Data: 04.01.99, horário: 17:00 horas, “Ad Perpetuam Rei Memoriam”:

Wilmar Domingues esteve na “sala de reuniões” da Delegacia-Geral a fim de se inteirar das novidades:

“(...)

  • Doutor, não vi o senhor lá na posse ontem na Academia? (Wilmar)
  • É, eu não fui, realmente, fiquei sabendo na última hora.
  • Ah, mas deveria ter ido lá.
  • Tudo bem, mas o Moretto sabe que conta comigo, ele é uma boa pessoa e já deveria ter  gente demais lá.
  • Olha, já pensou se tudo mundo pensasse assim, acabava não indo ninguém.
  • É, mas é que tem muita gente que quer ser lembrada nestas horas, não é?

(...)”.

Alertei Wilmar que com relação aquela informação sobre bicheiros que envolveria... mais tarde ele saberia de tudo, como aconteceu..., bastaria para tanto ler um livro que futuramente será lançado que iria tratar sobre os acontecimentos que ocorreram no ano de 1998, a luta pelo poder... Wilmar ficou entusiasmado com a novidade e fez questão de registrar:

  • Um exemplar é meu, já vou deixar reservado!
  • Pode deixar, é só aguardar!
  • Bom, quer dizer que não dá para falar mais nada perto do doutor?
  • Não Wilmar, o livro já foi encerrado, agora pode falar tudo que não tem problema.

(...)”.

Depois disso Wilmar me entregou a cópia do Ofício n. 099/98, datado de 10 de dezembro de 1998, dirigido ao Corregedor-Geral da Polícia Civil:

ESTADO DE SANTA CATARINA

SECRETARIA DA SEGURAÇA PÚBLICA

DIRETORIA ESTADUAL DE INVESTIGAÇÕES CRIMINAIS/DEIC

Ofício n. 099/98                                       Florianópolis, 10 e Dezembro de 1998

Marginal/ vagabundo algum conspurcará minha honorabilidade/ minha nobre carreira de Policial Civil abraçada com entusiasmo, ciosidade, senso de justiça e abnegação desde o ano de 1968 (pioneiro/primeira turma do Curso de Formação de Policiais Civis/Comissário da Polícia Academia da Polícia Civil), sem mácula alguma ao longo desses 30 (trinta) anos de ciosa atividade policial/consciência profissional, repito, quer na nobre missão de Comissário de Polícia (1968 a 1978), quer como Autoridade Policial/Delegado de Polícia (1978 em diante).

Denúncias caluniosas e sórdidas desse tipo, Sr. Corregedor Geral, jamais me esmorecerão e tenha certeza que ‘estourarei’/ fecharei esses antros/bancas de ‘Jogo do Bicho’, focos criminógenos que são, toda vez que deles tiver concludente notícia de funcionamento nalgum local, seja de propriedade desse marginal ou de outro qualquer, mormente  quando precedida de ameaças.

Também não hesitarei, Senhor Corregedor Geral, em ‘estourar’/fechar, com rigor devido, ponto de apostas do jogo/LOTÉRICO, de propriedade de cônjuge de policial, mormente em se tratando de Delegado de Polícia, que ouse afrontar as leis e colocar em cheque o bom nome da Instituição Policial Civil.

Senhor Corregedor Geral,

Atendendo promoção exarada no documento/representação da lavra do Dr. Nelson João Pimentel Ziliotto, patrono/advogado do contraventor Moacir Osmar Vidal, endereçada a esse órgão correicional, cumpre-me encaminhar a Vossa Senhoria, documentação pertinente à incursão/operação policial realizada sob o meu comando, no dia 18.09.98, redundando/resultando no fechamento da banca de ‘Jogo do Bicho’ Kina de Ouro, de propriedade do contumaz/refratário contraventor suso nominado.

(...)

Também, com isenção, Sr. Corregedor Geral, após denúncias insinuantes, a Polícia Civil fechou ponto de apostas do ‘Jogo do Bicho’ que funcionava em Lotérica de parentes próximos (esposa e sobrinho) do Delegado de Polícia/Doutor W. R., conforme Inquérito Policial n. 007/94-CPP, encaminhado ao Fórum em 28.12.94 e distribuído à 3a Vara Crime da Capital, cópia fotostática em anexo.

Para finalizar esta primeira contradita à falsa/leviana/execrável acusação assacada contra minha pessoa pelo marginal em tela, o qual restou denunciado pelo Ministério Público junto à 1a Vara Crime da Capital por tentativa de homicídio no Inquérito Policial retro citado, e botar por terra toda e qualquer conotação pessoal/desavença que está querendo dar a inédita e exitosa operação de 1994, por mim comandada, realço o saldo do desdobramento das investigações/operações que, além do desmantelamento/estouro da Mega organização CATARININHA, Prisão Temporária e indiciamento de seus associados pelos crimes alhures citados, redundaram no fechamento, também, de 11 (onze) bancas do ‘Jogo do Bicho’, - quase todos os banqueiros passaram a bancar o jogo de per se após o desmantelamento - , dentre elas a de Moacir Osmar Vidal, então instalada no Jardim Atlântico; 12 (doze) pontos de apostas do ‘Jogo do Bicho’ informatizados; e, apreensão de 57 (cinqüenta e sete) máquinas de vídeo-bicho, 32 (trinta e duas) motocicletas, 11 (onze) armas de fogo/Escopeta Carabina, pistolas e revólveres, - dois deles furtados, sendo um deles patrimônio da SSP -, e quase duas dezenas de micro-computadores e aprelhos FAX.

(...)

Marginal/vagabundo algum conspurcará minha honorabilidade/ minha nobre carreira de Policial Civil abraçada com entusiamo, ciosidade, senso de justiça e abnegação desde o ano de 1968 (pioneiro/primeira turma do Curso de Formação de Policiais Civis/Comissário da Polícia Academia da Polícia Civil), sem mácula alguma ao longo desses 30 (trinta) anos de ciosa atividade policial/consciência profissional, repito, quer na nobre missão de Comissário de Polícia (1968 a 1978), quer como Autoriade Policial/Delegado de Polícia (1978 em diante).

Ainda concernente à última operação policial/Setembro-98, quero consignar/repudiar, Senhor Corregedor Geral, ad perpetuam rei memoriam, - resguardar direitos-, primeiro, a condenável postura da Delegada de Polícia Sandra Mara Pereira/8a. DP – Capoeiras, ao esquivar-se/ negar-se em dar apoio a este signatário, - previamente acordado, vez que a banca do ‘Jogo do Bicho’ se situava em sua área circunscricional -, cujo apoio consistiria em deslocamento de viatura e dois policiais, bem como a lavratura de TC, alegando, pasme, que havia recebido orientação nesse sentido do Diretor de Polícia do Litoral.

Segundo, mais estarrecedor ainda, é que soube através do Dr.Douglas Marreiros/3a DP-Estreito, que determinação semelhante fora-lhe dada pelo Diretor de Polícia do Litoral, sobrelevando notar que referido Delegado de Polícia nem sequer tinha ciência da operação deflagrada.

Essas, Senhor Corregedor-Geral, em princípio, as indeclináveis informações que presto a Vossa Senhoria.

Sendo só o que se me apresenta para o momento, reitero votos de apreço e consideração.

Atenciosamente.

Wilmar Domingues

Delegado de Polícia Especial

DEIC

Ao

Doutor José Guayanaz de Lima

Delegado de Polícia – Corregedor Geral da Polícia Civil

NESTA

“O que desce desce quadrado”:

E lendo o ofício de Wilmar, lembrei que alguns dias antes das eleições de outubro/98 estava na sala do Osnelito sozinho, encostado numa parede lendo jornal, nessa época, no final de tarde,  aquele local às vezes era um deserto,  nenhuma alma viva, quase todos já tinham ido embora. E, estava eu ali sentado num canto em pleno silêncio, quando ouvi duas mulheres recém-chegadas conversando na janela frontal da sala ao lado e, sem que elas me vissem,  não pude deixar de ouvir o que falavam, mesmo porque a porta estava aberta e as divisórias na parte superior possuem aberturas para ventilação. Uma delas dizia: “...Mas o que eu faço, estou tão nervosa, ele pediu que eu fornecesse o documento atestando que esse cabo eleitoral do Julio não tem antecedentes, mas ele tem,  eu já verifiquei, e mesmo assim ele pediu para que eu passe para o Schmidt o documento como se não tivesse que ele não vai verificar nada. Eu estou muito preocupada, não quero fazer isso, estou nervosa, ele tem me telefonado e insistido, disse que vai mandar no próximo governo, aí eu fico naquela se ficar o bicho pega se correr o bicho come...”.  E também ouvi a outra policial responder que existia o certo e o errado e que ela não deveria fazer o errado, trair a confiança de seus superiores, mesmo que isso descesse quadrado, mas ela ficaria bem com a sua consciência. E, logo em seguida um telefone tocou lá no fundo do andar térreo, para o lado da Gerência de Armas e Munições, sob a  direção do Delegado Schmidt e aquelas duas servidoras abandonam o local reservado onde conversavam sem notar a minha presença, enquanto eu de fino retornei para o “meu local reservado” no segundo andar, sem ter o que pensar e no que poderia ser capaz de descer tão quadrado ao ponto de engasgar aquela pobre policial sob intensa pressão... 

Horário: 19:30 horas, “A Leiteira de Leninha”:

Resolvi ir até a residência de Jorge Xavier para colocá-lo a par  dos acontecimentos envolvendo a tentativa de conversar com Julio Teixeira. Foi  Francine que me atendeu e logo ao entrar visualizei Jorge Xavier sem camisa sentado na mesa da cozinha tomando café, acompanhado de seu sogro e sogra. Quando soube da minha chegada foi rapidamente pegar uma camisa:

  • Não Jorge, fica à vontade, fica sem camisa mesmo, que quê é isso?
  • Estamos meio improvisados hoje.
  • Tudo bem, tudo bem!

E fui tomar acento na mesa da cozinha, enquanto Leninha se aligeirava e preparava um café.

  • Pô! Leninha não criasse vergonha ainda, não comprastes uma "leiteira" decente para as visitas?

Como nas vezes anteriores  Leninha havia improvisado mais uma vez uma leiteira, alternando hora com os “vidrões” de nescafé e agora num copo de vidro próprio para tomar água. Jorge me fixou tentando ler se eu estava falando sério e merecia uma resposta à altura ou se deixava tudo passar batido. Leninha preferiu parecer fina diante das minhas observações e antes que pairasse qualquer dúvida:

  • Leninha, tu sabes que eu estou brincando, é que eu aqui me sindo em casa!

Depois disso todos se sentiram mais à vontade e o que eu disse era a mais pura verdade.

“Caso Julio Teixeira: a prova dos nove:

E entramos direto no assunto principal:

  • Jorge, tentei uma dez vezes falar com o Julio e acho que ele nem quis me atender, numa das ligações quando ouviu a minha voz no telefone desligou bruscamente, depois tentei novamente e dava fora de área ou desligado, fui tentando e Julio não sabia que eu tinha o seu número novo de celular que o Krieger nos repassou na noite do nosso jantar, lembra?
  • O quê? Ele fez isso? S. v.! (Leninha)

E Jorge Xavier deixou escapar aquele seu sorriso irônico:

  • Ele fez isso? E, aí fica difícil. (Jorge).
  • Falei com o Knaesel e ele disse que quanto ao veto do nome do Julio para Secretário Adjunto não teve nada haver com a PM, coisa nenhuma, é “grupo” dele. O Knaesel disse que foi o Heitor que vetou o nome do Julio.
  • Bom, já que o Julio vetou o nome do Heitor para Secretário, então foi dado o troco, o nome do Julio também foi vetado para Adjunto. (Felipe)
  • É isso aí! Olha Jorge tentei dez vezes falar hoje com o Julio.
  • Eu não acredito que esse Julio tenha feito isso? (Leninha proferindo uma série de impropérios impublicáveis contra o ex-parlamentar)
  • É, foi isso, custo a acreditar, mas é a pura verdade. (Felipe)
  • Eu nunca confiei nesse Julio. (Leninha)
  • É, a Leninha nunca confiou nele. (Jorge)
  • Nós tivemos que confiar e eu agradeço ao Jorge por ele ter insistido para que eu tentasse falar com ele mais uma vez, só assim pude conhecer a sua verdadeira face, fico triste pela pequenez dele, mas em política é assim mesmo. (Felipe)
  • “Pequenez” mesmo, eu nunca vi, com é que pode uma pessoa ser tão baixa, tão pequena? (Jorge)
  • É a política, e me admiro também com a situação do Knaesel, ficou pequeno,  ele que foi o mais votado do partido, o terceiro mais votado no cômputo geral,  acho que foi mesmo boicotado pelo Gilson dos Santos. (Felipe)
  • Gilson dos Santos o quê? Foi coisa do “Vieirão”! (Jorge)
  • Vieirão, que “Vieirão”, Jorge? (Felipe)
  • Sim, ele para aceitar a “Fazenda” exigiu carta branca, ele é fogo, não brinca e o Amin teve que aceitar. (Jorge)
  • Agora começo a entender, o Vânio Bosle deu um pau nele lá no comentário político de hoje, chamou ele de beiço torcido, sim, o Knaesel, tu vê! (Felipe)
  • Ele disse isso, eu não soube. (Jorge)
  • Foi sim, disse que o Knaesel no dia da posse estava de beiço torcido porque não conseguiu colocar um apradinhado na Fazenda, pode? (Felipe)
  • O Knesel ficou perplexo, perguntou sobre como estava o nosso “Plano” e eu disse que nós ficamos fora de tudo, ele não acreditou, disse que iria falar com o “Carvalho” e que depois me daria um retorno. (Jorge)
  • E tu vais telefonar para ele? Eu vou aguardar então.  (Felipe)

(...)

E Jorge Xavier tentou fazer um contato com Knaesel e seu telefone uma hora dava fora de área e outra hora dava ocupado. E Jorge ainda comentou que o parlamentar fazia contatos e depois desligava o telefone:  

  • Acho que vou ligar para o Julio. (Jorge)
  • Isso, tenta, tenta, só prá gente medir a pressão. (Felipe)
  • Tens o novo número do celular dele? (Jorge)
  • Sim, um momento,  aqui está... (Felipe)

E em seguida Jorge Xavier ligou para o número indicado:

  • Alô! Alô!
  • Julio é o Jorge!

E bruscamente o telefone é desligado. Jorge Xavier pareceu não acreditar, ficou empalidecido, e “Leninha” incrédula com a sua “leiteira” improvisada na mão mudou de cor, passou externar na sua face um misto de ódio e raiva: .

  • E vocês ainda tiveram a coragem de ligar para esse s.v., v. f.d.p.? (Leninha)
  • O quê? Ele desligou na minha cara, e tenho certeza que quando ele viu eu me identificar, logo depois que eu disse que era o Jorge, ele não quis atender de propósito, fugiu! Mas o que ele está pensando? (Jorge)
  • Eu não te disse, até fico contente que isso tenha acontecido contigo também Jorge, porque se não poderia ainda pairar alguma dúvida. (Felipe)
  • Sim, eu até cheguei a pensar que poderia ter sido algum problema de linha. (Jorge)
  • Jorge tu me conheces, tu sabes que eu não iria inventar uma história dessas, ou me enganar assim facilmente, não ligo mais para ele, deu! (Felipe)
  • É, o que a gente queria é que ele desse uma satisfação para nós. (Jorge)
  • Sim, só isso, nós entenderíamos a situação dele, mas não querer falar conosco, mas tenta de novo Jorge, tenta, insiste! (Felipe)
  • Vou tentar! (Jorge)
  • O quê? Eu não acredito que vocês vão tentar telefonar de novo para esse c.  (Leninha)
  • Sim, tenta de novo Jorge! (Felipe)

(...)

E Jorge ao tentar falar com Julio recebeu aquela mensagem eletrônica que dizia que o telefone se encontrava fora da área de serviço ou desligado.

  • Olha, e ele pensa que consegue me enganar? (Jorge)
  • Existe um macete para saber se o telefone está realmente desligado ou se foi desligado propositalmente, se a ligação demorar a chamar... (Francine)
  • Eu estou muito bem, me preparei desde o início para isso, era previsível e é lastimável, que pobreza de espírito. (Felipe)

(...)”.

“Pragmatísmo Leninhista”:

Deixei a casa de Jorge Xavier e seus familiares pensando na maga “Tereza” e num possível encontro épico dela com “Leninha”? Quantas ilusões, esperanças... e agora estava ali “Leninha” com sua “leiteira” e, distante, a fada e anjo salvador  Julio Teixeira com suas dores, temores, medos... E, também, nessa hora pensei em Guinevere, sobre lendas, sonhos, luzes e todas elas pareciam longe, sumiam... e só escuridão e trevas. “Leninha” com seus ares “bruxólicos”, uma senhora sem mais os predicados da jovialidade, depressiva, dizia com furor verdades aos trancos como se fosse sinais de tempos apocalípticos, tal como a deusa grega Themis já entrando na terceira idade, capaz de digladiar com as palavras que nos conduzia a uma realidade cruel que eram capazes de nos tirar definitivamente daquele sonho profundo que parecia não ter fim. Ao final, pensei na sua figura emblemática, segurando a sua “leiteira” contendo conteúdo fervente, com a mão firme e seus dedos grudados no entorno do vidro, pronta para arremessar pelo espaço como se quisesse atingir um alvo fictício, um mero detalhe diante do pragmatismo de suas palavras permeadas por requintes de sua ultra sensibilidade em defesa das pessoas que lhes eram muito caras.