Prova de Matemática

Eu não podia acreditar que já era o dia da prova de matemática. Não era justo. Tive muito pouco tempo para estudar. Uma semana passou muito rápido.

Eu tentei entender as fórmulas e os macetes que o professor tentou nos ensinar, mas eu simplesmente não consegui entender nada. Aquilo era estranho demais pra mim. Antes tentasse nos ensinar grego, que eu acho que entenderia mais rápido.

Afinal de contas, quem é que inventou aquelas fórmulas complicadas, hein?

Não é possível que alguém tenha gastado tanto tempo de sua vida naquilo, gente.

Às vezes, eu sinto a impressão de que essa pessoa teve algum trauma na infância e, para se vingar, resolveu traumatizar todos os adolescentes que nascessem depois dele criando essas fórmulas alienígenas. Ou então ele pretendia ser lembrado eternamente como o cara que deu um nó na cabeça dos jovens depois dele. Aliás, será que ele recebeu alguma homenagem por nos deixar tão medonha tarefa? Será que há algum busto dele por aí?

Acho que não. Matemática não dá fama. Nenhum matemático ficou famoso só pela matemática. Pitágoras, Arquimedes, Euclides, Descartes... Todos eles ficaram conhecidos como matemáticos e filósofos ou engenheiros. Eu nunca ouvi falar de alguém que tenha sido conhecido apenas como matemático e tenha sido admirado por isso.

Também. Inventaram cada nome estranho que só vendo. Hipotenusa, cateto, vértice, tangente, cosseno, cossecante... É tanta palavra estranha que parece ser outra língua. Ninguém me tira da cabeça que foi uma tentativa de ficarem famosos.

Tá legal. Alguém vai lembrar o matemático Oswaldo de Souza, que todo tempo era chamado naquele programa de televisão para dizer as probabilidades de alguém ganhar na loteria, quanto seria o prêmio para os ganhadores ou calcular as chances de um time ser campeão ou de ser rebaixado no campeonato brasileiro. E daí? Ele foi alguma vez entrevistado para outra coisa? Alguém perguntou a ele como ele começou sua carreira, por exemplo? Alguém o entrevistou para lhe perguntar sobre sua família ou qual sua comida preferida? Quem quer saber como é a vida de um matemático? E o Malba Tahan, que escreveu “O homem que calculava”? Teve que usar um pseudônimo para escrever seus livros sobre matemática. Acho que era para se safar da vergonha caso os livros fossem um fracasso de vendas.

É sério. Por que é que eu tinha que enfrentar esse stress, pessoal? Eu tenho apenas 15 anos! É bom que alguém pesquise até que ponto a matemática não é responsável pela baixa autoestima do jovem.

Será que não é a obrigatoriedade da matemática na escola, e pior, com mais aulas que as outras disciplinas, a responsável por tantos casos de depressão, apatia, desinteresse pelos estudos, complexo de inferioridade e sentimento de fracasso entre os jovens de hoje? Sei não. Acho melhor a gente repensar isso, senão podemos criar uma geração de jovens frustrados que não vão querer ouvir falar em matemática por nada desse mundo.

Bem, isso é uma opinião e é claro que não tinha nada a ver com o meu desespero de ter prova em alguns minutos e não ter a menor ideia do que fazer na prova.

Mas, raciocina comigo: que custa tentar tirar essa disciplina da grade curricular? Vamos ver no que vai dar, ora.

Tudo bem, é uma teoria, mas acredito que a maioria dos jovens do mundo não acharia ruim, não. E isso já é um bom motivo para tentar. Afinal de contas, jovem feliz estuda mais feliz.

Eu acho que tudo começou quando eu tinha uns cinco anos. Minha mãe mandou comprar pão e eu trouxe o troco errado. Levei um cascudo. Não era melhor reclamar com o padeiro, que errou o troco?

Noutra vez, meu pai me mandou acordá-lo às 16 horas. Quando eu reparei que no relógio só aparecia até 12 horas, eu fiquei maluquinho e não sabia se deveria acordá-lo às 12 horas ou esperava dar 6 horas da tarde, que, pelo menos – raciocinei eu – termina em 6. Não querendo chamá-lo muito cedo, resolvi seguir a segunda alternativa e levei uma grande bronca. “Tu não sabes contar no relógio, menino!?”, esbravejou.

Aí essa frase me marcou: “Tu não sabes contar?”. Pelo jeito, até hoje não.

Ao chegar à sala de aula, parecia que ia ter um ataque de nervos. E o pior era ver a cara de tranquilidade dos outros alunos. Será possível que só eu estivesse sentindo esse pré-infarto? Só eu é que não entendera a matéria e sofreria sozinho o infortúnio dos estudantes? Seria o único a provar do veneno da serpente rastejante da matemática?

Já sei! Tive uma ideia brilhante! Fingiria que estava com uma baita dor de barriga. Que não conseguiria nem respirar direito. Um espirro, então, seria fatal. Não conseguiria nem começar a prova. O nervosismo aumentaria a dor e o risco de não acabar bem.

Assim, eu estaria dispensado da prova e teria, sei lá, mais dois ou três dias para me preparar mais.

Peraí, será que isso não aumentaria ainda mais a minha tensão e nervosismo?

E se, no dia da prova, me desse dor de barriga de verdade? Será que dessa vez me dariam mais uma chance? Ou eu perderia de vez a prova de matemática? Isso me faria perder muitos pontos. Fazendo a prova, pelo menos eu poderia tentar acertar alguma coisa na sorte. Escolheria uma alternativa. Se tivesse dúvida em duas, tiraria cara e coroa. Mas se eu perdesse a prova, aí não teria nenhuma chance de pelo menos arriscar alguma.

Achei melhor deletar essa ideia e começar a orar mesmo, que o negócio estava ficando cada vez mais sério.

Quase desmaiando de medo e tensão, vi um colega de sala se aproximar de mim, como que para dar o primeiro golpe na minha triste condição psicológica e física, ele me olhou nos olhos e me perguntou:

― Com licença, Marcelo. Você está bem?

― Como poderia estar bem? Hoje é o meu fim. Meus últimos suspiros. Como poderia fazer essa prova de matemática se eu não entendi nada do que o professor ensinou?

― Mas você não sabia que a prova hoje é de História?