Data: 30.12.98, horário: 08:20 horas:

Estava ainda na cama... era algo incomum... e o Delegado Wilmar me telefonou ..

  • Doutor Felipe!
  • Oi Wilmar.
  • Estava dormindo?
  • Não, não, mas e daí?
  • Já leu aquele documento?
  • Ainda não, não tive tempo, é tanta coisa para se ler.
  • Mas poderia dizer para mim se o Wanderley Redondo chegou a comentar alguma coisa sobre aquele assunto com o Secretário?
  • Não, não sei, é aquilo que eu te disse, foi no meio de uma conversa e ele fez umas considerações.
  • Mas foi sobre aquilo?
  • É, mais ou menos, ele fez uma referência, mas não esquenta a cabeça  com isso.
  • Mas lendo aquele documento vai entender, é tudo em razão do que ocorreu em 1994...
  • Sim...
  • Mas a tarde vai estar lá naquele lugar?
  • Sim. A partir das dezesseis horas estou lá no “salão”, na sala da galeria dos ex-Chefes de Polícia.
  • Eu apareço lá.
  • Está bom Wilmar. Eu aguardo.
  • Certo. Um abraço.
  • Outro.

Naquele momento não poderia abrir o jogo para Wilmar, poderia criar um grande problema e lembrei que futuramente ele saberia como é surgiu essa informação acerca de b., e o que Redondo teria dito sobre ele, mas na era hora.

Horário: 10:00 horas, “Quartel General”:

Valter Genovez, meu primo e Comissário de Polícia de Araranguá me telefonou:

(...)

  • E daí doutor, como estão as coisas?
  • Sem novidades, é o que todo mundo já sabe, o Moretto vai ser o Delegado-Geral e eu estou de fora.
  • Sim.
  • E tu, como é que está, pretendes alguma coisa?
  • Não sei, acho que uma Distrital e aí eu fico prestando serviço numa Delegacia aqui da Comarca, o problema é que a Lúcia colocou um monte de PMs nas distritais e está todo mundo aí em Florianópolis, ninguém acha os Distritais.
  • É, infelizmente.
  • Escuta, e o Redondo?
  • Dizem que está mandando, parece que vai ser o diretor do Detran.
  • Ah, é?
  • E o pessoal aí em Araranguá como é que está o clima?
  • O pessoal está na expectativa, querem mudanças.
  • E a Regional aí de Araranguá?
  • Aqui estão brigando, tem três Delegados que querem, mas parece que vai ser o Adalto, ele é lá de Criciúma.
  • Sei quem é, e lá em Criciúma?
  • Bom, lá é um Delegado que é do PSDB, ele é vereador, foi candidato.
  • Ah, sei, é o Bona.
  • Isso! Ele é que vai ser o Regional. Escuta tem o celular do Redondo?
  • Não. Mas isso é fácil de conseguir, telefona lá para a Oitava Delegacia e  eles te dão.
  • Eu já sei, vou telefonar aqui para Urussanga, ali eles sabem, era o quartel general dele?
  • Como?
  • É, ele trabalhou para o Julio ali, e foi ali na região que ele conseguiu bastante votos, o Artur Nitz que é Delegado trabalhou um monte para ele. Tu não conheces o Artur?
  • Não, não me lembro.
  • Ele quer retornar para a região de Camboriú, ele é de lá.
  • Certo!

(...)”.

Horário: 16:40 horas:

Telefonei para a residência de “Marquinhos” para saber dos preparativos do Jantar, já tinha telefonado para o Celito Cordiole que não poderia ir porque hoje à noite tem o aniversário da sua irmã e não consegui contatar com o Doutor Lima...:

  • Alô!
  • Marquinhos, e daí como estão as coisas?

(...)

  • Ó, a Rita falou que o Secretário Adjunto não vai ser mais o Julio Teixeira.
  • Isso era bem provável, estava difícil mesmo.
  • Que pena! Parece que saiu no jornal "O Estado" ou ‘" Notícia" de hoje.
  • É mesmo?
  • Sim!

(...)".

Horário: 17:00 horas, "Ovo da Serpente":

E não pude deixar de sair rapidamente em busca dos jornais daquele dia, a fim confirmar a informação de “Marquinhos”. Na volta encontrei o Delegado Carlos Andretti da 9a Delegacia da Capital. Ele estava sentado na mureta em frente ao edifício Pérola Negra (Av. Osmar Cunha – Centro de Florianópolis) que ficava ao lado da Delegacia-Geral. Andretti estava aguardando o motorista que havia entrado para levar uma correspondência e pude perceber que ele me olhava com um olhar diferente das outras vezes, parecia cansado, desgastado, bem diferente daquele Andretti dos tempos de Chapecó, quando trabalhamos juntos na Delegacia da Comarca. Pude observar ainda um respiro do seu estilo jovial de baterista de banda, só que parecia estar mais para ouvir do que para falar. Apesar de tudo parecia passar sinceridade nos seus gestos e palavras, entretanto, ficava aquele mar de dúvidas e incertezas:

  • E daí Andretti?
  • Oi Felipe!

(...)

E ele não se levantou, continuou sentado, dando a impressão de cansado:

  • Quais são as novidades, você que é um homem bem informado?
  • Não. O que eu sei todo mundo sabe.
  • Que quê é isso, sabe sim!
  • Não. Eu sei o que os jornais já publicaram, que o Moretto vai ser o Delegado-Geral, o Maurício parece que vai ser o “DPI”, o Redondo está se articulando para ser o Diretor do Detran, é isso!

(...)”.

Andretti faz um sinal de quem concordava com o que eu estava afirmando e antes que ele perguntasse:

  • Bom, não estou pleiteando nada, trabalhei naquele projeto, mas o Julio não se elegeu e ele foi para o saco, então estou fora, nunca pedi cargo algum,  sempre combati isso e como Delegado Especial prefiro continuar fazendo o meu trabalho, pesquisando, escrevendo, é a minha contribuição. Mas se mudar e o Moretto me convocar para alguma coisa, como tu sabes convocação é convocação, eu me sinto preparado para enfrentar qualquer situação. Só que eu espero que haja um mínimo de respeito por ser Delegado Especial. Você vê Andretti na Magistratura chega-se a Desembargador e não há rebaixamento, no Ministério Público o promotor chega a Procurador e não pode ser mais rebaixado, na Polícia Militar chega-se a Coronel e vai ocupar um cargo de direção, numa função condizente com a dignidade do seu cargo, agora só na Polícia Civil que é como na cassa da “mãe Joana”, é uma bagunça!
  • Ah, sim, mas essa bagunça é generalizada, todo o Executivo é assim!
  • Não! Eu te citei o exemplo da Polícia Militar, eles institucionalmente estão muito na frente, lá existe hierarquia, no Judiciário e no Ministério Público é a mesma coisa.
  • Tu achas isso?
  • Sim. Não tenho dúvidas, o problema dos Coronéis é salarial. Se se der aumento para os oficiais há um berreiro geral e eles são milhares, são mais de treze mil na ativa e tem ainda os inativos. Mas lá existe critérios, não vê o Coronel Walmor Backes, ele é Diretor de Ensino e Pesquisa no atual governo do PMDB, muito embora seja filiado ao PPB e amigo do Amin. Agora vai ser o Comandante-Geral da PM.
  • É, mas eu já fechei o meu tempo de serviço, estou indo para casa.
  • Que coisa boa, eu ainda tenho que penar no mínimo mais uns dez anos.
  • Isso é bom, pelo menos vou ver ainda um amigo que tem uma cabeça privilegiada fazer alguma coisa de bom pela instituição.
  • É, enquanto vocês estão em casa, nós é que vamos ter que segurar a peteca e toda essa politicagem que existe na disputa de cargos, onde ninguém respeita ninguém. Se eu e você Andretti estamos disputando um cargo deixa de existir amizade, vale a lei do quem pode mais e esse talvez seja o grande “ovo da serpente”, uma das formas como nós estamos matando nossa instituição e esses “cabeças de bagre” não enxergam isso.

Andretti se levantou, deu um forte abraço e deixou um sorriso, desejando um um feliz ano novo. Nesse clima me despedi, deixando o recado que ele saberia onde me encontrar.