Querer, já é aprender.

Quando temos consciência de que não sabemos, quebramos paradigmas para o aprender. É quem pensa que sabe que não se abre para aprender, perde, portanto, a oportunidade de discutir consigo mesmo, os seus limites e oportunidades. Sabe mais quem pensa que sabe menos e aprende mais quem acredita precisar de muito mais.

Em pleno século da máquina é preciso, ainda, reconhecer que o homem continua no centro do universo, povoando o imaginário de um coletivo, a partir de inventos, experimentos, hipóteses, análise e teses. O aprender continua sendo a grande tarefa do homem que mergulhado na velocidade do tempo ainda é o epicentro de todos os fenômenos sociais. “Não há um só homem de coração bem formado, que não se sinta confrangido ao contemplar o doloroso quadro oferecido e vivido pela atual sociedade, vil e mercantilista...A missão do século XX será colocar o homem no controle de seus saberes...” (Euclides da Cunha in Os Sertões).

Há várias maneiras de se aprender, confusas maneiras de se ensinar. Como fica o aprendiz diante da visível frustração de um sistema educacional que ainda se debate com o efetivo exercício do ensino-aprendizagem? Existem várias maneiras de se aprender, podemos, na prática, aprender com nossos erros, ou teoricamente observando e assimilando os erros dos outros. Mas o princípio de tudo pode estar no reconhecimento de que é preciso aprender o que não sabemos, independente da forma como aprendemos. Há um preço a ser pago, seja pela renúncia de outros valores, seja pela priorização do que realmente é importante, seja pela capacidade de escolher o que precisa ser feito em detrimento ode outras ações. O homem precisa, desde cedo, criar condições de opções, aprender é preciso estar à frente de todas as outras possibilidades.

Muitas vezes, as pessoas são induzidas a determinadas ações que, nem sempre são levadas a sério, por diversos fatores que vão desde à falta de motivação, pelo fato de que pessoas outras não precisaram fazer isso para serem felizes, seja pelo exemplo de quem sugeriu a tarefa. Ler um bom livro, por exemplo: depende de quem indica, que prefacia, quem comenta, quem já leu, com quem a pessoa comenta a leitura, qual o preço do livro, quantas páginas tem, como é o seu formato, encadernação... pouco pesa o que diz o livro, seus objetivos. Numa analogia simples é como se questionar se um copo com água pela metade está maio cheio ou meio vazio. O fato é que ele está meio. Mas o sentimento com relação ao seu conteúdo é que define o seu conceito e envolvimento. Se a pessoa está bastante sedenta vai julgar que o copo está meio vazio, se for orientado para beber água forçado enquanto medicamento, certamente será mais cômodo alegar que o copo está meio cheio. Nas duas situações o copo está meio. Este é o fato.

No campo do ensino-aprendizagem, o fato é indiscutível. O sentimento que envolve o binômio que representa o desafio das sociedades de todos os tempos é precisa ser revisto, redimensionado e posto em prática em terreno fértil, propício ao processo de crescimento.

O fato é que precisa ser localizado o ponto de partida no rol dos interesses de quem pretende aprender, no caso, o aprendente. Se há um ponto que precisa ser determinado, esse ponto é a vontade de. Trata-se de uma decisão solitária e definitiva. É possível que haja várias tentativas e várias desistências; um início e vários recomeços; um avançar e diversos recuos. Mas um ponto-chave na relação entre motivação e aprendizagem existe e precisa ser trabalhado no mesmo ritmo da urgência com que se precisa produzir cada e mais pessoas melhores e mais preparadas.  

Nos nós que fortalecem o caule, uma árvore calca sua resistência. Conforme o aprendizado flui, a vontade de continuar persistindo aumenta, por conta do aprofundamento do assunto, para acelerar o ritmo de apreensão e envolvimento, nada melhor que começar pela leitura de mundo que envolve o fato. Leitura, sim, parece pouco inovador ou quase nada instigante, ler continua sendo a palavra mágica da ação humana. Ler aqui não está sendo tomado ao pé-da-letra, mas indo além do letramento identificando-se com o com compreender, interpretar, modificar, se for o caso, reproduzir de forma ampliada. Esse ponto-chave pode estar no objeto do estudo, no fato observado, na ação julgada. Na medida que o leitor se familiariza com o assunto, a velocidade do aprendizado aumenta, pois ela vai conhecendo a maior parte dos conceitos fundamentais e tendo mais ganchos mentais para encaixar as informações novas, elaborando, a partir daí novas teias e meandros, tecendo um novo conceito do mesmo fato.

Na escola atual, que muito pouco difere da escola do passado, as relações são muito frágeis. A Escola, engessada representa um sistema falido que não tendo o embasamento necessário a um projeto a longo prazo, opta por trabalhar com programas e projetos governamentais muito mais próximos de um modelo que representa o segmento dos gestores distanciam-se do público alvo. O aluno, que mesmo estando no século da máquina, pensa com os limites de uma escola que dá o mínimo do básico, como se de fato, não pretendesse emancipa-lo, reveste a Escola de cotas e concessão para remediar uma situação que chega ao caos. O professor, com uma carga-horária de 60 horas semanais se desdobra mais para ganhar o necessário à sobrevivência da família que à realização do mister de ajudar a formar homens capazes de pensar, crescer, trabalhar, produzir, por um país mais digno, mais seguro, mais feliz.

Como se preparar realizar um trabalho envolvente com o aluno tem sido objeto de grandes preocupações de pessoas que pesquisam, estudam e acompanham o dia-a-dia de uma escola que acredita que o aluno precisa querer. Querer ser, querer ver, querer ouvir, querer aprender. O professor precisa acreditar-se capaz de transformar aulas engessadas, sistemáticas, enfadonhas e maçantes, sem gosto e sem entusiasmo, em atividades que fujam dos padrões impostos e que possam por si mesmas, despertar o interesse do aluno. Mesmo diante da difícil tarefa de apresentar algo tão motivador e instigante quanto os dispositivos eletrônicos, urge que se alcance o coração do aluno com uma proposta de mudança de procedimentos, posturas e paradigmas. Autorregulação, controle de seus atos, domínio de sua vontade, superação dos seus medos, erradicação de suas frustrações, podem representar a curva do aprender, a possibilidade do ensinar e a expectativa da ensinagem.

O aluno vai à escola porque alguém assim impôs. Para fugir do ócio, para fugir das drogas, para fugir das ruas e das más companhias. Para não ficar sozinho em casa, para ter merenda, para garantir o bolsa-família, para ser alguém na vida. Ser alguém. Conceito, por demais vago, quando não há um aprofundamento do que é ser alguém e que alguém se quer ser. Quando nos  perguntamos onde pretendemos chegar, estamos nos propondo a avançar, dialogar no sentido mais amplo da palavra, reconhecemos que esse processo só funciona se estivermos abertos ao novo e não fixados em nossos paradigmas e opiniões, muitas vezes enraizadas e alicerçadas em nossa alma, porém equivocados. Precisamos estabelecer diálogos que nos conduzam ao consenso. E o consensual é o convencional. Os sistemas de ensino sinalizam para conquistas, precisamos captar esses sinais que nos trazem possibilidades de entendimento entre o que se pretende ensinar, verificando sempre o porquê, o quando, o que e como ensinar. Vamos conseguir sim, uma resposta positiva que é o aprender. Ainda que tenhamos de refazer os caminhos de volta.

Façamos como o bambu chinês. Depois de plantada, sua semente passa um longo tempo “sem nascer”. Estaria a semente, biologicamente parada durante esses longos dias? Impossível! Ela está, de fato, crescendo mas para baixo da terra sulcando-a para fincar seus tentáculos, raízes das quais ela irá depender para sustentar sua imponente haste no futuro, pois sabe-se que o bambu chinês em sua vida adulta chega a atingir 30 metros de altura. Somente raízes profundas seriam capazes de sustenta-la. Com o ensino aprendizagem é assim. Ou se prepara o solo, (estado de espírito do aluno) para que ele receba todas e quaisquer informações de forma serena e equilibrada, sem vê-las como tarefa, carga, dever, teste, prova mas sim como uma oportunidade ímpar de abrir caminhos criar trilhas, firmar envolvimento estabelecer rotinas e criar meios de encadeamentos e somatórios que os conduzam a um outro estágio, plano, nível de conceitos, entendimento e aprendizado.

Crescemos enquanto seres humanos através do diálogo franco e aberto. Crescemos enquanto cidadãos através da troca de experiências, da busca e informações que possam contribuir para a melhoria da qualidade de vida em todos os sentidos. Por isso a leitura é caminho para se questionar, se verificar, e refletir, se permitir, se testar e se ver como agente do seu próprio tempo e produtor de sua história. Nesse processo, fazendo com que os outros nos descubram e nos ajudem a descobrirmo-nos mais e mais.

Sebastião Maciel Costa