Data: 05.05. 99, horário: 09:10 horas, “Reunião do Conselho”:

Horário: 19:45 horas - “A reunião do Grupo”:

Cheguei no Restaurante Candeias e tudo estava deserto, certamente que o local não era mais o mesmo, desde aquele rombo causado por um dos sócios empregados e Jorge e “Cesinha” agora eram quem tocavam tudo, o “buffet” da noite havia sido retirado, passou a ser a “la carte” e, pensei: “mudou o tempo das vacas gordas”. Não havia uma única alma viva, minto, somente eu e os garçons. Comecei a imaginar como seriam os momentos seguintes. Pedi uma “coca diet” e um queijo provolone à milanesa, ficando na frente da televisão assistindo não sei o quê? Os pensamentos vinham com muita força, bem mais do tudo a minha volta, mas esforçava-me para mostrar tranquilidade e saber esperar o pessoal chegar. 

Horário: 20:05 horas – “O alívio”:

Ouvi vozes do lado de fora como estava sentado de costas para o “buffet” não conseguia saber se eram clientes ou se um bom prenúncio. Afinal, era Braga e Krieger que haviam chegado para nosso encontro. Logo que Braga me viu sentado teve uma espécie de alívio também, podia até imaginar, mas menos aliviado estava eu que teria de explicar o inexplicável:

  • Nós estávamos ali fora aguardando, não sabíamos que tu já estavas aqui sentado. (Braga)
  • Eu cheguei bem mais cedo e já vim tomar algo que estava com sede. (Felipe)

(...)”.

“Sob o signo do Rei Sol”:

Aquela altura já confirmava aquilo que meus pressentimentos sinalizavam,  era só nós e um deserto. O restaurante continuava vazio, bem diferente de anteriormente quando havia sempre um bom movimento. Até nós do grupo, além dos Deputados Gilmar Knaesel e Julio Teixeira, vivemos bons momentos naquele lugar. E agora os tempos pareciam outros...

Apesar de tudo, me sintia como uma fortaleza, feliz porque parecia estar preparado para tudo aquilo, lembrei até daquela canção popular: “.. levanta, sacode a poeira e da volta por cima...”, mas afinal como sacudir tanta poeira, com grandeza, generosidade, tolerância?

Procurando dar uma agora de “João Sem Braço”, pedi ao garçom que ligasse para a residência do doutor Jorge e perguntasse a ele se já estava a caminho?

E, em seguida o Garçom retornou a nossa mesa:

  • O doutor Jorge está lhe chamando ao telefone.
  • Ah, sim, obrigado. (Felipe)

Em segundos estava lá com o aparelho e naqueles passos rápidos tinha acumulado muitas contingências:

  • Alô!
  • Felipe vocês já estão aí reunidos, eu falei com o garçom para dar um atendimento especial, um atendimento da casa.
  • Sim, e daí?
  • Quem é que veio?
  • O Braga e o Krieger, não sei se o restante do pessoal vem, falei com a mulher do Garcez, sabe como é, o Cláudio não sei..., o Wilmar também.
  • O Krieger não pode falar nada porque no último encontro ele também não veio, até que horas nós ficamos esperando por ele, lembras?
  • Mas parece que ele tinha compromissos na universidade Jorge.
  • Compromissos o quê? Ficamos esperando por ele até tarde.
  • Pois é.
  • Eu estou com um problema, a Leninha está com febre e de cama e não poderei ir, mas vocês vão tocando, já falei com o garçom para dar um atendimento padrão para vocês, pedi que fizesse aquele picadinho de carne e salada.
  • Não precisa Jorge, eu acho que o pessoal nem vai querer jantar, vão ficar só no aperitivo  mesmo.

(...)

E me despedi de Jorge Xavier meio que decepcionado, mas procurando deixar transparecer que estava tudo mais que normal...:

Retornando à mesa esclareci aos dois companheiros as razões de Jorge Xavier não ter aparecido e assumi sozinho todo o desgaste com o que estava acontecendo, especialmente, no que diz respeito à Braga que estava tendo a primeira impressão e certamente era a que ficava, talvez para sempre, e que muitas vezes não dava mais para apagar.

Horário: 21:00 horas -  “Carvalhismo à prova de fogo”:

Aproveitei para dirigir minha atenção a Krieger, a fim de saber o que aconteceu no gabinete do Secretário, sobre a sua breve passagem e, também, obter informações acerca de Carvalho, quando surgiram muitas pérolas dignas de registro:

“(...)

“Mas krieger, como é que tu poderias descrever o Carvalho, considerando o pouco tempo de convivência com ele lá?’ (Felipe)

“...Um ‘maq.’ , ‘man.’ de p....! (Krieger)

“...’Maq.’ e ‘man.’  de p. ? Sim, vamos ver se eu estou certo, tu falastes com o teu tio Arcebispo e fostes lá para o gabinete, certo? O teu objetivo era a Academia, mas ficasses prestando assessoria para ele que foi deixando a corda solta para ti... e você com aquele discurso de mestrado, Inglaterra, doutorado, professor, piloto de helicóptero... e ele foi deixando, até que o discurso se esgotou e ele te mandou andar, será que está certa a minha lógica?” (Felipe)

“Foi bem isso Felipe, não que eu quisesse a direção da Academia, eu sempre sonhei em trabalhar lá, enquanto estive na Inglaterra fazendo o meu curso havia pessoas de várias partes do mundo, os problemas eram muito parecidos na nossa área, nós conversávamos muito, fiz boas amizades e quando voltaram todos foram para a Academia, menos eu, sabe, então eu achava que o meu destino era esse...” (Krieger)

“Sim, entendi, mas essa tua ida lá para a Sétima Delegacia de Canasvieiras, como foi isso....?” (Felipe)

“Em determinando momento eu senti que o Secretário me detestava, não podia me ver mais, eu chegava e sentia nele uma repulsa muito grande e num determinado dia estava ele e o Maurício Eskudlark  e mandaram me chamar,  e ele simplesmente disse que iria trabalhar na Sétima Delegacia, foi isso, mas cara bacana esse Eskudlark, né?” (Krieger)

“Pera aí, então vamos ver se eu entendi, o Carvalho quer uma polícia operacional, quer Delegados que saiam por aí subindo morros, prendendo bandidos, mostrando serviço na mídia, para que haja espaços para sua gestão  todo dia, só que isso esbarra justamente na nossa pretensão de termos também Delegados que ficam estudando, se aperfeiçoando, fazendo mestrado, doutorado... E, justamente tu espelhavas essa visão, aquilo que talvez ele não quisesse pensar para o nosso pessoal, não interessava para ele esse perfil de Delegados como o pessoal do Ministério Público faziam com os Oficiais da PM. E quando tu vinhas com aquele discurso de mestrado, doutorado na Inglaterra, piloto de helicóptero ele que não tem nada disso na verdade ficava com raiva porque para ele nós tínhamos que ser apenas operacionais e com uma formação voltada só para isso, especialmente, em se tratando de Delegados...?” (Felipe)

“Sim. No final o Secretário não podia nem mais me ver e é bem isso aí,  Promotores e Delegados entram em choque justamente por isso, eles querem o perfil jurídico somente para eles enquanto que para nós...” (Kriguer)

“Quem são os Delegados que têm penetração lá no Gabinete com o Carvalho...:?” (Felipe)

“O Wanderley Redondo não sai de lá, o Rachadel também, o Lipinski..., eles estão sempre lá com ele...” (Krieger)

“O Redondo não sai lá do gabinete, todo mundo sabe disso!” (Braga)

“Mas Krieger e esse Paulo Koerich, afinal como é que um Delegado Substituto desconhecido veio ser o Chefe de Gabinete dele?” (Felipe)

“O Paulo foi aluno dele na faculdade, depois  foi estagiário no Fórum e criou-se essa relação e quando o Carvalho foi escolhido, convidou-o para trabalhar no Gabinete com ele...”.  (Krieger)

“E o Cid Goulart, parece ser boa gente, não?” (Felipe)

“Sim. Esse é boa gente!” (Krieger)

“Mas como é que o Carvalho foi convidar justamente o Cid para ser Consultor Jurídico?” (Felipe)

“O Cid tem uma irmã que é casada com o Jorginho, irmão do Juliano, Juiz lá em Blumenau e o Carvalho não saia da casa do Jorginho e aí fizeram amizade”.  (Krieger)

“Tu estais falando do Jorge Schaffer Martins, do irmão dele o Nelson Schaefer?”

“Sim, esses mesmos que são, inclusive, meus parentes”.  (Kriguer)

“Mas o Secretário parece ter muita penetração no Tribunal de Justiça, ele estava falando que se o Moretto assinasse a portaria suspendendo as promoções seria melhor porque ele conversaria com o Carlin na Vara da Fazenda..., realmente ele tem esse bom relacionamento que diz ter?” (Felipe)

“Sim. Ele consegue o que ele quer lá dentro, tem muito relacionamento, o pessoal respeita muito ele e sabe o que ele está querendo? Ele está preparando todo o terreno para ir a Desembargador, é o sonho dele, pode anotar isso, ele estava fazendo toda esse trabalho na mídia, aparecendo direto na imprensa porque está preparando o terreno e vai chegar lá, podem escrever!” (Krieger)

“Eu falei para o Felipe, o homem não sai mais dos jornais, todo dia sai nota sobre ele na imprensa, é muito esperto mesmo e só notas boas”.  (Braga)

“Ele passa o dia todo com a televisão ligada, ao meio dia é o passa tempo dele, vê todos os noticiários, não perde nada, a gente entra na sala dele e ele está com a televisão ligada, lê todos os jornais, está atento a todo o noticiário,  e telefona para os repórteres, comentaristas, não perde nada...!” (Krieger)

“Eu disse para o Felipe, o homem é muito esperto,  tenho que admitir isso!” (Braga)

“E o Teixeira? Que decepção, heim? E ele me disse que emplacou o Carvalho, sabiam disso?” (Kriguer)

“O Julio te disse isso, que foi ele que colocou o Carvalho, foi pessoalmente?” (Felipe)

“Não. Foi pelo telefone. Na época eu estava mantendo contato com ele e me disse que tinha emplacado o Carvalho”. (Krieger)

“Mas Krieger tu dissestes que ele é um man. de pessoas, por quê?”(Felipe)

“Ele é muito inteligente, habilidoso, pode ter certeza que é muito forte, nem o Amin  consegue mexer com ele mais, podem ter certeza!” (Kriguer)

“O Braga, e o Heitor Sché, tens tido contato com ele?” (Felipe)

“O Heitor está morto! Não se elege nunca mais”. (Braga)

“Agora Felipe eu não entendo uma coisa se tu és um cara tão inteligente como eu sei que tu és, se o Secretário te chama lá no gabinete...” (Braga)

(...)”.

Horário: 22:30 horas, “Os templários”:

Krieger convidou eu e Braga para ingressar numa organização voltada para ações filantrópicas, especialmente na área da saúde, tratava-se dos  templários, cujo batismo deveria ocorrer na Áustria, com possibilidades de participação em cursos. Logo imaginei se Krieger teria feito esse mesmo convite para Carvalho...

Agradeci o convite, disse que me sentia honrado, especialmente, porque partiu de uma amigo, mas que prezava muito a minha liberdade e isso poderia comprometer ainda mais o meu tempo que já é escasso. Braga declinou também desse convite.

E depois disso entendi que era hora de bater em retirada. Braga ainda comentava que gostaria que nossas reuniões devessem continuar e que não tem saído de casa, tinha pouco contato para falar de polícia, o que mais gostava. Me questionei se seria esse realmente o nosso último encontro, parecia que era para valer diante da falta dos “amigos”, cada qual dos faltantes dentro dos seus respectivos quadrados, cheios de razão, verdades... absolutos nas suas justificativas, menos nós?