Edivan Mota[1] e Joacir S. d'Abadia[2]

A obra de Pié-Ninot "Introdução à eclesiologia", no capitulo III aborda a questão eclesiológica da relação de Jesus com a Igreja para se entender de que modo essa tem sua origem em Jesus Cristo. O autor recorre ao tema da Igreja primitiva como norma e fundamento da Igreja de todos os tempos para ratificar a sua explanação. Para tanto buscaremos responder a objeção: quem é o fundador da Igreja?

O tema da formação da Igreja e de sua relação com Jesus é fundamental para a fé cristã.O lugar de tal desenvolvimento se encontra no acontecimento de Pentecostes, como também na função de protagonista dos Apóstolos, especialmente de Pedro, como pioneiro da primeira comunidade cristã, que juntamente com Paulo, missionário dos gentios, se revelam os grandes portadores do desenvolvimento e da formação da Igreja.

Para ser membro dessa primeira comunidade é preciso satisfazer a estas exigências: conversão à fé em Cristo, o batismo, o dom do Espírito de Pentecostes, a Celebração Eucarística, o amor operante e comunitário (cf. At 2, 38. 42-47). Nos próprios Evangelhos, nos relatos sobre Jesus, encontramos muitos elementos da formação da Igreja, como continuidade de sua pregação e missão, especialmente mediante os Apóstolos.

Entretanto, será somente a partir da fase patrística, sobretudo com Santo Inácio, Santos Ireneu, Orígenes, São João Crisóstomo e, especialmente, Santo Ambrósio, que o tema da formação da Igreja se transformará num enfoque teológico de sua fundação, perspectiva que será mantida praticamente até o iluminismo e a disputa modernista do início do século XX. A partir desses grandes Padres, a formação da Igreja é apresentada na imagem mística do nascimento da Igreja do lado ferido do Crucificado.

"A Igreja foi instituída imediata e diretamente pelo próprio Cristo, verdadeiro e histórico, enquanto vivia entre nós" (DS 3540).

Nos números da LG 2-5, se delineia uma visão da instituição da Igreja de um processo, e no último número são empregadas pela primeira e única vez as palavras "fundação" e "fundador".

A ciência canônica usa a expressão "jus divinum" para indicar aqueles elementos básicos provenientes de Jesus Cristo que determina a Igreja de todos os tempos. Essa expressão designa uma realidade de instituição divina positiva, em favor da qual se pode invocar uma referência da Sagrada Escritura.

Santo Tomás de Aquino se situará nessa abordagem de "jus divinum" e esclarecerá que este não suprime o "jus humanum", o "jus Ecclesiasticum" uma vez que o "jus divinum" provenientes da graça não suprime o "jus hunanum" proveniente apenas da razão natural.

Em relação à fundação da Igreja por parte de Jesus, Reimarus (1694-1768) afirma que o objetivo de Jesus não era o de fundar uma Igreja, mas o de restabelecer o reino de Davi na Palestina. E depois da morte de Jesus, e como resultado da frustração dos seus seguidores, expandiu-se a noção de uma Igreja. A partir disso questionamos: Jesus tinha a intenção de fundar a Igreja ou essa foi apenas a consequência inevitável da junção de seus seguidores?

Vários autores negam qualquer forma de Igreja organizada, dentre ele Harnack, Sabatier, Tyrrel, Loisy e Bultmann, no pensamento e na pregação de Jesus, porque a Igreja global surgiu de uma confederação posterior de comunidades locais. Dentre eles destaca-se a famosa expressão de Loisy: "Jesus anunciava o reino, mas o que veio foi a Igreja".

Por outro lado, tem-se uma nova visão de Igreja: "novo consenso". Que define a Igreja como povo de Deus do fim dos tempos, reunida pelo Messias, constituída a partir da morte e ressurreição de Jesus e confirmada pelo dom escatológico do Espírito em Pentecostes.

Depois dessas pesrpectivas, surgem os teólogos católicos propondo a "nova abordagem" no interior da teologia católica. De tal modo, sobressaem dois exegetas, Schnakenburg Vögtle que afirmavam que só se pode falar de Igreja depois da glorificação de Jesus e de Pentecostes. Todavia, eles também destacavam que a manifestação da Igreja depois da Páscoa está em continuidades com Jesus, e chegavam a falar de "ato de Jesus criadores de Igreja".

Em continuidade com as etapas precedentes, surgiu o tema da "eclesiologia implícita" que pode ser considerada uma "nova síntese" exegético-teológica. A "eclesiologia implícita" significa que Deus leva adiante o Reino de Deus iniciado por Jesus e que permanece fiel a "esse" início quando o confia, depois da Páscoa, a uma Igreja, ligada ao mesmo tempo a esse início.

O Concílio Vaticano II foi, todavia, o primeiro concílio a oferecer uma abordagem teológica da relação originária e fundadora de Jesus a respeito da Igreja. A LG 5 está centrada na relação entre Igreja e o Reino de Deus e é aqui que se emprega a palavra "fundação" e "fundador". O mesmo Concílio se situa na linha da reflexão atual sobre os dados do Novo Testamento, a qual evidencia que o que está mais de acordo com este mesmo testamento é a ideia de uma fundação da Igreja durante toda a atividade de Jesus, tanto do Jesus terreno como do Jesus glorificado.

Essa fundação da Igreja deve ser entendida como um processo histórico, isto é, como o devir da Igreja no interior da história da Revelação. Com efeito, é preciso afirmar que Jesus quis fundar a Igreja. Logo, a história do cristianismo fundamenta-se, em última análise, na intenção e na vontade de Jesus de fundar a sua Igreja.

A importância da época apostólica da Igreja primitiva é decisiva para a eclesiologia, devido ao caráter definitivo da Revelação plena que é Jesus Cristo.

Nos evangelhos, o termo "Igreja" aparece apenas duas vezes: Mt 18, 17, que se refere à comunidade local ao tratar da correção fraterna e em MT 16, 18 que recorda que Jesus falou da Igreja em sentido amplo: "sobre esta pedra edificarei a minha Igreja".

Toda essa etapa configura a Igreja primitiva, na sua época apostólica, que pode ser dividida em três períodos: o período apostólico (30-65), o período subapostólico (66-100) e o período pós-apostólico (100-150).

O período apostólico (30-65) que tem como característica principal a koinonia. O modelo de vida dessa comunidade está bem descrita em At 2, 42 e reflete um claro fundo judeu-cristão nos seus quatro aspectos: oração, fração do pão, ensinamento dos Apóstolos e comunhão de bens.

Já no período subapostólico (66-100): o testemunho cristão torna-se menos missionário e móvel e mais pastoral e estável para consolidar as igrejas estabelecidas no período apostólico precedente.

O período pós-apostólico (100-150) caracteriza-se pelas consequências do desaparecimento dos grandes apóstolos, a destruição de Jerusalém e crescente separação do judaísmo. Esses eventos configuraram os elementos básicos da eclesiologia nascente em uma instituição eclesial já regularizada.

Portanto, as características da Igreja primitiva e o fato da Igreja estar relacionada e radicada em Jesus são os dados essenciais para compreendermos que a própria origem, fundação e fundamento da Igreja é Jesus Cristo.



[1] Estudou Filosofia e cursa Teologia no SMAB (Seminário Maior Arquidiocesano de Brasília).

[2] Fez Filosofia e cursa Teologia no SMAB (Seminário Maior Arquidiocesano de Brasília). É autor das obras: "Riqueza da humanidade ligadas ás relações interpessoais" e "Opúsculo do conhecer" (internet). Escreve para jornais de Formosa Goiás e de Brasília.