Resumo

Este trabalho tem o objetivo de analisar a estrutura do Sistema de Saúde pública no Brasil, com relação ao tratamento e o atendimento de pessoas transgêneros e travestis, a partir do primeiro acolhimento, onde a pessoa precisa apresentar um documento de identificação civil, que não condiz com o nome social usado pela pessoa para se identificar na sociedade; o que acaba gerando inúmeros constrangimentos e humilhações e, por consequência, a evasão desse público do sistema de saúde.

PALAVRAS-CHAVE: Nome Social, Transgênero, Política de Saúde, SUS, cidadania

Introdução

As opressões que acontecem a segmentos da população, sempre se fizeram presentes na história da humanidade, e perduram até os dias de hoje, através da exploração e extração da mais valia dos trabalhadores, e perseguições às ditas “minorias” sociais, como as mulheres, negros, indígenas e hoje de uma maneira muito forte, àqueles considerados “diferentes”, que não se enquadram as normas sociais impostas, como os gays, lésbicas e transexuais. Nesse contexto, no século XIX, as lutas de classes, exploravam os menos favorecidos e impunham aos trabalhadores condições precárias, o que se mantém ainda hoje, e está associada à desigualdade social, e é concretamente derivada do sistema que vivemos, por meio da qual os donos do meio de produção (capitalista), retiram do trabalhador (força de trabalho) a mais valia, numa exploração continua do seu trabalho. Assim esse sistema não assegura a grande massa de trabalhadores condições mínimas de sobrevivência, condições econômicas ou igualdade. Se a política social tem relação com a luta de classes, e considerando que o trabalho no Brasil, apesar de importantes momentos de radicalização, esteve atravessado pela marca do escravismo, pela informalidade e pela fragmentação/cooptação, e que as classes dominantes nunca tiveram compromisso democrático e redistributivos, tem-se um cenário complexo para as lutas em defesa dos direitos de cidadania, que envolvem a constituição da política social. É nesse quadro que se deve observar as medidas esparsas e frágeis de proteção social no país até a década de 1930, embora tais características sejam persistentes e nos ajudem a pensar os dias de hoje (BEHRING &BOSCHETTI, 2011, p.79). No Brasil no século passado, os embates se fizeram contra as desigualdades raciais que aconteceram por conta do tráfico de escravos africanos. Ao término da escravidão não houve políticas, nem a intenção de inserir essa grande massa de negros escravos, agora livres, no mercado de trabalho que foram ocupados pelos imigrantes europeus, que eram estimulados a virem para o Brasil, numa política de branqueamento do país. Dessa forma a maioria absoluta de negros ficou relegada a pobreza, a fome, aceitando qualquer subemprego para não morrer de fome; Essa situação trouxe reflexos até os dias de hoje, motivo da grande desigualdade social e racial que se vive no Brasil. Através dos movimentos negros que reivindicavam uma melhoria na situação em que o negro vivia, explorado, marginalizado, discriminado, impedido de viver a sua cidadania, inclusive sendo tratado com violência e preconceito pelo próprio poder público, se pôde aprovar leis que determinam que racismo seja uma contravenção penal. Essa lei Afonso 12 Arinos de 1951 acaba com o mito da democracia racial no Brasil, que impedia o debate sobre racismo, trazendo à discussão as diversas formas de preconceito existentes no Brasil. Em 1988 com a Constituição Federal, e ainda mediante as lutas dos movimentos negros, essa lei foi substituída por uma lei mais dura, que transformou em crime o que era apenas contravenção penal. Esta conquista pôde ser articulada, devido a diversas denúncias de racismo contra a população negra, em diversos lugares do país; nas favelas com a violência policial, nos lugares comuns, com a percepção da diferença de tratamento nos atendimentos, nas ofertas de emprego, no número de negros em cargos públicos ou de chefia, na entrada nas universidades públicas, entre tantas outras situações discriminatórias. Também através de lutas, temos visto o direito das mulheres serem reconhecidos, situação que durante os séculos passados não haveria possibilidade de acontecer. No século XIX no Brasil surge a primeira lei que permitia que as mulheres frequentassem a educação elementar, o que até então era proibido, ou seja, as mulheres não podiam estudar, e apesar do avanço dessa Lei, continuavam proibidas de frequentar o nível superior. Ainda no Brasil, Nísia Floresta defendia mais educação para as mulheres, e escreve o livro Direito das Mulheres e Injustiça dos Homens, uma tradução de um livro inglês, trazendo uma nova reflexão sobre a realidade brasileira. Nos anos 1980 devido às lutas das feministas surgem os primeiros conselhos estaduais da condição feminina que traçam políticas públicas para as mulheres; na saúde o Ministério da Saúde cria programas de Atenção Integral a Saúde da Mulher, em resposta a forte mobilização desses movimentos. A primeira delegacia de Atendimento Especializado a Mulher é inaugurada e um projeto de lei cria o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher. Na assembleia geral das Nações Unidas, em 1979 os direitos das mulheres e a violência de gênero recebem destaque, gerando com isso a Declaração sobre a eliminação da violência contra a mulher. Ainda hoje essa luta por respeito continua, e apesar de se ter obtido algumas vitórias, muitas mulheres ainda são vítimas de violência, por conta do machismo que ainda impera na sociedade. Apesar de todos os avanços mencionados, de acordo com dados do IPEA, entre 2009 e 2011, no Brasil, foram registrados 16.900 assassinatos de mulheres ocasionados por discriminação de gênero, cujo agressor era o próprio parceiro íntimo da vítima, cerca de 5.630 mortes por ano (GARCIA, 2013). Só no ano de 2013, ainda de acordo com o IPEA, mais de 50.300 casos de estupros foram denunciados, mas a estimativa é que anualmente ocorrem 527 13 mil estupros no Brasil, mas apenas 10% são reportados a polícia (CERQUEIRA & COELHO, 2014). A comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais) que desde tempos imemoriáveis sofreram discriminação ao longo da história, foi nesses últimos anos, atacada com uma agressividade e violência tão grande, que fez com que seus militantes percebendo a barbárie a que estavam sujeitos, discriminados, excluídos, violentados, espancados e mortos, e ainda vendo seus direitos mais elementares serem tirados, perceberam a necessidade de mobilizarem a sociedade e elegerem parlamentares comprometidos com a causa para que se formulasse leis, em defesa dessa comunidade. A homossexualidade foi tratada desde outros séculos com desprezo e desrespeito. Os corpos seriam estudados como feminino e masculino e a heterossexualidade era vista como única prática sexual “normal”. Assim a homossexualidade era vista como doença ou disfunção psíquica ou ainda desequilíbrio hormonais, bem como a transexualidade (UNASUS, 2015). Alguns membros da comunidade LGBT, ao longo dos anos uniram-se em prol de diversas lutas para sua emancipação, e ainda hoje encontram resistência e dificuldade para que as conquistas obtidas ao longo desses anos sejam efetivadas na prática, o desrespeito a essa população se tornou generalizado e os ataques violentos a sua integridade física, tem levado a insegurança e a morte de muitos. O nome social é uma conquista que ainda hoje não é efetivada ou acolhida em vários espaços públicos e privados, devido à falta de capacitação dos profissionais e desconhecimento das leis que asseguram essa conquista. Desde 2009 já existem decretos locais e portarias federais dentro do âmbito da saúde, regulamentando o nome social. No ano de 2016, a Presidente Dilma assinou o decreto de número 8.727/2016 que dispõe sobre o nome social nos órgãos do poder público, ministérios, autarquias, empresas estatais, instituições de ensino e no Sistema Único de Saúde. Assim, torna-se pertinente o debate sobre gênero e sexualidade nos diversos ambientes de educação, da política, da religião e da saúde. Nesse sentido, pode-se desmistificar todo preconceito que se faz presente nessas áreas, que impedem que a grande maioria da população LGBT tenha a possibilidade de concluir seus estudos inserindo-se no mercado de trabalho, de terem oportunidades e de utilizarem lugares públicos sem se sentirem marginalizados, desrespeitados, humilhados e sem sofrerem violência física e psíquica. É necessário que estes consigam atendimentos nas unidades de saúde, com qualidade e respeito a sua identidade e ao 14 nome social. Assim, o debate irá oferecer a oportunidade de vida, pois estes estão sendo mortos pela falta de saúde, de acolhimento, por falta de trabalho, de oportunidades, mas também estão morrendo pela discriminação e violência que sofrem todos os dias, inclusive sendo assassinados. [...]