composto por uma embarcação movido a moto a óleo, onde na sua composição existe uma caixa fixa chamada de “urna” ou uma caixa móvel que é colocada dentro do espaço da embarcação; ou ainda, é caracterizado por vários isopores de tamanhos variados, conhecidos como “cubas”, onde são armazenados os peixes juntamente com gelo para a sua conservação e preservação da carne dos mesmos.

Na dinâmica da captura do pescado que ocorre em duas ocasiões: no inverno e no verão amazônico, quando o primeiro, corresponde de janeiro a ao final de julho, e o verão o restante do ano; assim, no inverno a “pescaria” com malhadeiras é feita de maneira parada, e que depende do espaço ou mesmo das características dos lagos e rios, muitas vezes mais fundos que os outros, e as vezes rasos também; o que define como serão distribuídas as boias nas malhadeiras, permitindo que elas afundem ou não, ou que atinjam o solo lacustre. Já no verão, como as lagoas e lagos tendem a secar ou ficar com as águas baixam, e muitas vezes os peixes ficam presos nestes ambientes, as redes ou malhadeiras são distribuídas em forma oval, quando são recolhidas (ponta com ponta) pouco a pouco, prendendo os cardumes que aos poucos vão se malhando e sendo despescados; já também existe o processo de arrasto, em que em forma de maia lua, as malhadeiras vão sendo puxadas carregando consigo os pescados de acordo com o tamanho da malha, tendo em vista que os pescados menores, escapam por entre as malhas.

Outro aspecto observado na captura do pescado na época do verão, são as grandes distâncias existentes entre onde fica o local de despesca e captura e o “paradeiro” do barco geleiro, ou mesmo de uma embarcação intermediária de transporte. Pois, os pescadores munidos de canoas e seus acessórios pesqueiros, tende a desloca-los até o ambiente propício ou onde estão concentrados os cardumes; assim carregam nas costas as canoas-botes ou se utilizam de uma carroça para a execução do transporte das embarcações, que as vezes estão quilômetros de distância entre um ponto e outro, tornando um processo penoso e demorado. No entanto, com a assídua presença das motocicletas, hoje se tornou muito mais fácil, já que as mesmas (quem as possuem ou alugam) são utilizadas no transporte do pescado capturado. Possibilitando com isto ganho e 3 pontos básicos: maior quantidade transportada, alcance de em menos tempo dos pontos de pesca e pesagem, ou mesmo retirando o processo do pescador de transportar em carroças ou mesmo nas costas e cabeças o quantitativo de pescado capturado.

5 - 3: Mortandade do pescado:

Este é um processo natural que, devido o “abaixamento” rápido das aguas lacustres, o que impede a saída dos cardumes para locais mais profundos ou mesmo os rios, e também, a evaporação da água devido ao calor do verão amazônico, os cardumes presos nas lagoas e lagos estão sujeitos a morrem por causa da temperatura da água ou por pela seca completa do espaço onde ficaram retidos, pois se os mesmos não foram capturados a tempo, terão este triste fim, o que poderá comprometer outro ano/período, tanto em quantidade como também em qualidade (tamanho). Porém, como foi citado anteriormente, este é e foi um processo que se alterou consideravelmente pela falta da quantidade de vegetação que impedia que as águas vazassem rápido da região lacustre. Pois, quanto mais vegetação de aningais e outras, mais água ficava retida na área pesqueira, o que possibilitava a vivência e sobrevivência dos cardumes e espécies, como também colaborava com a locomoção dos pescadores na época do verão amazônico.

Ou tipo de mortandade de pescados, que ocorre quase todos anos, e na época do inverno, está relacionado à composição da água, a qual ficando infestada por algas microscópicas ou não, as quais retiram o oxigênio da água, o que leva ao processo denominado pelos pescadores de “aiua”, que nada mais é que pela falta de oxigenação da água o pescado vem â tona para tentar receber uma dose extra de oxigênio, ficando com a cabeça de fora ou uma parte do corpo, acabando assim se tornando presa fácil aos pescadores, botos e aves, tento em vista que a falta deste gás deixa-nos “tontos”. Valendo lembrar que, por observação as espécies mais afetadas são aqueles de “peixes de água profunda”, como pescada, surubim, mapará, arraia, douradas, bacus, charutos e outros tipos de bagres e mandiís. Porém, neste período, aparecem boiando de “aiua”, grandes cardumes de pacus, tucunarés, tambaquis, acaraçu e curimatã, que por alguma razão são difíceis de serem capturados com as redes paradas;

As águas pretas durante o inverno amazônico nas áreas lacustre é um indicativo de que aquelas áreas na época do verão foram queimadas, assim caracterizando as águas com tom escuro, o que também indica uma água pobre em oxigênio, porém concentra cardumes de algumas espécies muito fortes as intempéries como o acari (principal produto do piracui), do tamuatá (outra e pequena espécie de cascudo) e acaraçu, mas não são exclusivas delas. Geralmente estas águas-preta, com odor característico e gosto salobra, estão próximas de “boiados” e aningais que em sua parte foram queimados na época do verão, quando permanecem por um longo período com estas características, amenizadas quando as águas começam a “baixar” nestes locais, e que as vezes são substituídas por novas plantas da mesma espécie.  Sendo que, as gramíneas também estão propensas a este processo de queima na época do verão.

5 – 4: Seca e dinâmica do pescado:

Os grandes cardumes, que com a baixada das águas ficam presos e as vezes acabam morrendo nestes ambientes são os de acari, carauaçu, arraia, acará, pescada, cutimatá, “bocó”, tamuatá, traíra, uruanã, pirarucu, tucunaré, jiju, mandiis, entre outros pescados, que, por falta de sorte por não encontrarem os canais dos igarapés que dão acesso aos rios, acabam ficando presos nestas lagoas que aos poucos suas águas vão ficando rasas devido a evaporação rápida, o que facilita a sua captura de forma mais rápida, pois não há outra saída, tanto para o pescado e seus variados tamanhos e espécies, como ao pescador, que procura as maneiras mais eficazes para captura-los e transportá-los até ao local de pesagem e conservação, neste último caso o uso de gelo em grandes recipientes que servem para o armazenamento e conservação do pescado até ao seu posto de venda.

É neste período que, devido a facilidade da captura de grandes quantidades de pescado que as geleiras são abastecidas mais rapidamente, pois os peixes estão mais concentrados nestes ambientes rasos e de pouca água, o que permite que os pescadores artesanais sejam mais agem nesta atividade, assim possibilitando duas situações: a primeira tentar retirar o maior quantitativo em pouco tempo, evitando com que exista a mortandade de um quantitativo maior; segundo, facilitando o abastecimento em curto período das “geleiras”, as quais podem dar várias viagens entre a área pesqueira e o centro consumidor. Este processo faz com que o pescador atue num ambiente hostil, onde a água não é potável, está contaminada por grande quantidade de bactérias, por causa dos pescados mortos, assim como os riscos de peixes como piranha, traíra, arraia, e mandiis, e outros perfurantes, o que poderá desencadear um grande risco a saúde do mesmo, sem contar a insolação, o consumo de água não tratada e também o risco de desidratação pela falta do consumo desta. Nesta situação ainda se pode destacar ainda, a presença de animais que implicam algum perigo a vida do pescador, como gados soltos nestas áreas, assim como serpentes como sicuriju (Eunectes) (não-venenosa), comboia, jararaca e jaracaca d’água, ainda a presença de poraquês, os quais podem desmaiar um pescador com sua descarga elétrica, podendo levar ao óbito por afogamento o pescador. Sem contar a grande quantidade de baratas d’agua que ferroam, as frieiras pela exposição contínua da agua com as dobras do corpo e também o famoso cauixi.

Todos os pescadores são ímpares em falar que onde há grandes cardumes de pescado no verão amazônico, é uma época de bamburrar ou fazer fartura, pois como são fáceis de serem capturados, há a possibilidade de se extrair uma grande quantidade de uma só vez, facilitando a vida dos mesmos por vários meses, já que o quantitativo capturado neste período equivale há muitos meses o que seria capturado no período do inverno amazônico ou das águas cheias.

Vale ressaltar que, o pescado capturado neste período não é, muitas vezes, de boa qualidade, pois implica em um período em que os mesmos não estão se alimentando ou que devido ao contato com o barro ou lama, passam a ter algumas características peculiares, menos sangue e tamanhos não adequados para a comercialização com o geleiro, o que por vezes são descartados ali mesmo sem dó e nem piedade. Um exemplo clássico disto, é a menos apreciação e procura por algumas espécies, como a uruanã, traíra, tamuatá, acarí e alguns tipos excêntricos como peixe-cachorro, sarda, piranhas e outros, como bacu e bocó, quando os geleiros falam que no comércio “não tem saída”.

A presença de cardumes de piranhas, neste período, é mais assíduos em canais ou em trechos dos rios onde há o despejo de sangue, com aqueles bombeados pelos barcos geleiros e também onde há a concentração de pescadores de acarí, quando pela retirada do bucho e da cabeça desta espécie, implica a concentração de piranhas, o que torna um empecilho e transtorno aos pescadores de “peixe-branco”, pois as mesmas além de atacarem os peixes malhados nas redes, também, cortam as malhas com seus dentes afiadíssimos, causando prejuízos de toda ordem ao pescador. Onde este prefere procurar os lugares de água corrente, ou onde se apresenta cardumes de peixes maiores, pois mesmo assim, ainda existem a presença delas, visto que no próprio verão todos os cardumes, devido ao nível da água, ficam concentrados.

A dinâmica da captura neste período do verão, é bastante exaustivo, pois muito diferente da época do inverno, quando os pescadores acordam mais cedo devido as distâncias existentes das áreas de pesca ou as lagoas onde estão os cardumes e o local de pesagem, no caso onde fica ancorado o geleiro. Às vezes sendo quilômetros de distância entre estes dois pontos, implicando em uma situação um tanto desagradável que, pelo sol “escaldante” desta época, o pescado capturado, logo nos primeiros momentos tendem a ficar com a carne “cozida” ou como conhecida “peixe moído”, observados pelas guelras com características esbranquiçadas, o que podem levar ao descarte deste pescado, ou ainda pelo “toque” na textura da carne.

Nestas grandes distâncias, após a captura do pescado, os mesmos são colocados em sacas de plásticos de 60 quilos, que depois são transportados em carroças, lombos de cavalos ou por mesmo nos ombros e cabeça dos pescadores, o que neste último caso requer um esforço a mais. Sabendo que quanto ao espaço, se dar por meio de caminhos “feitos, por rebanho de bois, trilhas que são feitas pelos próprios pescadores, ou transportados através de lamaçais, terroados, ou terra seca partida pelo sol, ou ainda atravessando espaços alagados de pouca profundidade.

Neste período os cardumes são capturados em redes que apresentam malhas de acordo com a espécie preferida a ser capturada. Como também, são cercados os cardumes nos “poços” quando as malhadeiras são puxadas pelas cabeças até ir tornando um círculo diminuto, o que possibilita ir “apertando” os cardumes em sua capacidade de malha-los, tendo ainda neste processo a “batição” dá água para espanta-los e assim eles se malharem mais rapidamente, o que facilita a despesca da malhadeira.

Já na época do inverno, utiliza-se mais o processo de rede “parada, onde as malhadeiras são esticas em espaços de 50, 100 ou 200 metros ou até mais, afixadas suas pontas em duas varas, as quais impedem que elas se desloquem com a correnteza da água, e que são indicadas nos lagos ou regiões profundas por bandeirolas ou boias que permitam sua identificação. Também existe o processo de “bobuiar” que, nos rios ou nas áreas de grandes correntezas ou profundidades as malhadeiras são soltas em uma ponta indicada por uma boia maior e outra sua outra extremidade está nas mãos do pescador, e que dependendo do quantitativo de boias secundarias (distribuídas na extensão do corpo da malhadeira), a rede pode afundar ou não, o que depende de vários fatores, entre eles está a posição do cardume em relação à lâmina de água, a profundidade do espaço ou área de pesca e ainda os obstáculos existentes na profundeza do leito do rio, os quais são evitados, pois causam enormes prejuízos.

5 – 5: Depredação e mudança no estilo de captura:

Com o passar do tempo, e se baseando nas histórias de pessoas e pescadores mais antigos, hoje se tem uma visão e analise sobre de quão rico já foi este espaço pesqueiro que corresponde a área do Camapu-Uruará, assim também a região ribeirinha (de várzea) da margem direita do Município de Prainha – Pará. Quando as mesmas concentraram enormes cardumes, assim como possuíram espécies em qualidade e quantidade inimagináveis. Pois, segundo alguns mais antigos pescadores, ainda em vida, relataram o quanto de fartura tinha outrora, mas com o passar das décadas, e a inserção de procedimentos, instrumentos/apetrechos e equipamentos, possibilitou consideravelmente a diminuição dos cardumes, ou até quase o desaparecimento de algumas espécies que vão de pescados, crustáceos, quelônios, crocodilianos e outros, como pássaros.

Relatos dão conta de que os peixes para a alimentação eram escolhidos, dos maiores aos melhores, e eram pescados no “quintal da casa”, pois devido grande quantidade existente, nem se precisava ir muito longe para se conseguir o almoço ou janta. Além de se contar com uma infinidade enorme de espécies durante todo o ano, fosse no inverno, fosse no verão. Que além destes tinha grande quantidade de capivaras, cabeçudos, jacarés, tracajás, ovos de marrecas, patos, e também de outros pássaros e dos quelônios durante a desova, a qual sempre ocorria na época do verão, quando as águas baixavam e propiciavam os melhores ambientes para a postura. Assim, o homem ia dividindo o espaço e suprindo daquilo que a natureza lhe oferecia de maneira ordenada e respeitosa, sem depredar ou agredir pela devastação. Apenas competia com outros animais, como no caso dos ovos, com o jacuraru (tupinambis teguixin) e alguns pássaros e cães apreciadores de ovos de pássaros e tracajás.

A inserção do búfalo (Syncerus caffer) na região foi um dos fatores devastadores na região que compreende a área pesqueira da região do Camapu-Uruará e a região Ribeirinha, pois sendo um animal robusto e de grande resistência  ás intempéries meteorológicas e da natureza de forma geral, os rebanhos aqui inseridos proporcionaram uma grande devastação da vegetação, inclusive àquela que impedia na época do verão a vazão da água em sua totalidade ou parcialmente oriundas dos lagos e lagoas que compunham a grande área de pesca, e consequentemente a saída da maioria dos cardumes ali concentrados. Assim, a ação dos bubalinos na época do inverno nesta área ocasionou o afrouxamento dos conjuntos de pântanos formados em especial por aningais, ingazeiros e buritizeiros (Mauritia Flexuosa) que surgiram em cima de plataformas que acompanhavam a dinâmica e movimento das águas no seu sobe e desce no inverno, assim eles os búfalos, passaram a rasgar em seus deslocamento em busca de alimentos, estes grandes blocos em pequenos pedaços, os quais tiveram grande mobilidade de deslocamento e “fuga”, inclusive em períodos de temporais e na estação em que as águas começavam a fugir pelos rios no verão.

Esta saída destes pequenos pedaços de pântano através dos rios, inclusive pelo Rio Camapu, e depois pelo Rio Uruará e desembocando no Rio Amazonas, não só levava consigo as vegetações constituintes, mas também inúmeras espécies que ali por acaso se encontravam, como lagartos, uruás, cobras, insetos diversos (abelhas), jacurarus, algumas espécies de socós, garças e piaçoca, que pela obtenção de alimentos neste habitat, acompanhavam as espécies que também faziam parte da sua cadeia alimentar. Desta forma empobrecendo ainda mais este ecossistema.

Se já não bastasse a pesca predatória aplacada pelos pescadores, pelas grandes perdas na época do verão forte, o qual provocava a mortandade de peixes, ou mesmo os processos naturais provocados pelas algas na diminuição do oxigênio da água, assim como o crescimento do rebanho do gado bubalino, existiu um mais pernicioso e destruidor ora muitas vezes provocado pela ação direta e criminosa do homem: os incêndios na época do verão. Quando, segundo informações daquela época as queimadas nesta época tinham alguns objetivos, entre os quais: dar acesso aos pescadores aos novos lagos, facilitar a pesca e a caça, inclusive do jacaré e a captura do tracajá; “favorecimento” de renovação da vegetação e das gramíneas utilizadas pelos rebanhos criados soltos na época do verão.

Este processo criminoso, se dar principalmente na época que as águas baixam nas áreas pesqueiras ou na região de várzea, quando a vegetação de todas as espécies ficam suscetíveis a ação do sol, e assim ressecando, tornam-se um combustível essencial para a propagação do fogo em larga escala, que as vezes ultrapassam os limites atingindo grandes áreas de pântanos e vegetação que cobrem as áreas alagados, deixando que os animais que se refugiam nesta vegetação mais fáceis de serem capturados com grande facilidades pelos predadores.

 

5 – 6: Alternativas viáveis (Proposta de Intervenção):

Para se desenvolver ações que venham realmente contribuir com a revitalização da natureza e de seus inúmeros habitats, precisaria tomar posições radicais; pois, com o aumento da população local, assim como o aparecimento de novos apetrechos utilizados na pescaria ou atividade de captura do pescado, a primeira seria a sensibilização da população quanto à necessidade extrema da conservação e preservação da natureza, permitindo com isto uma garantia fundamental da vivência e permanência das futuras gerações locais.

Outra alternativa, seria ser a exclusão dos rebanhos de bubalinos localizados na região, já que este tipo de animal, além de compactar o solo, possibilita na época das cheias das águas do inverno amazônico a depredação das vegetações aquáticas, impossibilitando a manutenção dos esconderijos das espécies aquáticas, inclusive as dos peixes, as quais além de não conseguirem se procriar, não se desenvolvem, e ficam muito expostas a ação predatória dos pescadores.

Se por um lado, a manutenção do rebanho de gado bubalino na região, permite afugentar os cardumes, e a destruição da vegetação aquática, o homem também é um elemento extremamente pernicioso do ponto de vista de não respeitar a legislação ambiental e nem a época do defeso, pois além de desenvolverem técnicas de pescaria não adequadas com os preceitos regimental e legal, acabam por não obedecer o que lhes é por dever e obrigação na época da desova, migração , procriação e defeso das diferentes espécies que interagem num processo migratório entre as áreas alagadas e lacustres da região do Uruará e do Camapu e outras da região até ao Rio Amazonas, o qual serve por um bom período de refúgio, até a subida novamente no início do inverno destes pescados. Neste interim, na época do verão, o Rio Pará do Uruará que além de servir de meio ao entre estes dois habitats, também serve de local de “depósito” para muitas espécies, no entanto, quando as águas baixam, elas são atacadas pelos tamanhos diversos de redes e suas malhas, as quais muitas vezes não condizem com a permitida a certas espécies, colocando em risco todo um ciclo de reprodução anual. Além de que, já há histórico de uso de explosivos por parte de alguns pescadores na região que corresponde a extensão do Rio Pará do Uruará (inclusive na área de várzea), que se utilizam deste expediente proibido por lei nesta atividade, o que permite a matança de todos os tamanhos de pescados, e um desperdício incalculável, visto que após a detonação os peixes atingidos no raio da explosão tendem a afundar o que dificulta seu apanhado, e é claro, o dano é geral a outros tipos de seres vivos co-existentes neste espaço.

Outra situação ou estratégia que poderia dar certo seria o desafogamento das atividades relacionadas à pesca, que consistia na abertura de espaços de criação de peixes na área de várzea, já que a mesma é propícia, já que possui os dois momentos fundamentais para o desenvolvimento da piscicultura em larga escala: inverno (época das cheias na várzea) e verão, período de seca ou do “abaixamento” das águas, principalmente de final de julho ao final de janeiro, quando as águas começam a ocupar estas áreas de terras baixas no município e na região.

Pois, vale ressaltar que a região do Camapu, Uruará, e da Ribeirinha (Purus, Anela, Guajará) apresentam aspectos favoráveis para a escavação destes lagos artificiais, os quais ficariam sob a guarda e responsabilidade do responsável ou responsáveis pelas etapas, que seriam: manutenção, vigilância, período de vigência do crescimento dos alevinos, reposição, despesca e venda; já que na prática se tornariam donos dos espaços ora construídos sobre o espaço definido.

Isto se tornaria tão fundamental aos três aspectos: social, econômico e ambiental na região, pois, para diminuir a pressão da atividade pesqueira em cima da área natural, acredita-se que em poucos anos, os pescadores tradicionais e artesanais ´procurariam adquirir espaço na área de várzea para abertura do espaço (lagos) e fomentar sua própria criação de pescado; assim como o geleiro e a população teriam um pescado na qualidade e na quantidade, já que o tamanho e o quantitativo na produção seriam eficientes. E quem sabe, tornando-se um centro exportador de pescados e suas variadas espécies para outros estados e municípios através de associações de pescadores/piscicultores ou entidades de compras e venda como as cooperativas pesqueiras.

Pois como se observa quanto ao declino da qualidade do pescado, destacam-se:

Dentre os grandes problemas que ocasionam o desaparecimento das espécies, como diminuição na sua quantidade e tamanho; apresenta-se o tamanho da malha das redes de captura do pescado nos lagos e rios da região; ocasionando com isso uma diminuição da oferta do pescado em períodos do ano nas comunidades que tem o pescado como fonte alimentícia.

Outro fator colaborador para que haja este declínio está relacionado à pesca em grande quantidade e que não vão para o consumo interno, mas para outros núcleos consumidores, como a cidade de Santarém, e que hoje, o transporte é feito por “cubeiros” e caminhões-frigoríficos que deslocam-se do município anteriormente citado. Provocando com isso, um desequilíbrio na compra e venda aos donos de “geleiras” do município de Prainha; assim como possibilitando um escoamento da renda e da circulação de valores na região onde a área pesqueira está contida. (SANTOS, 2016, p. 16)

 

 

5.6.1 - PISCICULTURA: UMA ALTERNATIVA ECONÔMICA PROMISSORA AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÀVEL NA REGIÃO

Quando nos referimos a sustentabilidade, os primeiros nomes que nos vem em mente são natureza e meio ambiente. Porém, sustentabilidade vai muito além de preservação da natureza e conservação do meio ambiente, ela abrange questões como a “identificação de uma necessidade e a elaboração de ações práticas” que vem gerar resultados positivos em determinada sociedade; e para tanto, o homem como instrumento com habilidades e competências eficazes e eficientes, tem toda uma gama de conhecimento de como colocar estas ações em prática, as quais podem em, curto, médio e longo prazo, darem resultados positivos e coerentes, inclusive na questão da atividade pesqueira e suas particularidades na Margem direita do Município de Prainha – Pará, em especial nas regiões compreendidas como Uruará- Camapu, Ribeirinha e outras onde a pesca é bastante acentuada durante os dois períodos que compreende a captura do pescado: o inverno e o verão amazônico.

Diante disto, percebe-se que a pressão da atividade pesqueira sobre o meio natural é contínua, predatória e embalada numa dinâmica expressamente capitalista, pois possibilitada pelos pescadores, geleiros, cubeiros e mesmo os consumidores, não se leva em conta os tamanhos de pescados, nem sua quantidade, nem qualidade, nem maneiras como são capturados e nem mesmo o respeito ao período compreendido ao defeso, o que leva uma defasagem expressiva sobre o pescado da região.

Desta forma, entende-se que a criação (piscicultura) de pescado em lagos cavados nas áreas de várzea e mesmo nas margens dos rios e igarapés maiores, tornar-se-ia uma atividade lucrativa em três aspectos; social, econômico e ambiental, e assim cultural.

Cultural, porque a base alimentícia dos ribeirinhos e dos habitantes das comunidades que perfazem ou constituem esta grande região, tem como base o pescado in natura, ou mesmo em forma de farinha de peixe (piracuí). Pois, é uma alimentação contínua, menos onerosa e também do ponto de vista de saúde e bem-estar, saudável; apenas se varia no preparo e na espécie consumida no dia a dia.

Social, pois, os ganhos se tornam necessários, já que é uma atividade de troca ou escambo em algumas situações quando o dinheiro não se faz presente; então a permuta entre peixe e outras mercadorias e notável entre as pessoas. Por exemplo, o pequeno produtor da agricultura familiar que produz farinha de mandioca faz a troca com pescado; ou mesmo de apetrechos usados na pesca como remos, canos e outros são às vezes utilizados na troca com pescados.

Econômica, pois a atividade pesqueira figura-se e se destaca como a principal atividade de cunho do extrativismo animal, quando geleiros, cubeiros são os compradores e exportadores do pescado da região para outros municípios ou estados; além dos consumidores locais. Ressaltando que nesta atividade, também se destaca, a produção da farinha de peixe (piracui) e a pesca do camarão, que são as duas atividades paralelas a atividade pesqueira (peixe branco), e que dão grande repercussão à economia local. Pois, comunidade como a de Porto Franco, situada há dois quilômetros da Vila de Santa Maria do Uruará é a principal vila de pescadores da região, com grande concentração de números de pescadores, vinculados a atividade para dois fins: a captura para atender o Distrito de Santa Maria do Uruará, e, também o abastecimento dos barcos geleiros de variadas tonelagens e aos “cubeiros”, sendo que estes últimos armazenam e transportam o pescado no gelo em recipientes de isopor, mas de pequena capacidade.

Quanto ao aspecto ambiental, esta atividade “desafogaria” a pressão dada ao meio natural, quando a atividade pesqueira é executada durante o ano todo, sem nem espaço ou intervalo, para que haja a desova, reprodução e a procriação das inúmeras espécies de pescado que habitam esta região. Pois, quando na época do verão aos cardumes se deslocam para as áreas mais fundas, porém, mais estreitas, o que permite e facilita a captura em grande quantidade e variedades. Sendo que a grande vantagem dos cardumes é quando as aguas começam a dar sinais de baixa, e os mesmos se dirigem pelo leito do Rio Pará do Uruará e conseguem alcançar o Rio Amazonas, o qual serve de refúgio para muitos deles, até voltar o período das cheias das áreas que posteriormente se transformarão e lagos e possibilitarão que os cardumes se espalhem, dificultando assim, por um período aproximado de 5 a 6 meses a ação direta e predatória dos pescadores; reiniciando depois tudo de novo.

Portanto, a abertura de lagos artificiais nas áreas de várzeas para a criação de peixes das mais variadas espécies, como tambaqui, curimatã, pirapitinga e pirarucu, seria uma das alternativas para os pescadores, ou mesmo pessoas interessadas em se tornar um criador de peixes na região, pois como existe uma grande área de terras baixas, composta principalmente de argila, facilitaria a criação por causa do movimento do vai e vem das águas, assim como apropriado à escavação e manutenção do espaço.

Este processo de criação em lagos artificiais, abrangeriam diversas etapas; entre elas a primeira a identificação da melhor área; segunda orientações técnicas acerca da criação e produção; obtenção de recursos e escavação do empreendimento; aquisição de equipamentos a este tipo de estrutura; aquisição de alevinos; manutenção e aperfeiçoamento do espaço (plantio de espécies vegetais que viessem dar segurança ao solo); produção e espera pelo período de despesca; e comercialização.

Isto nos permite, levantar hipóteses acerca dos mais variados benefícios secundários que poderia trazer a atividade aos moradores da região, inclusive no que se refere a geração de emprego e renda. Pois, cada “lago” artificial necessitaria de pessoas para interagir na atividade em si, como para a manutenção, despesca (captura) e outras relacionadas ao empreendimento.

Este tipo de atividade deveria partir do interesse do proponente ou de algum órgão como a Secretaria e Agricultura e Pesca, a qual poderia implantar este projeto como uma forma de Política Pública de desenvolvimento econômico e ambiental. Pois, a própria entidade poderia seria responsável pelas orientações técnicas, assim como orientar sobre os caminhos viáveis a obtenção de recursos via parcerias público-privado, ou instituições bancárias que venham fomentar e apoiar este tipo de atividade econômica.

Em tese, os ganhos quanto a implantação da piscicultura na região Uruará-Camapu/Ribeirinha, possibilitaria uma mudança comportamental do cidadão, inclusive do pescador, onde estes passariam a tornarem-se micro-empreendedores, e não mais ligados a uma atividade que atualmente só olha para o lado da extração contínua, sem muitas vezes, contribuir com uma contrapartida mínima à natureza e a sociedade.

De acordo com Santos (2016, p. 17), destaca que:

Neste sentido, entende-se que a criação em tanques ou viveiros de pescados, proporcionaria uma diferenciação na dieta e cardápio do consumidor local, assim como possibilitado um dinamismo maior com a atividade pesqueira e as diretrizes relacionadas ao meio ambiente, da não promoção da captura desordenada e nem do uso proibidos de equipamentos por leis ambientais e pesqueiras. Além disso iria fomentar renda à região, como gerar emprego e circulação de divisas

 

6 - PRODUÇÃO DE POLPA DE FRUTAS

Esta é uma atividade ainda muito sensível quanto a sua oferta, demanda e produção, pois são poucos os produtores que desenvolvem esta prática na região; pois podemos considerar que, esta produção ainda é muito ínfima devido à vários fatores, como: baixa produção, falta de incentivos financeiros, falta de orientação técnica e agronômica aos produtores, assim como orientação quanto ao armazenamento, transporte e comercialização. Lembrando que, o mercado consumidor, é muito promissor e tem uma vantagem muito grande, por está perto em se falando de logística e proximidade com o mercado. E, o que mais oferece estas condições, são os de Monte Alegre e de Santarém que são cidade ou centros urbanos que necessitam desta matéria – prima na produção de sucos, sorvetes, cremes e outros produtos gerados a partir da polpa de frutas.

Porém, se houver um olhar mais aprofundado e sensível quanto ao desenvolvimento da agricultura na região, por parte da gestão pública ou mesmo de interessados que queiram promover esta atividade em grande escala, percebe-se que espaço (terreno agricultável) e boa vontade haverá por parte de muitos cidadãos, os quais perceberam a necessidade de sair do comodismo e utilizar de forma ordeira e comercial a produção de polpa de frutas.

Ressaltando que, mercado consumidor existe, e é claro para receber grandes quantitativos da produção de polpas de frutas e das mais variadas espécies, como: acerola, muruci, goiaba, cupuaçu, manga, graviola, entre outras espécies que aos poucos são plantadas e que já demonstram razoável aceitação do mercado no Distrito de Santa Maria do Uruará.

7 - PRODUÇÃO DE FARINHA DE MANDIOCA

Segundo a professora Helena Guedes, a qual defendeu em seu Trabalho de Conclusão de Curso em Pedagogia, tendo como tema a produção da farinha de mandioca na Região do Uruará, em especial à comunidade de Floresta do Uruará, esclarece que no processo:

é realizada a mistura feita manualmente, por mais ou menos 30 minutos, logo em seguida coloca-se em prensa ou tipiti para enxugar e empeneirar. Após tudo isso o forno de zinco ou cobre já deve estar aquecido para a torragem, que é feita com remo de madeira. Sendo que esse processo durará mais ou menos duas horas, para que se torre; que depois de torrada é empaneirada ou ensacada. Assim sendo,estará pronta para a comercialização ou consumo da própria família. (PEREIRA, 2010, p. 30)

No entanto, a produção da farinha de mandioca na Região do Uruará (Santa Maria do Uruará), desde 2000 teve uma queda significativa, pois aqueles produtores rurais que se ocupavam com esta atividade de grande relevância ao comércio local, passaram a produzir muito pouco, ou simplesmente não produziram mais nada. E, isto vinculada às mais variadas razões, dentre as quais podemos citar: migração para a área mais urbanizada da região (vila de Santa Maria do Uruará); a incerteza quanto a sua permanência sobre a terra (criação da Reserva Renascer na margem direita do Rio Pará do Uruará); satisfação com os repasses dos recursos via políticas assistencialistas; ingresso em outra atividade produtiva (aparecimento de empresas madeireiras e serrarias); desenvolvimento de outra atividade mais lucrativa, como o comércio, a pesca e a pecuária; escassez da própria terra, quando o cuidado sobre as culturas desenvolvidas, (plantação de roças) não mais eram suficiente ao novo estilo de vida; incapacidade da nova geração de executar as mesmas atividades que os antecessores (pais) faziam ou criavam. Assim como, falta de incentivos ou de recursos destinados aos projetos à agricultura familiar; como a inexistência de projetos que visem a fomentação desta atividade econômica, a qual tem uma história vinculada aos costumes, a cultura local, e as relações econômicas da região, sem contar com seu papel fundamental na alimentação do caboclo, não só o local, mas de toda a Região Amazônica.

Ressaltando que, a produção da farinha da mandioca ou “farinha puba”, passou a se concentrar o seu quantitativo, apenas em uma comunidade, a de Igarapé Açu do Uruará, pequena vila localizada a 12 quilômetros de distância da sede do Distrito de Santa Maria do Uruará, onde os principais fatores para que também houvesse um declínio deste produto nesta localiddade, estão: a mudança para outras atividades comerciais; o baixo preço do produto em diversas épocas; a mudança de comportamento das novas gerações de pessoas; falta de incentivos através de políticas públicas direcionadas à produção ou agricultura familiar, entre outros.

Com toda esta defasagem, o “monopólio” da produção da farinha de mandioca na margem direita do Município de Prainha - Pará acabou passando para outra região do Município, a do Cuçari – Itamucuri, onde existe uma expressividade muito grande nesta atividade, a qual possibilita embarcar para outros municípios várias toneladas por semana. Abrangendo assim as mesas dos consumidores até de outros estados como o Amapá e o Amazonas. Sendo que este transporte se dar através de barcos ou navios que fazem os transportes de mercadorias e produtos da região, onde o mais próximo porto para que seja embarcada esta produção e o porto de Monte Alegre.

Assim, o dinamismo da produção da farinha da mandioca, na região do Cuçari, se dar primeiramente seguindo as etapas preliminares, que depois passa pela produção, venda e revenda, transporte e consumo.

8 - PRODUÇÃO DE MÓVEIS EM MARCENARIAS/MOVELARIAS

Atualmente a produção nas marcenarias do Distrito de Santa Maria do Uruará está voltada especificamente para a área de movelaria, quando os mais e diversos tipos de móveis produzidos nestes espaços estão voltados a atender o mercado interno e o externo quando se trata de outros municípios da região Oeste do Pará, inclusive. Assim, a produção que já vem há mais de duas décadas se fazendo presente como uma das atividades da economia local que nos últimos anos ganhou impulso por vários fatores, entre os quais podemos citar a divulgação das produções de movelaria nas redes sociais, passaram a ganhar espaço no mercado consumidor, sendo introduzidos nos mais diferentes lares ou imóveis residenciais ou não.

A produção de movelaria no Distrito de Santa Maria do Uruará, em décadas de 90 estava apenas vinculada a produção de remos às canoas da região, carteiras para escolas, bancos para sentar de variados tamanhos e mesas. Mas que não passava de algumas dezenas no decorrer da produção mensal. Já nos dias atuais, a produção ganhou novos modelos, desenhos e também em qualidade, visto que se passou a produzir outros móveis como camas, guarda-louças, guarda-roupas, cômodas, escrivaninhas, criados-mudos, mesas de tamanhos variados e formas, cadeiras, redes de madeiras, caixilhos para portas e janelas, e outros como suporte/cabide de roupas, balcões, cadeiras e estantes de variados tamanhos

Além das variedades produzidas, os móveis ganharam estilo e desenhos com formas que remetem a traços ou linhas rústicas, mas que dão ao móvel um tom diferenciado de um para o outro, e que muitas vezes depende de quem o encomendou.

Por outro lado, para se produzir estas peças, existem as mais variadas etapas, que vão desde a aquisição da matéria-prima que é a madeira de lei, passando pelo desenvolvimento do projeto da peça, o corte, usinagem, colagem, furação, pintura e armazenamento. Pois são ações necessárias e fundamentais para que no final se tenha um produto seguro, bem apresentado, fiel à encomenda e duradouro, além da beleza e da estética elaborada para cada um através dos desenhos que o compõem. Além disto, o acabamento com a pintura feita com verniz ou selador possibilita leveza, durabilidade e segurança em outros ambientes.

Vale aqui ressaltar que as principais madeiras de lei utilizadas para a confecção destes móveis no Distrito de Santa Maria do Uruará, são o acapu, o cedro, a ipê, o pau-d’arco, angelim, andiroba, jacarandá, mogno, cedrorana, itaúba, jatobá, meracatiara, macacauba, sucupira, marupá, entre outras espécies que dependendo de sua dureza, densidade e leveza, favorecem uma beleza indescritível ao produto final. Permitindo com isto agregar valores na produção dos imóveis, os quais são definidos pelo tipo de madeira utilizado (as vezes mais de um no mesmo móvel), tamanho, utilidade, peso, e características afins, como o desenho ou traços inseridos e complexidade de montagem.

Pois, muitos produtos advindos desta atividade de movelaria, torna-se dispendioso pelo fato de que muitos são constituídos de inúmeras partes, e que leva tempo para a confecção e montagem do mesmo. Onde são utilizadas variadas ferramentas na sua produção e acabamento.

Os principais mercados recebedores dos produtos produzidos nas marcenarias/movelarias de Santa Maria do Uruará, estão concentradas na própria região Oeste do Pará, quando se destacam as cidades de Prainha, Monte Alegre, Santarém, e de outros estados, como Santana e Macapá no Amapá. Sem contar o mercado local, que é o principal adquirente dos produtos desta atividade que a cada dia vem crescendo em números de ambientes de produção, volume de encomendas, qualidade e valorização de mercado e preço.

Sabendo que, hoje, o Distrito de Santa Maria do Uruará conta com 11 unidades de produção de móveis de variados tamanhos, tipos, modelos e estruturas, e que funcionam geralmente em um espaço (barracão) de variados tamanhos coberto de telhas e estrutura de madeira. Os quais são localizados em espaços (terrenos) com área para alocação e armazenamento de moinhas e outros extratos (pedaços) de madeira, que são restantes da fabricação de móveis, os chamados “refugos”, e que podem posteriormente dois destinos, como a queima e destino a outros locais distante da área urbanizada.

Entre os principais equipamentos e instrumentos utilizados na produção de móveis, são a furadeira, serra tico-tico, parafuseira, trena, graminho, formões, riscadores, plainas, grampos martelo, marreta de borracha, nível, serradeira, desempenadeira, e outras utilizados na pintura, como pinceis, broxas, rolos e aplicadores com uso de gás (pistola de pintura), lixas variadas.

Quanto a origem da madeira de lei fornecida e utilizada para a construção de móveis nestes ambientes de marcenaria/movelaria, é adquirida de fornecedores da própria região do Uruará, sendo esta área muito rica na existência e extração de inúmeras espécies vegetais de grande qualidade e aceitação no mercado de móveis. No entanto, a extração que era antes feita na proximidade do Distrito de Santa Maria do Uruará, percebe-se que está cada vez mais longe. Quando antes eram feitas em torno de 5 a 8 quilômetros de distância, hoje encontra-se entre 30 a 70 quilômetros de distância ou mais, o que possibilita várias consequências, como a dificuldade no transporte, a extração de um quantitativo expressivo de espécies nobres, assim como o encarecimento do produto final. E, isto se deve a extração desenfreada por madeireiras que extraem a madeira para dois destinos específicos: alocação para o desdobramento de madeira em serrarias para exportação e para a exportação em toras (o maior volume).

Assim, entende-se que, a produção moveleira no Distrito de Santa Maria do Uruará, além do crescimento expressivo quanto a produção e a encomenda, que é uma consequência positiva; teremos possivelmente dois possíveis processos negativos futuramente, devido ao custo de transporte e a escassez das espécies de madeira de lei, que será o aumento do preço final do produto, assim como a diminuição da produção em madeira de boa qualidade.

9 - CONSTRUÇÃO NAVAL DE EMBARCAÇÕES

Esta é uma atividade que perdurou por muitos anos e ainda perdura, e foi uma das bases para o reconhecimento da produção naval na região, quando barcos de cabotagem, barcos geleiros, de transportes de mercadorias e outras menores usadas no deslocamento de pessoas e também na atividade pesqueira, eram encomendadas aos “engenheiros” da construção naval da região; os quais muitas vezes, recebiam encomendas de outros municípios e até mesmo de outros Estados da Região Norte do Brasil. Sendo que estas embarcações, construídas de madeira eram produzidas em larga escala, principalmente na década de 80 e 90, perdendo espaço ultimamente para aquelas construídas ou fabricadas de placas de ferro, o que possibilita uma durabilidade muito maior, mas em contrapartida são muito pesadas, em detrimento das de madeira, que são levem, menos onerosa em sua construção, e a matéria-prima em abundância na Amazônia.

Os estaleiros da Região do Uruará, geralmente localizados às proximidades das margens do rio ou mesmo rios, o que facilita a sua descida, após a conclusão da construção da embarcação à área fluvial e permanência das mesmas no ambiente destinado: o fluvial.

Na construção das embarcações além dos carpinteiros navais que atuam diretamente na confecção, tendo experiência na operação de motosserras quando promovem a confecção das peças menores, as quais serão encaixadas uma a uma de acordo com o desenvolvimento e as etapas da construção, tem-se dentro deste processo os conhecidos calafates e os pintores. Pois, os calafates, são trabalhadores que fazem a segunda etapa na embarcação pós período de construção do “casco”. Estes trabalhadores têm muita experiência no uso e manuseio de massas, tintas, algodão, pinceis, e produtos que darão seguridade ao processo que tem como função a não entrada ou infiltração das águas no interior das embarcações. Ou seja, o seu trabalho consiste em “tapar” e impedir que as embarcações sejam invadidas pelas águas exteriores, o que teria, caso entrassem, o alagamento da embarcação ou mesmo a danificação de instrumentos e equipamento dos interiores, como máquinas, bombas e sistema elétrico.

Já os pintores, após a calafetação, são os especialistas que usarão os tipos de tintas de acordo com as partes da embarcação que entram em contato com a água ou não. Assim, são várias os demãos de tinta no casco, o qual tem contato direto com a água; já nas partes como convés, balaústre, paredes de camarotes, banheiros, cozinhas, sala de máquinas, toldo inferior, tem um tratamento diferenciado do primeiro, tendo em vista o contato menos direto com água.

Assim, desde a escolha do terreno para servir na alocação do estaleiro até a “arriada” n’agua da embarcação, as etapas da construção naval de embarcações de madeiras, são inúmeras; das quais vão desde a instalação ou adequação do espaço para a construção e montagem; passando pela elaboração do projeto que depende do tamanho da embarcação; da aquisição do tipo de madeira que será utilizada na construção do casco, que são adquiridas muitas vezes, antes mesmo do início da construção; instalação dos equipamentos que darão suporte ao processo, como plainadeiras, motosserras, construção de depósitos guarda-equipamentos-instrumentos; em seguida, passando pela etapa de suspensão da quilha, confecção dos braços, instalação do talha-mar; passando pela “dobragem” das madeiras feitas ao fogo; laminação e talhamento das tábuas em tamanhos adequados para os encaixes perfeitos. Assim, ainda no casco recebem-se estruturas como as longarinhas, sobre-quilha, cavernas, e outras, as quais darão à embarcação equilíbrio e sustentação sobre as águas e a navegação do mesmo.

Por outro lado, construir uma embarcação de madeira vai muito além de um projeto de engenharia, mas sim de um dom e de qualidades desenvolvidas por poucos cidadãos que desenvolveram esta habilidade ao longo do tempo, repassado e aperfeiçoado através da tradição, costume e da necessidade vivida pela sociedade local ou mesmo de outras regiões, como é o caso da construção de embarcações destinadas as atividades de deslocamento (canoas), de pesca (barcos geleiros), de transporte de passageiros (os de cabotagem), de transportes animais (balsas boieiras), e outros menores e com diferentes finalidades.

Assim, as habilidades do construtor naval, perpassa os conhecimentos de qualquer projetista e do arquiteto de náutica, pois seus conhecimentos vão desde saber as diferentes espécies e dos tipos de madeiras utilizadas na construção, conhecendo sua durabilidade, densidade e seu teor maleável. Assim como, conhecimentos sobre ferramentas e equipamentos, conhecimento de marcenaria e carpintaria, como de pintura e calafetagem, além de saber do funcionamento das máquinas que comporão a estrutura de maquinário como o motor de propulsão propriamente dito e do timão. Ou seja, não é apenas um construtor, mas sim um aglomerado de conhecimentos que englobam: náutica, engenharia, carpintaria, pintura, matemática, calafetagem, desenho, botânica e outros conhecimentos.

Como falado anteriormente, os estaleiros da região do Uruará, assim e principalmente da Santa Maria do Uruará, estão perdendo espaços e números de encomendas, pois a construção com placas de aço ou mesmo aqueles construídos com fibra, nos últimos anos veem se destacando no mercado. Assim, existem outros fatores e aspectos que também têm contribuído para que haja um declínio na produção de embarcações de madeira; entre os quais se destacam, escassez na obtenção de madeira de lei, muito usada na construção naval, e que entre as quais se destacam o cedro, a itaúba e muracatiara, que por sua leveza, resistência e maleavelidade são as mais preferidas; e também a distância da extração, o que encarece o transporte, a plainação e o valor das toras ou das pranchas, o que depois são embutidos no valor da construção da embarcação, o que de alguma forma afugenta as encomendas.

Um dos exemplos de embarcação construídas na Santa Maria do Uruará, e que ganhou notariedade na imprensa, foi a do B/M Almirante Barroso, com grande capacidade para 100 pessoas, assim como de cargas, e que em um fatídico acidente foi a pique no ano de 2009 no Rio Amazonas, entre as cidades de Prainha e Monte Alegre, ocasionando a morte de 6 pessoas; sendo depois reformado, meses depois do acidente, no mesmo espaço que fora construído em Santa Maria do Uruará.

Grandes nomes da construção naval em madeira se faz notar em Santa Maria do Uruará e nesta regiões descritas, não apenas pela sua habilidade em trabalhar com madeira, mas por causa do conhecimento empírico, no entanto, muito respeitado por engenheiros da área; que vai desde o conhecimento da madeira mais apropriada a cada embarcação, suas dimensões, uso de equipamentos/instrumentos, até mesmo dos produtos para o acabamento final, no caso da calafetagem e pintura, sem contar ainda da mecânica naval e “timoragem”, visto que tem que ter o conhecimento do timão em consonância com o mecânica do motor.

Assim, entre os nomes, que mais se destacaram neste período, na construção naval em madeira estão: Antônio Gomes (Tuíca); Agrinaldo Miranda (Norte); Roberto Miranda, Gabriel Guedes, José Raimundo Carvalho, Beny (Vira Sebo), e outros que estão mais para a produção de embarcações para atender as localidades próximas.

 

10 – EXTRAÇÃO, PRODUÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO DE MADEIRAS

Como se sabe, esta atividade está relacionada com o uso do extrativismo vegetal nas suas mais diversas e variadas formas. Servindo de suporte às outras atividades paralelas e essenciais à vida e a sobrevivência da espécie humana, dentre as quais podemos destacar, a construção de embarcações, móveis, cercas para o gado e outros animais, canteiros para plantação de diversas, paredes de casas e barracões. Assim como na construção do próprio ambiente de morada, pontes para dar acesso, e uma infinidade de uso da madeira.

Ou seja, o extrativismo vegetal na sua forma bruta ocorre desde os primórdios da existência humana, quando hominídeos, acredita-se, obtinha estes recursos para elaboração ou fabricação de instrumentos e outros materiais para a sua sobrevivência como espécie, uso, organização social e outras finalidades afins.

Porém, a extração da madeira atualmente vem comprometendo consideravelmente o meio ambiente e o modo de vida das antigas famílias, assim como também trazendo suas consequências em relação a sua comercialização, extração e desdobramento. Pois, cada vez se torna mais raro as espécies nobres de madeiras, as quais são utilizadas para os mais diversos fins.

QUANTO AO PROCESSO EXTRATIVO

O que destaca esta atividade é o extrativismo in natura da madeira em áreas denominadas de “projetos extrativistas”, os quais estão localizados em distâncias e locais específicos da Região do Uruará, em torno que varia entre 55 quilômetros chegando até 150 quilômetros dista da sede do Distrito de Santa Maria do Uruará.

Os quais apresentam a seguinte dinâmica: pós aprovação do projeto, a empresa madeireira marca as árvores que supostamente apresentam os tamanhos adequados ao corte, assim entre o período de julho a dezembro os comboios com os maquinários pesados (, caminhões-julietas, tratores de esteira, pá mecânica, motos niveladoras, skidder e outros) e outros de suporte, como caminhonetes, carros pipas, carros tanques de combustíveis e de suporte mecânico). Ou seja, todo um arsenal de “guerra” contra a derrubada da natureza nativa aos meses que correspondem ao verão amazônico, visto que, se torna o período mais seco e assim com maior possibilidade de trafegabilidade dos “caminhões-julietas” pelas vicinais e estradas, no caso desta última, a de maior utilização e circulação é a PA -371 ou simplesmente Transuruará, que se estende em sentido Norte-Sul, tendo Santa Maria do Uruará se ponto chave, ou seja, onde existe porto de embarque e desembarque de equipamentos pesados e também de embarque de toras brutas de madeira extraídas.

Porém, vale ressaltar que, os maiores prejudicados por esta atividade de transporte de madeira via Transuruará, acaba sendo o pequeno colono ou o pequeno agricultor rural, os quais moram ás margens da mesma. Sendo que, o peso das toras em cima dos caminhões transportadores, acabem por danificar seriamente o leito da estrada e consequentemente de trafegabilidade de espaço de circulação, sem fazer os reparos necessários para que haja na época do inverno uma transitalidade de quem realmente necessita desta estrada nas suas atividades diárias (compra de mercadoria, combustível, assim com venda de produtos da agricultura na vila polo).

Assim, as áreas dos projetos de extração de madeira, geralmente funciona como um pequeno entreposto de circulação de pessoas e equipamentos pesados, dentre os mais organizados encontra-se a cozinha, refeitório, dormitório, garagem, oficina, parte administrativa, banheiros coletivos, área livre para circulação, depósitos de equipamentos diversos como motosserras e EPIs. Existem outros “projetos” que até pista de pouso de aviões existem, facilitando assim uma coisa crucial que é o atendimento ao trabalhador em caso de acidentes graves, fazendo o transporte do mesmo até recursos mais eficientes e apropriados.

Desta forma, entende-se que, existem várias equipes com atribuições diferentes neste contexto de extração de madeiras em toras. Onde estão as de pesquisa e identificação; de suporte (cozinha) e administração, de suporte (abastecimento) e apoio mecânico nas estradas, da equipe de extração (serradores e maquinistas), de transporte, de embarque e armazenamento nos portos intermediários e de transporte fluvial.

Quando se especifica em relação aos “portos intermediários”, se faz necessário uma abordagem sobre os principais pontos e portos de embarque de madeiras em toras brutas. Sendo que os principais estão localizados: no Rio Pará do Uruará (Santa maria do Uruará), onde o volume embarcado é bastante expressivo, as vezes confundindo o volume com aquele que são direcionados ás serrarias locais, que utilizam a medira bruta para o desdobramento para os diversos fins. Neste rio o volume de carga e quantitativo é bastante grande quando se fala do qualitativo de madeiras, pois por possibilitar uma navegação mais tranquila no que diz respeito à profundidade do rio, largura, sem muitas curvas e sem corredeiras torna-se um percurso essencial ao transporte da matéria-prima desta atividade.

Mesmo que se utilize os EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), existe a ocorrência de muitas mortes nesta atividade, muitas vezes ocasionados pela imprudência e negligência do próprio trabalhador/operador na área de extração, no entanto já houveram casos com terceiros, ou seja, com trabalhadores das empresas madeireiras e habitantes. Sendo que os mais notáveis na última década foram ocorridos por: árvores caídas em trabalhadores nas áreas de extração; de máquinas que com problemas mecânicos; na estrada, de transportadores com moradores e acidentes envolvendo pessoal do administrativo, entre outros.

Isto é algo que reflete negativamente junto à população, visto que a extração de madeira tem um vínculo muito grande com a comunidade, quando os comerciantes locais se tornam uns dos grandes fornecedores para estas “empresas” de extração de madeira nas áreas de projetos, os quais estão localizados a uma boa distância da sede do Distrito de Santa Maria do Uruará, servindo ,este último, como um entreposto de abastecimento de inúmeros produtos que variam desde o pescado, passando pelas padarias, combustível, peças automotivas, serviços de oficinas e outros. Assim como, em casos especiais ou situações de urgência e emergência, estas empresas já utilizaram, por muitas vezes, o aeródromo da sede do distrito, uma pista de pouso com mais ou menos 800 metros de comprimento, a qual está situada na parte mais alta do espaço urbanizado desta localidade.

Dos acidentes nesta atividade

Ao longo dos anos, os acidentes foram também algo que sempre se mostraram presente quanto a execução desta atividade na região ou nas vicinais que dão acesso às estradas dos projetos de extração de madeira.

Houveram alguns que ceifaram a vida de comunitários, que possibilitou uma repercussão muito grande e envolvimento da população, que revoltada fechou estradas, impediu o embarque de madeiras em toras, ou seja, criou-se um clima tenso entre madeireiros e moradores.

Sabendo que, o último acidente desta natureza, envolvendo veículos prestadores de serviços às empresas madeireiras e moradores, ocorreu no final de 2019, o que no final das contas, o que resultou mesmo foi simplesmente a reparação material e financeira à família da vítima; mas não ocorrendo o que se espera da justiça ou dos órgãos fiscalizadores: que seria a paralização da atividade ou ainda uma fiscalização mais rígida em relação a atuação das empresas e suas formas de ação. Inclusive sobre a natureza.

QUANTO AOS ESPAÇOS DE DESDOBRAMENTO DA MADEIRA

A atividade de desdobramento da madeira em toras executados nas serrarias locais têm uma finalidade tanto econômica como social, provocando um dinamismo de interação entre a atividade em si e a sociedade local. Pois:

as serrarias, que somam em número de 06 (seis) possibilitam a contratação de um grande número de mão-de-obra, possibilitando assim a geração de trabalho e divisas; assim como fazendo uma conexão de grande relevância com o comércio local, gerando com isso uma renda de “valores circulantes” de grande expressividade à vila de Santa Maria do Uruará. (SANTOS, 2016, p. 20)

No entanto, o número de serrarias para o desdobramento de madeira diminuiu significativamente a partir de 2017, ficando apenas duas funcionando, pois foi considerado um duro golpe à economia local depois de denúncias sobre o “funcionamento ilegal” de outras. Pois enfraqueceu tanto a questão de gêneros alimentícios ao pessoal da mão-de-obra destas empresas, quanto ao quantitativo de vínculos empregatícios, assim como ao declínio na geração de renda.

Porém, vale ressaltar que, levando em consideração que neste período, as denúncias foram dirigidas exclusivamente às empresas de desdobramento de madeiras (serrarias) e não as empresas madeireiras de exploração in natura, indicou que tinha dois viés de interesse: fechamento dos ambientes que produziam benefícios diretos e constantes à comunidade (elencado por interesse da politicagem); e dar continuidade ao interesse dos grandes madeireiros que por ventura, além de financiarem algumas bases na campanha e partidos eleitoreiros, o que garantiria seu espaço de extração na região, com isto tendo a permissibilidade de trocas de pequenos favores, como doação de suas máquinas para a recuperação de vicinais e estradas, mas de forma esporádica.

QUANTO A UTILIZAÇÃO DA MADEIRA

Santos (2016, p. 20), enfatiza que, quanto a finalidade das madeiras desdobradas:

São muitas as espécies que são desdobradas, como por exemplo, o ipê, a itauba, pau-d’arco, angelim, cedrorana, e outras, as quais são transformadas em ripas, ripões, tábuas, caibros, esteios, pranchas, vigas, vigões, que são direcionadas à construção de casas, palcos, cercas, coberturas, embarcações e para os trabalhos nas marcenarias, estaleiros e outras atividades de carpintaria em geral.

Estas madeiras, especialmente aquelas desdobradas nas serrarias, são direcionadas para o mercado interno no sentido de construção de casas, barcos, cercas, currais, caibramento de construções diversas, movelaria, forros e outros. O que faz com que haja um uso flexível e dinâmico deste material de tão grande importância para a economia e a subsistência dos moradores da região do Uruará.

A utilização de madeira bruta desdobrada ou em forma de pranchas de madeira, tem também outros destinos, que são utilizadas para a construção de canoas de “fundo bruto”; construção de marombas, botes, remos, quilhas e longarinas de embarcações de madeiras, trilho para puxar embarcações, trapiches e pontes de madeira e caixarias nas construções de alvenaria.  Ou seja, um infinidade sem-fim dos variados tipos de madeiras, e tamanhos e formas, assim como das espécies.

Porém, um percentual desta madeira desdobrado nestas serrarias, são destinadas à exportação aos mercados consumidores de outras regiões, estados e até mesmo para outros países, que neste último caso, são direcionados ao mercado internacional as espécies de madeiras mais raras e de grande valor comercial, assim de acordo com a sua densidade e durabilidade. E, que entre as espécies estão: cedro, mogno, ipê vermelho, jacarandá, angelim e sua variáveis, muiracatiara, acapu, cumaru, maçaranduba, e outras espécies nobres.

Segundo Santos (2019, p. 03), uma das alternativas para que se pudesse possibilitar uma contribuição mais expressiva e maior na sociedade local, gerando em suma emprego e renda, assim como amenizar o impacto da retirada desenfreada da madeira em toras, seria:

Art. 14 - As indústrias madeireiras ou empresas desta atividade ficarão proibidas de retirar em sua totalidade a madeira em toras a partir da vigoração desta lei, ficando um percentual a ser beneficiado nos locais apropriados.

Parágrafo Único: No que tange o artigo anterior e para a sua consolidação, as madeireiras deverão instalar instalações (edificações) de beneficiamento na região, ou vender seus excedentes para os proprietários aqui instalados para posterior beneficiamento local.

 

Todavia, quanto a extração da madeira na região do Uruará, o problema paira sobre o processo de extração, transporte e embarque de madeira bruta, isto é, em toras, as quais são uma constante na região e acabam não deixando absolutamente nada como contrapartida à sociedade local. Pois a retirada se baseia na questão legal dos chamados projetos de extração sustentáveis, onde são retiradas apenas as árvores com tamanho, comprimento e diâmetro adequado, assim das espécies permitidas pela lei ambiental. Porém, sabe-se que não é isto que realmente ocorre, pois existem três grandes destaques nesta situação: 1 – as empresas legalizadas se utilizam de documentos legais para invadir outras áreas de concentração de espécies valiosas; 2 – passam a comprar um determinado quantitativo dos chamados “bufeteiros”, que são pequenos madeireiros irregulares que agem paralelamente, os quais vendem a extração e acabam sendo este quantitativo “excedente” inserido dentro daquele legalizado; 3 – neste contexto, não só se vende os tipos de espécies definidas, mas árvores de madeiras nobres que ainda estão em processo de crescimento, dando assim, um prejuízo grandioso e irreversível ao local onde está sendo extraído estas espécies. Levando assim a degradação ambiental e também a inutilização do espaço ou mesmo sendo este utilizado posteriormente para outras atividades predatórias, como a plantação de outras culturas ou a possível utilização do espaço para a implantação de grandes áreas de pastagem à pecuária.

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Dentre as atividades ou produções aqui destacadas e retratadas de forma bem peculiar e com suas características, muitas estão ligadas ao extrativismo animal como a produção da farinha de piracuí, do camarão, a extração e exportação do pescado e a produção do queijo; e outras relacionados ao extrativismo vegetal, como a produção do açaí, da polpa de frutas, da produção nas movelarias/marcenarias, da construção de embarcações em madeira, e, claro da própria extração da madeira para o desdobramento local ou vinculada a retirada e transporte em toras, como também se insere neste meio a produção da farinha de mandioca.

Umas com uma interferência muito grande na economia local, como a extração de madeira, o pescado, a produção e exportação de farinha de peixe (piracuí) dão uma dimensão muito grande quanto a movimentação da economia local; estas claro, somadas a outras atividades como o comércio, aos serviços diversos e aos transportes, inclusive o aquático, quando este último se tornou uma notariedade na região por dois motivos específicos: o intercâmbio comercio e serviços entre os municípios próximos à região; e o segundo fator, relacionado a constituição da geografia, onde a predominância na hidrografia é caracterizada pela presença de rios e áreas de lagos e espaços temporariamente alagados (inverno amazônico), o que possibilita o uso maior e mais constante do transporte aquático feito em barcos, lanchas, ferry boat, canoas, botes, bajaras movidas a moto rabeta.

Todo este dinamismo e as características peculiares da região, tanto da área constituída de terra firma, como àquelas constituídas de terra de várzea, faz a região aqui destacadas neste trabalho como ímpares e propulsoras de outras futuras atividades comerciais que podem dar certo, diante do incentivo através de políticas públicas voltadas para a produção, seja na pecuária, na piscicultura, na agricultura e/ou na fomentação das pequenas fábricas de móveis e embarcações de madeira.

Assim, volto a expressar categoricamente que, a produção do pescado na possibilidade da “piscicultura em áreas de várzeas” com a criação de espécies pesqueiras da Amazônia, em lagos cavados, seria uma atividade promissora do ponto de vista social, cultural, econômico, comercial e ambiental; pois, pela grande área existente de terras baixas, as quais alagam por um período de 6 meses ou mais, traria não só ao município, mas a toda região oeste do Pará uma produção sem precedente, tanto no sentido qualitativo, como no quantitativo. Quando, se destacaria a suprir mercados de toda a região; e o que mais importante, seria anular ou diminuir a pressão feito sobre o meio ambiente natural, que atualmente é depredado através de vários fatores perniciosos utilizados na atividade pesqueira, que vai desde o aumento do número de pescadores, passando pelo desrespeito à época do defeso, até o uso de materiais e equipamentos proibidos  nesta atividade, que entre outros estão, o número inadequado do tamanho da malha, como citado anteriormente ou explosivos nos cardumes.

Entretanto, outras atividades, como a extração da madeira e que é exportada em todas, precisa de uma atenção, apesar de ser atividade que está passivamente vinculada ao movimento comercial local, pouco tem trazido de benefícios à sociedade local, pois, como se sabe a longo prazo, a matéria-prima desta atividade irá ficar cada vez mais escassa, distante e difícil de se restabelecer na natureza, o que trará enormes prejuízos a população q ou aqueles que aqui tem suas atividades relacionadas ao uso da madeira, como as movelarias, serrarias locais, marcenarias, estaleiros e a população que encontrava na madeira uma alternativa mais acessível e menor custo econômico na construção de suas residências.

Dentro de um espaço ou de um futuro não tão distante, se faz necessário que a sociedade local, assim como seus representantes legais, tenham uma postura mais eficiente e coerente quanto algumas problemáticas que poderão surgir quanto as atuais atividades econômicas e produtivas, ou ainda que se tenha uma atitude consistente quanto as grandes e possíveis alternativas e possibilidades que novas atividades possam oferecer de melhor à população de Santa Maria do Uruará, da região ribeirinha ou mesmo a toda margem direita (calha sul) do município de Prainha.

Porém, a população local precisa se ver não mais como um agente receptor ou mediador de alternativas para a produção regional e/ou das atividades desenvolvidas nos diversos campos de produção, mas sim como um povo criativo, fomentador e promotor de alternativas que venham futuramente colaborar com o espaço, em especial à Santa Maria do Uruará, no engrandecimento como sociedade organizada e capaz de atender com proficiência suas necessidades futuras, organizando-se e planejando suas potencialidades produtivas, as que estão em desenvolvimento, as que já são atuantes ou aquelas que poderão ser o sucesso do progresso e desenvolvimento de um povo.

 

GLOSSÁRIO

AIUA – Processo em que os peixes vêm à tona d’água para suprir a falta do oxigênio na época em que as algas se proliferam nas áreas lacustres, o que facilita a sua captura pelos pescadores, sem muito esforços. Tipo de embriaguez dos peixes pela falta de oxigênio na água.

ANINGA – Vegetação que perfaz uma grande parte das áreas lacustres, constituída por um tipo de arbusto que se adapta bem às áreas alagadas, e servem como “boias” às malhadeiras,

ANINGAL – Conjunto de aningas, local onde estas plantas (aningueiras) se concentram, juntamente com samambaias e outros tipos de vegetação características de áreas alagadas.

APÉ – vegetação aquática de tamanho pequeno, a qual muito apreciada na alimentação de suínos criados na região de várzea. Vegetação muito presente em região lacustre, servindo de esconderijo, alimentação aos peixes e dando características ao ambiente aquático por sua beleza.

BAIXÕES DE VÁRZEA – diferentemente das lagos e lagos, geralmente compreende uma faixa de terras baixas entre um teso e outro, onde há concentrações de água, vegetação, e às vezes pescados de pequeno porte, como tamuatá, jiju, traíras, sardinhas, aracus e acarás.

BOBUIAR – sistema de soltura da rede onde uma extremidade é afixada em uma boia maior e indicativa e a outra está nas mãos do pescador dentro de uma embarcação. Sendo que seu deslocamento se dar de acordo com a corrente da água no espaço; processo usado principalmente nos rios.

CANARÃNA – vegetal que cresce às margens dos rios e lagos, a qual possui características urticárias, sendo seu talo contido de pequenos esporos que causam coceira no corpo se não forem retirados das roupas onde se concentram. Muito apreciado por gados criados nas marombas das várzeas.

ESPINHEL – estrutura com linhas e anzóis dispostos distantes uns dos outros, usado para pescar tipos específicos de bagres de águas profundas ou de correntezas como a pirarara, o jandiá, o filhote, surubim, piraíba e outros.

MALHADEIRA – Estrutura feita de linha de nylon ou de linha de algodão e polietileno, com diferentes tipos de malhas de acordo com o cardume, e altura específica a atender as épocas e regiões de pesca.

MANDIORANA – espécie de arbusto característico da área de várzea com caule leitoso, e apresenta lindas flores rosadas. Considerada erva venenosa ao rebanho bovino. No inverno, na sua concentração, ótimo refúgio aos cardumes de pescados.

MARISCAR: atividade de pescador artesanal que envolve a caça e a pesca, principalmente através da salmoura. O mesmo que pescar, mas de forma artesanal.

MAROMBA – construção na várzea sobre a água onde se alocam os animais (porcos, cavalos, bois e outros) na época do inverno. Servindo de abrigo enquanto a água perdura sobre a terra.

MARRETAR – comprar e vender mercadorias. Geralmente se usa para os vendedores que utilizavam barcos a motor para que, andando nas comunidades ribeirinhas, pudessem vender seus produtos aos moradores.

MURERU – planta aquática que serve de esconderijo, alimentação e para ambiente reprodutivo para as diversas espécies de pescados, aves e crustáceos, quelônios e outros animais (insetos).

PIRACAIA – processo rústico onde se faz um fogo à lenha ou carvão com uma grelha improvisada, onde se colocam os acaris ou cascudos, que depois de assados são apreciados, sem muita cerimônia, com farinha de mandioca e tucupi. Podendo ser desenvolvida em qualquer espaço livre, seja embaixo de uma arvore, à beira do lago ou rio, ou ambiente natural que oferece as condições e as matérias-primas possíveis.

POMONGA – vegetação fina, cortante e densa que está presente nas áreas alagadas de várzeas; serve também para a alimentação dos animais retidos nas marombas, na época do inverno amazônico,

PREMEMBECA – vegetação que cresce e se desenvolve às margens dos lagos e rios da Amazônia, a qual pela sua composição como o talo macio, serve de alimento aos peixes herbívoros. Excelente alimentação para a criação de suínos na várzea.

RABO DE RATO -  capim que se desenvolve mais na época do inverno, com muitas flores e bastante água na sua composição; muito usado na criação de gados nas marombas na época do inverno.

REGATÃO – Comerciante que por via fluvial saia vendendo produtos ou trocando por outros produtos advindos da pesca artesanal.

TERROADO – espaço de campo na área de várzea que no verão se caracteriza pelo chão rachado devido a seca por causa da evaporação da água das áreas alagadiças, como os baixões e lagoas, ou mesmo às margens dos rios e igarapés da várzea.

TIRADEIRA – espécie de linha com vários anzóis, disposto um ao lado do outro com variada metragem, a qual está amarrada em uma boia fixa ou vara com identificação na margem do rio.

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

PEREIRA, Maria Helena Guedes. AGRICULTURA FAMILIAR NA COMUNIDADE DE FLORESTA.UCB, - RIO DE JANEIRO - RJ, 2010.

SANTOS, Sydney Pinto dos. (Org.) SANTA MARIA DO URUARÁ - SÍNTESE/RELATÓRIO DO MINI-ESTUDO SÓCIO ECONÔMICO DA VILA DE SANTA MARIA DO URUARÁ E REGIÃO DO URUARÁ - 2015 – 2016. Prainha/PA, 2016

_______; PROPOSTA DE PROJETO DE LEI DE Nº 03 DE 25 DE MAIO DE 2014 – SANTA MARIA DO URUARÁ – PRAINHÁ PARÁ[3]Santa Maria do Uruará, 2019. Disponível em: webartigossydneypintodossantos.

 

 

 

[1] Professor efetivo da rede Pública Municipal de Ensino de Prainha – Pará. Mestrando em Educação (Formação de Professores). – FUNIBER/UNINI

[2] Região de várzea que corresponde à margem direita do Rio Amazonas no Município de Prainha, indo da foz do Rio Guajará até os limites da Comunidade do Ipanema.

[3] Este foi uma proposta de Projeto de lei que deveria ser apresentado à Câmara de vereadores de Prainha, no entanto, o articulador não recebeu resposta da casa, o que desde o ano de 2014, ano de sua elaboração, não se obteve nenhuma resposta plausível; sendo o autor do projeto o professor Sydney Pinto dos Santos, a pedido do vereador Manoel da Cruz Viégas. E que, pela falta de resposta, o autor, fez a divulgação no ano de 2019, para conhecimento da sociedade em geral.