RAPOSA SERRA DO SOL: A QUESTÃO DA SUSPENSÃO DO JULGAMENTO POR MAIORIA DE VOTOS NO MESMO SENTIDO, DIANTE DO PEDIDO DE VISTA IMPEDITIVO DA EXECUÇÃO DA DECISÃO

 

INTRODUÇÃO

 

O presente trabalho focaliza o julgamento ocorrido em 10 de dezembro de 2009, referente à demarcação da reserva indígena Raposo Serra do Sol, ainda não concluído, e os desdobramentos da suspensão da sessão plenária, mesmo diante de oito votos favoráveis à cassação de liminar anteriormente concedida, evidenciando o silêncio da legislação com referência a essa peculiar situação.

 

1 O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

 

1.1 OS PODERES DO ESTADO

 

O artigo 2º da Constituição Federal consagrou o princípio da separação dos Poderes, declarando que os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário são independentes e harmônicos entre si. Tal a importância desse princípio, que o texto constitucional vedou a possibilidade de emenda tendente a abolir a separação dos Poderes (artigo 60, § 3º, da Constituição Federal), agregando-o ao chamado núcleo constitucional intangível.

Decorrem da separação dos Poderes as três funções desempenhadas pelo Estado: legislativa, executiva e jurisdicional.

A função legislativa exsurge da produção legislativa, ou seja, a feitura de leis para disciplinar a vida em sociedade. Somente há obrigação de fazer ou não alguma coisa se houver lei disciplinando a situação[1].

Referida função é chamada de primária porque cria o ordenamento jurídico, enquanto as funções executiva e jurisdicional são secundárias porque estão condicionadas à existência da lei para a sua atuação.

Incumbe, exclusivamente ao Poder Judiciário, a composição dos conflitos de interesses[2]. Referido mister incumbe aos magistrados, os quais possuem prerrogativas e garantias, visando a análise livre e imparcial dos casos a eles submetidos para apreciação.

Se a lei é aplicada ao caso concreto para a satisfação do interesse público, temos a implementação da função executiva. Nesse caso, a lei é aplicada de ofício, sem a necessidade de provocação pela parte interessada. Por sua vez, a função jurisdicional é exercida quando a lei é aplicada para a solução de uma lide – conflito de interesse qualificado por uma pretensão resistida – mediante a iniciativa do legitimado para a propositura da ação. Nesse sentido, a lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (art. 5º, XXXV, da CF).

Enquanto a função legislativa produz normas gerais e abstratas, dirigidas a um número indeterminado de pessoas, a jurisdição aplica a lei aos casos concretos, de forma individualizada[3].

 

1.2 OS ÓRGÃOS QUE INTEGRAM O PODER JUDICIÁRIO

 

Embora a jurisdição seja una, o Poder Judiciário é dividido em vários órgãos para melhor distribuição da justiça.

São órgãos do Poder Judiciário:

 

< >O Supremo Tribunal FederalO Conselho Nacional de Justiça[4]O Superior Tribunal de JustiçaOs Tribunais Regionais Federais e Juízes FederaisOs Tribunais e Juízes do TrabalhoOs Tribunais e Juízes EleitoraisOs Tribunais e Juízes MilitaresOs Tribunais e Juízes dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios 

 

 1.3 O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

 

Incumbe ao Supremo Tribunal a guarda da Constituição Federal. Ensina José Afonso da Silva que a jurisdição constitucional surgiu para a defesa da Constituição, considerada como “expressão de valores sociais e políticos”[5].

Evidencia-se o papel “político-jurídico” da jurisdição constitucional e o desiderato de “conformação política”, nos moldes desenvolvidos pelos demais órgãos de direção política[6].

O sistema de controle da constitucionalidade das leis evoluiu no Brasil do sistema norte-americano (controle difuso) para o sistema misto, agregando o sistema europeu (controle concentrado).

Temos o controle difuso quando a análise da compatibilidade entre as normas infraconstitucionais e a Constituição é executada por qualquer integrante do Poder Judiciário.

Caracteriza-se o controle concentrado pela existência de órgão específico para a verificação da constitucionalidade das leis: Tribunal Superior ou Corte Constitucional.

Nas decisões proferidas, o STF deve pautar-se, considerando a concepção clássica da separação dos Poderes, pela neutralização política. Esclarece Tércio Sampaio Ferraz Jr.:

 

“Neutralizar, portanto, não significava tornar genericamente indiferente, mas gerar uma indiferença controlada, ou seja, estabelecer uma relação em que a indiferença é garantida contra expectativas de influência. A neutralização, nesse sentido, não torna o Judiciário imune, de fato, a pressões de ordem política. Sua neutralização não se dá no âmbito dos fatos, mas no das expectativas institucionalizadas: ainda que, realmente, haja pressões políticas, estas institucionalmente não contam. A independência do juiz, dirá o jurista consciente dessa, exige que a institucionalização ‘crença nela esteja enraizada profundamente na população’ (...). Pois só desse modo a pressão política, como fato, descarta-se como versão ética.” (in Direito Constitucional: liberdade de fumar, privacidade, estado, direitos humanos e outros temas. Barueri, SP: Manole, 2007. p. 403)

 

Adverte, ainda, o jurista:

 

“O Judiciário não concentra a força, mas filtra o seu uso, ao decidir sobre ele. Essa importante conseqüência faz da neutralização, na concepção do Estado de Direito liberal, uma espécie de regulador do uso político da violência. A violência, concretamente, por sua imponderabilidade, pela sua limitação de fato, é sempre abstrata nas mãos do político, que oscila em usá-la demais ou de menos. Ou seja, o político lida mal com o uso da violência ou das medidas de força na sua concretude, o que se faz ver nas dificuldades em que se enredam os parlamentos no julgamento de seus membros ou nos crimes de responsabilidade de autoridades políticas, ou se percebe na politização dos processos judiciais nos regimes autoritários e totalitários. Uma justiça politizada, ao contrário, compartilha da responsabilidade pelos resultados do uso da violência, fazendo do juiz um justiceiro e do processo um movimento na direção dos famigerados tribunais de exceção. Ou seja, a justiça politizada arrisca-se a render-se ao marketing das opiniões, reduzindo o direito a elas, o que funciona bem no Legislativo mas, no Judiciário, torna opaco o uso da força, conduzindo-a à banalidade e à trivialidade do jogo dos interesses.” (in Direito Constitucional: liberdade de fumar, privacidade, estado, direitos humanos e outros temas. Barueri, SP: Manole, 2007. p. 404)

 

No entanto, a passagem do Estado Liberal para o Estado Social ou do Bem-estar Social, significou a mudança de lente para olhar a questão da liberdade. A liberdade negativa resta insuficiente, abrindo-se o cenário para a liberdade positiva, objetivando a consecução da igualdade pelo acesso à cidadania plena[7].

Agrega-se ao judiciário a função de examina se o poder discricionário de legislar está observando o bem-estar social como finalidade a ser atingida pelo Estado. Isso aumenta o espectro de visão do magistrado que considerará as necessidades sociais, considerando o seu âmbito coletivo e, de certa forma, “repolitiza” o Poder Judiciário, ou seja, afasta a sua “neutralização”. Há a expansão da atuação do magistrado, com a superação do binômio certo x errado de acordo com a lei, para adentrar na finalidade a ser atingida pela legislação considerada como base de decisão.

Os Poderes Executivo e Legislativo criam normas, no entanto, não criam direito. Cabe ao Poder Judiciário superar a dicotomia macropoder x micropoder, afastando as influências perpetradas pela “tecnologia do sucesso”, bem como a “transformação do direito em simples e corriqueiro objeto de consumo”[8].

 

1.4 ESCORÇO HISTÓRICO

 

O Supremo Tribunal foi instituído sob a égide da Constituição de 1824 e era formado por dezessete Ministros. Analisava os recursos de revista e julgava eventuais conflitos de jurisdição e ações de natureza penal ajuizadas em face dos detentores de alguns cargos públicos.

Com a Proclamação da República o número de integrantes diminuiu para quinze membros, sendo criado em 28 de fevereiro de 1891, já com feição republicana, pois vigorava a Constituição Provisória de 22 de junho de 1890.

A Constituição Republica de 1891 acrescentou nova característica ao STF, cabendo-lhe a guarda da Constituição e da ordem federativa. Além disso, passou a verificar a compatibilidade das demais normas do ordenamento jurídico com a Constituição, por meio do controle de constitucionalidade.

Ampliou-se ainda a aplicação do “habeas corpus”, utilizável para qualquer ato arbitrário praticado pelo Estado.

Nova redução dos componentes do STF ocorreu após a Revolução de 1930. O Decreto de 3 de fevereiro de 1931 delineou a Corte com onze componentes.

Com o advento da Constituição de 1934 surgiu a representação interventiva, destinada ao controle da constitucionalidade da intervenção federal.

Em 1937 foi outorgada nova Constituição que deveria ser aprovada por plebiscito, o qual nunca ocorreu. O Presidente do STF seria nomeado pelo Presidente da República, procedimento mantido até 1945.

Cessado o período autocrático, foi promulgada a Constituição de 1946 com viés democrático. O Supremo continuou composto por onze Ministros. Como as decisões de inconstitucionalidade de lei proferidas pelo STF não tinham eficácia “erga omnes”, a suspensão da lei eivada do referido vício se dava por atuação do Senado.

Rompeu-se a ordem constitucional em abril de 1964. O golpe militar impôs modificações na Constituição de 1946, com a edição do Ato Institucional nº 01, de 10 de abril de 1964.

A Emenda Constitucional nº 16 de 1965 introduziu o controle abstrato de normas a ser efetuado pelo Supremo Tribunal Federal. O Ato Institucional nº 2, de novembro de 1965, elevou o número de Ministros do STF para dezesseis, suspendendo, outrossim, as garantias da Magistratura.

Nova Constituição foi outorgada em 1967 e AI Nº 5, suspendeu mais uma vez as garantias dos magistrados, derrogadas pela nova Carta Constitucional.

Reduziu-se para onze o número de Ministros em 1969.

A Constituição de 1988 ampliou a competência originária do Tribunal, reduzindo sua competência recursal.

 

1.5 COMPOSIÇÃO ATUAL

 

O STF é composto por onze Ministros, nomeados pelo Presidente da República[9], após aprovação e escolha pelo Senado Federal. São requisitos: ser brasileiro nato, ter mais de trinta e cinco anos e menos de sessenta e cinco anos de idade, possuir notável saber jurídico e reputação ilibada (artigo 101 e seu parágrafo único, da CF)

Os magistrados da Suprema Corte possuem as garantias constantes do artigo 93 da Constituição: irredutibilidade dos vencimentos, vitaliciedade e inamovibilidade.

 

2 A CELERIDADE PROCESSUAL

 

A Emenda Constitucional 45/2004 acrescentou o inciso LXXVIII ao artigo 5º da Constituição, o qual prescreve que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração d o processo e os meios que garantam a celeridade da tramitação”. Tal artigo visa a concretização do acesso à justiça, previsto pelo inciso XXXV, do mesmo artigo. Faz-se, necessário, no entanto, o aprimoramento do aparelho judicial para a realização da função jurisdicional para dar eficácia à mencionada norma.  A concretização do preceito constante da referida norma requer a feitura de legislação, bem como a ampliação de recursos orçamentários para o reforço de recursos humanos, materiais e administrativos para a implementação do texto normativo. Busca-se com a celeridade a efetiva prestação jurisdicional e a conseqüente pacificação dos conflitos sociais. A morosidade na entrega do bem jurídico almejado pelo interessado acaba por gerar injustiças e indevida vantagem para a parte adversa.

O princípio da celeridade ou brevidade processual foi erigido a norma constitucional, protegida pelo artigo 60, § 4º, IV, como cláusula pétrea, não podendo ser excluída por Emenda Constitucional do texto constitucional, constituindo o chamado núcleo constitucional intangível.

 

3 O JULGAMENTO REFERENTE À DEMARCAÇÃO DA RESERVA INDÍGENA RAPOSA SERRA DO SOL

 

3.1 HISTÓRICO

 

A Fundação Nacional do Índio – FUNAI começou em 1992 um relatório visando a demarcação[10] de terras indígenas. No entanto, os rizicultores alegavam possuir títulos de posse de terras localizadas na área a ser demarcada.

O Ministério da Justiça expediu a Portaria nº 534, demarcando de forma contínua a reserva indígena Raposa Serra do Sol, no Estado de Roraima, com a área de 1.747.464 hectares.

Habitavam o local 194 comunidades indígenas, formadas pelos povos Ingaricó, Macuxi, Patamona, Taurepang e Wapichana.

A Portaria foi homologada por decreto presidencial em 15 de abril de 2005. Foi estabelecido o prazo de um ano para a saída dos não-índios do espaço geográfico demarcado.

Contra os referidos atos normativos foram ajuizadas várias ações. Entre elas a PET 3388, de autoria do Senador Augusto Affonso Botelho Neto.

A discussão foi polarizada entre o princípio constitucional da tutela dos índios em face dos princípios constitucionais da legalidade, segurança jurídica, devido processo legal, livre iniciativa, proporcionalidade e princípio federativo.

Outros aspectos considerados foram: o aumento da área originariamente considerada para a demarcação, o impacto negativo à economia do Estado de Roraima, diminuição da oferta de arroz aos Estados vizinhos, a questão da segurança das fronteiras.

A Polícia Federal iniciou em 2008 a retirada dos não-índios da área objeto da ação, todavia, a operação foi suspensa em decorrência de cautelar interposta pelo governo de Roraima (AC 2009), até o julgamento do mérito da ação.

 

3.2 O JULGAMENTO

Em 27 de agosto de 2008, Carlos Ayres Britto, Ministro Relator, votou favoravelmente à demarcação contínua da reserva indígena Raposa Serra do Sol com a cassação da liminar concedida pelo STF na AC 2009, impeditiva da retirada dos não-índios da reserva. O julgamento foi suspenso em decorrência do pedido de vista do Ministro Menezes Direito.

A decisão restou assim lavrada:

 

Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por unanimidade, resolveu questão de ordem, proposta pelo Relator, no sentido de admitir o ingresso na lide do Estado de Roraima e de Lawrence Manly Harte, Olga Silva Fortes, Raimundo de Jesus Cardoso Sobrinho, Ivalcir Centenaro, Nelson Massami Itikawa, Genor Luiz Faccio, Luiz Afonso Faccio, Paulo Cezar Justo Quartiero, Itikawa Indústria e Comércio Ltda., Adolfo Esbell, Domício de Souza Cruz, Ernesto Francisco Hart, Jaqueline Magalhães Lima, e do espólio de Joaquim Ribeiro Peres, na condição de assistentes do autor popular, e da Fundação Nacional do Índio - FUNAI, da Comunidade Indígena Socó e da Comunidade Indígena Barro, Comunidade Indígena Maturuca, Comunidade Indígena Jawari, Comunidade Indígena Tamanduá, Comunidade Indígena Jacarezinho e Comunidade Indígena Manalai, na posição de assistentes da União, todos eles recebendo o processo no estado em que se encontra. Em seguida, após o voto do Relator, julgando improcedente a ação popular, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Menezes Direito. Falaram: pelo assistente Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti, o Dr. Antônio Glaucius de Morais; pelo Estado de Roraima, o Dr. Francisco Rezek; pelos assistentes Lawrence Manly Harte e outros, o Dr. Luiz Valdemar Albrecht; pela União e pela assistente Fundação Nacional do Índio – FUNAI, o Ministro José Antônio Dias Toffoli, Advogado-Geral da União; pela assistente Comunidade Indígena Socó, o Dr. Paulo Machado Guimarães; pelas assistentes Comunidade Indígena Barro e outras, a Dra. Joenia Batista de Carvalho, e pelo Ministério Público Federal, o Dr. Antônio Fernando Barros e Silva de Souza, Procurador-Geral da República. Presidência do Senhor Ministro Gilmar Mendes. Plenário, 27.08.2008.

 

Retomado o julgamento em 10 de dezembro de 2008, o Ministro Menezes Direito concluiu pela demarcação da terra indígena. Entretanto, inovou ao acrescentar no dispositivo dezoito condições a serem observadas para a demarcação[11].

Votaram também os Ministros Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowsky, Eros Grau, Cezar Peluso e Ellen Gracie, todos favoráveis à demarcação.

Suspendeu-se o julgamento com o pedido de vista do Ministro Marco Aurélio, aguardando para votar os Ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes:

 

Após o voto-vista do Senhor Ministro Menezes Direito, que julgava parcialmente procedente a ação para que sejam observadas determinadas condições impostas pela disciplina constitucional ao usufruto dos índios sobre suas terras, nos termos de seu voto, o Tribunal, contra o voto do Senhor Ministro Celso de Mello, deliberou prosseguir no julgamento do processo, tendo em conta o pedido de vista formulado pelo Senhor Ministro Marco Aurélio. Em continuação ao julgamento, após o voto da Senhora Ministra Cármen Lúcia e dos Senhores Ministros Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Cezar Peluso e da Senhora Ministra Ellen Gracie, que julgavam parcialmente procedente a ação popular para que sejam observadas as mesmas condições constantes do voto do Senhor Ministro Menezes Direito, com ressalvas da Ministra Cármen Lúcia, quanto aos itens X, XVII e XVIII, e o voto do Senhor Ministro Joaquim Barbosa, julgando-a improcedente, o Senhor Ministro Carlos Britto (Relator) reajustou o seu voto para também adotar as observações constantes do voto do Senhor Ministro Menezes Direito, com ressalvas em relação ao item IX, para excluir a expressão “em caráter apenas opinativo” e inserir a palavra “usos” antes da expressão “tradições e costumes dos indígenas”, e propôs a cassação da medida cautelar concedida na AC nº 2.009-3/RR, no que foi acompanhado pelos Senhores Ministros Eros Grau, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa, Cezar Peluso, Ellen Gracie e Ricardo Lewandowski. Em seguida, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Marco Aurélio. Ausente, ocasionalmente, na segunda parte da sessão, o Senhor Ministro Celso de Mello. Presidência do Senhor Ministro Gilmar Mendes. Plenário, 10.12.2008.

 

 

 

Com oito votos favoráveis o julgamento foi decidido na sessão do dia 10 de dezembro. Todavia, não houve a finalização da sessão por ausência de três votos, impedindo a formalização da decisão.

Esse fato traz algumas indagações: uma sessão de julgamento, do ponto de vista formal, termina com a manifestação de todos os presentes. Por sua vez, no caso em tela houve a manifestação de oito magistrados, decidindo a lide. É uma situação peculiar, considerando que a causa encontra-se decidida, mas com a eficácia suspensa devido à ausência de votos que não influirão na decisão final; no entanto, agasalha o efeito de procrastinar a execução decidida por ampla maioria, e, por via transversa, mantém os efeitos da liminar concedida, ora cassada pelos demais Ministros. O argumento de que o julgamento não foi concluído, logo a decisão ainda não se encontra configurada, refoge à lógica do sistema, porquanto foram proferido oito votos pela cassação da liminar anteriormente concedida.

O julgamento retornou no 18/03/2009:

 

Decisão: Após o voto-vista do Senhor Ministro Marco Aurélio que, preliminarmente, suscitava a nulidade do processo, tendo em conta a ausência de: 1) - citação das autoridades que editaram a Portaria nº 534/05 e o Decreto de homologação; 2) – citação do Estado de Roraima e dos Municípios de Uiramutã, Pacaraima e Normandia; 3) – intimação do Ministério Público para acompanhar, desde o início, o processo; 4) – citação de todas as etnias indígenas interessadas; 5) – produção de prova pericial e testemunhal e 6) – citação dos detentores de títulos de propriedade consideradas frações da área envolvida, em especial dos autores de ações em curso no Supremo, e que, quanto ao mérito, julgava procedente o pedido, fixando como parâmetros para uma nova ação administrativa demarcatória: a) – audição de todas as comunidades indígenas existentes na área a ser demarcada; b) – audição de posseiros e titulares de domínio consideradas as terras envolvidas; c) – levantamento antropológico e topográfico para definir a posse indígena, tendo como termo inicial a data da promulgação da Constituição Federal, dele participando todos os integrantes do grupo interdisciplinar, que deverão subscrever o laudo a ser confeccionado; d) – em conseqüência da premissa constitucional de se levar em conta a posse indígena, a demarcação deverá se fazer sob tal ângulo, afastada a abrangência que resultou da primeira, ante a indefinição das áreas, ou seja, a forma contínua adotada, com participação do Estado de Roraima bem como dos Municípios de Uiramutã, Pacaraima e Normandia no processo demarcatório, e e) – audição do Conselho de Defesa Nacional quanto às áreas de fronteira; e, após o voto do Senhor Ministro Celso de Mello que julgava parcialmente procedente a ação, o julgamento foi suspenso para continuação na sessão seguinte. Ausente, justificadamente, a Senhora Ministra Ellen Gracie, com voto proferido em assentada anterior. Plenário, 18.03.2009.

 

Suspenso para continuação no dia seguinte – 19/03/2009 – consignou a redação:

 

       Decisão: Suscitada questão de ordem pelo patrono da Comunidade Indígena Socó, no sentido de fazer nova sustentação oral, tendo em vista fatos novos surgidos no julgamento, o Tribunal, por maioria, indeferiu o pedido, vencido o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, vencidos os Senhores Ministros Joaquim Barbosa, que julgava totalmente improcedente a ação, e Marco Aurélio, que suscitara preliminar de nulidade do processo e, no mérito, declarava a ação popular inteiramente procedente, julgou-a o Tribunal parcialmente procedente, nos termos do voto do Relator, reajustado segundo as observações constantes do voto do Senhor Ministro Menezes Direito, declarando constitucional a demarcação contínua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e determinando que sejam observadas as seguintes condições: (i) o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas (art. 231, § 2º, da Constituição Federal) pode ser relativizado sempre que houver, como dispõe o art. 231, § 6º, da Constituição, relevante interesse público da União, na forma de lei complementar; (ii) o usufruto dos índios não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional; (iii) o usufruto dos índios não abrange a pesquisa e lavra das riquezas minerais, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional, assegurando-se-lhes a participação nos resultados da lavra, na forma da lei; (iv) o usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação, devendo, se for o caso, ser obtida a permissão de lavra garimpeira; (v) o usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da política de defesa nacional; a instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico, a critério dos órgãos competentes (Ministério da Defesa e Conselho de Defesa Nacional), serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI; (vi) a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal na área indígena, no âmbito de suas atribuições, fica assegurada e se dará independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI; (vii) o usufruto dos índios não impede a instalação, pela União Federal, de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além das construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União, especialmente os de saúde e educação; (viii) o usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação fica sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade; (ix) o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade responderá pela administração da área da unidade de conservação também afetada pela terra indígena com a participação das comunidades indígenas, que deverão ser ouvidas, levando-se em conta os usos, tradições e costumes dos indígenas, podendo para tanto contar com a consultoria da FUNAI; (x) o trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação nos horários e condições estipulados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade; (xi) devem ser admitidos o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios no restante da área da terra indígena, observadas as condições estabelecidas pela FUNAI; (xii) o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios não pode ser objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza por parte das comunidades indígenas; (xiii) a cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza também não poderá incidir ou ser exigida em troca da utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público, tenham sido excluídos expressamente da homologação, ou não; (xiv) as terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno exercício do usufruto e da posse direta pela comunidade indígena ou pelos índios (art. 231, § 2º, Constituição Federal, c/c art. 18, caput, Lei nº 6.001/1973); (xv) é vedada, nas terras indígenas, a qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas, a prática de caça, pesca ou coleta de frutos, assim como de atividade agropecuária ou extrativa (art. 231, § 2º, Constituição Federal, c/c art. 18, § 1º, Lei nº 6.001/1973); (xvi) as terras sob ocupação e posse dos grupos e das comunidades indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o disposto nos arts. 49, XVI, e 231, § 3º, da CR/88, bem como a renda indígena (art. 43 da Lei nº 6.001/1973), gozam de plena imunidade tributária, não cabendo a cobrança de quaisquer impostos, taxas ou contribuições sobre uns ou outros; (xvii) é vedada a ampliação da terra indígena já demarcada; (xviii) os direitos dos índios relacionados às suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis (art. 231, § 4º, CR/88); e (xix) é assegurada a participação dos entes federados no procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas, encravadas em seus territórios, observada a fase em que se encontrar o procedimento. Vencidos, quanto ao item (xvii), a Senhora Ministra Carmen Lúcia e os Senhores Ministros Eros Grau e Carlos Britto, Relator. Cassada a liminar concedida na Ação Cautelar nº 2.009-3/RR. Quanto à execução da decisão, o Tribunal determinou seu imediato cumprimento, independentemente da publicação, confiando sua supervisão ao eminente Relator, em entendimento com o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, especialmente com seu Presidente. Votou o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, justificadamente, o Senhor Ministro Celso de Mello e a Senhora Ministra Ellen Gracie, que proferiram voto em assentada anterior. Plenário, 19.03.2009.

 

Nova questão de ordem apresentada em 25/09/2009, suscitada questão de ordem pelo patrono da Comunidade Indígena Socó, no sentido de fazer nova sustentação oral, tendo em vista fatos novos surgidos no julgamento, o Tribunal, por maioria, indeferiu o pedido, vencido o Senhor Ministro Joaquim Barbosa.

 

Decisão: Suscitada questão de ordem pelo patrono da Comunidade Indígena Socó, no sentido de fazer nova sustentação oral, tendo em vista fatos novos surgidos no julgamento, o Tribunal, por maioria, indeferiu o pedido, vencido o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, vencidos os Senhores Ministros Joaquim Barbosa, que julgava totalmente improcedente a ação, e Marco Aurélio, que suscitara preliminar de nulidade do processo e, no mérito, declarava a ação popular inteiramente procedente, julgou-a o Tribunal parcialmente procedente, nos termos do voto do Relator, reajustado segundo as observações constantes do voto do Senhor Ministro Menezes Direito, declarando constitucional a demarcação contínua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e determinando que sejam observadas as seguintes condições: (i) o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas (art. 231, § 2º, da Constituição Federal) pode ser relativizado sempre que houver, como dispõe o art. 231, § 6º, da Constituição, relevante interesse público da União, na forma de lei complementar; (ii) o usufruto dos índios não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional; (iii) o usufruto dos índios não abrange a pesquisa e lavra das riquezas minerais, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional, assegurando-se-lhes a participação nos resultados da lavra, na forma da lei; (iv) o usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação, devendo, se for o caso, ser obtida a permissão de lavra garimpeira; (v) o usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da política de defesa nacional; a instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico, a critério dos órgãos competentes (Ministério da Defesa e Conselho de Defesa Nacional), serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI; (vi) a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal na área indígena, no âmbito de suas atribuições, fica assegurada e se dará independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI; (vii) o usufruto dos índios não impede a instalação, pela União Federal, de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além das construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União, especialmente os de saúde e educação; (viii) o usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação fica sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade; (ix) o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade responderá pela administração da área da unidade de conservação também afetada pela terra indígena com a participação das comunidades indígenas, que deverão ser ouvidas, levando-se em conta os usos, tradições e costumes dos indígenas, podendo para tanto contar com a consultoria da FUNAI; (x) o trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação nos horários e condições estipulados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade; (xi) devem ser admitidos o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios no restante da área da terra indígena, observadas as condições estabelecidas pela FUNAI; (xii) o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios não pode ser objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza por parte das comunidades indígenas; (xiii) a cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza também não poderá incidir ou ser exigida em troca da utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público, tenham sido excluídos expressamente da homologação, ou não; (xiv) as terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno exercício do usufruto e da posse direta pela comunidade indígena ou pelos índios (art. 231, § 2º, Constituição Federal, c/c art. 18, caput, Lei nº 6.001/1973); (xv) é vedada, nas terras indígenas, a qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas, a prática de caça, pesca ou coleta de frutos, assim como de atividade agropecuária ou extrativa (art. 231, § 2º, Constituição Federal, c/c art. 18, § 1º, Lei nº 6.001/1973); (xvi) as terras sob ocupação e posse dos grupos e das comunidades indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o disposto nos arts. 49, XVI, e 231, § 3º, da CR/88, bem como a renda indígena (art. 43 da Lei nº 6.001/1973), gozam de plena imunidade tributária, não cabendo a cobrança de quaisquer impostos, taxas ou contribuições sobre uns ou outros; (xvii) é vedada a ampliação da terra indígena já demarcada; (xviii) os direitos dos índios relacionados às suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis (art. 231, § 4º, CR/88); e (xix) é assegurada a participação dos entes federados no procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas, encravadas em seus territórios, observada a fase em que se encontrar o procedimento. Vencidos, quanto ao item (xvii), a Senhora Ministra Carmen Lúcia e os Senhores Ministros Eros Grau e Carlos Britto, Relator. Cassada a liminar concedida na Ação Cautelar nº 2.009-3/RR. Quanto à execução da decisão, o Tribunal determinou seu imediato cumprimento, independentemente da publicação, confiando sua supervisão ao eminente Relator, em entendimento com o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, especialmente com seu Presidente. Votou o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, justificadamente, o Senhor Ministro Celso de Mello e a Senhora Ministra Ellen Gracie, que proferiram voto em assentada anterior. Plenário, 19.03.2009.

 

Em 1º/07/2010 conclui-se o julgamento apresentado nos dias 18 e 19/03/2009, ou seja, mais de um ano após a sessão em que se seu o advento dos debates sobre o tema, apresentado o desfecho:

 

Decisão: Suscitada questão de ordem pelo patrono da Comunidade Indígena Socó, no sentido de fazer nova sustentação oral, tendo em vista fatos novos surgidos no julgamento, o Tribunal, por maioria, indeferiu o pedido, vencido o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, vencidos os Senhores Ministros Joaquim Barbosa, que julgava totalmente improcedente a ação, e Marco Aurélio, que suscitara preliminar de nulidade do processo e, no mérito, declarava a ação popular inteiramente procedente, julgou-a o Tribunal parcialmente procedente, nos termos do voto do Relator, reajustado segundo as observações constantes do voto do Senhor Ministro Menezes Direito, declarando constitucional a demarcação contínua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e determinando que sejam observadas as seguintes condições: (i) o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas (art. 231, § 2º, da Constituição Federal) pode ser relativizado sempre que houver, como dispõe o art. 231, § 6º, da Constituição, relevante interesse público da União, na forma de lei complementar; (ii) o usufruto dos índios não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional; (iii) o usufruto dos índios não abrange a pesquisa e lavra das riquezas minerais, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional, assegurando-se-lhes a participação nos resultados da lavra, na forma da lei; (iv) o usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação, devendo, se for o caso, ser obtida a permissão de lavra garimpeira; (v) o usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da política de defesa nacional; a instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico, a critério dos órgãos competentes (Ministério da Defesa e Conselho de Defesa Nacional), serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI; (vi) a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal na área indígena, no âmbito de suas atribuições, fica assegurada e se dará independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI; (vii) o usufruto dos índios não impede a instalação, pela União Federal, de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além das construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União, especialmente os de saúde e educação; (viii) o usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação fica sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade; (ix) o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade responderá pela administração da área da unidade de conservação também afetada pela terra indígena com a participação das comunidades indígenas, que deverão ser ouvidas, levando-se em conta os usos, tradições e costumes dos indígenas, podendo para tanto contar com a consultoria da FUNAI; (x) o trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação nos horários e condições estipulados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade; (xi) devem ser admitidos o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios no restante da área da terra indígena, observadas as condições estabelecidas pela FUNAI; (xii) o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios não pode ser objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza por parte das comunidades indígenas; (xiii) a cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza também não poderá incidir ou ser exigida em troca da utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público, tenham sido excluídos expressamente da homologação, ou não; (xiv) as terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno exercício do usufruto e da posse direta pela comunidade indígena ou pelos índios (art. 231, § 2º, Constituição Federal, c/c art. 18, caput, Lei nº 6.001/1973); (xv) é vedada, nas terras indígenas, a qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas, a prática de caça, pesca ou coleta de frutos, assim como de atividade agropecuária ou extrativa (art. 231, § 2º, Constituição Federal, c/c art. 18, § 1º, Lei nº 6.001/1973); (xvi) as terras sob ocupação e posse dos grupos e das comunidades indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o disposto nos arts. 49, XVI, e 231, § 3º, da CR/88, bem como a renda indígena (art. 43 da Lei nº 6.001/1973), gozam de plena imunidade tributária, não cabendo a cobrança de quaisquer impostos, taxas ou contribuições sobre uns ou outros; (xvii) é vedada a ampliação da terra indígena já demarcada; (xviii) os direitos dos índios relacionados às suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis (art. 231, § 4º, CR/88); e (xix) é assegurada a participação dos entes federados no procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas, encravadas em seus territórios, observada a fase em que se encontrar o procedimento. Vencidos, quanto ao item (xvii), a Senhora Ministra Carmen Lúcia e os Senhores Ministros Eros Grau e Carlos Britto, Relator. Cassada a liminar concedida na Ação Cautelar nº 2.009-3/RR. Quanto à execução da decisão, o Tribunal determinou seu imediato cumprimento, independentemente da publicação, confiando sua supervisão ao eminente Relator, em entendimento com o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, especialmente com seu Presidente. Votou o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, justificadamente, o Senhor Ministro Celso de Mello e a Senhora Ministra Ellen Gracie, que proferiram voto em assentada anterior. Plenário, 19.03.2009.

 

Destaque-se, ainda, em 23/10/2013, foram apreciados embargos de declaração apresentados, com o desfecho:

 

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, não conheceu dos embargos de declaração opostos por Ação Integralista Brasileira, Movimento Integralista Brasileiro e Anésio de Lara Campos Júnior. Votou o Presidente, Ministro Joaquim Barbosa. Também por unanimidade, desproveu os embargos de declaração opostos por Lawrence Manly Harte e outros, pelo Estado de Roraima e pelo Senador Augusto Affonso Botelho Neto. Votou o Presidente, Ministro Joaquim Barbosa. Quanto aos embargos opostos pelo Senador Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti, em que ficou vencido o Ministro Marco Aurélio, que os acolhia em maior extensão; quanto aos embargos opostos pela Procuradoria-Geral da República, em que ficaram vencidos os Ministros Marco Aurélio e Joaquim Barbosa (Presidente), que os acolhiam com efeitos modificativos, e quanto aos embargos opostos pelas Comunidades Indígenas, o Tribunal os acolheu parcialmente, sem efeitos modificativos, apenas para esclarecer que: a) a decisão proferida na PET 3.388/RR não vincula juízes e tribunais quando do exame de outros processos, relativos a terras indígenas diversas; b) com o trânsito em julgado do acórdão proferido na PET 3.388/RR, todos os processos relacionados à Terra Indígena Raposa Serra do Sol deverão adotar as seguintes premissas como necessárias: (i) são válidos a Portaria/MJ nº 534/2005 e o Decreto Presidencial de 15.4.2005, que demarcaram a área, observadas as condições indicadas no acórdão; e (ii) a caracterização da área como terra indígena, para os fins dos arts. 20, XI, e 231, da Constituição, importa em nela não poderem persistir pretensões possessórias ou dominiais de particulares, salvo no tocante a benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé (CF/88, art. 231, § 6º); c) o usufruto dos índios não lhes confere o direito exclusivo de explorar recursos minerais nas terras indígenas. Para fazê-lo, quais pessoas devem contar com autorização da União, nos termos de lei específica (CF/88, arts. 176, § 1º, e 231, § 3º). De toda forma, não se pode confundir a mineração, como atividade econômica, com as formas tradicionais de extrativismo, praticadas imemorialmente, nas quais a coleta constitui uma expressão cultural ou um elemento do modo de vida de determinadas comunidades indígenas. No primeiro caso, não há como afastarem-se as exigências previstas nos arts. 176, § 1º, e 231, § 3º, da Constituição. Tudo nos termos do voto do Relator, Ministro Roberto Barroso. Quanto à votação dos embargos opostos pelas Comunidades Indígenas, ausentes os Ministros Joaquim Barbosa (Presidente) e Marco Aurélio. Presidiu e votou o Ministro Ricardo Lewandowski (Vice-Presidente). O Tribunal, por unanimidade, resolveu as questões de ordem suscitadas pelo Relator para: a) declarar encerrada a supervisão judicial sobre os atos relacionados ao cumprimento da Portaria/MJ nº 534/2005 e do Decreto Presidencial de 15.4.2005; e b) declarar exaurida a eficácia do acórdão proferido na RCL 3.331/RR, pondo fim à presunção absoluta de competência desta Corte para as causas que versem sobre a referida Terra Indígena, sem prejuízo da possibilidade de que, em cada situação concreta, os interessados demonstrem ser esse o caso. Votou o Ministro Ricardo Lewandowski (Vice-Presidente). Ausentes, ocasionalmente, os Ministros Joaquim Barbosa (Presidente) e Marco Aurélio. Impedido o Ministro Dias Toffoli. Ausente, justificadamente, a Ministra Cármen Lúcia, em viagem oficial para participar do Programa del VI Observatorio Judicial Electoral e do Congresso Internacional de Derecho Electoral, promovidos pela Comissão de Veneza, na Cidade do México.  Plenário, 23.10.2013.

 

Mencionada decisão foi publicada em 04/02/2014.

Em 14/02/2014 foi oposta petição no Supremo Tribunal Federal por LAWRENCE MANLY HARTE E OUTROS e em 16/07/2018 nova petição foi protocolada junto ao mesmo órgão.

No caso em tela, as regras processuais, ou seja, legais, impediram a aplicação de uma decisão irreversível, inicialmente proferida nos referidos autos.

A primeira análise do tema ocorreu em 27/08/2008 e em 16/07/2018 houve a interposição de manifestação. Logo, até a presente data, não houve o trânsito em julgado dessa ação, iniciada há mais de dez anos.

 

4 O PROCESSO COMO INSTRUMENTO DE PACIFICAÇÃO SOCIAL

 

O Estado resolve os conflitos interindividuais objetivando a solução dos conflitos e a pacificação social. Para isso o Estado decide imperativamente e impõe suas decisões.

Nesse sentido:

 

“A pacificação social é o escopo magno da jurisdição e, por conseqüência, de todo o sistema processual (uma vez que todo ele pode ser definido como a disciplina jurídica da jurisdição e seu exercício). É um escopo social, uma vez que se relaciona com o resultado do exercício da jurisdição perante a sociedade e sobre a vida gregária dos seus membros e felicidade pessoal de cada um.”[12]

 

O sistema processual é instituído pela União, como norma nacional, ou seja, com abrangência no território brasileiro, visando apaziguar os inúmeros conflitos que surgem no seio da sociedade.

Atua o direito processual como “instrumento a serviço do direito material”[13], cuja função é possibilitar a plena aplicação das normas jurídicas.

O processo caracteriza-se, entre outros aspectos, por sua instrumentalidade. Assim:

 

“Falar em instrumentalidade do processo, pois, não é falar somente nas suas ligações com a lei material. O Estado é responsável pelo bem-estar social turbado pela existência de conflitos entre pessoas, ele se vale do sistema processual para, eliminando os conflitos, devolver à sociedade a paz desejada. O processo é uma realidade desse mundo social, legitimada por três ordens de objetivos que através dele e mediante o exercício da jurisdição o Estado persegue: sociais, políticos e jurídico. A consciência dos escopos da jurisdição e sobretudo do seu escopo social magno da pacificação social (...) constitui fator importante para a compreensão da instrumentalidade do processo, em sua conceituação e endereçamento social e político.”[14]

 

Outrossim, o processo também possui o aspecto negativo. Ele ocorre quando utilizado como um fim em si mesmo. O processo não deve frustrar ou contrariar a aplicação do direito material. Com efeito, o princípio da instrumentalidade das formas, propugna que somente serão cumpridas as exigências formais do processo, “na medida em que isso seja indispensável para a consecução dos objetivos desejados”[15].

 

5 O REGIMENTO INTERNO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E O PEDIDO DE VISTA

Pelo disposto no artigo 119, § 3º, da Constituição de 1967, o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal possuía força de lei, competindo-lhe estabelecer regras sobre a competência do Pleno e das turmas. Também o Regimento deveria dispor a respeito das regras processuais pertinentes à competência originária e recursal[16].

Tendo em vista que a Constituição atual não permite que o STF edite normas de natureza processual, até que sejam promulgadas novas leis, aplicar-se-á as regras constantes do Regimento Interno, em homenagem ao princípio da continuidade da ordem jurídica. Alguns aspectos processuais foram disciplinados pela Lei nº 8.038/90, subsistindo, todavia, muitas prescrições regimentais.

Determina o artigo 134 do Regimento Interno do STF que se algum dos Ministros pedir vista dos autos, deverá apresentá-los, para prosseguimento da votação, até a segunda sessão ordinária subseqüente.

O § 1º do artigo 134 determina sejam computados os votos já proferidos na continuação do julgamento.

A antecipação do voto vem prevista no artigo 135, § 1º, do Regimento Interno.

A decisão será proclamada pelo Presidente somente no encerramento da votação.

O artigo 134 do RI/STF foi regulamentado pela Resolução nº 278, de 15 de dezembro de 2003, subscrita pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, redigido nos seguintes termos:  

 

Art. 134. Se algum dos Ministros pedir vista dos autos, deverá apresentá-los, para prosseguimento da votação, até a segunda sessão ordinária subsequente.

§ 1º Ao reencetar-se o julgamento, serão computados os votos já proferidos pelos Ministros, ainda que não compareçam ou hajam deixado o exercício do cargo.

§ 2º Não participarão do julgamento os Ministros que não tenham assistido ao relatório ou aos debates, salvo quando se derem por esclarecidos.

§ 3º Se, para o efeito do quorum ou desempate na votação, for necessário o voto de Ministro nas condições do parágrafo anterior, serão renovados o relatório e a sustentação oral, computando-se os votos anteriormente proferidos.

 

 

Dispõe o artigo “caput” do artigo 134 mencionado, que o Ministro ao pedir vista dos autos deverá apresenta-los até a segunda sessão ordinária subsequente.

Nota-se um silêncio sepulcral quanto à situação ocorrida no julgamento da demarcação da Raposa Serra do Sol, decorrente da antecipação dos votos e a configuração fática de oito votos favoráveis à cassação da liminar concedida. Há uma incoerência lógica no desdobramento ocorrido após serem proferidos os votos no mesmo sentido. O contexto apresentado no julgamento demonstrou uma situação peculiar e certo descompasso se considerarmos a execução da decisão e a ausência de apresentação dos votos que não alterarão o desfecho da causa.

Evidencia-se a necessidade de revisão das normas que disciplinam o julgamento para a adequação do procedimento a ser adotado quando delineadas situações em que a causa tenha sido decidida por maioria dos presentes às sessões que irão decidir o processo pautado.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CONCLUSÃO

 

O Supremo Tribunal Federal harmoniza o ordenamento jurídico nacional, mantendo íntegras as normas constantes do texto constitucional. As decisões tomadas possuem cunho jurídico-político, na medida em que a Corte exerce uma face dos Poderes estatais.

Para a declaração e reconhecimento dos direitos materiais tutelados constitucionalmente, vale-se das normas processuais para a execução dos atos necessários para a execução das suas decisões.

Não obstante, as regras procedimentais deverão manter adequada conexão lógica, visando um dos fins do processo, consubstanciado na celeridade e pacificação dos conflitos sociais

A suspensão do julgamento referente à demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol evidenciou um hiato na legislação processual para uma situação esdrúxula apresentada, ou seja, embora tenha ocorrido a manifestação de oito Ministros – dos onze que compõem o órgão – em decisão contrária à liminar anteriormente concedida, um pedido de vista inviabilizou a propogação dos efeitos do julgamento até posterior reapresentação dos autos para a continuação da sessão plenária e finalização do “decisum”, com o acréscimo dos votos faltantes. As regras constantes do Regimento Interno não delimitam um prazo peremptório para o julgamento iniciado, o que pode gerar a morosidade da execução da decisão, embora, no caso em comento, com resultado irreversível. Além da ausência de regulamentação quanto a esta situação, também não há disposição que tenha considerado o fato ocorrido, o que refoge e engessa a prestação jurisdicional plena e eficaz.

Nessa toada, faz-se necessária a revisão da legislação que disciplina os julgamentos no âmbito do Supremo Tribunal Federal para a sua adequação às novas realidades que porventura possam surgir, competindo à União legislar sobre as normas processuais, nos termos do artigo 22, I, da Constituição Federal[17].

Fica como questionamento o desequilíbrio entre os binômios catalisadores do equilíbrio da ordenamento jurídico: justiça x certeza jurídica. Em muitos casos há uma leve prevalência entre esses dois elementos para a concretização das normas jurídicas. No caso, intensifica-se a impotência do arcabouçou jurídico pela ausência de caracterização de quaisquer dos referidos balizadores, caros para a sustentação, efetivação, legitimação e créditos nos parâmetros normativos garantidores de uma sociedade justa, solidária e plural, como exigidos nas normas iniciais constitucionais, pilares de sustentação da República Federativa do Brasil.

 

 

 

 

    

 

REFERÊNCIAS

 

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CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 17. ed. São Paulo: Malheiros. 2001

FERRAZ JR, Tercio Sampaio. Direito Constitucional: liberdade de fumar, privacidade, estado, direitos humanos e outros temas. Barueri, SP: Manole, 2007. p. 405

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.

HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional: A sociedade aberta dos intérpretes da Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Tradução por Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor. 1997.

MENDES, Gilmar Ferreira Mendes. Jurisdição constitucional: o controle abstrato de normas no Brasil e na Alemanha. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 21

MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Tomo II. 3. ed. Coimbra: Coimbra Editora. 1996.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 5. ed. rev. amp. São Paulo: Atlas, 1999.

____________________. Direitos Humanos Fundamentais. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

NERY JR, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. 8. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004.]

PIOVESAN, Flávia. PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e  Direito Constitucional Internacional. São Paulo. Max Limonad, 2006.

SILVA, de Plácido e. Vocabulário Jurídico. 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 31 ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2008. p. 554

 

 

 

[1] Prevê o artigo 5º, inciso II, da Constituição: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”

[2] No Brasil, nem sempre a jurisdição foi monopólio do Poder Judiciário, porquanto durante a monarquia havia a jurisdição eclesiástica, destinada às questões envolvendo direito de família, extinguindo-se com o advento da separação entre Estado e Igreja (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 31 ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2008. p. 554).

[3] cf. SILVA, José Afonso da. op. Cit. p. 554-555.

[4] O Conselho Nacional de Justiça foi acrescentado por meio da  Emenda Constitucional nº 45, de 08 de dezembro de 2004.

[5] SILVA, José Afonso da. Op. Cit. p. 557.

[6] Cf. CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito Constitucional. 7. ed. Coimbra: Livraria Almedina, 1989. p. 681.

[7] FERRAZ JR, Tercio Sampaio. Direito Constitucional: liberdade de fumar, privacidade, estado, direitos humanos e outros temas. Barueri, SP: Manole, 2007. p. 405.

[8] Idem. p. 408.

[9] Foram propostas alterações no processo de nomeação dos Ministros por ocasião da Constituinte de 1988.

[10] Nesse sentido pontua Tércio Sampaio Ferraz Jr.: “A demarcação das terras dos índios é uma competência da União (art. 231 da CF). O ADCT, art. 67, deu-lhe um prazo de cinco anos, a contar da promulgação da Constituição, para concluí-la. Esse prazo é assinalado nas disposições transitórias, representando uma meta a ser cumprida, que, por isso mesmo, não exclui a competência dada no corpo constitucional, e eu é permanente. Ademais, a demarcação não engendra nenhum direito às terras, pois tal direito é declarado originário (antecede à demarcação). Mas tem o sentido de conferir certeza e segurança ao exercício do direito, no que se refere ao seu conteúdo (faculdades) e objeto (terras ocupadas tradicionalmente).

A demarcação é ato administrativo e se refere a bens da União (dos quais as comunidades indígenas têm o direito originário de posse), bens nos quais estão incluídas ‘as terras devolutas destinadas à preservação ambiental’. Ademais, a Constituição fala também em terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras (art. 20, II). Tanto umas como outras, bem como as referentes aos índios (que não são devolutas), são descontínuas. Daí a exigência de demarcação.(...) Feita a demarcação, conforme os critérios constitucionais, as linhas divisórias entre terras devolutas e indígenas estarão traçadas. Daí para frente, um eventual conflito entre exercício da soberania e de direitos originários é outro tema. A própria Constituição, art. 231, § 5º, regula o assunto ao proibir a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, ad referendum do Congresso, em caso de catástrofe ou epidemia que ponham em risco a sua população, ou no interesse da soberania nacional, após deliberação do Congresso. ( in Direito Constitucional: liberdade de fumar, privacidade, estado, direitos humanos e outros temas. Barueri, SP: Manole, 2007. p. 508.)

 

[11] Deverão ser observadas as seguintes determinações:

 

1 – O usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas pode ser suplantado de maneira genérica sempre que houver como dispõe o artigo 231 (parágrafo 6º, da Constituição Federal) o interesse público da União na forma de Lei Complementar;

 

2 – O usufruto dos índios não abrange a exploração de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre da autorização do Congresso Nacional;

 

3 – O usufruto dos índios não abrange a pesquisa e a lavra de recursos naturais, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional;

 

4 – O usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação, dependendo-se o caso, ser obtida a permissão da lavra garimpeira;

 

5 – O usufruto dos índios fica condicionado ao interesse da Política de Defesa Nacional. A instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico a critério dos órgãos competentes (o Ministério da Defesa, o Conselho de Defesa Nacional) serão implementados independentemente de consulta a comunidades indígenas envolvidas e à Funai;

 

6 – A atuação das Forças Armadas da Polícia Federal na área indígena, no âmbito de suas atribuições, fica garantida e se dará independentemente de consulta a comunidades indígenas envolvidas e à Funai;

 

7 – O usufruto dos índios não impede a instalação pela União Federal de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além de construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União, especialmente os de saúde e de educação;

 

8 – O usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação fica restrito ao ingresso, trânsito e permanência, bem como caça, pesca e extrativismo vegetal, tudo nos períodos, temporadas e condições estipuladas pela administração da unidade de conservação, que ficará sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade;

 

9 – O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade responderá pela administração da área de unidade de conservação, também afetada pela terra indígena, com a participação das comunidades indígenas da área, em caráter apenas opinativo, levando em conta as tradições e costumes dos indígenas, podendo, para tanto, contar com a consultoria da Funai;

 

10 – O trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação nos horários e condições estipulados pela administração;

 

11 – Deve ser admitido o ingresso, o trânsito, a permanência de não-índios no restante da área da terra indígena, observadas as condições estabelecidas pela Funai;

 

12 – O ingresso, trânsito e a permanência de não-índios não pode ser objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza por parte das comunidades indígenas;

 

13 – A cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza também não poderá incidir ou ser exigida em troca da utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público tenham sido excluídos expressamente da homologação ou não;

 

14 – As terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico, que restrinja o pleno exercício da posse direta pela comunidade jurídica ou pelos silvícolas;

 

15 – É vedada, nas terras indígenas, qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas a prática da caça, pesca ou coleta de frutas, assim como de atividade agropecuária extrativa;

 

16 - Os bens do patrimônio indígena, isto é, as terras pertencentes ao domínio dos grupos e comunidades indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o disposto no artigo 49, XVI, e 231, parágrafo 3º, da Constituição da República, bem como a renda indígena, gozam de plena isenção tributária, não cabendo a cobrança de quaisquer impostos taxas ou contribuições sobre uns e outros;

 

17 – É vedada a ampliação da terra indígena já demarcada;

 

18 – Os direitos dos índios relacionados as suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis.

 

[12] CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 17. ed. São Paulo: Malheiros. 2001.

[13] Idem. p. 40.

[14] Ibidem. p. 41.

[15] Ibidem. p. 42.

[16] Cf. MENDES, Gilmar Ferreira Mendes. Jurisdição constitucional: o controle abstrato de normas no Brasil e na Alemanha. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 21.

[17] Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:I – direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho