Data: 28.01.98, horário: 09:10 horas, “O Poço”:

Estava na “sala de reuniões” (Delegacia-Geral da Polícia Civil) e como precisei usar o “telefone vermelho” para fazer alguns contatos,  me dirigi até o andar térreo, onde encontrei Osnelito lendo as notícias dos jornais em sua mesa:

  • Osnelito e a Guinevere, onde é que ela anda?
  • Quem?
  • A Guinevere?

Até então “Lito” não tinha entendido nada, na verdade dei um nó nele porque nunca tinha utilizado esse nome para “Rosângela”. Mas pudera, tinha feito aquela provocação propositalmente, mas não é que ele me surpreendeu:

  • Ah, sim, ela foi embora, já faz dias, nem sei prá aonde.
  • O apelido dela é Guinevere, não sei se tu sabias?
  • Não...! Telefonaram lá do gabinete me convidando para ir a solenidade de colocação do retrato da Secretária na Galeria e sabe o que eu disse? “por  mim vocês podem colocar esse retrato num poço”.

Como messe momento estava tentando completar uma ligação, fiz um gesto para que Osnelito completasse:

  • Poço do quê?
  • É bem isso, num poço de m.!
  • Poço de m.?
  • Eu falei bem isso, semana passada eles me convidaram para ir a inauguração da Delegacia de São José, ora se eu iria, fazer sala para Lúcia, Lourival, eles colocaram todos os p. d. na P. C. e para mim o que sobrou? Não! Não sei ser falso, não gosto de falsidade, cambada de s. v., s...
  • É Osnelito, ainda bem que nenhum parente meu entrou na Polícia nos últimos vinte anos, nem o meu irmão para Médico Legista, ele continua sendo Técnico em Necrópsia, acabou se prejudicando por minha causa...
  • Sim, é por isso que eu falo essas coisas para ti, por que sei que tu tens moral e o teu irmão não passou porque eles têm medo, ele pode assumir a Diretoria de Polícia Técnica e já vistes?
  • Não! Meu irmão não iria aceitar ser Diretor..., reprovaram ele no concurso por minha causa, foi para me atingir, coisa da greve dos Peritos e meu irmão aqui resolveu assinar uns laudos urgentes e acabou sendo queimado pelos médicos legistas lá que estavam em greve, foi na época do Jorge Xavier, mas isso é outra história...
  • Outra merda que eu não vou apertar a mão é desta aí em cima...
  • Tu tá falando aqui do prédio?
  • Sim, é bem aqui...

(...)”.

“O Ovelha”:

E consegui, enfim fazer um contato com “Marquinhos” que naquele final de semana não estava trabalhando:

  • Alô!
  • Oi.
  • Quem fala?
  • É o Marcos.
  • Marcos, você está sendo procurado.
  • O quê? Procurado? É o Felipe.
  • Como é que tu sabes?
  • Conheço pela voz.
  • Puxa, quer dizer que a minha voz é fácil.
  • Sim, o pessoal quer saber se a festa vai ser mesmo na quarta-feira?
  • Eu estou telefonando exatamente para isso, vamos fazer a festa na quarta-feira, tens alguma sugestão?
  • Ah, meu Deus, eu não aguento mais comida, acho que a gente podia fazer uma ovelha, o que acha?

Não pude conter a minha surpresa pois “Marquinhos” além de ser inspirado e um excelente cozinheiro, também sabia surpreender e me virei para o Osnelito e exclamei:

  • Osnelito, o “Marquinhos” quer comer ovelha

E Marcos ouvindo meu comentário, intercedeu do outro lado da linha:

  • Olha, eu não sou ovelha não,  não tenho lã!

Esse é o estilo “Marquinhos”, sempre pronto para brincar, especialmente, quando se tratava de qualquer assunto picante:

  • Pode ser ovelha! (lançou Osnelito com um sorriso bem malicioso)

Continuei a conversa com “Marquinhos”:

  • Marquinhos, está bom, pode ser.
  • Escuta, quantas pessoas vão?
  • Umas vinte,. deixa que a cerveja fica por minha conta,  cada um ajuda com uns cinco reais.
  • Eu tenho conta lá no Mercado.
  • Bom, amanhã eu dou uma chegada aí na tua casa entre treze e quatorze horas, tu me aguardas.

(...)

“Moreto Minado?”

E, em seguida liguei para o Mário Martins e fui informado que estava no terreno da BR 101 (imóvel repassado por meio de contrato de comodato entre  Governo e Adpesc), em cujo imóvel estavam construindo alguma coisa:

  • Alô!
  • Mário, é o Felipe.
  • Fala Felipe. Eu pedi para a secretária te ligar hoje de manhã, ela te ligou?
  • Não. Pedistes para ela ligar?
  • Sim. Aquele negócio acabou não dando certo e abriu uma brecha, acho bom tu fazeres contatos.
  • Mas que negócio Mário, eu não estou entendendo?
  • O Moretto, parece que ele não vai mais ser o Delegado-Geral e acho bom tu fazeres algum contato, eu acho que aquele nosso trabalho deu certo,  surtiu efeito.
  • Tu estais me dizendo que o Moretto não vai ser mais o Delegado-Geral?
  • Sim.
  • Quer dizer que minaram ele?
  • Por quê “minaram”?
  • Não. Eu quis dizer que está minada a nomeação dele.
  • Sim. Podes anotar isso “o Moretto não vai mais ser o Delegado-Geral” e acho bom tu fazeres algum contato.
  • Mas Mário eu não estou pleiteando o cargo.
  • Não Felipe! Acho que tu tens que pensar seriamente nisso, já te falei!
  • Quem está querendo é o Braga.
  • Bom, tu já sabes.
  • Tudo bem, mas Mário mudando de ares, escuta quando é que nós poderemos fazer aquele contato com o Kuster?
  • Ah, sim, ainda esta semana, deixa que amanhã eu tento falar com ele, marco um horário e nós vamos lá.
  • Bom, tu podes marcar a qualquer hora que eu estarei a tua disposição. Certo?
  • Certo.
  • Então aguardo o teu contato.
  • Tá bom Felipe.

E depois que encerrei a ligação: ...

  • Que bom! (Osnelito)
  • Por quê?
  • Tanto este que está atualmente como ele não fizeram nada, isso aqui ficou uma bagunça, sabe prá que o Moretto servia e nisso ele atuou muito bem?
  • Não?
  • Para representar a Polícia Civil no Mercosul, no Codesul, isso ele soube fazer bem, eu pude ver lá na Polícia Militar.

(...)

E antes que deixasse a sala do “telefone vermelho” olhei do outro lado e percebi a presença da Escrevente Policial Ledanir verificando uns Diários Oficiais. Em razão disso perguntei para Osnelito:

  • Puxa, quem diria a Ledanir trabalhando, heim?
  • O quê? Ela que se cuide, pediu para sair daqui, foi lá para o primeiro “DP” e saiu porque não se adaptou, depois foi para a Identificação e saiu porque também não se adaptou, voltou para cá e eu tive uma conversa muito séria com ela: “Minha filha, aqui é o seguinte, se tu não te adaptares só tens um caminho, tu vais ser apresentada na Corregedoria, vais responder sindicância e vais para rua, a decisão é tua”.
  • Sei lá Osnelito, quem somos nós para julgarmos quem?

(...)”.

E fui deixando a sala de Osnelito recordando da época que ele trabalhava comigo na “Assistência Jurídica”, quanto eu me esforcei para ajudá-lo a se adaptar aos serviços, quanto tempo em vão, quantas faltas, chegadas tardias...  E agora estava ele na condição de “Gerente” de Fiscalização de Jogos e Diversões da Polícia Civil, com as baterias carregadas, pronto para fazer justiça com uma pobre funcionária subalterna...numa instituição cheia de problemas.